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Diferentes instruções durante teste de velocidade de marcha determinam aumento significativo na velocidade máxima de indivíduos com hemiparesia crônica

Resumos

OBJETIVO: Avaliar os efeitos de diferentes instruções para avaliação da velocidade de marcha máxima de indivíduos hemiparéticos durante o teste de caminhada de 10 metros. MÉTODOS: Os indivíduos deambularam em quatro condições experimentais: (1) velocidade habitual, (2) velocidade máxima (comando verbal simples), (3) velocidade máxima (comando verbal modificado: pegar ônibus), (4) velocidade máxima (comando verbal + demonstração). Solicitou-se a cada participante que deambulasse três vezes em cada condição, e a média do tempo necessário para percorrer os 10 metros intermediários de um corredor de 14 metros foi utilizada para cálculo da velocidade (m/s). A ANOVA de medidas repetidas, com contrastes pré-planejados, foi utilizada para comparação dos dados (α=5%), sendo apresentados valores de média, desvio-padrão e intervalos de confiança (IC) de 95%. RESULTADOS: As médias de velocidade para as quatro condições foram: (1) 0,74m/s; (2) 0,85m/s; (3) 0,93m/s; (4) 0,92m/s, respectivamente, apresentando diferenças significativas entre as condições (F=40,9; p<0,001). A velocidade de marcha habitual diferiu das demais condições, indicando que os indivíduos foram capazes de aumentar a velocidade quando solicitados. Foram observadas diferenças significativas entre a segunda condição, a terceira (p=0,002; IC95%=-0,13 a -0,03) e a quarta (p=0,004; IC95%=-0,12 a -0,02), sendo que as duas últimas condições não diferiram entre si (p=1,00; IC95%=-0,04 a 0,05). CONCLUSÕES: Os resultados indicaram que comandos verbais simples não foram suficientes para captar velocidade de marcha máxima em indivíduos com hemiparesia crônica. Assim, em situações em que seja necessária a avaliação de velocidade máxima, deve-se utilizar estratégia de comando verbal modificada ou associada à demonstração para garantir acurácia da informação.

mobilidade; acidente vascular encefálico; reforço verbal; fisioterapia


OBJECTIVE: To evaluate the effects of different instructions for the assessment of maximum walking speed during the ten-meter walking test with chronic stroke subjects. METHODS: Participants were instructed to walk under four experimental conditions: (1) comfortable speed, (2) maximum speed (simple verbal command), (3) maximum speed (modified verbal command-"catch a bus") and (4) maximum speed (verbal command + demonstration). Participants walked three times in each condition and the mean time to cover the intermediate 10 meters of a 14-meter corridor was registered to calculate the gait speed (m/s). Repeated-measures ANOVAs, followed by planned contrasts, were employed to investigate differences between the conditions (α=5%). Means, standard deviations and 95% confidence intervals (CI) were calculated. RESULTS: The mean values for the four conditions were: (1) 0.74m/s; (2) 0.85 m/s; (3) 0.93 m/s; (4) 0.92 m/s, respectively, with significant differences between the conditions (F=40.9; p<0.001). Comfortable speed was significantly slower than the maximum speed, indicating that the participants were able to increase speeds when required. Significant differences were observed between the second condition with the third (p=0.002; 95%CI=-0.13 to -0.03) and the fourth conditions (p=0.004; 95%CI=-0.12 to -0.02) with no differences between the third and fourth conditions (p=1.00; 95%CI=-0.04 to 0.05). CONCLUSIONS: The results indicated that simple verbal commands were not sufficient to capture maximum gait speed with chronic stroke subjects. Thus, for clinical assessments and research purposes, where measurements of the maximum gait speed are necessary, modified verbal commands or demonstration strategies could be employed by physical therapists to ensure acurate information.

mobility; stroke; verbal reinforcement; physical therapy


IDepartamento de Fisioterapia, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil

IIFisioterapeuta, Belo Horizonte, MG, Brasil

Correspondência para

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar os efeitos de diferentes instruções para avaliação da velocidade de marcha máxima de indivíduos hemiparéticos durante o teste de caminhada de 10 metros.

