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Indivíduos que apresentam diferença estática entre os joelhos também apresentam diferença durante a marcha?

Resumos

CONTEXTUALIZAÇÃO: A articulação do joelho destaca-se por ser uma estrutura comumente afetada por alterações degenerativas, lesões e síndromes. Avaliações clínicas objetivas e precisas são necessárias para estabelecimento de diagnósticos adequados e, conseqüentemente, melhores resultados tanto das cirurgias como dos programas de reabilitação. OBJETIVO: Verificar a presença de diferença entre os joelhos durante a marcha e sua relação com a diferença estática, nos planos sagital e frontal. MÉTODO: Foram avaliados 45 sujeitos saudáveis, sendo 21 do sexo masculino e 24 do sexo feminino. Mediu-se a amplitude de movimento da articulação do joelho, na marcha, por meio da eletrogoniometria. A avaliação da postura estática do joelho foi feita por meio de fotogrametria. Os dados foram analisados descritivamente e aplicou-se o coeficiente de correlação de Pearson. RESULTADOS: Os indivíduos apresentaram valores médios similares para os lados direito e esquerdo (diferença de aproximadamente 0,5º) no registro estático dos planos sagital e frontal. No entanto, o desvio-padrão foi alto, indicando grande variabilidade entre os sujeitos. Para o registro dinâmico, a diferença entre os joelhos foi de 0,4º para o plano sagital e 1º para o plano frontal. No entanto, a variabilidade encontrada também foi alta, principalmente para o plano frontal. Não foi encontrada correlação entre os registros estáticos e dinâmicos nos dois planos de movimento avaliados (r= -0,003 e p= 0,492 para o plano sagital e r= -0,014 e p= 0,465 para o plano frontal). CONCLUSÕES: Embora não tenha sido encontrada relação entre os registros estático e dinâmico, esse assunto merece ser investigado em estudos futuros, avaliando-se grupos mais amplos e com alterações posturais específicas e mais pronunciadas.

articulação do joelho; postura; marcha; eletrogoniometria


INTRODUCTION: The knee joint stands out as a structure that is commonly affected by degenerative alterations, injuries and syndromes. Precise objective clinical evaluations are necessary for establishing appropriate diagnoses and, consequently, better results from both surgical procedures and rehabilitation programs. OBJECTIVE: To investigate the existence of differences between the knees during gait and their relationship with the static difference in the sagittal and frontal planes. METHOD: Forty-five healthy subjects were included, of whom 21 were male and 24 were female. Knee joint range of motion was measured during gait by means of flexible electrogoniometry. The static posture of the knee was evaluated by means of photogrammetry. The data were analyzed descriptively and the Pearson correlation coefficient was applied. RESULTS: The individuals presented mean values that were similar for right and left knees in static recordings of the sagittal and frontal planes (difference of approximately 0.5º). However, the standard deviation was large, thus indicating great variability between the subjects. For the dynamic recordings, the difference between the knees was 0.4º for the sagittal plane and 1º for the frontal plane. The variability found was also large, especially for the frontal plane. There was no correlation between the static and dynamic recordings in the two planes of motion evaluated (r = -0.003 and p = 0.492 for the sagittal plane; r = -0.014 and p = 0.465 for the frontal plane). CONCLUSION: Although no relationship was found between the static and dynamic recordings, this matter deserves investigation in future studies, with evaluations of broader groups with specific and more pronounced postural abnormalities.

knee joint; posture; gait; electrogoniometry


ARTIGOS CIENTÍFICOS

Indivíduos que apresentam diferença estática entre os joelhos também apresentam diferença durante a marcha?

Do individuals who present a static difference between the knees also present a difference during gait?

