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Avaliação da toxicidade aguda de uma cepa de Microcystis spp. por meio de testes com camundongos

Acute toxicity evaluation for a Microcystis spp. strain by bioassay with male swiss albino mice

Resumos

Este estudo teve como objetivo complementar a caracterização da toxicidade de uma cepa de Microcystis spp., por meio de testes de toxicidade aguda com camundongos, após caracterização química preliminar de microcictinas - MCs realizada por cromatografia líquida de alta eficiência com detector de diodo HPLC-PDA e espectrometria de massas com ionização por electrospray MS-ESI. Os testes de toxicidade aguda com camundongos demonstraram, segundo classificação proposta por Lawton et al (1994b), que a cepa tóxica testada enquadra-se no grau de elevada toxicidade com valor de DL50 24h de extrato seco menor que 100 mg/kg p.c. (peso corpóreo) (13,7 mg/kg p.c.), de DL50 24h de microcistinas totais estimada de 24,2 µg/kg p.c. e concentração de MCs no material seco maior que 1,0 µg/mg p.s. (entre 1,64 e 1,86 µg/mg p.s.).

Análise de água; microcistinas; bioensaio; camundongos; DL50; cromatografia líquida de alta eficiência; espectrometria de massas; cianobactéria; toxicidade; PROSAB


This study was carried out to evaluate the toxicity of a strain of Microcystis spp, using acute toxicity bioassays with swiss albino mice and to characterize chemically the microcistins using high efficiency liquid chromatography with photodiode array detector (HPLC-PDA) and mass spectrometry with electrospray ionization (MS-ESI). The acute toxicity tests with mice showed that according to the classification proposed by Lawton et al (1994b), the toxic strain here tested corresponds to the degree of high toxicity with DL50 24h values for the dry extract lower than 100 mg/kg corporal weight (13,7 mg/kg corporal weight), while DL50(24h) for total microcystin - MCs concentration around 24,2 µg/kg corporal weight. and concentration of MCs in the dry material higher than 1,0 µg/mg dry weight (between 1.64 and 1.86 µg/mg d.w.).

Water analysis; microcystins; bioassay; mice DL50; high efficiency liquid chromatography; mass spectrometry; cyanobacteria; toxicity; PROSAB


ARTIGO TÉCNICO

Avaliação da toxicidade aguda de uma cepa de Microcystis spp. por meio de testes com camundongos

Acute toxicity evaluation for a Microcystis spp. strain by bioassay with male swiss albino mice

Emília Kiyomi KurodaI; Alessandro MinilloII; Odete RochaIII; Edson Rodrigues FilhoIV; Luiz Di BernardoV

IEngenheira civil, mestre em Hidráulica e Saneamento e estudante de pós-graduação de Doutorado do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo

IIOceanógrafo e Doutor em Ciências da Engenharia Ambiental no Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo

IIIProfessora Titular do Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva da Universidade Federal de São Carlos

IVProfessor Adjunto do Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos

VProfessor Titular do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Emília Kiyomi Kuroda Dep. de Hidráulica e Saneamento - Escola de Engenharia de São Carlos – USP Av. Trabalhador São-Carlense, 400 13566-590 São Carlos – SP – Brasil Tel.: (16) 3373-9528 E-mail: ekkuroda@yahoo.com.br

RESUMO

Este estudo teve como objetivo complementar a caracterização da toxicidade de uma cepa de Microcystis spp., por meio de testes de toxicidade aguda com camundongos, após caracterização química preliminar de microcictinas - MCs realizada por cromatografia líquida de alta eficiência com detector de diodo HPLC-PDA e espectrometria de massas com ionização por electrospray MS-ESI. Os testes de toxicidade aguda com camundongos demonstraram, segundo classificação proposta por Lawton et al (1994b), que a cepa tóxica testada enquadra-se no grau de elevada toxicidade com valor de DL50 24h de extrato seco menor que 100 mg/kg p.c. (peso corpóreo) (13,7 mg/kg p.c.), de DL50 24h de microcistinas totais estimada de 24,2 µg/kg p.c. e concentração de MCs no material seco maior que 1,0 µg/mg p.s. (entre 1,64 e 1,86 µg/mg p.s.).