MÉTODOS: Os indivíduos deambularam em quatro condições experimentais: (1) velocidade habitual, (2) velocidade máxima (comando verbal simples), (3) velocidade máxima (comando verbal modificado: pegar ônibus), (4) velocidade máxima (comando verbal + demonstração). Solicitou-se a cada participante que deambulasse três vezes em cada condição, e a média do tempo necessário para percorrer os 10 metros intermediários de um corredor de 14 metros foi utilizada para cálculo da velocidade (m/s). A ANOVA de medidas repetidas, com contrastes pré-planejados, foi utilizada para comparação dos dados (α=5%), sendo apresentados valores de média, desvio-padrão e intervalos de confiança (IC) de 95%.

RESULTADOS: As médias de velocidade para as quatro condições foram: (1) 0,74m/s; (2) 0,85m/s; (3) 0,93m/s; (4) 0,92m/s, respectivamente, apresentando diferenças significativas entre as condições (F=40,9; p<0,001). A velocidade de marcha habitual diferiu das demais condições, indicando que os indivíduos foram capazes de aumentar a velocidade quando solicitados. Foram observadas diferenças significativas entre a segunda condição, a terceira (p=0,002; IC95% [-0,13 a -0,03] e a quarta (p=0,004; IC95%=-0,12 a -0,02), sendo que as duas últimas condições não diferiram entre si (p=1,00; IC95%=-0,04 a 0,05).

CONCLUSÕES: Os resultados indicaram que comandos verbais simples não foram suficientes para captar velocidade de marcha máxima em indivíduos com hemiparesia crônica. Assim, em situações em que seja necessária a avaliação de velocidade máxima, deve-se utilizar estratégia de comando verbal modificada ou associada à demonstração para garantir acurácia da informação.

Palavras-chave: mobilidade; acidente vascular encefálico; reforço verbal; fisioterapia.

Introdução

O acidente vascular encefálico (AVE) é conceituado como uma síndrome clínica decorrente de uma redução do suprimento sanguíneo a estruturas encefálicas, sendo considerado um dos maiores problemas de saúde pública e uma das principais causas de incapacidade no mundo1-4. De modo geral, os indivíduos após AVE podem apresentar alterações sensitivas e cognitivas, embora sejam mais frequentes as alterações motoras, dentre as quais se destacam fraqueza muscular, hipertonia, padrões anormais de movimento e descondicionamento físico5. As alterações musculoesqueléticas são consideradas importantes deficiências em indivíduos com AVE e, usualmente, determinam limitações durante a realização de atividades funcionais, prejudicando a eficiência em atividades de vida diária, tais como descer e subir escadas e deambular2.

Indivíduos com hemiparesia comumente apresentam modificações nas variáveis biomecânicas da marcha. De modo geral, apresentam diminuição da velocidade e de cadência, fase de balanço prolongada, redução de amplitude de movimento, diminuição do equilíbrio e inabilidade para transferir o peso no membro parético3,6,7. São descritas, ainda, dificuldades para modificar velocidade, direção, duração e intensidade da atividade muscular, resultando em movimento malcoordenado do membro parético3,6.

A velocidade de marcha é um parâmetro espaço-temporal comumente deficiente após AVE, e evidências científicas demonstraram considerável correlação de tal variável com indicadores de funcionalidade e qualidade de vida nessa população8,9. Para tanto, a velocidade de marcha tem sido utilizada como referência para definição de prognóstico, grau de independência, eficácias de intervenção8 e, por ser uma medida confiável, sensível a mudanças e de fácil aplicação, tem sido utilizada em avaliações clínicas como parâmetro mensurável e comparativo durante programas de reabilitação3,6 e em pesquisas científicas10.

