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Ensino de Psicologia

RESENHA

Ensino de Psicologia1 1 Resenha de Handbook of the teaching of Psychology, organizado por William Buskist e Stephen F. Davis e publicado pela Editora Blackwell, em 2006.

Geraldina Porto Witter

Universidade Camilo Castelo Branco

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: AV. Pedroso de Morais, 144/302 (Pinheiros) CEP: 05420-000. Tel./Fax: (11) 4796-5156 E-mail: gwitter@uol.com.br

Independentemente da área do conhecimento e da atuação profissional, está cada vez mais forte a necessidade de pesquisas, de revisões e inovações que permitam acompanhar e mesmo prever as mudanças decorrentes do avanço científico e do contexto social. Com a Psicologia ocorre o mesmo. O livro organizado por Buskist e Davis, Handbook of the teaching of psychology, traz uma contribuição substantiva para os que se ocupam, direta ou indiretamente, com o ensino da Psicologia, independentemente do enfoque teórico que adotem. É constituído por dez partes (57 capítulos), cada uma precedida de uma informação de seu objetivo, e inclui índice de autores e de conteúdo. O Prefácio foi redigido pelos próprios autores, que apresentam o ensino de Psicologia como uma área vibrante, rica e de grande vitalidade. Um exemplo é o livro que editaram com a colaboração de muitos pesquisadores norte-americanos, canadenses e europeus que atuam na área, cuja abrangência e sugestões são úteis a todos, independentemente do país em que trabalhem, pois é baseado em evidências.

A Parte I é composta por quatro capítulos que apresentam uma perspectiva ampla e os elementos básicos para o ensino da Psicologia. No primeiro capítulo, os organizadores enfocam o que os professores precisam saber sobre o ensino e a aprendizagem em termos básicos, para ir além da sala de aula e ser um professor mais eficiente, capaz de fazer o ensinar-aprender parecer fácil e natural. Bernard C. Beins lembra o fato do professor universitário que se dedica a uma área e ao mesmo tempo enfoca cientificamente o ensino da mesma ter um duplo papel ou seguir um duplo caminho. Considera difícil acreditar que "qualquer professor consciente de psicologia não tenha desenvolvido novas técnicas ou adaptado técnicas pedagógicas existentes" (p. 12). O capítulo de Thomas V. McGovern apresenta o currículo de Psicologia no Ensino Superior nos EUA e a evolução da disciplina Ensino de Psicologia, os resultados alcançados e perspectivas de desenvolvimento. Fechando esta parte, G. William Hill IV trata da Society for the Teaching of Psychology (STP), que é uma das primeiras divisões estabelecidas pela American Psychological Association (APA), em 1945. Rapidamente descreve sua evolução e serviços que oferece. No Brasil é necessário contar com mais pesquisas na área e só tardiamente foi criada uma associação voltada para o ensino, na década de 1990.

A Parte II trata do preparo para o ensino e é integrada por três capítulos, sendo o primeiro deles assinado por Anne-Marie Suddreth e Amy T. Galloway, que apresentam opções para planejamento de curso e desenvolvimento de currículo. Andrew Christopher trata dos cuidados para a escolha dos textos básicos e complementares para o ensino de qualquer disciplina. Sandra Goss Lucas enfoca a importância do primeiro dia de aula, o que é estabelecido com a classe e a necessidade de cumprir o definido, válido para todos os níveis de ensino.

