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Psicoterapias psicodinâmicas breves: propostas atuais

RESENHA

Psicoterapias psicodinâmicas breves: propostas atuais1 1 . Resenha do livro Psicoterapias psicodinâmicas breves: propostas atuais, de autoria de Elisa M. P. Yoshida & Maria Leonor E. Enéas, publicado em 2004, em Campinas, pela Editora Alínea.

Tales Vilela Santeiro

Universidade de Franca

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Saldanha Marinho, 2310, sala 11 (São José) Franca, SP; CEP: 14403-120 Tel.: (16) 3723-3989 E-mail: talessanteiro@hotmail.com

O livro organizado por Elisa Medici Pizão Yoshida e Maria Leonor Espinosa Enéas reúne textos sobre as psicoterapias psicodinâmicas breves (PPBs), em algumas de suas propostas praticadas na atualidade, nos cenários brasileiro e estrangeiro, com ênfase no latino-americano.

Elisa M. P. Yoshida é docente do Programa de Pós-Graduação e da Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas; Maria Leonor E. Enéas vincula-se ao Curso de Graduação em Psicologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. As organizadoras são, ainda, psicólogas clínicas e supervisoras com extensa prática no domínio das PPBs. Ambas integram um grupo de pesquisas do Diretório do CNPq, dedicado às PPBs e à validação de instrumentos de medida psicológica para a realidade brasileira.

Embora concebidas a partir de conceitos e técnicas decorrentes da psicanálise, desde suas origens, as PPBs diferenciam-se de sua matriz, essencialmente porque se centram na definição prévia do tempo e dos objetivos do tratamento. Desde meados dos anos 40, momento em que se desprenderam em definitivo da psicanálise tradicional, até os dias atuais, muito evoluiu e se modificou nas PPBs, seja do ponto de vista teórico, técnico ou prático. O livro se propõe, ao longo de seus nove capítulos, a dar conta de parcela dessas mudanças, principalmente aquelas surgidas nas últimas duas décadas. Para tanto, as organizadoras, além de assinarem alguns capítulos, convidaram pessoas reconhecidas por seus trabalhos de pesquisa e prática em PPB, o que incluiu profissionais brasileiros, chilenos e uruguaios.

O Capítulo 1, escrito por Elisa Yoshida, é um texto teórico, no qual é traçado um perfil da evolução das PPBs, focalizando seu surgimento e seu desenvolvimento ao longo do tempo. Ao fazê-lo, organiza a exposição de forma que contemple as diversas gerações de autores. Refere-se a autores de PBP que se situam no modelo pulsional/estrutural – descarga do impulso – e que constituiriam a primeira geração, tais como David Malan, Habib Davanloo e Peter Sifneos. Apresenta também os autores da segunda geração, que se guiam pelo modelo relacional – como o homem se relaciona consigo e com outros – do qual são representantes pesquisadores como Lester Luborsky, Paul Crits-Christoph e Cláudio L. Eizirik. Por fim, caracterizando a terceira geração de autores, estariam aqueles alinhados ao modelo integrativo – transcender limites de abordagens distintas e aprender com elas – entre os quais destacam-se James Mann, Mauricio Knobel e as próprias organizadoras do livro.

Os Capítulos 2 e 3 também tratam de exposições teóricas. Em ambos os textos as autoras relatam experiências de grupos de pesquisadores norte-americanos, que têm exercido forte influência no campo das pesquisas e práticas em PPBs e sobre os quais é escassa a literatura no idioma português.

No Capítulo 2, Maria Leonor Enéas enfoca o grupo liderado por Hans Strupp, pesquisador da Universidade Vanderbilt e expoente da Terapia Dinâmica de Tempo Limitado. Desde a década de 1970, esse grupo tem conduzido inúmeras pesquisas sobre processos e resultados em psicoterapias. Investigações sobre quais fatores influenciam os resultados de uma psicoterapia, se os específicos (técnicos) ou inespecíficos (interpessoais), são grandes contribuições decorrentes destes estudos, ao apontar, por exemplo, que os fatores não específicos determinam a qualidade geral dos resultados obtidos em uma psicoterapia.

No terceiro capítulo, Glaucia da Rocha discute o grupo liderado por Lester Luborsky, pesquisador da Universidade da Pensilvânia e que defende a Terapia Suportivo-Expressiva. O Método do Tema Central de Relacionamento Conflituoso (Core Conflictual Relationship Theme Method) é enfatizado para definição do foco desta psicoterapia, já que se acredita que o paciente, via transferência, ativa seu padrão central de relacionamento, construído por modos de se relacionar com pessoas significativas de sua vida pregressa e atual. Embora os grupos focalizados nos Capítulos 2 e 3 apresentem algumas divergências, têm em comum o fato de priorizarem a relação paciente-terapeuta, como elemento central para realização de um diagnóstico, e sobre a qual se assentam o foco da psicoterapia e a possibilidade de obtenção de mudanças psicológicas.

Nos dois capítulos seguintes são expostas propostas de pesquisadores de países latino-americanos: no Capítulo 4 encontra-se o relato do Grupo de Santiago do Chile, e no Capítulo 5, as experiências do Instituto Ágora, de Montevideo, no Uruguai. Nos dois casos fica marcada uma proximidade entre as propostas apresentadas e algumas das experiências de profissionais brasileiros.

