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Qualidade de medições e neutralização de efluentes alcalinos com dióxido de carbono

Quality of measurements and neutralization of alkaline effluents with carbon dioxide

Resumos

O controle de pH de efluentes industriais, para fins de descarga, é estabelecido por leis estaduais e federais. Devido ao não conhecimento da incerteza de suas medições e principalmente não se conhecendo sua rastreabilidade a padrões nacionais e/ou internacionais, pode ocorrer não conformidade ao se permitir a descarga de efluente ao meio ambiente. Este trabalho enfoca a qualidade das medições de pH, através dos aspectos da rastreabilidade e da incerteza de medição, seguindo os conceitos introduzidos pela ISO GUM. O experimento foi realizado com amostra de efluente alcalino coletado de uma indústria têxtil, envolvendo a reação de neutralização usando o dióxido de carbono. Resultados de pH acompanhados de suas incertezas oferecem informação mais completa na prevenção contra descargas impróprias de efluentes ao meio.

Efluente alcalino; dióxido de carbono; pH; incerteza


State and federal laws rule the control of pH of industrial effluents aiming discharge and environmental protection. Improper effluent discharges can occur if obtained pH measurements do not meet traceability to national and/or international standards and are not associated with their uncertainties. This work focuses the quality of the pH measurements and follows the ISO GUM instructions by demonstrating the traceability and estimating the uncertainty of the measurements. The experiment was carried out using an alkaline effluent sample of a textile industry, involving the neutralization reaction with carbon dioxide. Having pH measurements associated with its uncertainty can prevent risks of improper discharge of effluent to the environment.

Alkaline effluent; carbon dioxide; pH; uncertainty


ARTIGO TÉCNICO

Qualidade de medições e neutralização de efluentes alcalinos com dióxido de carbono

Quality of measurements and neutralization of alkaline effluents with carbon dioxide

Eloy Alves Ferreira FilhoI; Queenie Siu Hang ChuiII

IMestre em Engenharia e Ciência dos Materiais. Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciência dos Materiais - PPGECM. Universidade São Francisco - USF

IIDoutora em Química Analítica Ambiental. Docente do PPGECM - USF

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Queenie Siu Hang Chui Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciência dos Materiais - PPGECM Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45 Itatiba 13251-040 São Paulo - SP - Brasil Tel.: (11) 4534 8025 E-mail: queenie.hang@saofrancisco.edu.br

RESUMO

O controle de pH de efluentes industriais, para fins de descarga, é estabelecido por leis estaduais e federais. Devido ao não conhecimento da incerteza de suas medições e principalmente não se conhecendo sua rastreabilidade a padrões nacionais e/ou internacionais, pode ocorrer não conformidade ao se permitir a descarga de efluente ao meio ambiente. Este trabalho enfoca a qualidade das medições de pH, através dos aspectos da rastreabilidade e da incerteza de medição, seguindo os conceitos introduzidos pela ISO GUM. O experimento foi realizado com amostra de efluente alcalino coletado de uma indústria têxtil, envolvendo a reação de neutralização usando o dióxido de carbono. Resultados de pH acompanhados de suas incertezas oferecem informação mais completa na prevenção contra descargas impróprias de efluentes ao meio.

Palavras-chave: Efluente alcalino, dióxido de carbono, pH, incerteza

ABSTRACT

State and federal laws rule the control of pH of industrial effluents aiming discharge and environmental protection. Improper effluent discharges can occur if obtained pH measurements do not meet traceability to national and/or international standards and are not associated with their uncertainties. This work focuses the quality of the pH measurements and follows the ISO GUM instructions by demonstrating the traceability and estimating the uncertainty of the measurements. The experiment was carried out using an alkaline effluent sample of a textile industry, involving the neutralization reaction with carbon dioxide. Having pH measurements associated with its uncertainty can prevent risks of improper discharge of effluent to the environment.