Palavras-chave: Análise de água, microcistinas, bioensaio, camundongos, DL50, cromatografia líquida de alta eficiência, espectrometria de massas, cianobactéria, toxicidade, PROSAB.

ABSTRACT

This study was carried out to evaluate the toxicity of a strain of Microcystis spp, using acute toxicity bioassays with swiss albino mice and to characterize chemically the microcistins using high efficiency liquid chromatography with photodiode array detector (HPLC-PDA) and mass spectrometry with electrospray ionization (MS-ESI). The acute toxicity tests with mice showed that according to the classification proposed by Lawton et al (1994b), the toxic strain here tested corresponds to the degree of high toxicity with DL50 24h values for the dry extract lower than 100 mg/kg corporal weight (13,7 mg/kg corporal weight), while DL5024h for total microcystin - MCs concentration around 24,2 µg/kg corporal weight. and concentration of MCs in the dry material higher than 1,0 µg/mg dry weight (between 1.64 and 1.86 µg/mg d.w.).

Keywords: Water analysis, microcystins, bioassay, mice DL50, high efficiency liquid chromatography, mass spectrometry, cyanobacteria, toxicity, PROSAB.

INTRODUÇÃO

A presença de florações de algas e cianobactérias e seus subprodutos em rios, lagos e reservatórios destinados ao abastecimento, interfere diretamente na qualidade da água, podendo introduzir efeitos negativos tanto de ordens estética e organoléptica pela produção de cor, odor e sabor, como de saúde pública devido à produção de compostos potencialmente tóxicos e carcinogênicos (Di Bernardo, 1995).

Baseado em bioensaios e em análises por cromatografia líquida de alta eficiência – HPLC, pelo menos 50 a 75% das amostras tem-se mostrado tóxicas (Cood, 2000). As toxinas de cianobactérias ou cianotoxinas apresentam mecanismos tóxicos específicos em vertebrados e podem ser classificados de acordo com o modo de ação em neurotoxinas (anatoxina-a, anatoxina-a(s), saxitoxinas, BMMA (beta-n methylamino-L-alanina), hepatotoxinas (microcistina, nodularina e cilindrospermopsina) e dermatotoxinas (lipopolissacarídeos, lingbiatoxinas e aplisiatoxinas).

As espécies já identificadas como produtoras de hepatotoxinas estão incluídas nos gêneros Microcystis, Anabaena, Nodularia, Oscillatoria, Nostoc e Cylindrospermopsis (Carmichael, 1994). Para Sant'Anna & Azevedo (2000), a espécie Microcystis aeruginosa é considerada a de distribuição mais ampla no território nacional, e a Anabaena, o gênero com maior número de espécies potencialmente tóxicas (A. circinalis, A. flos-aquae, A. planctonica, A. solitaria e A. spiroides).

O tipo mais comum de intoxicação envolvendo cianobactérias é ocasionado por hepatotoxinas, destacando-se as microcistinas (heptapeptídeo). Variações estruturais nos aminoácidos, grau de metilação e isomeria são usados para designar as diferentes MCs, tendo-se conhecimento da existência de mais de 60 microcistinas (Chorus & Bartram, 1999).

O uso dos bioensaios, complementados com técnicas qualitativas e quantitativas diversas disponíveis na atualidade, possibilitam a aquisição de importantes informações sobre a toxicidade de uma amostra, permitindo um maior entendimento do seu impacto no ambiente natural destinado ou não ao abastecimento de água, além dos mecanismos de ação nos organismos.

