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Mobilidade funcional e função executiva em idosos diabéticos e não diabéticos

Resumos

CONTEXTUALIZAÇÃO: Idosos diabéticos tendem a ter declínio da funcionalidade motora e a apresentar déficits cognitivos relacionados a processos mais complexos, como a função executiva, o que pode levar a um maior risco de quedas. OBJETIVOS: Comparar idosos com e sem diabetes tipo 2 quanto à mobilidade funcional, ao risco de quedas e à função executiva e verificar a correlação entre essas variáveis. MÉTODOS: Participaram do estudo 40 idosos da comunidade, divididos em dois grupos: G1, idosos com diabetes tipo 2 e G2, idosos sem diabetes, sendo os grupos semelhantes quanto ao gênero, idade e índice de massa corporal. A mobilidade funcional e o risco de quedas foram avaliados pelo Timed Up and Go (TUG e TUGcognitivo), e a função executiva, pelo teste de fluência verbal (categoria animal). RESULTADOS: Os diabéticos apresentaram pior desempenho no teste de fluência verbal (G1:14,9±4,5; G2:17,7±5,6; p=0,031). Uma diferença estatisticamente significativa foi observada entre os grupos em relação à mobilidade funcional, sendo que o G1 apresentou pior desempenho no TUG (G1:10,5±1,8s; G2:8,9±1,9s; p=0,01) e noTUGcognitivo (G1:13,9±3,2s; G2:10,9±2,3s; p=0,004). Uma correlação siginificativa foi observada entre o TUGcognitivo e o teste de fluência verbal apenas no G1 (G1: Spearman's rho = -0,535; p=0,015; G2: Spearman's rho = -0,250; p=0,288). CONCLUSÕES: Os diabéticos apresentaram um pior desempenho nos testes de mobilidade funcional e de fluência verbal que os idosos sem a doença, sugerindo um maior risco de quedas para idosos diabéticos. A inclusão desses parâmetros de avaliação para diabéticos na prática clinica da fisioterapia é fundamental para preservar a funcionalidade e evitar quedas.

diabetes mellitus; acidentes por quedas; cognição; limitação da mobilidade


BACKGROUND: Elderly diabetics tend to show cognitive deficits related to more complex processes such as the executive function, which can lead to a greater risk of falls. OBJECTIVES: The aims of this study were to compare the functional mobility, the risk of falls and the executive function among elderly with and without type 2 diabetes, and to check the correlation between these variables. METHODS: Forty community elderly participated in the study and were divided into two groups: G1 elderly with type 2 diabetes and G2 elderly without diabetes, being the variables age, body mass index and gender similar between the groups. The functional mobility and the risk of falls were assessed by the "Timed Up and Go" test (TUG and cognitive TUG) and the executive function was assessed by the Verbal Fluency Test (VFT) (animal category). RESULTS: Elderly with diabetes showed worse performance in the verbal fluency test (G1:14.9±4.5; G2:17.7±5.6; p=0.031). A statistically between-group difference was observed regarding the functional mobility; being the G1 presenting worse performance in TUG (G1:10.5±1.8sec; G2:8.9±1.9sec; p=0.01) and cognitive TUG (G1:13.9±3.2sec; G2:10.9±2.3sec; p=0.004) tests. A significant correlation was observed between the cognitive TUG and VFT only in G1 (G1: Spearman's rho = -0.535; p=0.015; G2: Spearman's rho =-0.250; p=0.288). CONCLUSIONS: Diabetics presented worse performance in the functional mobility and in the verbal fluency test than non-diabetics elderly that suggests a greater risk of falls for the elderly with diabetes. The inclusion of these evaluation parameters for diabetics on the physical therapy clinical practice is crucial in order to maintain the functionality and to prevent falls.

diabetes Mellitus; accidental falls; cognition; mobility limitation


ARTIGO ORIGINAL

Mobilidade funcional e função executiva em idosos diabéticos e não diabéticos* * Resumo da pesquisa apresentado em forma de pôster. ANJOS, D. M. C, ALVARENGA, P. P, PEREIRA, D.S. Risk of fall and executive functional in diabetic and non diabetic elderly. In: 19 IAGG World Congress of Gerontology and Geriatrics, 2009, Paris. The Journal of Nutrition, Health & Aging. Paris: JNHA, 2009. v.13. p.607-607.