Onze capítulos integram a Parte III, sobre tecnologias de ensino. No primeiro, Stephen H. Hobbs trata dos cuidados com a aula expositiva, técnica antiga, questionável que, não só sobrevive, mas predomina no cenário educacional, a despeito das inovações hoje disponíveis. Escrever em Psicologia é o tema do capítulo de Robin K. Morgan e David L Morgan, em que destacam a importância e os cuidados que se deve ter para ensinar o aluno a escrever textos na área. O trabalho em equipe para assegurar um bom ensino é o tema de Kenneth D. Keith, destacando a necessidade de estar preparado, ter coragem para discordar, dar tempo aos colegas, tratar da avaliação dos alunos e demonstrar entusiasmo. Em seguida, Tina Vazin e Phyllis Reile apresentam a aprendizagem colaborativa como uma estratégia para maximizar o potencial dos alunos para que tenham êxito. Trata-se de estratégia pouco usada e pesquisada no Brasil e que pode ser de grande valia especialmente no atendimento ao aluno menos preparado para o ensino superior. A aprendizagem por solução de problemas, surgida nos anos 60 do século passado, ainda pouco usada no Brasil, é o tema de Patrícia A. Connor-Greene, a qual apresenta a justificativa para seu uso, a logística para sua implementação, a escolha de problemas significativos e os benefícios de ensinar recorrendo a esta tecnologia. Em seguida, Heidé R. Riggio e Diane F. Halpern tratam de como tornar os alunos pensadores críticos. Partem do conceito do que é pensar criticamente, mostram suas relações com as emoções, o inconsciente, as influências sociais, o poder das evidências e o poder do comportamento. Outro método freqüentemente usado em sala de aula é a discussão, que muitas vezes é inadequadamente aplicada e que implica em uma ampla variedade de estratégias e de procedimentos, por vezes desconhecidos pelos professores brasileiros. Tracy E. Zinn e Bryan K. Saville cuidam deste assunto, lembrando a importância do preparo para a discussão, sua facilitação, saber fazer questões, avaliar a discussão e fazer o fechamento. Douglas A. Bernstein apresenta as bases para o professor ser eficiente ao fazer qualquer demonstração em sala de aula. O uso de programas como o PowerPoint como recurso de ensino vai se tornando cada vez mais freqüente, para o quê Timothy J. Huelsman aponta muitos problemas, que persistem, a despeito da popularidade desse recurso. Poderiam ser evitados se os docentes acompanhassem mais de perto as pesquisas na área e se preparassem adequadamente para usá-los, evitando problemas como os que desviam a atenção, prejudicam a memória seletiva, etc. A internet é outro recurso que está cada vez mais popular e é enfocada por Vincent W. Hevern com ênfase em homepages e e-mails.

A Parte IV foi estruturada em seis capítulos que continuam a discussão do uso de estratégias e táticas de ensino para situações especiais. O ensino em classes numerosas é considerado por Katherine Kipp e Steffen Pope Wilson, que dão pistas tecnológicas sobre o que fazer quando se tem um "oceano de faces" de pessoas a quem ensinar, situação comum no ensino superior brasileiro. Em seguida, Lauren Fruh VanSickle Scharff enfoca o uso de assistentes como recurso para melhoria da eficiência de cursos, especialmente em classes numerosas. Em muitas disciplinas o uso de laboratório é parte integrante do ensino. Esta situação é focalizada por Dana S. Dunn, que destaca a importância de estar bem definido o objetivo das experiências no que concerne à formação do aluno; há necessidade de ênfase no método científico e na prática real da pesquisa. A importância de desenvolver competência para o estudo independente é enfocado por Jeffrey S. Katz, Bradley R. Sturg, Kent D. Bodily e Michelle Hernandez que, além da estrutura conceitual, tratam de como dar início a esse desenvolvimento, as estratégias a serem usadas e do contexto de ensino, que muito carece de atenção no Brasil. Randall E. Osborne e Oren Renick consideram os serviços de aprendizagem, raramente encontrados no Brasil, com esta ou outra denominação, mas, que são de grande relevância no apoio ao aluno, na redução nas distâncias sociais e outras diferenças. O último capítulo trata do ensino à distância em Psicologia e é assinado por Mary N. Duell, que descreve critérios para verificar a conveniência de tais cursos, como desenvolver e integrar ao currículo disciplinas ministradas com esta tecnologia.

A Parte V apresenta seis capítulos que tratam do acompanhamento de alunos não tradicionais ou atípicos e começa com o trabalho de Cathy A. Grover que enfoca de forma geral a questão. No capítulo seguinte, David E. Johnson trata do ensino e o acompanhamento de pessoas com dificuldades físicas e mentais no contexto da vida universitária, as exigências legais e condições para seu atendimento. No capítulo 27, Elizabeth Yost Hammer descreve a questão tendo por foco o gênero feminino; Loretta Neal McGregor apresenta o problema tendo em vista os estudantes etnicamente diferentes; C. R. Snyder, Hal S. Shorey e Kevin L. Rand genericamente tratam dos chamados estudantes de risco, enquanto Loreta R. Prieto vê a problemática do aluno com identidade multicultural.

A Psicologia inclui uma multiplicidade de assuntos controversos com os quais os professores freqüentemente se deparam no seu trabalho. A Parte VI foi composta por seis capítulos que tratam do como ensinar as questões controvertidas sem impor um ponto de vista ou uma interpretação como sendo a única. O primeiro capítulo é geral – Ensino da Psicologia. James E. Freeman trata do ensino das controvérsias envolvendo raça e etnia; Lewis Barker enfoca as controvérsias religião-teoria da evolução e de como ensinar a Psicologia da Evolução ou Evolucionária. Laura L. Finken enfoca sexualidade, Margaret A. Lloyd analisa o gênero, Maureen P. Hester e Raymond F. Paloutzian tratam da Psicologia da Religião e Scott A.Bailey das drogas.