Poletto PRI; Sato TOI; Carnaz LI; Lobo da Costa PHII; Gil Coury HJCI

IDepartamento de Fisioterapia, Universidade Federal de São Carlos - UFSCar, São Carlos, SP - Brasil

IIDepartamento de Educação Física e Motricidade Humana, UFSCar, São Carlos, SP - Brasil

Correspondência para Correspondência para: Patrícia Rios Poletto Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal de São Carlos Rodovia Washington Luís, km 235 CEP 13565905, São Carlos, SP Brasil e-mail: patricia.poletto@gmail.com

RESUMO

CONTEXTUALIZAÇÃO: A articulação do joelho destaca-se por ser uma estrutura comumente afetada por alterações degenerativas, lesões e síndromes. Avaliações clínicas objetivas e precisas são necessárias para estabelecimento de diagnósticos adequados e, conseqüentemente, melhores resultados tanto das cirurgias como dos programas de reabilitação.

OBJETIVO: Verificar a presença de diferença entre os joelhos durante a marcha e sua relação com a diferença estática, nos planos sagital e frontal.

MÉTODO: Foram avaliados 45 sujeitos saudáveis, sendo 21 do sexo masculino e 24 do sexo feminino. Mediu-se a amplitude de movimento da articulação do joelho, na marcha, por meio da eletrogoniometria. A avaliação da postura estática do joelho foi feita por meio de fotogrametria. Os dados foram analisados descritivamente e aplicou-se o coeficiente de correlação de Pearson.

RESULTADOS: Os indivíduos apresentaram valores médios similares para os lados direito e esquerdo (diferença de aproximadamente 0,5º) no registro estático dos planos sagital e frontal. No entanto, o desvio-padrão foi alto, indicando grande variabilidade entre os sujeitos. Para o registro dinâmico, a diferença entre os joelhos foi de 0,4º para o plano sagital e 1º para o plano frontal. No entanto, a variabilidade encontrada também foi alta, principalmente para o plano frontal. Não foi encontrada correlação entre os registros estáticos e dinâmicos nos dois planos de movimento avaliados (r= -0,003 e p= 0,492 para o plano sagital e r= -0,014 e p= 0,465 para o plano frontal).

CONCLUSÕES: Embora não tenha sido encontrada relação entre os registros estático e dinâmico, esse assunto merece ser investigado em estudos futuros, avaliando-se grupos mais amplos e com alterações posturais específicas e mais pronunciadas.

Palavras-chave: articulação do joelho, postura, marcha, eletrogoniometria.

ABSTRACT

INTRODUCTION: The knee joint stands out as a structure that is commonly affected by degenerative alterations, injuries and syndromes. Precise objective clinical evaluations are necessary for establishing appropriate diagnoses and, consequently, better results from both surgical procedures and rehabilitation programs.

OBJECTIVE: To investigate the existence of differences between the knees during gait and their relationship with the static difference in the sagittal and frontal planes.

METHOD: Forty-five healthy subjects were included, of whom 21 were male and 24 were female. Knee joint range of motion was measured during gait by means of flexible electrogoniometry. The static posture of the knee was evaluated by means of photogrammetry. The data were analyzed descriptively and the Pearson correlation coefficient was applied.

RESULTS: The individuals presented mean values that were similar for right and left knees in static recordings of the sagittal and frontal planes (difference of approximately 0.5º). However, the standard deviation was large, thus indicating great variability between the subjects. For the dynamic recordings, the difference between the knees was 0.4º for the sagittal plane and 1º for the frontal plane. The variability found was also large, especially for the frontal plane. There was no correlation between the static and dynamic recordings in the two planes of motion evaluated (r = -0.003 and p = 0.492 for the sagittal plane; r = -0.014 and p = 0.465 for the frontal plane).

CONCLUSION: Although no relationship was found between the static and dynamic recordings, this matter deserves investigation in future studies, with evaluations of broader groups with specific and more pronounced postural abnormalities.

Key words: knee joint, posture, gait, electrogoniometry.

INTRODUÇÃO

Dentre as articulações dos membros inferiores, o joelho destaca-se por ser uma estrutura comumente afetada por alterações degenerativas, como a osteoartrose, por lesões como rupturas de ligamento cruzado anterior e por síndromes como a disfunção fêmuro-patelar. Avaliações clínicas objetivas e precisas são necessárias para estabelecimento de diagnósticos adequados que, por sua vez, poderão promover melhores resultados tanto nos procedimentos cirúrgicos como nos programas de reabilitação1. O exame físico dessa articulação envolve avaliações estáticas e dinâmicas.