Baseado em estudos de toxicidade oral em níveis subcrônicos, realizados com camundongos (Fawell et al, (1994)) e com porcos (Falconer et al, (1994)), foi estabelecida como ingestão diária aceitável para microcistina-LR, o valor de 0,04µg/Kg de peso corpóreo (Chorus & Bartram, 1999). A partir desse valor foi adotado pela Organização Mundial da Saúde - OMS um limite máximo aceitável de 1µg/L de microcistinas, valor incorporado à Portaria MS/518 de 25 de março de 2004.

OBJETIVO

Este trabalho teve como objetivo complementar a caracterização da toxicidade de uma cepa de Microcystis spp., por meio de testes de toxicidade aguda com camundongos, após caracterização química preliminar de microcictinas - MCs realizada por cromatografia líquida de alta eficiência com detector de diodo HPLC-PDA e espectrometria de massas com ionização por electrospray MS-ESI.

MATERIAIS E MÉTODOS

Caracterização química preliminar das microcistinas

Culturas de Microcystis spp. NPLJ4, cepa comprovadamente tóxica gentilmente cedida pelo Laboratório de Ecofisiologia e Toxicologia de Cianobactérias do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro, foram mantidas em meio ASM-1, sob aeração, temperatura de 22 ± 1° C, fotoperíodo de 12 h e intensidade luminosa da ordem de 55 µE. m-2.s-1. No final da fase de crescimento exponencial das culturas, foram coletadas alíquotas para extração (congelamento / descongelamento por 3 vezes), purificação em fase sólida (cartuchos de C18) e preparação dos extratos semipurificados, de microcistinas de acordo com Krishnamurthy et al (1986), Lawton et al (1994a) e ENVIRONMENT AGENCY (1998) com adaptações, para análise por cromatografia líquida de alta eficiência com detector de diodo – HPLC-PDA e espectrometria de massas com ionização por electrospray ESI/MS.

As análises por HPLC foram realizadas em cromatógrafo Shimadzu (LC-10AD) com detector de UV/VIS (SPD-M10A) a 238 nm em condições isocráticas e fase reversa C18 (5 µm, 250 × 10 mm) com fase móvel de acetonitrila : acetato de amônio (28:72 v/v) 20 mM, pH 5,0, fluxo = 1 mL /min, forno a 40°C(CTO-10A). As análises por MS foram feitas em espectrômetro do tipo triplo-quadrupolo (QuattroLC da Micromass) equipado com fontes API. Foi utilizada a ionização por electrospray (ESI) no modo positivo, usando um potencial de 3,6 kV no capilar, 46 V no cone de amostragem e 8 V no cone extrator. A aquisição dos dados foi feita na região de m/z 300 a 1400. O extrato foi inserido na fonte de ionização por meio de uma bomba tipo seringa (Carlo Erba Phoenix 40), usando metanol : água (7:3 v/v) como solventes e fluxo de 150 µL/min.

Preparação do extrato para o teste de toxicidade

Para obtenção dos extratos para o teste de toxicidade, foram preparadas culturas da cepa tóxica de Microcystis spp. NPLJ4 e de cepa não tóxica de Microcystis aeruginosa, sob condições descritas no item 5.1. Após 15 a 20 dias (fase final do crescimento exponencial), as culturas foram concentradas (Figura 1) e quantificadas pelo método de sedimentação de Uthermöhl (1958). Em seguida, os concentrados foram congelados, liofilizados (liofilizador LB 5000 TT da Terroni-Fauvel) e mantidos em freezer até o uso (Figura 2).



Os extratos foram preparados misturando-se porções do material liofilizado e solução salina (NaCl - 0,09%), de forma a obter as concentrações correspondentes às dosagens previstas para cada peso médio corpóreo dos animais previamente selecionados e volume de injeção. Após homogeneização, os extratos foram submetidos ao processo de congelamento / descongelamento e alíquotas dos extratos foram separadas e mantidas em freezer para análise posterior de microcistinas - MCs totais por imunoensaio ELISA (Enzyme-linked immunosorbent assay).

