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Transferência de oxigênio em reatores de leito fluidizado com circulação em tubos concêntricos em meios bifásico e trifásico com variação da relação entre diâmetros

Oxygen transfer in two and three-phase internal-loop airlift reactor with riser diameter variation

Resumos

A eficiência do reator de leito fluidizado com circulação em tubos concêntricos depende das condições hidrodinâmicas que influem na transferência de oxigênio ao biofilme. Este trabalho investigou a influência da relação entre diâmetros dos tubos e da concentração de meio suporte (areia), sobre o coeficiente global de transferência de oxigênio (K La). Os ensaios - em reatores de 2,6 m de altura, com diâmetro externo de 250 mm e internos de 100, 125, 150 e 200 mm - empregaram vazões de ar até 2.500 L.h-1 e concentrações de até 150 g.L-1 de areia. O K La aumentou ligeiramente com 30 g.L-1 e diminuiu para concentrações maiores, confirmando relatos da literatura em condições semelhantes. Um modelo para K La em meio bifásico foi ajustado para as diversas relações ensaiadas entre a área externa e a interna, postulando-se uma redução na razão entre a transferência na fase líquida e o diâmetro da bolha com o aumento da vazão de ar.

leito fluidizado; reator aeróbio; transferência de oxigênio


The efficiency of the concentric tubes internal-loop airlift reactor depends on the hydrodynamic conditions that affect oxygen transfer to the biofilm. This work studied the effects of the relation between diameters of the tubes and of the carrier (sand) concentration on the global oxygen transfer coefficient (K La). The tests - in 2,6 m high reactors with 250 mm external diameter and 100, 125, 150 and 200 mm internal diameters - were performed with air flow taxes up to 2,500 L.h-1 and sand concentrations up to 150 g.L-1. The K La increased slightly for 30 g.L-1 and decreased for higher concentrations, in accordance with related data for similar conditions. A model for K La in biphasic medium was fitted embracing all the external/internal area relationships tested, based on the reduction of the liquid phase transfer coefficient and the bubble diameter ratio with increasing air flow rates.

fluidized bed; aerobic reactor; oxygen transfer


ARTIGO TÉCNICO

Transferência de oxigênio em reatores de leito fluidizado com circulação em tubos concêntricos em meios bifásico e trifásico com variação da relação entre diâmetros

Oxygen transfer in two and three-phase internal-loop airlift reactor with riser diameter variation

Leandro Santos de AraújoI; Milton Dall'Aglio SobrinhoII; Dib GebaraIII

IEngenheiro Civil pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (Unesp). Mestre em Engenharia Civil com ênfase em Recursos Hídricos e Tecnologias Ambientais pela Unesp. Engenheiro Civil da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp)

IIEngenheiro Civil pela Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC/USP). Doutor em Hidráulica e Saneamento pela (EESC/USP). Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Civil da Faculdade de Engenharia da Unesp, Campus de Ilha Solteira

IIIEngenheiro Civil pela EESC/USP. Doutor em Hidráulica e Saneamento pela Escola Politécnica da USP (Poli/USP). Professor Assistente Doutor do Departamento de Engenharia Civil da Faculdade de Engenharia da Unesp, Campus de Ilha Solteira

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Leandro Santos de Araújo Rua Martin Afonso de Souza, 211, apto 91 - Aviação 11702-790 - Praia Grande (SP), Brasil Fone: (17) 9716-9965 E-mail: lesaraujo@yahoo.com.br

RESUMO

A eficiência do reator de leito fluidizado com circulação em tubos concêntricos depende das condições hidrodinâmicas que influem na transferência de oxigênio ao biofilme. Este trabalho investigou a influência da relação entre diâmetros dos tubos e da concentração de meio suporte (areia), sobre o coeficiente global de transferência de oxigênio (KLa). Os ensaios - em reatores de 2,6 m de altura, com diâmetro externo de 250 mm e internos de 100, 125, 150 e 200 mm - empregaram vazões de ar até 2.500 L.h-1 e concentrações de até 150 g.L-1 de areia. O KLa aumentou ligeiramente com 30 g.L-1 e diminuiu para concentrações maiores, confirmando relatos da literatura em condições semelhantes. Um modelo para KLa em meio bifásico foi ajustado para as diversas relações ensaiadas entre a área externa e a interna, postulando-se uma redução na razão entre a transferência na fase líquida e o diâmetro da bolha com o aumento da vazão de ar.