Keywords: Alkaline effluent, carbon dioxide, pH, uncertainty

INTRODUÇÃO

A grande preocupação com o controle do meio ambiente tem motivado as indústrias e órgãos ambientais do governo a minimizar os efeitos prejudiciais da poluição ambiental. A manutenção dos recursos hídricos, tanto para o consumo industrial como doméstico, obriga o controle de parâmetros previamente estabelecidos, de modo a permitir a preservação da fauna e flora, além do reaproveitamento das águas dos mananciais.

O Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, foi instituído pela Lei 6938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, regulamentada pelo Decreto 99274/90. A Resolução nº 20 do CONAMA, de 18.06.86, estabeleceu nove classes de rios em função dos usos preponderantes para águas doces, salinas e salobras do Território Nacional. Diversas leis federais foram estabelecidas integrando a Política Nacional do Meio Ambiente, porém a grande evolução veio com a lei nº 9433, de 08.01.97, que instituiu a Política e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, em que cabe a cada Estado do Território Nacional instituir o Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos, que prevê congregar os órgãos estaduais e municipais e a sociedade civil, e assegurar meios financeiros e institucionais. Na Constituição do Estado de São Paulo, o artigo 208 veda o lançamento de efluentes industriais e esgotos urbanos sem o devido tratamento em qualquer corpo de água. Para estabelecer limites e condições para os corpos de água em função dos usos e o sistema de licenciamento para as fontes de poluição foi criado o Decreto nº 8468, de 08.09.79, que regulamentou a Lei Estadual de 31.05.76.

No que tange ao pH, o artigo de nº 18 desta lei estabelece que "os efluentes de qualquer fonte poluidora somente poderão ser lançados, direta ou indiretamente, nas coleções de água, desde que os valores se encontrem entre 5,0 (cinco inteiros) e 9,0 (nove inteiros)"; por outro lado, o artigo de nº 19 indica que "os efluentes somente poderão ser lançados em sistema de esgotos, provido de tratamento com capacidade e de tipo adequados, conforme previsto no § 4º deste artigo, se obedecerem às condições de pH entre 6,0 (seis inteiros) e 10,0 (dez inteiros)".

A condição de pH dos efluentes decorre da contaminação provocada pelos diversos processos industriais de fabricação. O contato da água com substâncias como soda cáustica, potassa cáustica, cal, entre outras, libera um efluente final alcalino altamente prejudicial aos mananciais, necessitando de uma solução corretiva para redução do pH para níveis toleráveis. Em geral empregam-se os ácidos inorgânicos, sulfúrico e clorídrico, para efluentes provenientes de indústrias muitas vezes localizadas em áreas de mananciais. Os danos causados por estes ácidos agressivos e os altos riscos advindos de sua utilização e problemas durante o transporte podem comprometer seriamente o meio ambiente.

A alternativa usando o dióxido de carbono como neutralizador de efluentes alcalinos é justificada pela sua facilidade operacional. Além de evitar os riscos provenientes de vapores tóxicos, queimaduras e outras lesões, que ocorrem com a manipulação de ácidos inorgânicos, reduz os custos de manutenção devido ao seu baixo potencial de corrosão. Devido às características do sistema tampão CO32-/HCO3- presente, o pH final de neutralização do efluente alcalino não se altera mesmo com a adição de excesso de dióxido de carbono. Isto representa uma vantagem sobre o processo com ácidos minerais inorgânicos, pois um pequeno excesso destes já levaria o pH do efluente a valores mais baixos, levando a conseqüências adversas ao meio ambiente.

O controle de pH dos processos de neutralização é simples, porém observa-se que, em geral, não existe rastreabilidade para suas medições. Apesar de as empresas dedicarem grandes esforços na obtenção de certificados de sistemas de gestão ambiental, seus laboratórios muitas vezes não têm o controle de calibração de seus equipamentos validado, não demonstram a rastreabilidade de soluções tampão a padrões nacionais e/ou internacionais, não atendem aos procedimentos adequados de limpeza e manutenção de eletrodos, enfim não demonstram efetivamente a confiabilidade metrológica de suas medições.