Teste de toxicidade aguda - 24h

Os testes de toxicidade aguda foram realizados com camundongos machos da espécie Swiss albino com peso corpóreo entre 16,4 e 28,2 g, fornecidos pelo Biotério da Universidade Federal de São Carlos - UFSCar. Os animais foram identificados e separados em grupos de 3 animais em função do peso corpóreo, com o intuito de equalizar os efeitos por dosagem aplicada e facilitar a interpretação dos resultados.

Para cada dosagem testada foram utilizados 3 camundongos, tendo sido aplicados volumes que variaram em função do peso médio dos animais entre 0,880 e 1 mL no teste T1 e entre 0,355 e 1,0 mL no teste T2, por meio de injeções intraperitoniais (i.p). Após as injeções, os animais foram mantidos em local arejado com ração e água, sob observação contínua durante as 5 primeiras horas e posteriormente, em intervalos de 3 a 6 h até 24 horas. Para o cálculo estatístico da DL50 24h de extrato seco foi usado o programa Trimmed Spearman-Karber (Hamilton et al, 1977) com intervalo de confiança de 95%.

Análise de microcistinas MCs totais

A análise de microcistinas - MCs totais (intra + extracelulares) foi realizada por imunoensaio ELISA (Enzyme-linked immunosorbent assay) de placas da Beacon Analytical Systems Inc.. O método de ELISA utilizado baseia-se na competição direta entre dois tipos de antígenos (a possível microcistina – MC presente na amostra, e em seguida, o antígeno marcador ligado a uma enzima), sobre um número limitado de anticorpos policlonais com reatividade cruzada também contra vários congêneres de microcistina, adsorvidos na parede da placa de reação. Após os processos de incubação - lavagem da placa - adição de substrato da enzima – incubação, procede-se a análise por absorção espectrofotométrica a 450 nm. A coloração resultante ao final dessa reação enzimática é inversamente proporcional à concentração da toxina presente na amostra analisada.

As alíquotas dos extratos foram previamente filtradas (pré-filtro GF/C) e em seguida diluídas em água deionizada em proporções variadas, de forma a possibilitar a quantificação pela curva de calibração construída especificamente para o lote de amostras.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Embora os valores de índice de similaridade obtidos entre os espectros de UV a 238 nm dos picos da principal microcistina - MC dos extratos e do padrão de MC-LR (Sigma M2912 Lot 31K 1647) sejam elevados, com valores de até 0,9999, os tempos de retenção dos picos correspondentes às MCs dos extratos variaram entre 9,8 e 10,4 min (Figura 3a) e foram bem diferentes dos tempos de retenção obtidos pelo pico do padrão de MC –LR, entre 7,3 a 7,8 min.



A análise posterior do extrato por espectrometria de massas revelou um espectro com [M+H]+ a m/z 1037,8 (Figura 3b), indicando tratar-se de outro tipo de MC, possivelmente alguma variante da MC -LR (Matthiensen et al, 2000) ou outra desconhecida, pois o espectro do padrão de MC-LR apresentou [M+H]+ a m/z 995,7.

Desta forma, pôde-se constatar que embora a principal MC presente no extrato e a MC-LR do padrão sejam quimicamente diferentes, os grupos cromóforos podem ser são muito similares ou coincidentes, o que explica os elevados índices de similaridade obtidos.

Os valores da DL50 (camundongos, i.p.) de 60 diferentes MCs são reportados em Sivonen & Jones (1999) e variaram em média entre 50 e 300 µg/Kg de peso corpóreo. Diferenças minoritárias na estrutura podem levar a diferenças pronunciadas na toxicidade. Valores reportados de DL50 (i.p.) foram de 250 e 180 µg/Kg para [D-Asp3]MC-RR e [Dha7]MC-RR, respectivamente, mas de 600 µg/Kg para MC-RR. Em contraste, a [D-Asp3]MC-LR é uma variante com menor toxicidade (DL50 entre 90 e 300µg/Kg) do que MC-LR (DL50 entre 25 e 150 µg/Kg).