Patrícia P. AlvarengaI; Daniele S. PereiraII; Daniela M. C. AnjosII,III

IFisioterapeuta

IIDepartamento de Fisioterapia, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil

IIIDepartamento de Fisioterapia, Campi Saúde, Faculdade Pitágoras (FAP), Belo Horizonte, MG, Brasil

Correspondência para Correspondência para: Daniela Maria da Cruz dos Anjos Rua Julio Pereira da Silva, 510 - apto. 301, Cidades Nova CEP 31170-360, Belo Horizonte, MG, Brasil e-mail: danielacruzanjos@gmail.com

RESUMO

CONTEXTUALIZAÇÃO: Idosos diabéticos tendem a ter declínio da funcionalidade motora e a apresentar déficits cognitivos relacionados a processos mais complexos, como a função executiva, o que pode levar a um maior risco de quedas.

OBJETIVOS: Comparar idosos com e sem diabetes tipo 2 quanto à mobilidade funcional, ao risco de quedas e à função executiva e verificar a correlação entre essas variáveis.

MÉTODOS: Participaram do estudo 40 idosos da comunidade, divididos em dois grupos: G1, idosos com diabetes tipo 2 e G2, idosos sem diabetes, sendo os grupos semelhantes quanto ao gênero, idade e índice de massa corporal. A mobilidade funcional e o risco de quedas foram avaliados pelo Timed Up and Go (TUG e TUGcognitivo), e a função executiva, pelo teste de fluência verbal (categoria animal).

RESULTADOS: Os diabéticos apresentaram pior desempenho no teste de fluência verbal (G1:14,9±4,5; G2:17,7±5,6; p=0,031). Uma diferença estatisticamente significativa foi observada entre os grupos em relação à mobilidade funcional, sendo que o G1 apresentou pior desempenho no TUG (G1:10,5±1,8s; G2:8,9±1,9s; p=0,01) e noTUGcognitivo (G1:13,9±3,2s; G2:10,9±2,3s; p=0,004). Uma correlação siginificativa foi observada entre o TUGcognitivo e o teste de fluência verbal apenas no G1 (G1: Spearman's rho = -0,535; p=0,015; G2: Spearman's rho = -0,250; p=0,288).

CONCLUSÕES: Os diabéticos apresentaram um pior desempenho nos testes de mobilidade funcional e de fluência verbal que os idosos sem a doença, sugerindo um maior risco de quedas para idosos diabéticos. A inclusão desses parâmetros de avaliação para diabéticos na prática clinica da fisioterapia é fundamental para preservar a funcionalidade e evitar quedas.

Palavras-chave: diabetes mellitus; acidentes por quedas; cognição; limitação da mobilidade.

Introdução

O crescimento da população idosa é um fenômeno observado na maioria dos países e também no Brasil1. O envelhecimento é um processo fisiológico, dinâmico, em que ocorrem modificações na capacidade de adaptação homeostática, podendo assim suprimir algumas das etapas do controle postural, levando a um aumento da instabilidade. Porém, o envelhecimento associado a uma doença, como o diabetes mellitus, leva o indivíduo, progressivamente, a prejuízos ainda maiores2,3. O diabetes mellitus constitui uma síndrome de etiologia múltipla, decorrente da falta de insulina e/ou da incapacidade de o hormônio exercer adequadamente seus efeitos, podendo levar ao desenvolvimento de doenças associadas e complicações, como retinopatia, nefropatia, neuropatia periférica, perda de mobilidade articular e força muscular4. Além disso, a função cognitiva parece também tornar-se comprometida em indivíduos portadores de diabetes mellitus5.

Estima-se que, até o ano de 2025, a população mundial de diabéticos duplicará quando comparada ao número de diabéticos existentes no ano de 2000 (150 milhões para 300 milhões)6. Idosos com diabetes mellitus tipo 2 são mais propensos a apresentarem algum déficit cognitivo quando comparados àqueles sem a doença7. Paralelamente às mudanças estruturais e funcionais no sistema nervoso central (SNC), decorrentes do processo do envelhecimento, as estruturas corticais e subcorticais podem sofrer alterações adicionais devido às modificações no metabolismo. Evidências sugerem que os déficits da aprendizagem e da memória nesses indivíduos podem ser resultado de uma interação sinergista entre as alterações do metabolismo relacionadas ao diabetes, em que as mudanças na concentração da glicose sanguínea afetam rapidamente a função cerebral, e as mudanças estruturais e funcionais que ocorrem no SNC, decorrentes do processo normal do envelhecimento8. Entretanto, esses déficits cognitivos provavelmente se limitam aos processos mais complexos, diretamente relacionados ao lobo frontal, como a função executiva, que se refere à habilidade no planejamento de estratégias de resolução de problemas e execução de metas9,10.