Palavras-chave: leito fluidizado; reator aeróbio; transferência de oxigênio.

ABSTRACT

The efficiency of the concentric tubes internal-loop airlift reactor depends on the hydrodynamic conditions that affect oxygen transfer to the biofilm. This work studied the effects of the relation between diameters of the tubes and of the carrier (sand) concentration on the global oxygen transfer coefficient (KLa). The tests - in 2,6 m high reactors with 250 mm external diameter and 100, 125, 150 and 200 mm internal diameters - were performed with air flow taxes up to 2,500 L.h-1 and sand concentrations up to 150 g.L-1. The KLa increased slightly for 30 g.L-1 and decreased for higher concentrations, in accordance with related data for similar conditions. A model for KLa in biphasic medium was fitted embracing all the external/internal area relationships tested, based on the reduction of the liquid phase transfer coefficient and the bubble diameter ratio with increasing air flow rates.

Keywords: fluidized bed; aerobic reactor; oxygen transfer.

Introdução

Os reatores aeróbios de leito fluidizado com circulação em tubos concêntricos requerem pequenos tempos de detenção hidráulica, proporcionando reatores compactos, capazes de remover, em uma única etapa, material carbonáceo e nutrientes. São compostos por dois tubos concêntricos, nos quais o efluente circula devido à injeção de ar na parte inferior do tubo interno. O ar é o principal insumo em termos de custo operacional, sendo desejável a otimização de seu emprego para ampliar a atratividade econômica da tecnologia.

A remoção de matéria carbonácea e de nitrogênio é possível, porque a biomassa cresce aderida ao meio suporte, formando um biofilme composto por uma zona aeróbia - localizada em uma camada mais externa - e uma zona anóxica-anaeróbia, situada na camada mais interna, próxima ao material suporte (HAGEDOM-OLSEN et al., 1994).

A eficiência do reator depende grandemente da estrutura e espessura do biofilme formado sobre as partículas de areia, que, por sua vez, são afetadas pelas condições do escoamento. A ocorrência desse fenômeno nesse tipo de reator pode apresentar variações de acordo com a relação Ae/Ai - razão entre a área de descida (externa) e de subida (interna) - em função das diferentes velocidades em cada etapa.

Em reatores aeróbios de leito fluidizado, grande parte do ar injetado é requerida para manter o meio suporte em suspensão. Entretanto, ao se definir a quantidade de ar a ser injetada, buscando-se o equilíbrio entre custos operacionais e eficiência de tratamento, deve-se garantir o oxigênio necessário para que os processos biológicos de oxidação não sejam comprometidos. A quantidade de oxigênio transferido, desta forma, torna-se um importante parâmetro de controle nesses dispositivos. De acordo com Bishop e Zhang (1994), a transferência de massa está intimamente relacionada com a quantidade de oxigênio dissolvido na camada externa do biofilme.

Nedeltchev e Schumpe (2007) avaliaram o efeito dos sólidos na transferência de massa. Eles afirmam que o efeito sobre o coeficiente global de transferência de oxigênio (KLa) é a soma dos efeitos sobre os dois parâmetros distintos que compõem esse coeficiente: KL (coeficiente de difusão na fase líquida) e a (área específica da interface ar-líquido). O efeito sobre KL estaria relacionado à difusão do oxigênio através da camada líquida envoltória da bolha, com espessura variável, que depende da concentração de sólidos. O efeito sobre a área específica a ocorre pela influência no tamanho das bolhas.