No contexto clínico, a avaliação estática é feita usualmente por observação. Nesse tipo de avaliação, o fisioterapeuta estima visualmente o alinhamento do membro inferior, identificando alterações posturais e assimetrias entre os lados do corpo2. No entanto, a estimativa visual não é uma medida objetiva e tem sua confiabilidade questionada, já que podem existir grandes diferenças entre examinadores3. A fotogrametria é uma forma mais precisa de avaliação estática. Nesse tipo de avaliação, realiza-se um registro fotográfico do segmento corporal que se quer avaliar com demarcações em referências anatômicas pertinentes4.

A avaliação dinâmica do joelho pode ser realizada pela medida da amplitude de movimento, em função do tempo, em situações funcionais (marcha, subida/descida de degraus, corrida, saltos, etc.). Dentre as atividades funcionais, a marcha é a mais comumente avaliada. Esse registro dinâmico pode ser obtido por filmagens simples ou computadorizadas, sistemas opto-eletrônicos e equipamentos para medidas diretas. Dentre esses últimos, a eletrogoniometria é uma ferramenta bastante útil. O eletrogoniômetro flexível é prático, portátil, relativamente simples de operar, possui boa adaptação aos segmentos corporais e é mais confiável do que outros tipos de goniômetro disponíveis5. O eletrogoniômetro flexível é composto por dois terminais, um fixo e um telescópico, e uma mola de proteção que une os terminais. O elemento sensível, um fio com uma série de strain gauges montados ao redor de sua circunferência, encontra-se dentro dessa mola. Conforme o ângulo entre os dois terminais é alterado, a mudança ao longo do comprimento do fio é medida e convertida em ângulos. A construção do eletrogoniômetro biaxial permite o registro dos ângulos em dois planos de movimento ortogonais entre si6,7.

A partir das medidas obtidas por esses métodos, é possível comparar os lados do corpo, identificando assimetrias estáticas e dinâmicas. Diferenças entre os membros inferiores são comumente relacionadas a debilidades, incapacidades e disfunções, e a similaridade entre os membros lesado/não lesado é um dos principais objetivos dos programas de reabilitação8. No entanto, essa premissa pode ser questionada, uma vez que não se sabe se previamente à lesão o indivíduo era simétrico e, ainda, qual a importância dessa simetria para a capacidade funcional do indivíduo.

Alguns autores encontraram diferenças angulares entre os joelhos na marcha saudável1,9-11. Maupas et al.10,11, utilizando eletrogoniômetro biaxial flexível, encontraram 51,6% e 62,5% de indivíduos assimétricos para a amplitude de movimento do joelho no plano sagital, em dois estudos conduzidos em diferentes momentos. A partir desses resultados afirmam que a marcha não deve ser considerada um fenômeno estritamente simétrico. Esses autores buscaram explicar a diferença entre os joelhos por meio de diversos fatores como: dominância lateral, nível de atenção na atividade e força muscular nos membros inferiores. No entanto, não encontraram correlações significativas com qualquer um desses aspectos investigados.

Um possível fator que poderia levar a uma diferença na amplitude dos joelhos, durante a marcha, seria uma diferença prévia entre os joelhos dos indivíduos, ou seja, caso um indivíduo tivesse uma diferença estática entre os joelhos, essa poderia afetar os registros dinâmicos, levando à preponderância angular de um dos joelhos na marcha.

Diante disso, o objetivo deste estudo é identificar a presença de assimetria entre os joelhos durante a marcha de indivíduos saudáveis e verificar se há relação entre a assimetria na marcha com a assimetria estática dos joelhos, para os planos sagital e frontal.