Em muitas atividades da vida diária, as pessoas precisam realizar mais de uma tarefa simultaneamente, como uma caminhada comunicando-se com outras pessoas. Uma alteração cognitiva durante a realização de uma dupla tarefa pode, então, ser um importante indicador do estado funcional em que se encontra um paciente com diabetes mellitus. Quando duas tarefas são executadas simultaneamente, o desempenho de uma ou de ambas pode ser diminuído. A dupla tarefa, por muitas vezes, envolve simultaneamente informações visoespacial e verbal, que são denominadas função executiva11. Com a alteração dessa função, observa-se risco aumentado de quedas12.

Como o desempenho de tarefas simultâneas é complexo, tal fato pode levar a um déficit na estabilidade postural e até mesmo na execução de tarefas cognitivas relativamente simples, influenciando o equilíbrio13-15. A avaliação combinada de tarefas de equilíbrio e cognição em idosos torna-se, portanto, de grande relevância, uma vez que a maioria das quedas nessa população ocorre durante as atividades em que a atenção precisa ser dividida16. Além disso, a restrição da mobilidade funcional do idoso pode diminuir o seu convívio social, interferir na autoestima e no seu senso de bem-estar. Preservar a deambulação e a mobilidade na velhice é uma das principais diretrizes dos tratamentos fisioterápicos. Portanto, os objetivos deste estudo foram: 1) comparar a mobilidade, o desempenho em dupla tarefa e a função executiva entre idosos com e sem diabetes; 2) verificar a associação entre o tempo de diagnóstico do diabetes, o valor glicêmico, o número de acertos das contas matemáticas feitas durante o Timed Up and Go (TUGcognitivo) com o tempo de realização dos testes de mobilidade funcional e 3) verificar a correlação entre os desempenhos nos testes de fluência verbal e de dupla tarefa.

Materiais e métodos

Trata-se de um estudo transversal, do tipo exploratório, com uma amostra de conveniência de idosos diabéticos e não diabéticos residentes na comunidade. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário de Belo Horizonte (UNIBH), Belo Horizonte, MG, Brasil (021/2008).

Os voluntários foram contatados por telefone, sendo agendados data e local para a coleta de dados. A ordem de aplicação dos testes foi estabelecida de forma aleatória, por meio de sorteio, e não houve perdas amostrais. Todos os indivíduos selecionados foram informados sobre os objetivos e os procedimentos do estudo e participaram da pesquisa após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

Participaram do estudo 40 idosos divididos em dois grupos: G1, composto por 20 idosos com diagnóstico médico de diabetes mellitus tipo 2 e G2, composto por 20 idosos sem diagnóstico clínico de diabetes mellitus. Os seguintes critérios de inclusão foram adotados: idosos diabéticos classificados clinicamente como tipo 2, idade superior ou igual a 60 anos, tempo de diagnóstico do diabetes superior ou igual a seis anos, marcha independente, não havendo nenhuma restrição quanto ao sexo, classe social, cor ou grupo étnico.

Os critérios de exclusão foram: valor glicêmico maior ou igual 200 mg/dl no momento da coleta de dados, presença de doenças neurológicas (exceto neuropatia periférica diabética), déficit visual não compatível com correção por lentes, marcha claudicante, uso de órtese ou prótese de membros inferiores, amputação ou cirurgia de membros inferiores, úlceras plantares ativas, idosos ativos (prática de atividade física três vezes por semana ou 150 minutos semanais) e presença de alterações cognitivas detectáveis pelo Miniexame do Estado Mental17.

Para caracterização da amostra, os dados sociodemográficos e as informações relativas às condições clínicas dos idosos foram obtidos por meio de um questionário padronizado, aplicado por avaliador previamente treinado.