Embora indivíduos acometidos por AVE apresentem considerável dificuldade em aumentar a velocidade de marcha, estudos9,11 indicaram que eles são capazes de modificá-la quando solicitados ou em determinadas situações de vida diária, tais como correr para alcançar um ônibus ou atender ao telefone. Entretanto, estudos prévios avaliaram a velocidade de marcha habitual e máxima somente por meio de comando verbal simples9,10,12-14, definido como sequência de palavras expressas pelo terapeuta ao participante a fim de obter uma resposta motora específica15,16.

O comando verbal simples pode ser um instrumento facilitador e eficiente para permitir a emergência de diferentes comportamentos motores, e variações impostas pela tonalidade da voz podem influenciar diretamente a resposta motora17. Porém, em determinadas situações, o componente verbal pode não ser suficiente para instruir o paciente acerca de um conjunto particular de respostas pretendidas15,17 e, especificamente, não ser capaz de direcionar adequadamente indivíduos com hemiparesia crônica para permitir a emergência da máxima velocidade de deambulação suportada pelo sistema. Desse modo, a fim de melhorar o entendimento da instrução fornecida, pode-se agregar às informações usuais componentes não-verbais15,18.

A associação de outros componentes aos tradicionais componentes verbais tem sido utilizada para melhorar o desempenho de indivíduos durante testes de caminhada ou durante avaliações do membro superior parético. Guyatt et al.19 constataram o efeito do comando verbal de encorajamento durante o teste de caminhada, encontrando valores maiores de distância percorrida quando os participantes receberam comando verbal de encorajamento, estabelecendo, dessa forma, orientações específicas para direcionamento do teste. Em avaliações do membro superior parético, em que o indivíduo deve realizar as tarefas propostas em menor tempo possível20,21, a demonstração da atividade em máxima velocidade pelo terapeuta tem se mostrado eficiente para melhor avaliar a capacidade dos indivíduos22. Embora condições com informações adicionais pareçam facilitar o entendimento e otimizar o desempenho motor durante a execução da tarefa, não se encontraram estudos sobre o efeito de diferentes instruções para avaliação da velocidade de marcha máxima em indivíduos com hemiparesia.

Para tanto, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito de diferentes instruções na avaliação de velocidade de marcha de indivíduos com hemiparesia crônica durante a realização do teste de caminhada de 10 metros. As perguntas clínicas foram:

1. Indivíduos com hemiparesia crônica conseguem aumentar a velocidade de marcha habitual quando solicitados?

2. A associação de novos componentes instrucionais aos comandos verbais simples determina aumento significativo da velocidade de marcha máxima?

3. Qual componente instrucional associado aos comandos verbais simples determina maior aumento da velocidade de marcha máxima?

Materiais e métodos

Delineamento

Realizou-se um estudo experimental no Laboratório de Análise de Movimento da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil, do qual participaram indivíduos com hemiparesia crônica recrutados na comunidade em geral a partir de divulgação prévia de acordo com os seguintes critérios de inclusão: (1) diagnóstico clínico de AVE unilateral superior a seis meses, associado à hemiparesia de membro inferior; (2) idade igual ou superior a 20 anos; (3) capacidade de deambular 14 metros de forma independente; (4) ausência de alterações cognitivas significativas identificadas pelo Miniexame do Estado Mental (MEEM)23,24 e (5) ausência de outras deficiências neurológicas ou ortopédicas não relacionadas ao AVE. Foram excluídos do estudo os indivíduos que eram incapazes de compreender ou realizar o teste proposto. Todos os participantes incluídos no estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG (parecer nº. ETIC 0538.0.203.000-09).