Mirón et al. (2000) apresentaram uma equação para relacionar o coeficiente global de transferência de massa com o conteúdo volumétrico e com a velocidade superficial do gás, os quais são as principais variáveis operacionais em reatores airlift e colunas de bolhas.

A área específica da interface gás-líquido, a, é relacionada com a fração volumétrica de gás e com o diâmetro médio da bolha. As Equações 1 e 2 apresentam essas relações.

Onde:

a: área superficial específica das bolhas (m2.m-3);

ε: fração volumétrica do gás;

dB: diâmetro da bolha (m);

KL: coeficiente de transferência de massa na fase líquida (m.s-1).

Mirón et al. (2000) propuseram uma simplificação para o difícil problema de previsão teórica da transferência de massa nos reatores de leito com circulação, ao afirmarem a relação proposta na Equação 3, baseando-se no que consideraram evidências experimentais substanciais, independentemente do regime do escoamento e do tipo de fluido.

Além disso, a fração volumétrica de gás é necessariamente relacionada com a velocidade superficial de gás e com a velocidade de deslocamento da bolha, de acordo com a Equação 4.

onde:

Ug: velocidade superficial do gás (m.s-1);

Us: velocidade de ascensão de uma bolha (m.s-1).

Substituindo as equações (3) e (4), a Equação (2) pode ser escrita como (Equação 5):

Para um dado fluido e regime de escoamento, a velocidade de deslocamento da bolha depende apenas do diâmetro da bolha, sendo Us = f(dB). Para as demais condições fixadas, o tamanho da bolha é controlado pela energia específica introduzida no reator e, para um reator de coluna de bolhas, têm-se, conforme Equação 6:

O expoente k é usualmente próximo a -0,4, conforme Mirón et al. (2000). Assim, a Equação 5 pode ser escrita como:

O parâmetro c, conforme Mirón et al. (2000), é próximo à unidade para um regime uniforme de escoamento de bolhas. Assim, pode-se definir a Equação 8:

Onde Φ = 6z.

A Equação 8 é dimensionalmente consistente, sendo o produto adimensional; isso significa que c tem unidades m-ysy. Essa equação foi deduzida para uma coluna de bolhas; porém, uma relação similar pode ser proposta para reatores airlift, com a consideração descrita na Equação 9:

Onde:

Ae: área do tubo externo (m2);

Ai: área do tubo interno (m2).

Segundo Chisti (apud MIRÓN et al., 2000), mesmo quando εe 0, (KLa)e << (KLa)i e, geralmente, Ae< Ai. Consequentemente, em reatores airlift, pode-se dizer pela Equação 10 que:

E, portanto, seguindo a lógica das equações anteriores, obtém-se a Equação 11, que define o modelo de Mirón et al. (2000).

Metodologia

Foram utilizados quatro reatores construídos com tubos de PVC. Cada reator possui tubo externo de 250 mm e tubo interno de diâmetro variável. A altura nominal do reator é de 2,60 m e a altura da coluna de fluido, 2,35 m. O tubo interno apresenta altura igual a 2,22 m, posicionado 5 cm acima do fundo do reator. A distância percorrida em um ciclo é de 4,70 m. O injetor de ar comprimido tem o topo posicionado a 15 cm do fundo do reator e área total de injeção de 1,23 cm2. O reator possui também um decantador, a fim de evitar a saída das partículas sólidas. A vazão de ar comprimido no sistema foi controlada por um rotâmetro, o qual foi instalado a jusante da válvula reguladora de pressão.

Por conveniência, os reatores foram nomeados conforme o diâmetro do tubo interno em milímetros. Assim, os reatores utilizados no trabalho foram: R100, R125, R150 e R200. A Figura 1 apresenta o esquema do reator R100.


O Quadro 1 apresenta as principais características geométricas dos modelos de reator estudados.