METODOLOGIA

Sujeitos

Foram avaliados 45 sujeitos saudáveis, sendo 21 do sexo masculino e 24 do sexo feminino (22,1+3,0 anos; 62,2+8,8 kg; 1,67+0,1 m; IMC = 22,9+2,4 kg/m2). Esses indivíduos foram recrutados após avaliação prévia de um grupo maior (N= 70). Um esclarecimento inicial sobre os objetivos gerais do estudo e procedimentos da coleta foi fornecido aos indivíduos que, posteriormente, assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. Os fatores de inclusão dos sujeitos foram: 1) apresentar índice de massa corporal (IMC) entre 18 e 24 kg/m², 2) apresentar estatura variando de 1,60 a 1,80 m. Como fatores de exclusão, considerou-se a presença de lesões ou doenças nos membros inferiores, sintomas que persistiram três dias ou mais no ano precedente, distúrbios de equilíbrio, discrepância real no comprimento dos membros inferiores maior que 1 cm. Este estudo foi desenvolvido em conformidade com os aspectos éticos previstos na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Carlos (parecer 035/04).

Materiais e Equipamentos

Utilizou-se, neste estudo, um conjunto constituído de eletrogoniômetro (sensores XM 110) e unidade para aquisição de dados (Biometrics Ltd, Gwent, UK); uma câmera fotográfica digital (MVC – FFD91, Sony); uma esteira elétrica (Explorer Action Fitness); caneta dermográfica; fita métrica; marcadores reflexivos; fita adesiva dupla face; trena; cronômetro e outros materiais de consumo.

Procedimentos

Preparo dos sujeitos: Inicialmente os indivíduos foram submetidos à tricotomia no local de fixação dos sensores para promover melhor adesão dos terminais sobre a pele.

Medidas dos ângulos do joelho por fotogrametria: Os processos ósseos foram identificados por meio de palpação manual (espinha ilíaca ântero-superior - EIAS, trocânter maior do fêmur, maléolo lateral, centro da patela, cabeça do tálus). Todos os pontos foram identificados seguindo as recomendações de Gross et al.12. Nesses pontos anatômicos, foram fixados marcadores esféricos. A interlinha articular do joelho foi demarcada com caneta dermográfica. Os indivíduos foram fotografados em vista frontal e lateral (direita e esquerda); o programa AutoCAD (2000) foi usado para medir os ângulos entre os segmentos coxa-perna. Nas fotos frontais, foram traçados os ângulos de varo/valgo do joelho por meio de duas retas: uma unindo a EIAS ao centro da patela, e a outra unindo o centro da patela à cabeça do tálus. A partir das fotos em vista lateral, traçaram-se duas retas para medida do ângulo de flexo/extensão, uma unindo o trocânter maior do fêmur à interlinha articular, e outra unindo a interlinha ao maléolo lateral (Figura 1).


Foi feita uma análise prévia da confiabilidade intra-avaliador do traçado dos ângulos com um intervalo de uma semana entre as medidas, e a diferença média foi de 0,7º ± 0,5º (r= 0,99). Foi avaliada também a confiabilidade interavaliadores, entre dois fisioterapeutas treinados por um período de 1 semana, e a diferença média foi de 1,0º ± 1,0º (r= 0,98). Cada avaliador não tinha acesso às informações obtidas pelo outro avaliador.

Colocação do eletrogoniômetro: Os sensores do eletrogoniômetro foram acoplados na face lateral dos joelhos com o auxílio de uma trena alinhada ao centro dos marcadores do trocânter maior do fêmur e maléolo lateral. Foram traçadas duas retas cruzando a interlinha articular, o que permitiu a colocação dos terminais do sensor na coxa e na perna de forma reprodutível. As recomendações do manual do fabricante foram seguidas, alinhando-se o terminal inferior do sensor ao eixo da perna e o terminal superior ao eixo da coxa. Embora o fabricante não determine a projeção lateral do eixo articular, considerou-se, neste estudo, que essa projeção do eixo estaria localizada no ponto de intersecção da interlinha articular com a reta que unia o trocânter maior do fêmur ao maléolo lateral, conforme Kadaba et al.13.

