Acessibilidade / Reportar erro

Geotecnologias aplicadas ao planejamentode sistemas de abastecimento de água urbanos:uma proposta metodológica

Geotechnologies applied to management of urbanwater supply systems: a methodologic proposal

Resumos

A modelagem e otimização da disposição espacial de unidades de reservação que constituem os Sistemas Urbanos de Distribuição de Água (SUDA) são abordadas neste estudo sob a perspectiva do apoio à decisão no planejamento desses sistemas. Tendo em vista os avanços e técnicas encontrados nos Sistemas de Informação Geográfica (SIG) e a possibilidade de utilizá-los como Sistema de Apoio a Decisão Espacial (SADE), este trabalho apresenta uma metodologia que viabiliza a tomada de decisão em planejamento de SUDA. Utilizando critérios espacializados, são gerados mapas de riscos de desabastecimento em lotes urbanos que podem servir como indicadores em ações de planejamento e gestão, assim como são mapeadas zonas consideradas como ótimas para a localização de novas unidades de reservação, as quais constituem diretrizes no planejamento para expansão dos SUDA

geotecnologias; sistemas de abastecimento de água; sistema de apoio a decisão espacial


This research presents a modeling and optimizing alternative for water reservoirs placement of an Urban Water Supply Systems (UWSS). These systems are considered as decision making support systems for planning. The focus is the advances and techniques found in the Geographical Information Systems (GIS) and the possibility to use it as Spatial Decision Support System (SDSS). This research presents a new methodology for decision making in a planning of UWSS. Risk Maps are produced using multi-criteria evaluation techniques for urban parcels. They can indicate some planning and management actions. It is established a suitability zoning to locate new water reservoirs units, which can support guidelines and planning for expansion of system

geotechnologies; water supply systems; spatial decision support system


Introdução

A dinâmica de crescimento dos centros urbanos associada ao aumento populacional provoca uma contínua expansão dos Sistemas Urbanos de Distribuição de Água (SUDA), fato que os caracteriza como equipamentos complexos exigindo, muitas vezes, soluções eficazes que possam refletir no seu adequado planejamento. Devido a tal complexidade, a tomada de decisão, com o auxílio de ferramentas que possibilitem a indicação das soluções ótimas, torna-se bastante relevante.

A localização ou disposição espacial mais adequada de equipamentos, ou seja, aquela considerada como ótima, é uma técnica de grande relevância, em virtude da possibilidade de aprimorar certos tipos de serviços prestados à sociedade (SENDRA & JIMÉNEZ, 2007SENDRA, J.B. & JIMÉNEZ, A.M. (2007). Localización-asignación y justicia/equidad espacial con Sistemas de información geográfica. In: Conferência Iberoamericana de SIG, 11 Anais... Departamento de Ciencias Sociales, Universidad de Lujan, p. 95-115. ISBN: 978-9285-33-6, Lujan. Disponível em: <www.geogra.uah.es>. Acesso em: 20/01/2009
Disponível em: <www.geogra.uah.es>...
), além de resultar em benefícios econômicos, pelos quais tem sido objeto de muitas discussões (CURTIN & CHURCH, 2006CURTIN, K.M. & CHURCH, R.L. (2006). A family of location models for multiple-type discrete dispersion. Geographical Analysis, v. 38, p. 248-70. ; DEVERTEUIL, 2000DEVERTEUIL G. (2000). Reconsidering the legacy of urban public facility location theory in human geography. Progress in Human Geography, v. 24, p. 47-69.; SENDRA & JIMÉNEZ, 2007SENDRA, J.B. & JIMÉNEZ, A.M. (2007). Localización-asignación y justicia/equidad espacial con Sistemas de información geográfica. In: Conferência Iberoamericana de SIG, 11 Anais... Departamento de Ciencias Sociales, Universidad de Lujan, p. 95-115. ISBN: 978-9285-33-6, Lujan. Disponível em: <www.geogra.uah.es>. Acesso em: 20/01/2009
Disponível em: <www.geogra.uah.es>...
; SENDRA et al., 2007SENDRA, J.B.; PALM, F.; GÓMEZ, M.D. (2007). LOCALIZA: una herramienta SIG para resolver problemas de localización óptima. In: Jornadas de SIG libre, 1 Anais... Girona. Disponível em: <www.sigte.udg.es/jornadassiglibre2007/comun>. Acesso em: 05/07/2008
Disponível em: <www.sigte.udg.es/jornada...
).