Determinação do coeficiente de aeração

Os ensaios para determinação do KLa foram realizados com água limpa e em meio bifásico e trifásico. Para isso, utilizou-se um medidor portátil de oxigênio dissolvido DM-4 (Digimed), com termômetro embutido. A determinação do KLa seguiu a metodologia padronizada para emprego com água limpa, método não estacionário, recomendado pela American Society of Civil Engineers (ASCE, 1990).

Nos ensaios com água limpa (meio bifásico), as vazões de ar utilizadas foram 1.000, 1.200, 1.500, 1.800, 2.100 e 2.500 L.h-1. Em meio trifásico, utilizando-se areia em concentração igual a 100 g.L-1, os ensaios repetiram as mesmas vazões de ar. Outros ensaios em meio trifásico com concentração de areia, variando em um intervalo de 30 a 150 g.L-1, foram realizados no reator R100 a vazões de ar de 2.500 L.h-1.

Para se obterem valores confiáveis de KLa, foram realizados dois ensaios para cada vazão de ar, sendo que, caso houvesse um erro acima de 10%, outro ensaio era realizado, desconsiderando-se, então, o ensaio mais discrepante.

De posse dos dados obtidos no ensaio, procedeu-se ao cálculo do KLa por meio de regressão não-linear, conforme algoritmo recomendado pela ASCE (1990). Para tanto, foi utilizada uma versão do programa em linguagem de macros de planilha Excel apresentado por Dall'Aglio Sobrinho et al. (2001). Nesse programa, os valores de KLa, Cs (concentração de saturação de oxigênio) e C0 (concentração de oxigênio no tempo t=0) são ajustados a partir de uma estimativa inicial fornecida manualmente.

Para facilitar a comparação dos valores, pode-se padronizar os resultados obtidos do KLa de acordo com as diferentes temperaturas medidas no momento do ensaio; para isso, calcula-se o KLa com correção para a temperatura de 20ºC, que é denominado KLa 20. O C corrigido é denominado de C∞20 , e foram determinados pelas equações fornecidas pela ASCE (1990).

Ensaios realizados

Os ensaios foram realizados inicialmente com meio bifásico. Numa segunda etapa, foram ensaiados os 4 reatores com 100 g.L-1 de areia. Problemas com a suspensão da areia nos reatores R150 e R200, entretanto, permitiram discutir apenas os dados dos reatores R100 e R125 nessa etapa. Os ensaios prosseguiram com a terceira etapa, usando o R100 com concentrações crescentes de areia de 30 a 150 g.L-1. Foi utilizada areia com diâmetro médio de 0,28 mm em todos os ensaios.

A verificação da suspensão da areia consiste em coletar, em uma proveta graduada, 1 L de amostra no tubo de descida do reator. O material coletado deve permanecer durante 1 minuto em repouso e, logo após, mede-se o valor do volume decantado. O volume é comparado com o de amostras previamente preparadas com as concentrações desejadas. Para a retirada da amostra, foi instalada uma tomada com válvula de fecho rápido na parede do tubo externo.

Resultados

Para permitir que os resultados sejam comparados com outros obtidos em condições semelhantes, o Quadro 2 apresenta as velocidades superficiais de ar e a potência inserida por volume unitário de reação para cada vazão de ar.


Os valores de KLa20 obtidos para os ensaios em meio bifásico em função da velocidade superficial do ar são apresentados na Figura 2.


Os valores obtidos são semelhantes aos encontrados em outros trabalhos. Bello, Robinson e Moo-Young (1984), Hernandes (2002) e Sinclair e Ryder (apud BELLO, ROBINSON e MOO-YOUNG, 1984), ao estudarem reatores de leito fluidizado com relações entre áreas similares às deste trabalho, encontraram valores de KLa parecidos com os apresentados na Figura 2, numa faixa de vazão de ar compatível.

Ainda na Figura 2, pode-se notar que os reatores com relação Ae/Ai menor atingem valores de KLa muito maiores para uma mesma velocidade superficial do ar. A causa dessa ocorrência também reside no fato de que os reatores com maiores diâmetros de tubo interno apresentam velocidades do líquido menores para as mesmas velocidades superficiais do gás.