Muitas vezes as medições de pH obtidas, utilizando equipamentos sem a devida calibração e controle (Fraga et al, 2002), podem estar indicando valores permitindo o descarte de efluente em pH dentro do padrão ambiental estabelecido (pH entre 5,0 a 9,0 conforme atendendo ao artigo 18 ou pH entre 6,0 a 10,0 com respeito ao artigo 19); porém, na realidade, pode estar ocorrendo não conformidade, devido ao não conhecimento da incerteza desses valores. E a incerteza somente pode ser estabelecida quando se conhece a rastreabilidade das medições (Oliveira, 2003).

Com referências às normas da série NBR/ISO 14000 para a gestão ambiental, esta compartilha princípios comuns com as normas da série NBR/ISO 9000 relativas ao sistema da qualidade. No entanto em auditorias de sistemas de gestão ambiental, pouca ênfase é dada à confiabilidade em resultados de medições gerados nos laboratórios das empresas.

Este trabalho enfoca a qualidade das medições de pH, através da abordagem da rastreabilidade e incerteza da medição, em um estudo de caso envolvendo o processo alternativo de neutralização de efluente alcalino usando o dióxido de carbono.

RASTREABILIDADE E INCERTEZA DE MEDIÇÕES

Toda medição possui erros de natureza sistemática ou aleatória, o que acrescenta uma incerteza ao resultado. Resultados de medições expressos apenas como médias sem as respectivas incertezas carecem de significado, pois não dão a informação completa sobre a medição. Assim, não podem ser comparados com os valores designados como limites e/ou valores de referência. Para conferir qualidade às medições é necessário conhecer a rastreabilidade (VIM, 1995) e a incerteza associada aos seus valores.

A rastreabilidade das medições tornou-se obrigatória (CNI, 2005), ou seja, qualquer resultado de medição deve fazer parte de uma cadeia contínua de valores, denominada "cadeia de rastreabilidade" (ISO GUM, 1998). Em todos os níveis dessa cadeia, deve-se adotar o Sistema Internacional de Unidades - SI (BIPM, 1998), bem como deve ser feita uma investigação sobre a incerteza da medição. Em todos os países, os Institutos Nacionais de Metrologia têm o papel de controlar e manter os valores das propriedades específicas atribuídas aos padrões nacionais. No Brasil, esse papel é desempenhado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – INMETRO.

A incerteza total do resultado de uma medição resulta da soma das incertezas que se originam de diversos fatores de influência do processo de medição e que geram variabilidades no cômputo do resultado final. A incerteza se propaga desde a calibração da grandeza primária até a utilização final do instrumento, incorporando as incertezas dos vários laboratórios hierarquicamente organizados, que tenham participado do processo de medição. Apesar de a incerteza refletir principalmente características de padrões e métodos, ela contém também componentes do próprio instrumento calibrado.

A forma de expressar a incerteza da medição deve ser padronizada para que todos os laboratórios se expressem da mesma maneira, e para que a propagação dessa incerteza se dê de forma conhecida. De acordo com as instruções do Guia para a Expressão da Incerteza de Medição (ISO GUM, 1998), o técnico deve calcular e avaliar a incerteza padrão tipo A, a(s) incerteza(s) padrão tipo B, a incerteza combinada e a incerteza expandida, que é a sua expressão final. Por definição, a incerteza padrão tipo A (µA) é aquela obtida por meios puramente estatísticos, ou seja, é avaliada a partir da análise de uma série de observações, calculando-se o desvio padrão da média seguindo os métodos da estatística clássica. A incerteza padrão tipo B (µB) também deve ser dada na forma de desvio padrão, porém seguindo o princípio da estatística bayesiana (Harry e Waller, 1994), ou seja, consiste em admitir que os possíveis valores das quantidades em estudo seguem uma distribuição de probabilidades que esteja de acordo com todo o conhecimento e informações disponíveis sobre as variabilidades dessas quantidades (Vuolo, 1999); dentre elas incluem-se as informações técnicas fornecidas por fabricantes dos instrumentos utilizados, a incerteza de padrões utilizados para a devida calibração do instrumento (evidenciada no seu relatório de calibração), a incerteza observacional (paralaxe, interpolação, instabilidade da indicação digital, etc.), as incertezas ambientais, que compreendem as influências devidas à temperatura ambiente e outras de importância para cada situação específica em estudo. Algumas das distribuições comumente consideradas são a distribuição retangular, a distribuição triangular e a de Laplace-Gauss (Harry e Waller, 1994). A combinação de incertezas padrão tipo A e tipo B deverá ser feita pela fórmula usual de propagação de incertezas, para chegar à incerteza expandida (U), que expressa a incerteza combinada multiplicada por um fator de abrangência, K, obtido em função do nível de confiança e número de graus de liberdade efetivo, usando a fórmula de Welch-Satterthwaite (ISO GUM, 1998; Vuolo, 1999).