Após a fixação dos sensores, o equipamento foi calibrado com o indivíduo em postura em pé, com o peso distribuído igualmente entre os dois pés e joelhos estendidos. Os movimentos de flexão e valgo foram considerados positivos, e extensão e varo, negativos. O registro dinâmico consistiu de caminhada em esteira elétrica na velocidade de 5,0 km/h por 90 segundos, com um período prévio de familiarização de 4 minutos. Ao término da coleta, os dados eram descarregados no computador para verificação imediata da qualidade do registro.

Análise dos dados

A partir das medidas obtidas pelo eletrogoniômetro, foi avaliada a excursão total do joelho (amplitude de movimento – ADM) nos planos sagital e frontal por meio de uma rotina desenvolvida em Matlab (versão 6.5). Essa rotina permitiu um processamento dos dados de forma mais rápida e confiável. Ela consiste em dividir o registro da marcha em ciclos (passadas) e extrair os dados angulares de interesse dessas passadas, como picos de movimento e amplitudes, tempo de ocorrência dos eventos e duração das fases e subfases do ciclo. Para avaliar a associação entre o registro estático e o registro dinâmico nos planos de movimento avaliados, utilizou-se a correlação de Pearson.

RESULTADOS

A média e o desvio-padrão para os lados direito e esquerdo nos registros estático (fotogrametria) e dinâmico (eletrogoniometria), nos planos sagital e frontal, podem ser observados na Tabela 1. Pode-se perceber que para o registro estático, nos planos sagital e frontal, os indivíduos apresentaram valores médios similares para os lados direito e esquerdo, com diferença de aproximadamente 0,5º. No entanto, o desvio-padrão foi alto, indicando grande variabilidade entre os sujeitos. Para o registro dinâmico, a diferença da amplitude de movimento (ADM) entre os joelhos foi de 0,4º para o plano sagital e 1º para o plano frontal. A variabilidade interindivíduos encontrada também foi alta, principalmente para o plano frontal. A diferença entre os joelhos para as médias dos picos mínimos e máximos dos movimentos nos planos sagital e frontal variou de 1,8º a 2,8º, com desvio-padrão entre 3,5 e 7,6º.

Foram calculadas as diferenças entre os lados direito e esquerdo para os registros estático (fotogrametria) e dinâmico (eletrogoniometria) para cada sujeito. Os resultados apontaram que não houve relação linear entre essas diferenças (registro estático x registro dinâmico) tanto para o plano sagital como para o frontal, conforme Figura 2. A correlação de Pearson também indicou não haver relação significativa entre os registros. Os valores de p e r encontrados foram: r = -0,003 e p = 0,492 para o plano sagital e r = -0,014 e p = 0,465 para o plano frontal.


DISCUSSÃO

Os resultados encontrados indicaram grande variabilidade interindividual para os registros estáticos e dinâmicos. Além disso, não foi encontrada correlação entre as diferenças estática e dinâmica.

Maupas et al.10,11 encontraram de 51,6% a 62,5% de indivíduos com diferença entre os joelhos direito e esquerdo maior que 5º para a amplitude de movimento no plano sagital. Esses autores buscaram identificar a causa dessa assimetria, sendo que alguns fatores como: dominância lateral (ocular, manual e podal), nível de atenção requerido e força muscular dos membros inferiores não explicaram essa diferença. De qualquer forma, tem sido reconhecido que a marcha pode apresentar uma "assimetria funcional", em que um membro assume uma função diferente do contralateral. Nesse sentido, enquanto um membro responsabiliza-se pela propulsão do corpo, o outro estaria mais relacionado ao apoio e controle. Assim, alterações assimétricas da marcha estariam mais relacionadas a mecanismos globais de adaptação do que a alterações locais1. No entanto, poucos estudos disponíveis avaliam alterações mais localizadas e padrões assimétricos da marcha. Por isso, buscamos verificar se diferenças estáticas entre os joelhos, tão comumente avaliadas em exames posturais, poderiam causar diferenças entre a amplitude de movimentos dos joelhos na marcha. Porém, os presentes resultados mostraram que não houve relação entre essas diferenças estáticas e dinâmicas avaliadas, respectivamente, pela fotogrametria e eletrogoniometria.