Nos ensaios da segunda etapa, pôde-se verificar a dificuldade em manter a areia em suspensão, principalmente em baixas vazões de ar. Apenas nos reatores R100 e R125 foi possível realizar ensaios com ao menos três das vazões de ar utilizadas em meio bifásico. Por essa razão, não foram realizados ensaios com os reatores R150 e R200.

A Figura 3 compara os valores obtidos de KLa 20 nos dois reatores, com 100 g.L-1 de areia e com meio bifásico. Como esperado, o reator que apresenta maior diâmetro interno é capaz de transferir uma quantidade maior de oxigênio, com a mesma vazão de ar.


Nos ensaios com areia, novamente verificou-se que, com o acréscimo da vazão de ar injetada no sistema, a transferência de oxigênio aumenta. Percebe-se que a curva obtida é semelhante à curva dos ensaios em meio bifásico.

Na Figura 3, nota-se que a transferência de oxigênio em meio trifásico é inferior em relação aos ensaios em meio bifásico, nos dois reatores. No R100, a diferença entre os valores chega a atingir 34,1%, enquanto no R125, a maior diferença é de 28,4%.

Com a finalidade de verificar o efeito da introdução progressiva de sólidos no reator, a terceira etapa dos ensaios consistiu em variar a concentração de areia em valores iguais a 30, 70, 100 e 150 g.L-1.

O reator utilizado foi o R100 e a vazão de ar injetada foi 2500 L.h-1, obtendo-se, assim, a maior velocidade superficial do ar possível dentre os parâmetros estudados, sendo esta 0,08842 m.s-1. Desta forma, essa configuração seria a mais indicada para manter o meio suporte em suspensão.

Os resultados expressos na Figura 4 mostram que, após um acréscimo inicial, o coeficiente de transferência de oxigênio tende a diminuir com o aumento da fração volumétrica de sólidos no reator. Esse comportamento pode ser explicado pelo aumento da coalescência gerado pelo aumento na concentração de areia, o qual será discutido a seguir.


Discussão

A Figura 2, que apresenta os valores de KLa 20 em meio bifásico, indica que, para maiores velocidades de gás, maior é a transferência de oxigênio para o meio, conforme previsto. Os pontos obedecem a uma curva, na qual os valores de KLa tendem a estabilizar para maiores velocidades de gás. Essa afirmação é evidenciada principalmente nos resultados para os reatores R100 e R125. Essa ocorrência deve-se ao fato de que esses reatores apresentam velocidades do líquido maiores no tubo interno para mesmas velocidades superficiais de gás. Desta forma, como a transferência de oxigênio é dada, sobretudo, no tubo de subida e uma alta velocidade do líquido é atingida, quando comparada aos demais reatores, torna-se evidente uma limitação de KLa para as maiores vazões estudadas em virtude do menor tempo de contato líquido-gás. O equacionamento apresentado por Mirón et al. (2000) foi utilizado para se verificar sua compatibilidade com os reatores empregados nos experimentos conduzidos em meio bifásico. A Figura 5 apresenta os valores encontrados de z para , sendo . Nos cálculos foram considerados c=1 e y=-1,4, conforme sugestão desses autores.


Por meio da Figura 5, observa-se que os valores de z não são constantes, como suposto por Mirón et al. (2000). No entanto, nota-se que uma curva atende ao comportamento do parâmetro z para os quatro reatores. Por meio de um ajuste dos dados, obteve-se uma relação para z em função da velocidade superficial do gás, a qual é definida de acordo com a Equação 12.