A RASTREABILIDADE NA MEDIÇÃO DE PH

Na rotina de laboratórios comuns, as medições são obtidas utilizando o medidor de pH e dois eletrodos, o indicador (geralmente o de vidro) e o de referência (de calomelano saturado ou de prata-cloreto de prata). O sistema medidor e eletrodos é previamente calibrado com uma ou mais soluções tampão de concentração hidrogeniônica conhecida, adquiridas no mercado. Muitas dúvidas são levantadas a respeito da rastreabilidade dos produtos comercializados, uma vez que o adequado preparo dessas soluções requer a utilização de materiais de referência primários (Buck et al, 2002), que são sais de pureza e de estabilidade comprovadas. Para a certificação destes materiais, suas medições devem estar referidas a sistemas primários para a medição de pH, cujas operações são atribuídas aos laboratórios nacionais metrológicos (Koch, 1997; Baucke et al, 1998). Até o momento, materiais de referência para fornecer rastreabilidade e confiabilidade às medições de pH não são produzidos no Brasil. Porém o INMETRO, através de sua Diretoria de Metrologia Científica e Industrial, cumprindo um de seus papéis de Instituto Nacional de Metrologia do País, implantou na sua Divisão de Metrologia Química o sistema primário para a medição de pH (Souza, 2003) com o objetivo de possibilitar a certificação de material de referência para soluções de pH. As soluções tampão assim certificadas fornecerão rastreabilidade e confiabilidade aos padrões secundários e medições de pH aos usuários.

MATERIAL E MÉTODO

Considerando o processo de neutralização usando dióxido de carbono, foi montado um protótipo similar ao existente em uma estação de tratamento de efluentes, usando uma bomba de circulação e um sistema de injeção de CO2 com venturi e plug poroso, para tornar as bolhas pequenas (Figura 1). O plug poroso era conectado a um cilindro de 8 kg de CO2 tipo post-mix, com regulador de pressão de duplo estágio marca White Martins tipo R-201 e fluxômetro de 0-15 l/min calibrado para uma pressão de 3,5 kgf/cm2 a fim de controlar a injeção de CO2.


Uma cuba em acrílico de 20 cm de largura, 60 cm de comprimento e 20 cm de profundidade, com capacidade de 24 litros foi usada para conter o efluente. O volume de aproximadamente 18 litros de efluente utilizado no experimento alcançava até 15 cm de altura.

Mangueiras poli-flow foram utilizadas para interligar a saída do fluxômetro à entrada da válvula de retenção e mangueira incolor de 12,5 mm, interligando a saída da cuba na entrada da bomba, saída da bomba, entrada no injetor de CO2 e saída do injetor na entrada da cuba.

Complementando o sistema, foram usados uma válvula de retenção Danfoss diâmetro 3/8 de polegadas, um injetor com sinterizado cerâmico e uma bomba de recirculação marca DANCOR com entrada e saída de 3/4 de polegadas, de recirculação com motor de 1/8 CV e 110V.

O medidor de pH marca Orion modelo 520 A foi usado para o controle do processo. Para a calibração do medidor, foram usadas 2 soluções tampão, de (7,00 ± 0,01) e (10,01 ± 0,02) unidades de pH, materiais de referência certificados por laboratório do National Institute of Standards and Technology – NIST (EUA).