Alguns aspectos metodológicos podem ter sido responsáveis pela diferença entre os resultados encontrados por Maupas et al.10,11 e pelo presente estudo, como: recrutamento dos sujeitos, posicionamento dos sensores, posição de referência, calibragem do equipamento, etc. Além disso, os procedimentos adotados neste estudo foram reproduzidos da mesma maneira para todos os sujeitos avaliados, e isso pode ter filtrado parte das fontes de variação. Cabe ressaltar ainda que o critério adotado por Maupas et al.10,11 para definir assimetria (diferença de 5° na amplitude de movimento entre os joelhos) é arbitrário e pode não ser suficientemente sensível para expressar variações relevantes do ponto de vista funcional.

Alguns pontos também merecem ser discutidos em relação à fotogrametria. Embora a colocação dos marcadores nos pontos anatômicos e a posição do sujeito e da câmera tenham sido controladas de forma sistemática, outros fatores podem ter influenciado as medidas estáticas. A diferença entre os joelhos, a partir das fotos, parece ser melhor identificada no plano frontal do que no plano sagital. No plano frontal, as medidas dos dois joelhos são obtidas a partir de uma mesma fotografia; já para o plano sagital, ocorre movimentação do sujeito para que seja possível fotografar o outro lado do corpo. Acredita-se que pode ter havido diferenças entre os joelhos no plano sagital devido ao posicionamento e reposicionamento do indivíduo e não, necessariamente, a uma assimetria estrutural. Além disso, o plano sagital possui maior amplitude de movimento que o plano frontal, por isso espera-se que a variação entre as fotografias também possa ser maior. No que tange ao reposicionamento, novos procedimentos, no sentido de evitar a ocorrência dessa possível fonte de variação, deverão ser considerados em estudos futuros.

A confiabilidade intra e interexaminadores e a repetibilidade da avaliação postural foram investigadas por Iunes et al.14. Esses autores investigaram diversos parâmetros posturais, inclusive os ângulos do joelho nos planos sagital e frontal. A confiabilidade interexaminadores foi considerada excelente (ICC entre 0,943 e 0,996), a confiabilidade intra-examinador foi menor (ICC entre 0,385 e 0,955) e a repetibilidade dos ângulos obtidos por fotos intervaladas em 1 semana foi baixa (ICC entre 0,575 e 0,782). Os autores sugerem que o método é pouco indicado para o acompanhamento de mudanças posturais devido à sua baixa repetibilidade. A qualidade do método de avaliação postural pode ser melhorada com treinamento adequado dos avaliadores e redução do número de avaliadores que realizam o teste, aumentando assim a confiabilidade intra e interavaliadores. Esses procedimentos podem minimizar diferenças entre as avaliações posturais; no entanto variações posturais dos indivíduos não podem ser totalmente controladas, independente do método de avaliação utilizado.

Embora as diferenças estáticas não tenham mostrado relação com as diferenças dinâmicas, a configuração postural em valgo ou varo causa sobrecarga desigual entre os compartimentos medial e lateral do joelho, o que posteriormente poderá alterar a funcionalidade do movimento na marcha. Assim, este assunto merece ser melhor investigado em estudos futuros, nos quais grupos mais amplos e com alterações posturais acentuadas possam ser avaliados.

Apoio: CAPES e FAPESP - Processos N.2004/07207-0 e 04/15579-5.

Recebido: 14/02/2006

Revisado: 26/06/2006

Aceito: 11/10/2006

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  • Correspondência para:

    Patrícia Rios Poletto
    Departamento de Fisioterapia da Universidade Federal de São Carlos
    Rodovia Washington Luís, km 235
    CEP 13565905, São Carlos, SP Brasil
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Mar 2007
    • Data do Fascículo
      Fev 2007

    Histórico

    • Recebido
      14 Fev 2006
    • Revisado
      26 Jun 2006
    • Aceito
      11 Out 2006
    Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Fisioterapia Rod. Washington Luís, Km 235, Caixa Postal 676, CEP 13565-905 - São Carlos, SP - Brasil, Tel./Fax: 55 16 3351 8755 - São Carlos - SP - Brazil
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