Segundo ORMSBEE & LANSEY (1994)ORMSBEE, L.E. & LANSEY, K.E. (1994). Optimal Control of Water Supply Pumping Systems. Journal of Water Resources Planning and Management, ASCE, v. 120, n. 2, p. 237-252., devido ao aumento dos níveis de urbanização e, por conseguinte, aumento da demanda, o planejamento de muitos SUDA têm se tornado uma tarefa complexa. Além disso, as autoridades gestoras, muitas vezes, decidem as ações com base na própria experiência profissional, sem considerar a interação entre os elementos envolvidos, resultando em práticas menos eficientes na fase de operação do sistema. Diversos estudos atentam para essas lacunas no processo de planejamento dos SUDA e sugerem novas propostas e técnicas hidráulicas e de gestão para enfrentá-las e ultrapassá-las (BAU, 2000BAU, J. (2000). Abastecimento de água e saneamento: uma nova visão e uma nova cultura para serviços essenciais. Lisboa: Empresa Portuguesa das Águas Livres.; BRITTO & ORIÁ, 2000BRITTO, D.A. & ORIÁ, V.B.B. (2000). A utilização das ferramentas de geoprocessamento na Embasa. Bahia Análise & Dados, v. 10, n. 2, p. 43-46.; BUZETI et al., 2000BUZETI, C.; CASAGRANDE, A.P.; BAGGIO, M.A. (2000). Rede de distribuição de água: por que não a operamos?. In: Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental, 27 Anais... Porto Alegre: ABES, CD-ROM.; RIGHETTO, 2002RIGHETTO, A.M. (2002). Operação ótima de sistema urbano de distribuição de água. In: Seminário de planejamento, projeto e operação de redes de abastecimento de água: o estado da arte e questões avançadas. João Pessoa. 16p. CD-ROM.; SIMÃO & RODRIGUES, 2003SIMÃO, A.C.R. & RODRIGUES, J.M.C. (2003). Um SI protótipo para apoio à gestão de sistemas urbanos de abastecimento de água. Coimbra: Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores de Coimbra, ISSN: 1645-2631, Portugal.; LOPES et al., 2004LOPES, L H.A.; LOCH, C.; BÄHR, H.P. (2004). Modelo de gestão urbana baseado na capacidade de atendimento do sistema de abastecimento de água. In: Congresso Brasileiro de Cadastro Técnico Multifinalitário, Anais... Florianópolis: Ed. UFSC. CD-ROM.; CARRIJO & REIS, 2005CARRIJO, I.B. & REIS, L.F.R. (2005). Obtenção de estratégias operacionais ótimas de sistemas de distribuição de água utilizando algoritmos evolucionários, aprendizado de máquina e ordem de preferência. In: Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 16 Anais... João Pessoa. CD-ROM. 15 p. ).

A fim de indicar áreas ótimas para a localização de unidades de reservação, este estudo fundamenta-se na utilização de técnicas que possibilitem maior viabilidade para a modernização das atuais práticas de localização dos reservatórios constituintes dos SUDA. Partindo do princípio que o estudo da disposição mais adequada constitui etapa expressiva no planejamento dos SUDA, a escolha desses locais torna-se uma decisão complexa, que pode ser apoiada por ferramentas do geoprocessamento.

Em razão do número de variáveis envolvidas â€" tais como a altimetria, distâncias da rede e dos reservatórios aos usuários, demanda atual e futura, entre outras â€", os SIG, com suas funções de reunir, integrar, armazenar, recuperar, transformar e cartografar dados sobre o mundo real (SENDRA et al., 1997SENDRA, J.B.; PALM, F.; GÓMEZ, M.D. (2007). LOCALIZA: una herramienta SIG para resolver problemas de localización óptima. In: Jornadas de SIG libre, 1 Anais... Girona. Disponível em: <www.sigte.udg.es/jornadassiglibre2007/comun>. Acesso em: 05/07/2008
Disponível em: <www.sigte.udg.es/jornada...
), são considerados uma ferramenta útil na modelagem e otimização de diversos elementos que compõem as redes de distribuição de água, atuando, principalmente, na tomada de decisão, importante aspecto na fase de planejamento.