Instrumentos e medida

A velocidade de marcha foi avaliada por meio do teste de caminhada de 10 metros, seguindo critérios descritos por Salbach et al.12. O teste foi realizado em um corredor plano que continha 14 metros, e o tempo necessário para percorrer os 10 metros intermediários foi registrado por meio de um cronômetro digital, sendo desconsiderados os dois metros iniciais e finais. Cadeiras foram utilizadas para demonstrar o início e final do trajeto, promovendo uma meta visual aos participantes. As diferentes instruções para a realização do teste foram fornecidas sempre pelo mesmo examinador e estão descritas nos procedimentos do estudo.

Procedimentos

Todos os participantes participaram de uma avaliação inicial para coleta de dados demográficos, clínicos e verificação dos critérios de inclusão/exclusão. Então, os indivíduos foram convidados a realizar o teste de caminhada de 10 metros em quatro diferentes condições experimentais, sendo as duas últimas aleatorizadas: (1) velocidade de marcha habitual - solicitou-se ao participante que caminhasse em sua velocidade confortável e habitual; (2) velocidade de marcha máxima (comando verbal simples) - o participante recebeu orientação para caminhar o mais rápido possível, com segurança e sem correr; (3) velocidade de marcha máxima (comando verbal modificado: alcançar um ônibus) - o indivíduo recebeu comando verbal específico para caminhar o mais rápido possível, com segurança e sem correr, para alcançar um ônibus prestes a arrancar e (4) velocidade de marcha máxima (comando verbal + demonstração) - o indivíduo foi orientado a caminhar o mais rápido possível, com segurança e sem correr, como demonstrado previamente pelo terapeuta. Cada participante foi orientado a deambular três vezes em cada condição específica, com descanso de 20 segundos entre cada mensuração, sendo registrada a média das três medidas. O tempo necessário para percorrer os 10 metros intermediários do corredor de 14 metros foi registrado e, posteriormente, utilizado para cálculo da velocidade de marcha (m/s) em cada condição.

Análise estatística

Estatísticas descritivas foram utilizadas para a caracterização da amostra em relação às principais variáveis clínicas e antropométricas. Testes de normalidade (Shapiro-Wilk) e de homogeneidade de variância (Levene) foram aplicados para todas as variáveis de desfecho do estudo. Considerando a distribuição normal dos dados, uma análise de variância multifatorial para medidas repetidas (ANOVA), seguida por contrastes pré-planejados para localizar as diferenças entre as condições, foi conduzida para comparação das velocidades de marcha em cada condição experimental. Todos os cálculos foram realizados utilizando o programa estatístico SPSS para Windows, versão 15.0, e o nível de significância estabelecido foi de 5%. Os resultados foram apresentados considerando médias, desvios-padrão e intervalos de confiança de 95% (IC95%) na comparação entre as diferentes condições experimentais.

Resultados

A amostra estudada incluiu 14 indivíduos (10 homens) com idade média de 58±4,94 anos e tempo pós-AVE de 102±76,90 meses. As características clínicas dos indivíduos são descritas na Tabela 1.

A velocidade média obtida em cada condição foi: (1) velocidade habitual: 0,74±0,23 m/s; (2) velocidade de marcha máxima (comando verbal simples): 0,85±0,27 m/s; (3) velocidade de marcha máxima (comando verbal modificado: alcançar ônibus): 0,93±0,30 m/s; (4) velocidade de marcha máxima (comando verbal + demonstração): 0,92±0,30 m/s (F=40,9; GL=3; p<0,001). Contrastes pré-planejados revelaram que a velocidade habitual diferiu das demais condições, indicando que os indivíduos estudados foram capazes de aumentar a velocidade de marcha quando solicitados (p<0,001; IC95% [-0,27 a -0,06]).