A função executiva foi verificada por meio do teste de fluência verbal - categoria animais. Trata-se de uma avaliação da capacidade de buscar e recuperar dados estabelecidos na memória de longa duração, exigindo habilidades de organização, autorregulação e memória operacional18. Para a aplicação do teste, solicitou-se ao paciente: "Você deve dizer todos os nomes de animais/bichos de que se lembrar, o mais rápido possível. Vale qualquer bicho: insetos, pássaros, peixes, animais do mato/selva, animais de casa, etc. Quanto mais você falar, melhor. Pode começar". O escore se dá pelo número de respostas corretas obtidas dentro de um minuto, porém com algumas observações: boi e vaca são considerados dois bichos, gato e gata somente um. Para essa categoria semântica, indivíduos sem alterações, com pelo menos oito anos de escolaridade, são capazes de evocar pelo menos 13 bichos, enquanto indivíduos sem alterações, com menos de oito anos de escolaridade, evocam pelo menos 9.

O risco de quedas foi avaliado por meio de dois testes de confiabilidade reconhecidos pela literatura, denominados TUG (ICC=0,98) e TUGcognitivo, associado a uma tarefa cognitiva (ICC=0,99)18. O TUG é um teste de equilíbrio comumente utilizado para examinar a mobilidade funcional em idosos. O tempo tomado para completar o teste está fortemente relacionado ao nível de capacidade funcional. Os idosos independentes e sem alterações no equilíbrio realizam o teste em 10 segundos ou menos, os que são independentes em transferências básicas realizam o teste em 20 segundos ou menos, e os que necessitam de mais de 20 segundos para realizar o teste são dependentes em muitas atividades da vida diária e na mobilidade. Esse último valor indica a necessidade de intervenção adequada, sendo que idosos que gastam mais de 14 segundos para completá-lo possuem alto risco de quedas19.

Para a aplicação do TUG, utilizou-se uma cadeira com braços, com altura, em média, de 46 cm; um cronômetro e fichas para anotações dos resultados, e foi pedido que se usasse um sapato de uso habitual20. Antes do início do exame, o paciente recebeu informações sobre a execução do teste e, por meio da instrução verbal "vai", começava a prova. No início da cronometragem, o idoso partia da posição inicial, com as costas apoiadas no encosto da cadeira e pés paralelos ao chão, depois levantava-se da cadeira, percorria a distância de 3 metros e retornava à cadeira no menor tempo possível. Permitiu-se que os pacientes realizassem o teste duas vezes, sendo que a primeira serviu apenas de aprendizado (não se permitiu ao paciente receber nenhuma ajuda de outra pessoa durante a prova).

O TUGcognitivo, foi realizado utilizando os mesmos parâmetros que o TUG, porém requereu-se ao paciente que, durante a execução do teste, fosse dada a resposta de uma operação matemática de subtração, feita pela examinadora, a partir do número 100 até o número 20, sempre diminuindo três, de forma aleatória19. Durante o teste, não se relatava ao paciente seu acerto ou erro.

Uma tarefa secundária tem efeito deletério sobre a mobilidade, dessa forma, consegue-se avaliar a influência da demanda atencional sobre a mobilidade dos idosos. O tempo para realização do TUGcognitivo aumenta de 22% a 25% o tempo do TUG, considerando-se 15 segundos o tempo de corte, com especificidade de 93%. Salienta-se que o TUG e o TUGcognitivo são testes igualmente sensíveis na avaliação do risco de quedas19.

A análise estatística descritiva foi usada para todas as variáveis clínicas e demográficas do estudo. Para a comparação das variáveis idade, índice de massa corpórea (IMC), desempenho nos testes TUG, TUGcognitivo e número de acertos obtidos durante a realização do TUGcognitivo entre os grupos de idosos com diabetes mellitus e de idosos sem a doença, foi usado o teste de Mann-Whitney. A proporção de gêneros entre os grupos foi comparada pelo teste de Fisher para duas proporções.

A possível influência das variáveis tempo de diagnóstico do diabetes mellitus, valor glicêmico e número de acertos obtidos durante a realização do TUGcognitivo no tempo de realização dos testes de mobilidade foi verificada pela análise de regressão simples. Para verificar a existência de correlação entre o desempenho dos idosos nos testes fluência verbal e TUGcognitivo, foi realizado o teste não paramétrico de correlação de postos de Spearman. Em todos os testes estatísticos, considerou-se um nível de significância de 5% (a=0,05). As análises foram realizadas no software estatístico Minitab, versão 15, 2007.