Metodologia

Diante de toda a discussão acerca da disposição espacial mais adequada de equipamentos utilizando os Sistemas de Informações Geográficas (SIG) como um Sistema de Apoio à Decisão Espacial (SADE) e considerando como problema de estudo as unidades de reservação que compõem o SUDA da cidade de Campina Grande (PB), este estudo se baseia em duas etapas: a proposição de efetuar um diagnóstico da situação atual, a fim de verificar riscos de desabastecimento (Alternativa 1), e a indicação de zonas para a disposição espacial de novas unidades de reservação (Alternativa 2).

Área de estudo

A área abordada neste estudo compreende a zona urbana da cidade de Campina Grande (PB), localizada no agreste paraibano na região oriental do Planalto da Borborema, a 7o13'11" de latitude Sul e a 35o52'31" de latitude Oeste. O município de Campina Grande tem uma área que se aproxima de 621 km², enquanto a zona urbana apresenta em seus limites 96 km², aproximadamente. A topografia do município conta com curvas de nível variando entre 337 m e 665 m acima do nível médio de mar. O município apresenta uma população de 385.213 habitantes, uma densidade demográfica de 648,31 hab.km-2 e uma população urbana compreendendo 95% do total (IBGE, 2010).

Aquisição de dados

Foram obtidas, na Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (CAGEPA), informações sobre altitudes e uso do solo, e sobre características da rede, em especial a respeito dos aspectos relacionados aos reservatórios em operação.

Avaliação de critérios e modelagem

Para a escolha dos critérios a serem considerados na análise, foi elaborado um modelo conceitual a fim de simular a implementação com todas as operações a serem efetuadas no SIG. Modelos como este podem ser desenvolvidos baseados no conhecimento de especialistas ou em análises quantitativas (padrões pré-estabelecidos pela literatura ou por medições) ou ainda uma combinação de ambos (GREEN, 1999GREEN, K. (1999). Development of the spatial domain in resource management. In: STAIN, M. (1996). GIS solution in natural resource management: balancing the technical political equation. Santa Fe: Word Press.).

Denominamos esse tipo de análise de Avaliação Multicritério (Multi-Criteria Evaluation), entendida como um conjunto de métodos que permitem o tratamento simultâneo de aspectos econômicos, sociais, políticos, ambientais, entre outros, em um processo de tomada de decisão (BRAGA & GOBETTI, 1997BRAGA, B. & GOBETTI, L. (1997). Análise multiobjetivo. In: Porto, R.L. et al. (1997). Técnicas quantitativas para o gerenciamento de recursos hídricos. Porto Alegre: Ed. UFRGS/ABRH.).

Localização e área de influência das unidades de reservação

As unidades de reservação foram devidamente localizadas a partir de suas coordenadas geográficas. Foram geradas áreas de influência (AI), as quais compreendem a área atendida por cada reservatório (Figuras 1A e B).

Figura 1
(A) Localização das unidades de reservação em operação do SUDA de Campina Grande (PB) e rede geral com principais condutos; (B) Áreas de influência das unidades de reservação do SUDA de Campina Grande.

No entanto, as áreas de influência podem não representar exatamente o alcance espacial de atendimento de cada unidade, pois, devido à dinâmica de crescimento urbano, são adicionadas rapidamente novas derivações da rede para atender a novas demandas, ocasionando a intervenção de um alcance em outro.

Altimetria

Para a obtenção do Modelo Numérico do Terreno (MNT) foi gerada uma grade irregular triangular (TIN do inglês: Triangular Irregular Network) (Figura 2A). Em seguida, essa grade irregular foi transformada em uma grade regular (GRID) (Figura 2B) para que fosse possível sua utilização por álgebra de mapas (operações realizadas célula a célula). Para a obtenção dessa grade regular optou-se por uma resolução de 5×5 m e, portanto, todas as informações a elas associadas também foram compatibilizadas para a mesma resolução espacial.