Esses dados revelam a importância e necessidade da realização de testes de toxicidade com organismos como complemento às sofisticadas técnicas qualitativas e quantitativas, por possibilitar a aquisição de importantes informações sobre a toxicidade de uma amostra, especialmente nos casos em que os padrões de toxinas não são comercialmente disponíveis.

As culturas concentradas tóxica NPLJ4 e não tóxica, apresentaram densidades de 3,8 × 107 cel/mL e de 1,1 × 107 cel/mL, respectivamente.

Visando o enquadramento da cepa de acordo com a classificação sugerida por Lawton et al (1994b), o teste preliminar T1 foi realizado com dosagens de 125, 250, 500, e 1000 mg/kg p.c. (mg de material seco / kg de peso médio corpóreo dos camundongos), para a cepa tóxica NPLJ4, e com a dosagem mais elevada (de 1000 mg/kg p.c.) para a cepa não tóxica utilizada como controle tipo A. Além deste controle, foi estabelecido o controle tipo B, realizado com aplicação de 1 mL de solução salina.

Para as dosagens de extrato da cepa NPLJ4 aplicadas, todos os camundongos morreram em menos de 1 h e manifestaram efeitos comumente descritos em intoxicações por hepatotoxinas (Falconer (1991) e Carmichael (1992)), como baixa mobilidade, fotofobia e paralisia dos membros inferiores, letargia, perda de brilho nos olhos, inchaço da região abdominal, contrações musculares, respiração ofegante, paradas respiratórios, seguidas por coma e morte (Figura 4).


A inibição bioquímica particular das proteínas fosfatases tipo 1 e 2A, resultam na desorganização do citoesqueleto dos hepatócitos e como conseqüência, o fígado perde sua arquitetura e desenvolve graves lesões internas (Carmichael, 1994). A perda de contato entre as células cria espaços internos que são preenchidos pelo sangue que passa a fluir dos capilares para esses locais, provocando acumulo de sangue neste órgão e inchaço do mesmo, condição esta que pôde ser observada na maioria dos casos de cobaias que tiveram a morte em poucas horas dos ensaios realizados.

Em função dos resultados obtidos foram preparadas, logo em seguida, diluições do extrato de 125 mg/kg p.c. e novo extrato para dosagem de 10 mg/kg p.c., de forma a possibilitar a continuidade do teste com as dosagens de 62,5, 31,25, 15,625 e 10 mg/kg p.c. (mg de material seco / kg de peso médio corpóreo dos camundongos). Como o peso médio dos camundongos selecionados para essas dosagens diferiu do peso médio considerado na preparação do extrato de 125 mg/kg p.c., aplicou-se um fator de correção no volume a ser injetado para cada dose. Os resultados de interesse obtidos no teste T1 são apresentados na Tabela 1.

Os camundongos do controle A realizado com dosagem de 1000 mg/kg p.c. de extrato da cepa não tóxica ficaram imóveis após as injeções intraperitoniais mas começaram a apresentar sinais de restabelecimento após cerca de 5 h.

A curva de calibração construída para análise de microcistinas - MCs apresentou correlação (%Bo e concentração de MCs) R2 = 0,9913 e foi devidamente validada com o emprego de padrão externo com concentração previamente conhecida, apresentando porcentagem de recuperação de 118% (80 a 130 % - faixa estabelecida pelo fabricante para validação da análise). As análises apresentaram valores de coeficiente de variação relativa máxima de 8,3%. Na Figura 5 são apresentadas as concentrações de microcistinas - MCs totais (µg/L) dos extratos analisados por imunoensaio ELISA e as correspondentes dosagens de MCs totais (µg/kg) (µg de MCs totais / kg de peso médio corpóreo dos camundongos) calculadas em função do volume injetado e do peso médio corpóreo dos camundongos.