Resultados

As características demográficas, sociais e clínicas dos 20 idosos diabéticos (G1) e dos 20 não diabéticos (G2) são apresentadas na Tabela 1. Não houve diferença entre os dois grupos quanto à idade, ao IMC e ao gênero.

O desempenho dos idosos nos testes TUG e TUGcognitivo são apresentados na Tabela 2. Observou-se diferença estatisticamente significativa entre os grupos no desempenho de ambos os testes: TUG (p=0,0186) e TUGcognitivo (p=0,0043). O grupo de idosos com diabetes mellitus apresentou pior desempenho em ambos os testes quando comparado ao daqueles sem a doença, ou seja, exigiu maior tempo para a realização deles.

As variáveis tempo de diagnóstico do diabetes mellitus e valores glicêmicos não influenciaram os resultados dos testes TUG e TUGcognitivo (p>0,05) no grupo G1. O número de acertos obtidos durante a realização do TUGcognitivo, não afetou o tempo de realização dos testes de mobilidade tanto para o grupo G1 quanto para o grupo G2.

Houve diferença estatisticamente significativa no desempenho dos grupos no teste de fluência verbal (p=0,031). Idosos com diabetes mellitus apresentaram menor número de evocações corretas (14±4,4997 animais) do que os idosos sem diabetes (17,7±5,6948 animais).

Verificou-se correlação significativa, com valor moderado e negativo, entre o TUGcognitivo e o teste de fluência verbal apenas no grupo G1 (s=-0,535; p=0,015), mas não no grupo G2 (s=-0,250; p=0,288). A comparação do desempenho dos idosos nos três testes está representada na Figura 1.


Discussão

O diabetes mellitus tipo 2 encontra-se relacionado a reduções significativas na eficiência psicomotora do indivíduo, com diminuição do equilíbrio postural, levando a uma marcha mais lenta e instável13,21. Evidências também demonstram uma forte associação entre déficits psicomotores e a deficiência cognitiva em diabéticos, principalmente em pessoas com idade superior a 65 anos13,21.

As principais conclusões deste estudo transversal são que a mobilidade funcional e a dupla tarefa (mobilidade funcional associada com função executiva) tiveram pior desempenho em idosos diabéticos do que em idosos sem a doença, pareados pela idade, IMC e sexo, apontando um maior risco de quedas para idosos diabéticos.

Os achados do presente estudo demonstraram que o grupo de idosos com diabetes mellitus apresentou um desempenho inferior no TUG, demonstrando uma redução da mobilidade e um maior risco de quedas quando comparado ao grupo de idosos não diabéticos. Resultados semelhantes foram encontrados em relação ao desempenho do TUGcognitvo e teste de fluência verbal, indicando o comprometimento no desempenho da dupla tarefa e função executiva em idosos diabéticos. Esses resultados endossam a relação entre alterações na função executiva, mobilidade e maior risco de quedas para indivíduos diabéticos13,15,21,22.

Em estudo realizado por Asimakopoulou e Hampson22, idosos com diabetes mellitus apresentaram um prejuízo significativo na execução de tarefas mais complexas, como a dupla tarefa, avaliada por Munshi et al.10. Isso pode ocorrer, pois a capacidade de atenção total é excedida, porque há diminuição de transmissão neural e, assim, há tempos de respostas mais longos. Entretanto, tais resultados contrastam com os de outras investigações que não verificaram alterações significativas durante a realização de testes, incluindo a dupla tarefa, por idosos diabéticos23,24.

Observando o desempenho no teste de fluência verbal, idosos sem diabetes mellitus obtiveram melhores resultados que os diabéticos. O teste de fluência verbal encontra-se diretamente relacionado à função executiva, que está ligada ao lobo frontal. Segundo alguns estudos, essa região é a mais afetada pelo diabetes mellitus, podendo apresentar uma atrofia cortical21 e ter, como consequência, uma forte predisposição à ocorrência de quedas25.

Além disso, segundo Ble et al.26, existe uma associação entre o controle glicêmico e a função cognitiva. Exames de neuroimagem demonstraram alterações no tronco encefálico, sugerindo que a hiperglicemia crônica pode contribuir para o desenvolvimento de deficiências orgânicas no cérebro, manifestadas como uma redução total na eficiência mental27. A hiperglicemia crônica em pessoas com diabetes mellitus tipo 2 prejudica significativamente a velocidade do processamento de informações, como memória trabalhada e alguns aspectos de atenção28. Alterações no processamento de informações também ocorrem durante a hiperglicemia aguda, assim como aumento da tristeza e da ansiedade, o que pode afetar a função executiva do indivíduo. Entretanto, o valor glicêmico capilar obteve média de 151,75 mg/dl entre os idosos diabéticos, mantendo-se abaixo do valor considerado agudo (valores superiores a 200 mg/dl)29.