Mirón et al. (2000) consideraram em seu trabalho que o parâmetro z seria constante, uma vez que é definido como uma razão entre KL e dB. A variação dos valores de z apresentados na Figura 5 pode ser explicada pelo fato de que o parâmetro KL pode sofrer alterações de acordo com a velocidade superficial de ar aplicada. Essa hipótese é compatível com o modelo de filme estagnado e também com o modelo de renovação de superfície. Com o aumento da turbulência causado pela maior vazão de ar e pela maior velocidade de circulação do líquido, cresceriam os fluxos difusivos de oxigênio na fase líquida, aumentando o KL. Outra explicação seria o efeito de coalescência das bolhas, o qual acarreta em um aumento do diâmetro das mesmas, alterando, assim, os valores de z. Neste caso, para que o parâmetro z apresentasse o comportamento observado na Figura 5, o diâmetro das bolhas deveria aumentar com o aumento da velocidade superficial do ar, o que pode ter ocorrido em função do movimento turbulento gerado a altas velocidades de ar. Essas hipóteses, todavia, não eliminam o fato de que ambos os efeitos possam ter atuado simultaneamente, provocando, assim, a variação observada do parâmetro z para diversas velocidades superficiais de ar.

Deste modo, foi definida a Equação 13 para a determinação do KLa, a qual é capaz de atender aos reatores utilizados neste trabalho e, possivelmente, a outros reatores de leito fluidizado com circulação interna, uma vez que essa equação foi testada para quatro diferentes configurações geométricas, com relação Ae/Ai variando entre 0,56 e 5,25.

Para o meio trifásico, pode-se observar na Figura 3 que os valores de KLa 20 são menores quando comparados aos ensaios em meio bifásico, o que possibilita concluir que a presença de areia no reator seria desfavorável à transferência de oxigênio.

Gebara (2006), em ensaios com reatores de leito fluidizado com circulação, observou acréscimos significativos do KLa20 com a adição de areia no reator a concentrações de 50, 100 e 150 g.L-1. O autor considera que esse acréscimo tenha ocorrido devido à diminuição do tamanho das bolhas causado pela presença das partículas sólidas, o que teria acarretado um aumento na área superficial de contato entre as fases gasosa e líquida.

Freitas et al. (2000) afirmam, entretanto, que a presença de sólidos ocasiona um aumento da coalescência pelo fato das bolhas apresentarem uma tendência de agregação na região próxima ao eixo longitudinal com o acréscimo da concentração de sólidos, o que gera uma maior interação entre as mesmas, contrapondo a hipótese de Gebara (2006).

Uma explicação para os resultados encontrados por Gebara (2006), contudo, seria um aumento de KL, ao invés de um aumento de a. Nedeltchev e Schumpe (2007) afirmam que, em algumas situações, partículas sólidas podem aumentar a frequência de renovação da superfície do filme líquido em contato com as bolhas e, assim, haveria um acréscimo no valor de KL; neste caso, o aumento de KL seria mais influente no valor do coeficiente de transferência de oxigênio do que a diminuição da área superficial das bolhas.

Yoshimoto et al. (2007), operando com reatores airlift de circulação interna, de circulação externa e coluna de bolhas, verificaram que a área superficial das bolhas diminui com o aumento da viscosidade do líquido. Essa afirmação é válida se considerarmos uma viscosidade pseudo-homogênea maior para o meio trifásico, como estudado por Nedeltchev e Schumpe (2007).

Portanto, a diminuição do KLa com o acréscimo de sólidos, apresentada na Figura 3, pode ser atribuída ao parâmetro área superficial de bolhas a, o qual demonstrou grande influência no valor do coeficiente global KLa, quando comparado ao parâmetro KL, que pode ter aumentado suavemente em função da maior turbulência no filme líquido, gerada pela presença de partículas sólidas de maior tamanho.

A Figura 4, que apresenta os valores de KLa 20 em função das diferentes concentrações de areia, demonstra que a transferência de oxigênio tende a sofrer uma redução com o acréscimo da concentração de sólidos.