Para a verificação das condições operacionais do protótipo proposto, foram preparadas soluções aquosas de hidróxido de amônio com pH de aproximadamente 12, adicionando, a um volume de 18 litros de água de torneira, alíquotas de 10 ml de reagente NH4OH 28%, até que o pH da solução resultasse em torno de 12. Em seguida, o processo de neutralização com dióxido de carbono foi simulado utilizando uma amostra de 18 litros de efluente alcalino coletado na Estação de Tratamento de Efluentes da Empresa Vicunha Textil Ltda, Unidade I em Itatiba, São Paulo, em 19/09/2003 às 18:00 horas. O efluente com vazão de 42 m3/h na entrada da estação apresentava os seguintes parâmetros: pH 11; sólidos totais dissolvidos de 210 mg/l; demanda química de oxigênio (DQO) expresso como 766 mg/l de O2 e temperatura de 61 0C.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os ensaios preliminares de neutralização utilizando 18 litros de soluções aquosas de hidróxido de amônio de pH de aproximadamente 12 foram repetidos 16 vezes, para observar a repetitividade do experimento. Os resultados estão mostrados na Tabela 1.

Pode-se observar que os ensaios apresentaram boa repetitividade, tendo sido consumidos 4,28 litros (valor médio) de CO2, com desvio padrão de 0,49 litros, representando um coeficiente de variação (CV) de 11%. O pH inicial médio de 12,53 com desvio padrão de 0,57 (CV = 4,5%) foi reduzido a um pH final com valor médio de 6,59 e desvio padrão de 0,14 (CV = 2,1%). Em seguida foram efetuados os cálculos para obter a incerteza final da medição de pH, seguindo as instruções do ISO GUM.

- Cálculo da incerteza padrão tipo A, uA, com base na dispersão das medições em replicatas em que S(pH) é o desvio padrão dos 16 resultados de pH e n=16 é o número de replicatas efetuadas.

- Cálculo da incerteza padrão do tipo B, uB , utilizando as informações técnicas (exatidão do instrumento) fornecidas pelo fabricante do instrumento, em que I é o valor da incerteza (±0,01) declarada pelo fabricante do instrumento dividido por fator (3½), considerando a distribuição retangular.

- Cálculo da incerteza padrão do tipo B, uB, considerando as informações técnicas sobre a resolução (R) do instrumento, sendo que sua incerteza é estimada como a metade do valor de sua resolução. O ISO GUM sugere, para resolução de indicadores digitais, considerar a distribuição retangular, portanto o valor da incerteza é dividido por raiz quadrada de 3.

- Cálculo da incerteza padrão do tipo B, uB, levando-se em conta a incerteza dos materiais de referência NIST usados para a calibração do medidor de pH. Considerando que a incerteza declarada compreendia o intervalo de 95% de confiança de uma distribuição normal, seu valor é dividido por 2.

- Cálculo da incerteza combinada (uC), que resulta da raiz quadrada da soma quadrática das várias parcelas, que representam as incertezas tipo A e tipo B.

- Cálculo dos graus de liberdade efetivos (uef) usando a expressão de Welch-Satterthwaite (ISO GUM, 1998; Vuolo, 1999).

Utilizando a tabela de T-Student, para graus de liberdade 20, o fator de abrangência é de 2,09 (95% de confiança), que é usada para o cálculo da incerteza expandida.

- Cálculo da incerteza expandida (U) para o valor de pH final na neutralização de soluções aquosas de NH4OH.

Como resultado final para o valor de pH e sua incerteza tem-se (6,59 ± 0,08).

Após ter sido verificado que a reação de neutralização acontecia sem problemas operacionais, foi conduzido o experimento usando efluente coletado da Estação de Tratamento de Efluentes da Vicunha Têxtil. Uma amostra de 18 litros desse efluente foi despejada na cuba de acrílico, após o que foi introduzido um fluxo de CO2 de 3 litros (0,55 m3 kg-1). A solução de pH inicial 11 foi neutralizada após 15 segundos, tendo o pH sido reduzido para 6,50. Considerando medição sem repetição e utilizando os valores obtidos para as incertezas do tipo B no caso acima, foi estimada a incerteza do valor de pH.