Em função dos resultados obtidos, um novo teste T2 foi realizado, aplicando-se as dosagens de 8, 10, 12, 14, 16 e 18 mg/kg p.c. (mg de material seco / kg de peso médio corpóreo dos camundongos) do extrato da cepa tóxica NPLJ4, com o intuito de obter maior precisão da DL5024h. Neste ensaio utilizou-se o mesmo extrato e variou-se o volume aplicado entre 0,355 e 1 mL por meio de injeções intraperitoniais (i.p), a fim de resultar nas dosagens preestabelecidas. Os resultados obtidos são apresentados na Tabela 2. Na Figura 6 são apresentadas fotos dos camundongos do controle (ativos) e das dosagens de 8 mg/kg p.c. (imobilidade) e 18 mg/kg p.c. (imobilidade e fotofobia). Na Figura 7 são apresentadas as concentrações de MCs totais (µg/L) do extrato analisado por imunoensaio ELISA e as correspondentes dosagens de MCs totais (µg/kg) (µg de MCs totais / kg de peso médio corpóreo dos camundongos) calculadas em função do volume injetado e do peso médio corpóreo.



De acordo com os resultados obtidos da Tabela 2, observou-se a morte de todos os animais submetidos à dosagem de 18 mg/kg p.c. do extrato e a resistência de todos os animais submetidos à dosagem de 8 mg/kg p.c., o que confirma a faixa de sensibilidade obtida no teste T1.

A faixa de sensibilidade encontrada no teste T1 é bastante similar à encontrada no teste T2 em relação às dosagens de extrato seco T1 (10 a 15,625 mg/kg p.c.) e T2 (8 e 18 mg/kg p.c.), e especialmente, em relação às dosagens de MCs totais: T1 (16,4 e 29,1 µg/Kg) e T2 (14,1 e 31,7 µg/Kg) (Figuras 5 e 7, Tabela 3).

As correlações entre as dosagens de extrato utilizados nos testes e os resultados obtidos de MCs totais analisados nos extratos apresentaram elevada correlação (R = 0,988 e R2 = 0,976), o que assegura a confiabilidade do procedimento experimental empregado. Esses valores aumentam (R = 0,992 e R2 = 0,984) com a inclusão dos dados calculados.

Os valores das DL5024h encontrados nos ensaios foram de 13,7 mg/kg p.c. de extrato seco e de 24,2 µg/kg p.c. de MCs totais estimada e revelaram a elevada toxicidade da cepa NPLJ4, o que pode ser explicada pela elevada concentração de MCs totais presentes nos extratos (Figuras 5 e 7, Tabela 3).

A DL5024h de MC – LR em camundongos via intraperitonial (i.p) é estimada entre 25 e 150 µg/Kg. Para as demais microcistinas, os limites de toxicidade variam entre 50 a 1.200 µg/Kg, influenciados pelas modificações químicas dos aminoácidos individuais ou de variação na composição de aminoácidos (Rinehart et al, 1994).

As concentrações calculadas de MCs no material seco utilizado para preparação de extratos com diferentes concentrações resultaram entre 1,64 e 1,86 µg/mg p.s. (µg de MCs totais / mg do material seco) (Tabela 3), o que condiz com a classificação proposta por Lawton et al (1994b), apresentada na Tabela 4. Segundo os autores, o material contendo cianobactérias é considerado altamente tóxico, se a DL50 24h para camundongos for menor que 100 mg/kg p.c. ou se a concentração de MCs totais no material seco for superior a 1,0 µg/mg p.s. Assim, pôde-se verificar que a cepa NPLJ4 testada enquadra-se no grau 3 de elevada toxicidade e que a cepa não tóxica utilizada como controle tipo A, com concentração de MCs totais inferior ao limite de detecção do método não é tóxica para as cobaias utilizadas.