Outro achado relevante foi a correlação entre os testes TUGcognitivo e de fluência verbal em idosos com diabetes mellitus, demonstrando que as alterações na função executiva podem afetar a mobilidade, influenciando o risco de quedas. Dessa forma, a inclusão de métodos de avaliação como a dupla tarefa é de grande importância, uma vez que permite investigar outros aspectos relacionados ao processamento de informações, atenção e mobilidade, sendo úteis na previsão sobre o risco quedas e/ou na avaliação de possíveis intervenções30.

Ambos os grupos de idosos apresentaram semelhança quanto à idade, ao gênero e ao IMC. Considerando que essas variáveis podem afetar o desempenho nos testes de mobilidade física, pode-se excluir, então, a influência de tais fatores sobre as alterações observadas no presente estudo. Rosa et al.31 observaram uma associação entre risco de quedas e aspectos socio-demográficos, como escolaridade e atividades de lazer. O nível de escolaridade e as atividades que os idosos consideram de lazer também foram semelhantes nos dois grupos.

Apesar dos importantes resultados encontrados neste estudo, algumas das suas limitações devem ser consideradas. Primeiramente, o fato de tratar-se de uma amostra de conveniência limita sua validade externa, impedindo que seus resultados sejam generalizados. Segundo, o delineamento transversal não permite inferências causais sobre as relações entre as variáveis estudadas. Outro ponto a ser considerado é que a ocorrência de hiperglicemia crônica, importante fator de influência na função executiva, não foi investigada por exigir exames laboratoriais mais complexos, maiores custos e acompanhamento dos participantes. Porém, futuros trabalhos que investiguem a hiperglicemia crônica são importantes para melhor compreensão de seus efeitos sobre a funcionalidade do idoso diabético.

Este estudo demonstrou que idosos diabéticos apresentaram pior desempenho em relação à mobilidade, dupla tarefa e função executiva, sugerindo um maior risco de quedas para esses indivíduos, quando comparados a idosos sem diabetes. Observou-se também uma correlação entre o teste de fluência verbal e desempenho na dupla tarefa (TUGcognitivo), indicando que a mobilidade pode ser afetada por alterações na função executiva. Esses resultados, juntamente com achados de pesquisas prévias, enfatizam a necessidade de se incluir, na avaliação de idosos diabéticos, testes como o de dupla tarefa, uma vez que eles apontam aspectos importantes relacionados ao processamento de informações, atenção e funcionalidade.

Além de os idosos diabéticos gastarem um tempo maior para realização do teste de mobilidade funcional e dupla tarefa e apresentarem um pior desempenho no teste de fluência verbal, ainda são mais vulneráveis às quedas. Este estudo também demosntrou que as sugestivas alterações na função executiva presentes nos idosos da amostra pesquisada tiveram associação com o desempenho nos testes de mobilidade (TUG e o TUGcognitivo). Assim, analisar os fatores que levam idosos com diabetes mellitus a apresentarem um maior risco de quedas é de fundamental importância para a prática clínica. A inclusão do TUG associado à tarefa cognitiva pode ser de grande valia para um diagnóstico fisioterápico mais fidedigno, sendo importante na prática clínica da fisioterapia na velhice, a qual busca principalmente preservar a mobilidade do idoso, manter a função executiva e a funcionalidade e diminuir quedas.

Recebido: 15/09/2009 - Revisado: 23/03/2010 - Aceito: 07/07/2010

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  • Correspondência para:
    Daniela Maria da Cruz dos Anjos
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    Resumo da pesquisa apresentado em forma de pôster. ANJOS, D. M. C, ALVARENGA, P. P, PEREIRA, D.S. Risk of fall and executive functional in diabetic and non diabetic elderly. In: 19 IAGG World Congress of Gerontology and Geriatrics, 2009, Paris. The Journal of Nutrition, Health & Aging. Paris: JNHA, 2009. v.13. p.607-607.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Revisado
      23 Mar 2010
    • Recebido
      15 Set 2009
    • Aceito
      07 Jul 2010
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