A condição de comando verbal simples apresentou valores de velocidade de marcha significativamente inferiores em relação às condições de comando modificado, indicando que novas instruções devem ser incorporadas para avaliação de velocidade de marcha máxima em indivíduos com hemiparesia crônica. A diferença média entre a condição 3 foi equivalente a 0,08 m/s (p=0,002; IC95% [-0,13 a -0,03]) e, entre a condição 4, equivalente a 0,07 m/s (p=0,004; IC95% [-0,12 a -0,02]). As duas últimas condições não diferiram entre si, indicando que ambas as instruções modificadas podem ser utilizadas para avaliação da velocidade de marcha máxima (0,01 m/s; p=1,000; IC95% [-0,04 a 0,05]). Os valores obtidos em cada condição experimental estão representados na Figura 1.


Discussão

Medidas de velocidade de marcha de curta distância são frequentemente utilizadas como medidas de desfecho na prática clínica e em trabalhos científicos a fim de estimar a capacidade funcional e o desempenho de indivíduos pós-AVE8,12,25. Os testes clínicos de velocidade de marcha são os mais aplicados e recomendados para avaliação da mobilidade de indivíduos com sequelas de AVE, seja em ambientes comunitários seja em institucionais, devido à facilidade de aplicação, não-necessidade de treinamento ou equipamentos sofisticados e por proverem medidas adequadas da mobilidade dos indivíduos na realização de atividades de vida diária26,27. Ademais, mudança na velocidade de marcha apresenta-se como um dos principais fatores determinantes da melhora de incapacidades funcionais nessa população e significativa correlação com o desempenho social e comunitário de indivíduos com hemiparesia crônica26,28.

Os resultados do presente estudo indicaram que indivíduos com hemiparesia crônica foram capazes de aumentar a velocidade de marcha habitual quando solicitados, sugerindo que essa habilidade seja utilizada em situações de vida diária que exijam aceleração imediata, tais como andar mais rapidamente para alcançar um ônibus ou atender a um telefonema. Esses achados reforçam a importância da avaliação clínica da velocidade de marcha máxima em adição à velocidade habitual. De acordo com Perry et al.8, a partir da velocidade de marcha máxima alcançada por esses indivíduos, pode-se estimar seus níveis de mobilidade e independência. Por exemplo, após três meses de AVE, a velocidade de 0,8 m/s sugere marcha independente; valores em torno de 0,4 m/s indicam uma mobilidade restrita na comunidade e de 0,26 a 0,4 m/s, mobilidade restrita à casa8.

A velocidade de marcha máxima nessa população é comumente avaliada por meio de comandos verbais simples fornecidos pelo terapeuta ou pesquisador durante as instruções do teste9-13. Entretanto, a não-associação desses comandos verbais simples a outras estratégias de incentivo pode subestimar a real capacidade do indivíduo. Os dados do presente estudo indicaram que a associação de novos componentes instrucionais aos comandos verbais simples determinou aumento significativo da velocidade de marcha máxima. Clinicamente, recomenda-se, portanto, que, durante a avaliação de velocidade de marcha máxima de indivíduos com hemiparesia crônica, seja utilizada a estratégia de demonstração ou estratégia de comando verbal modificado (alcançar um ônibus) para mimetizar o melhor desempenho funcional dos indivíduos em situações de vida diária.

Esforços têm sido conduzidos na tentativa de estimar a velocidade de marcha máxima em indivíduos com hemiparesia. Kollen, Kwakkel e Lindeman9 sugeriram que, na população de indivíduos com sequela de AVE, a velocidade de marcha máxima é 1,3 vez maior que a velocidade habitual, sendo a relação estável ao longo do tempo, não sofrendo variação em função da idade, tempo pós-AVE, nem tipo de intervenção a que o indivíduo foi submetido. Há uma preocupação em submeter indivíduos com hemiparesia a avaliações consecutivas de velocidade de marcha relacionadas ao número de repetições do teste para se obter uma medida válida e confiável, principalmente em relação ao teste em velocidade máxima, que poderia sobrecarregar os pacientes ou colocá-los em risco29,30. No presente estudo, optou-se por utilizar a média de três repetições para análise dos dados, mas evidências recentes26 indicaram que única medida após familiarização com o teste demonstrou ser suficiente para captar informações reais sobre velocidade de marcha em ambiente clínico, sem alterações significativas das propriedades psicométricas ou erros de medida relacionados aos procedimentos de avaliação. Dessa forma, recomenda-se, quando possível, a avaliação clínica da velocidade de marcha máxima como alternativa ao uso de estimativas, pois o uso da estimativa de velocidade máxima poderia determinar valores diferentes da real velocidade de marcha possível por esses indivíduos em condições experimentais ou durante a reabilitação. Tais achados reforçam a importância de se estabelecerem comandos eficazes para permitir a emergência da velocidade máxima durante a avaliação de pacientes. Os dados do presente estudo demonstraram que o uso do componente instrucional modificado (alcançar ônibus ou demonstração) foi capaz de determinar aumento significativo na velocidade de marcha máxima de indivíduos com hemiparesia crônica similarmente ao estimado, facilitando o entendimento e a ação específica da atividade.