No Capítulo 4, escrito por Guillermo de la Parra, é relatada uma adversidade bastante comum também no meio brasileiro, que é a questão do índice de desistência nos serviços de psicoterapia oferecidos em instituições, o que muitas vezes, decorre de uma inadaptação da técnica ao paciente. Diante desse tipo de peculiaridade, é sugerido como imprescindível no contexto psicoterápico tornar cada momento minimamente proveitoso para a pessoa em sofrimento, de modo que as adaptações técnicas do terapeuta a cada casa específico é que sejam engendradas, e não o contrário.

No Capítulo 5, Denise Defey, Juan H. Elizalde e Jorge Rivera evidenciam uma outra característica de relevo, a qual perpassa todo o conteúdo do livro de modo implícito: a criatividade do terapeuta como aspecto técnico necessário à prática das PPBs. As autoras discutem, por exemplo, o término de um processo de PB, que tem sido tópico controverso entre autores do campo; alegam que um tratamento deve ser encerrado não apenas em função do tempo "cronológico", – mentalidade que perdurou entre os primeiros praticantes e autores – mas sim porque as necessidades do paciente e o contratado com o terapeuta foram contemplados ao longo do tratamento.

No Capítulo 6, escrito por Vera Lemgruber, Andréa Junqueira, Ana Stingel e Elizabeth Agostini, são relatadas experiências do grupo liderado por Lemgruber e que desenvolve a Psicoterapia Psicodinâmica Breve Integrada, uma proposta em parceria da Organização Mundial da Saúde e do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro. São discutidas questões contemporâneas relacionadas à integração entre psicoterapia e psicofarmacologia, dentre outras, com fundamento nos avanços das neurociências e ênfase no conceito de experiência emocional corretiva, proposto por Alexander e French (1946/1956) na década de 1940, e que ainda nos dias atuais ocupa papel central em muitas das propostas de PBP, incluindo as constantes nos demais capítulos do livro.

Nos Capítulos 7 e 8 são relatadas experiências decorrentes de atividades de ensino e pesquisa que constituíram o Núcleo de Estudos e Pesquisa em Psicoterapia Breve (NEPPB), entre 1987 e 2000, na cidade de São Paulo. No Capítulo 7, de autoria das organizadoras, estão especificados os trabalhos desenvolvidos junto à população adulta, e no Capítulo 8, de autoria de Tereza Iochico Hatae Mito e Elisa Yoshida, são descritas experiências sobre atendimentos clínicos a crianças e seus pais em PPB, contribuindo para o preenchimento de lacunas na escassa literatura brasileira nessa área. Embora com bases teóricas algo distintas, nos dois casos a teoria da eficácia da adaptação proposta por Ryad Simon (1989) embasa o entendimento e a prática da PPB. Nesses dois capítulos é interessante percorrer os bastidores do que venha a ser a criação e a sustentação de uma instituição de atendimento à população como o NEPPB, a qual aliou o ensino e a pesquisa de modo produtivo durante os anos de sua existência, promovendo discussões e avanços na construção de conhecimentos sobre as PPBs inseridas na realidade brasileira.

Por fim, no Capítulo 9, as organizadoras propõem uma síntese dos elementos comuns e peculiares a cada uma das propostas focalizadas no livro, delineando um panorama geral das contribuições dos diversos autores convidados. O diagnóstico, a valorização da qualidade da aliança terapêutica, o papel do psicoterapeuta no manejo da relação, a focalização dos processos e o manejo do término, dentre outras, são algumas das questões que alinhavam os diversos capítulos.

Faz-se necessário ressaltar o caráter didático que reveste a estrutura geral de todos os capítulos, o que facilita o entendimento dos textos, até mesmo para o leitor não experiente no terreno das PPBs. Tanto nos capítulos teóricos, quanto naqueles em que se focalizam as propostas de PPBs de seus autores originais, em geral, são considerados: a) os aspectos históricos e embasamento teórico; b) o processo de formulação do foco e dos objetivos do tratamento; c) os critérios de indicação e contra-indicação; d) os aspectos técnicos; e) as pesquisas empíricas que sustentam as diferentes propostas; f) exemplos clínicos e g) a avaliação crítica de cada uma das propostas, considerando suas vantagens e limitações.

A obra permite aos leitores dos mais diversos níveis, conhecer algumas propostas atuais em PPBs e o que elas disponibilizam em termos de pesquisas, teorias, técnicas e práticas que têm sido realizadas em vários contextos. Trata-se de referência oportuna ao psicólogo em formação, ao pesquisador e ao profissional, por demonstrar que o compromisso com a realidade sociocultural e com o bem-estar do homem é uma atitude indissociável nas PPBs. Ademais, no texto existe uma aproximação entre a possibilidade de articulação de diversas contribuições e de uma psicologia clínica empiricamente sustentada.

Referências

Alexander, F., & French, T. M. (1956). Psicoterapeutica psicoanalitica: principio y aplicación (L. Fabricant, Trad.). Buenos Aires: Paidós. (Original publicado em 1946)

Simon, R. (1989). Psicologia clínica preventiva: novos fundamentos. São Paulo: EPU.

Nota

Recebido em 10.nov.04

Revisado em 15.set.05

Aceito em 21.nov.05

Tales Vilela Santeiro, mestre em Psicologia Clínica e doutor em Psicologia como Profissão e Ciência, ambos pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas, é professor na Universidade de Franca.

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    . Resenha do livro
    Psicoterapias psicodinâmicas breves: propostas atuais, de autoria de Elisa M. P. Yoshida & Maria Leonor E. Enéas, publicado em 2004, em Campinas, pela Editora Alínea.
  • Endereço para correspondência:
    Rua Saldanha Marinho, 2310, sala 11 (São José)
    Franca, SP; CEP: 14403-120
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Fev 2007
    • Data do Fascículo
      Dez 2005
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