A Parte VII é constituída por quatro capítulos que estudam a administração da sala de aula, tema raramente tratado no Brasil. O ensino ético é considerado por William Douglas Woody. Lisa Damour escreve sobre a importância de como estabelecer e manter uma etiqueta ou regras gerais de conduta em sala de aula; Janie H. Wilson e Amy A. Hackney enfocam como administrar a sala com a presença de alunos problemáticos e Gregory J. Cizala conceitua desonestidade acadêmica, cuidados para prevenir o comportamento inadequado e promover o oposto, isto é, a integridade acadêmica.

A Parte VIII enfoca a avaliação da aprendizagem e inclui cinco capítulos, o primeiro dos quais foi elaborado por John A. June que trata da construção de testes, indicando o que evitar, o estabelecimento de objetivos por item e sugestões diversas. Em seguida, Peter J. Giordano apresenta os princípios da eficiência na atribuição de notas, que é uma atividade muito complexa e que requer conhecimentos, habilidades e competências específicas do professor. A avaliação de apresentações escritas e orais é o tema de Harold L. Miller Jr. e Casey L. Lance. Patti Price apresenta a problemática em termos de trabalhos em grupo, levantando questões sobre atitudes dos alunos, composição dos grupos, divisão de tarefas, trabalho em equipe e avaliação pelos pares. O capítulo de R. Eric Landrum discute os cuidados que o professor deve ter ao escrever cartas de recomendação para alunos.

A avaliação do ensino é fundamental para a sua melhoria, tópico tratado nos cinco capítulos da Parte IX. No primeiro, Victor A. Benassi e Lee F. Seidel mostram a importância de como usar a avaliação dos alunos para melhorar o ensino e introduzir mudanças produtivas. Regan A.R. Gurung lembra a importância de avaliar as estratégias de ensino usadas em sala de aula pelo professor. Baron Perlman e Lee I. McCann discutem a revisão pelos pares como estratégia de avaliação do ensino. Outra forma de melhorar o ensino é recorrer a retroalimentação por vídeo ou por consultoria, assunto desenvolvido por Steven Prentice-Dunn, Kristen L. Payne e Judy M. Ledbetter. Erin B. Rasnussen descreve os portfolios como forma de avaliação do professor, indicando os elementos que devem compor o material.

A última parte do livro trata do ensino dentro do contexto amplo e complexo da vida acadêmica e inclui seis capítulos. Márcia Rossi apresenta quando e como o professor de Psicologia pode ajudar universitários com problemas pessoais. A ajuda ao aluno em sua formação científica e seu encaminhamento para uma carreira desse tipo é o tema de Susan R. Burns, que considera a atuação do docente, os múltiplos benefícios que o aluno alcança quando se engaja em atividades de pesquisa. Eric Landrum mostra como é possível ajudar o aluno para um desenvolvimento profissional posterior e busca de cursos de pós-graduação. Matthew T. Huss continua o assunto, destacando falhar o desenvolvimento profissional se não houver integração nos vários aspectos curriculares e nos serviços de psicologia. O papel do departamento acadêmico no monitoramento da ação dos professores é essencial para a qualidade do ensino, como menciona Linda M. Noble. As políticas de ensino mereceram a atenção de Randolph A. Smith e devem ser transparentes, requerem muito trabalho, considerações sobre valores e programação, adesão do professor e sistema de valorizar eficiência, produtividade e cooperação docente.

Os textos são sintéticos, mas densos, informativos, didáticos e bem sustentados em bibliografia atualizada e de qualidade. Podem servir de sugestão para obras mais específicas, aprofundando cada parte do livro. Também é rico em sugestões para a pesquisa do ensino. Vai além da Psicologia, a grande maioria dos temas aplica-se a todo o ensino superior.

Recebido em 31.out.06

Revisado em 15.mar.07

Aceito em 09.abr.07

Geraldina Porto Witter, livre-docente em Psicologia Escolar pela Universidade de São Paulo, é Coordenadora de Pós-graduação da Universidade Camilo Castelo Branco.

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    Resenha de
    Handbook of the teaching of Psychology, organizado por William Buskist e Stephen F. Davis e publicado pela Editora Blackwell, em 2006.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Nov 2007
    • Data do Fascículo
      Abr 2007
    Programa de Pós-graduação em Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Psicobiologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte Caixa Postal 1622, 59078-970 Natal RN Brazil, Tel.: +55 84 3342-2236(5) - Natal - RN - Brazil
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