- Cálculo da incerteza combinada (uC) para o valor de pH resultante da neutralização de amostra de efluente de indústria têxtil:

- Cálculo da incerteza expandida (U) para o valor de pH final na neutralização de amostra de efluente de indústria têxtil. Considerando o nível de confiança de 95%, 1,96 corresponde ao fator de abrangência, K, que é multiplicado pelo valor obtido para a incerteza combinada.

O valor final de pH foi expresso como (6,50 ± 0,03). Portanto, pode-se dizer que, no final da reação, com 95% de confiança, o valor de pH se encontrava entre os limites de 6,47 a 6,53.

CONCLUSÃO

Pode-se observar que o resultado final de pH com a incerteza associada indicou valores que confirmam existirem condições de controle para fins de descarga, quando se consideram os limites admissíveis de pH 6,0 a 10,0 para a região onde a estação de tratamento está localizada.

Reações de neutralização de efluentes alcalinos, contando com medições de pH com rastreabilidade conhecida, representam uma segurança para evitar riscos de despejo de efluentes com pH fora dos níveis indicados pelas regras ambientais vigentes. O desconhecimento da incerteza associada à medição de pH possibilita que o responsável pelo controle de descarga do efluente tome decisões erradas.

Os procedimentos para a avaliação de incerteza tipo A usam métodos estatísticos bem conhecidos. No entanto não existe procedimento detalhado para a avaliação das incertezas tipo B. O avaliador deve escolher uma distribuição de probabilidades para valores possíveis da grandeza, sendo que essa escolha deve considerar as informações disponíveis sobre o mensurando e a medição. As instruções recomendadas pelo ISO GUM têm tido ampla repercussão e aceitação pelas instituições nacionais ligadas à Metrologia, porém ainda estão sujeitas a revisões e sugestões.

É importante ressaltar que também devem ser tomados cuidados com os eletrodos utilizados para a medição de pH. A sua inadequada manutenção pode favorecer a má qualidade de medições. Utilizar medidores e eletrodos não adequados para uso, invalidaria todos os resultados. A estimativa da incerteza das medições assim obtidas não teria sentido nenhum.

Apesar da importância de manter procedimentos de limpeza e manutenção dos eletrodos usados na rotina, os fabricantes dizem pouco a respeito de como fazê-lo e qual sua vida útil. Com referência a instruções em normas técnicas internacionais (BSI, 1984; DIN, 1989, 1985), são sugeridos testes de desempenho do eletrodo. O potencial de referência, a resistência de junção, o potencial da junção e a polaridade são itens que devem ser verificados. Porém, os procedimentos para testes de desempenho e os critérios para a sua aceitação ainda não foram estabelecidos, deixando ressaltada a necessidade da integração de laboratórios para a elaboração das normas técnicas nacionais (Chui et al, 2000).

Enfim, leis e regulamentações para proteção dos recursos hídricos estão bem definidas. Empresas em geral preocupam-se em atingir as metas da NBR/ISO 14000, porém nem todas dão a devida atenção à confiabilidade metrológica de suas medições, bem como os próprios auditores não o fazem em situações de avaliação. A disseminação dos conceitos de rastreabilidade e incertezas em medições só vem a favorecer a qualidade em todos os aspectos da vida humana.

Recebido: 06/09/05

Aceito: 02/05/06

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  • Endereço para correspondência:

    Queenie Siu Hang Chui
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Ago 2006
    • Data do Fascículo
      Jun 2006

    Histórico

    • Aceito
      02 Maio 2006
    • Recebido
      06 Set 2005
    Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental - ABES Av. Beira Mar, 216 - 13º Andar - Castelo, 20021-060 Rio de Janeiro - RJ - Brasil - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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