Os resultados indicaram, ainda, importantes implicações clínicas relacionadas ao treino de marcha nessa população, pois permite que profissionais da reabilitação estabeleçam metas de treinamento seguras em maiores velocidades, visando melhor preparação dos indivíduos para solucionar as demandas impostas por um estilo de vida independente9. Em indivíduos com hemiparesia, treinar em velocidades mais próximas da velocidade real determina aumento de velocidade de marcha e modificações na cinemática e padrão de ativação muscular, o que pode refletir em melhor adaptação social e marcha comunitária independente11,31.

O estudo apresenta limitações relacionadas ao tamanho e características da amostra, restringindo a generalização dos resultados para toda a população de indivíduos com hemiparesia decorrente de AVE. Os dados do presente estudo refletem a capacidade de indivíduos com hemiparesia em fase crônica e nível de recuperação motora variando entre leve e moderado, sem alterações cognitivas. Dessa forma, estudos futuros são necessários para avaliar a efetividade dos comandos propostos para indivíduos na fase aguda da doença ou com comprometimentos motores mais graves. Outras estratégias possivelmente deverão ser estabelecidas para a avaliação de indivíduos com hemiparesia associada a alterações cognitivas relacionadas ao AVE. Embora o estudo forneça informações acerca da capacidade de realização de velocidade de marcha máxima em um ambiente de pesquisa padronizado, outros fatores relacionados às características naturais do ambiente podem influenciar o desempenho desses indivíduos no cotidiano e devem ser investigados em estudos futuros.

Conclusões

Os resultados do presente estudo indicaram que indivíduos com hemiparesia crônica foram capazes de aumentar velocidade de marcha quando solicitados. Entretanto, comandos verbais simples não foram suficientes para captar velocidade de marcha máxima nessa população. Dessa forma, durante avaliações clínicas ou em pesquisas científicas, nas quais seja necessária a avaliação de velocidade de marcha máxima, deve-se utilizar estratégia de comando verbal modificada ou associada à demonstração para garantir realidade da informação. Os comandos propostos permitirão a terapeutas estabelecerem metas de treinamento em velocidades de marcha maiores e ainda seguras, visando à recuperação motora e funcional de indivíduos com hemiparesia crônica.

Agradecimentos

Às agências de financiamento nacionais Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).

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    Lucas R. NascimentoI; Lívia C. G. CaetanoII; Daniele C. M. A. FreitasII; Tatiane M. MoraisII; Janaine C. PoleseI, Luci F. Teixeira-SalmelaI
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Mar 2012
    • Data do Fascículo
      Abr 2012

    Histórico

    • Recebido
      15 Jun 2011
    • Aceito
      12 Jul 2011
    • Revisado
      30 Nov 2011
    Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Fisioterapia Rod. Washington Luís, Km 235, Caixa Postal 676, CEP 13565-905 - São Carlos, SP - Brasil, Tel./Fax: 55 16 3351 8755 - São Carlos - SP - Brazil
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