Para a concentração de areia igual a 30 g.L-1, porém, observa-se um pequeno acréscimo do KLa em relação ao meio bifásico. Neste caso, conclui-se que o aumento do KL, como resultado da maior turbulência na fase líquida, foi mais significativo no valor do coeficiente global de transferência de oxigênio do que a diminuição no parâmetro a, em função da maior coalescência provocada pelos sólidos. Entretanto, esse resultado não contradiz a literatura sobre o assunto, uma vez que os demais dados seguiram a tendência esperada de diminuição do KLa com o aumento da concentração de areia.

O aumento verificado com 30 g.L-1de areia é compatível também com os resultados de Nguyen-tien et al. (apud NEDELTCHEV e SCHUMPE, 2007), que mediram valores de KLa numa coluna de bolhas, variando a concentração e o diâmetro dos sólidos, utilizando altas velocidades do líquido para fluidizar as partículas maiores. Para as partículas menores (50 µm), os valores de KLa aumentaram suavemente para baixas cargas de sólido. Para altas concentrações, partículas menores aumentavam a viscosidade da solução, diminuindo a turbulência e aumentando a coalescência de bolhas, o que resultou em um decréscimo de KL e de a.

Yoshimoto et al. (2007) notaram, em reatores de circulação interna e externa e em coluna de bolhas, que, para velocidades superficiais entre 0,02 e 3,5 m.s-1, o parâmetro KL diminui com o acréscimo da concentração de sólidos. Esse efeito, juntamente com o aumento da coalescência (aumentada com a fração volumétrica de sólidos) esclarece o comportamento observado na Figura 4.

Lu, Hwang e Chang (1995) observaram que a expansão do leito diminuía com o acréscimo de sólidos no reator, alegando que isso faria com que a área para o fluxo do ar e do líquido diminuísse, ocasionando a coalescência das bolhas. Verlaan e Tramper (apud LU, HWANG e CHANG, 1995) ainda notaram em seus experimentos que as bolhas apresentavam uma tendência de se agregarem no centro da coluna com o aumento da taxa de aeração ou da quantidade de sólidos, intensificando ainda mais o efeito da coalescência.

Conclusões

O reator R150 foi o que apresentou maior eficiência na transferência de oxigênio dentre as vazões de ar aplicadas. Observou-se que os valores de KLa tendem a estabilizar para maiores velocidades de gás, o que pôde ser notado principalmente nos resultados obtidos para o R100 e o R125 em meio bifásico. Esse resultado pode ser explicado pelo menor tempo de contato no tubo de subida.

Verificou-se que não pode ser aceita, para os reatores ensaiados neste trabalho, a simplificação proposta por Mirón et al. (2000) para a previsão da transferência de massa nos reatores de leito com circulação, os quais afirmam que o coeficiente de difusão na fase líquida KL diminui com a diminuição do tamanho da bolha, fazendo com que a razão entre KL e dB seja constante, independentemente do regime do escoamento e do tipo de fluido.

O equacionamento para a determinação do KLa apresentado por Mirón et al. (2000) pode ser ajustado aos dados experimentais com a introdução de modificação que prevê a variação do parâmetro z com a vazão de ar injetado. O modelo, com a modificação relatada, pode ser possivelmente aplicado aos demais reatores com circulação interna, uma vez que se mostrou válido para uma ampla faixa de trabalho das relações Ae/Ai, variando entre 0,56 e 5,25.

Em meio trifásico, a transferência de oxigênio mostrou-se inferior quando comparada à obtida em meio bifásico, provavelmente devido ao aumento do tamanho das bolhas ocorrido em função da coalescência, fenômeno intensificado com a presença de sólidos. O efeito global da adição de areia é resultado de modificações simultâneas nos parâmetros KL e a, os quais, no entanto, não podem ser determinados individualmente pela metodologia adotada. Para isso, recomenda-se um estudo detalhado das características das bolhas presentes no reator, como distribuição de tamanhos e velocidades de ascensão, para que os efeitos de KL e de a sejam mais bem distinguidos, o que propiciaria facilidades na modelagem do KLa.

Recebido: 18/01/10

Aceito: 04/10/10

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Recebido
      18 Jan 2010
    • Aceito
      04 Out 2010
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