Os resultados encontrados neste ensaio demonstraram que a cepa utilizada apresentou toxicidade superior quando comparada com outras culturas mantidas em laboratório, por exemplo, ao reportado por Azevedo et al (1994), com a cepa de M. aeruginosa (NPJB-1) isolada do Lago das Garças, São Paulo – SP, cujo valor da DL100 24h foi de 31 mg/kg p.c. de extrato seco. Uma toxicidade menor foi descrita por Honda et al (2001), com cepas não axênicas de M. panniformis (SPC 686 e 702), também isoladas no Lago das Garças, São Paulo – SP, com valores da DL100 24h entre 100 e 316 mg/kg p.c. de extrato seco.

Estudos com amostras naturais realizados por Matthiensen et al (1999) em região integrante do Estuário da Lagoa dos Patos reportaram valores de DL50 24h menores que 100 mg/kg p.c., variando entre 35 e 140 mg/kg p.c. e concentrações de MCs no material seco, maiores que 1,0 µg/mg p.s. em amostras dominadas por Microcystis aeruginosa neste ambiente. A cultura de Microcystis aeruginosa PCC7813 apresentou DL5024h.de 70,7 mg/kg p.c. e teve maior concentração de MCs no material seco em relação às florações (1,145 µg/mg p.s.).

Níveis próximos a estes também foram reportados por Oliveira et al (2003), com valores de DL100 24h entre 28,44 e 62,90 mg/kg p.c., em amostras de água no reservatório do Funil, Rio de Janeiro, dominadas por florações de Microcystis spp, Cylindrospermopsis sp e Anabaena spiroides.

Estudos realizados por Vasconcelos (1999), com florações de cianobactérias coletadas em lagos e reservatórios na região Norte e Central de Portugal, demonstraram a alta toxicidade de duas amostras com valores de DL50 entre 30 e 175 µg/Kg, enquanto cepas isoladas e cultivadas destes florescimentos causaram uma maior ação tóxica, com valores de DL50 de 15 a 75 µg/Kg.

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Os testes de toxicidade aguda com camundongos demonstraram, segundo classificação proposta por Lawton et al (1994b), que a cepa tóxica testada enquadra-se no grau de elevada toxicidade, com valor de DL50 24h de extrato seco menor que 100 mg/kg p.c. (13,7 mg/kg p.c.), de DL50 24h de microcistinas totais estimada de 24,2 µg/kg p.c. e concentração de MCs no material seco maior que 1,0 µg/mg p.s. (entre 1,64 e 1,86 µg/mg p.s.);

Os resultados obtidos no estudo revelaram a importância e necessidade da realização de testes de toxicidade com organismos como complemento às sofisticadas técnicas qualitativas e quantitativas, por possibilitar a aquisição de importantes informações sobre a toxicidade de uma amostra, especialmente nos casos em que os padrões de toxinas não são comercialmente disponíveis.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho refere-se a resultados parciais de pesquisa realizada no âmbito do PROSAB (Programa de Pesquisa em Saneamento Básico) Edital 4 – Tema 1, com apoio financeiro da FINEP, CEF e CNPq. Os autores desejam expressar seus agradecimentos à FAPESP (proc. nº 01/13561 – 3) pela concessão da bolsa de Doutorado ao primeiro autor e (proc. 02/08341-7) pelo apoio financeiro.

Recebido: 25/11/05

Aceito: 24/11/06

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  • Endereço para correspondência:

    Emília Kiyomi Kuroda
    Dep. de Hidráulica e Saneamento - Escola de Engenharia de São Carlos – USP
    Av. Trabalhador São-Carlense, 400
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    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jul 2007
    • Data do Fascículo
      Mar 2007

    Histórico

    • Aceito
      24 Nov 2006
    • Recebido
      25 Nov 2005
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