Figura 2
Modelagem numérica do terreno: (A) Em grade triangular irregular; (B) Em grade regular, elaborados a partir de dados da CAGEPA.

Altura geométrica

Considerou-se a cota do nível de água das unidades de reservação em relação ao plano de referência da zona de consumo. Os valores negativos observados significam que o nível médio dos reservatórios situa-se abaixo dessa zona. Nesse caso, essas áreas deverão ser atendidas por meio de um sistema elevatório. Ressalta-se, porém, que, por indisponibilidade de dados, esse critério não foi utilizado na análise.

A Figura 3 apresenta os planos de informações de altimetria e as alturas geométricas para a área de influência de reservação, denominada R9.

Figura 3
(A) Altimetria; (B) Alturas geométricas para a área de influência da unidade R9.

Distâncias às unidades de reservação

As distâncias às unidades de reservação foram geradas para todas as áreas de influência. A Figura 4 trata da unidade de reservação R9.

Figura 4
Distâncias obtidas em relação à unidade R9.

População e número de domicílios atendidos pela rede geral

Existe uma inter-relação entre população e muitas outras variáveis que constituem os SUDA, tais como: demandas de água, fatores que afetam o consumo diário, vazão, pressões, determinação da capacidade do reservatório, entre outras. Quantificar os domicílios que são atendidos pela rede geral de distribuição de água pode indicar sinais de áreas desprovidas desse serviço. As informações dos setores censitários do IBGE (2000) trazem aspectos relacionados às formas de abastecimento de água, assim como apresentam situações de domicílios que são atendidos ou não pela rede geral (Figura 5B).

Figura 5
(A) População espacializada por bairros; (B) Número de domicílios atendidos pela rede geral, segundo censo do IBGE (2000).

Uso do solo urbano

O mapa de uso do solo (Figura 6A) foi a fonte de dados utilizada para a obtenção da localização da demanda potencial (usuários) de cada reservatório. Nesse sentido, na Alternativa 1, esse plano de informação foi entendido como uma restrição, enquanto na Alternativa 2 utilizou-se uma operação de subtração para obter áreas não ocupadas. Ressalta-se que em algumas áreas da cidade, como no bairro do Serrotão, ainda existem muitas ocupações irregulares que não se encontram devidamente mapeadas no mapa de uso do solo utilizado neste trabalho. Ações de mapeamento e atualização dessa base de dados já podem ser observadas na Prefeitura Municipal de Campina Grande (PMCG).

Figura 6
(A) Uso do solo da cidade de Campina Grande (PB) para o ano de 2006; (B) Zoneamento utilizado no SUDA de Campina Grande.

Zonas de pressão

As zonas de pressão fazem parte do zoneamento do sistema utilizado pela própria CAGEPA. Em geral, esse zoneamento da rede em zonas de pressão é uma técnica usada em sistemas de médio e grande porte para promover a operação e manutenção de uma forma mais eficiente.

São quatro as zonas de pressão do SUDA estudado (Figura 6B): Zona A e Zona D apresentam as menores e maiores pressões, respectivamente; as Zonas B e C mostram números intermediários de pressão. Assim, a Zona A está na região mais baixa da cidade em termos de altimetria, enquanto a zona D situa-se na região mais alta. Da mesma forma, as zonas B e C estão em regiões de altimetria intermediária que cresce gradativamente da Zona B à Zona C. As áreas de expansão urbana já estão inseridas dentro dos limites da Zona A.

Distância à rede geral e volumes armazenados

A Figura 7A apresenta o desenho da rede geral através dos condutos principais, bem como as distâncias calculadas em relação à mesma, as quais foram utilizadas como critério.

Figura 7
(A) Distâncias à rede geral (principais condutos); (B) Representação espacial da capacidade de armazenamento do SUDA de Campina Grande (PB).

A capacidade de armazenamento de água em um SUDA depende diretamente da quantidade de unidades de reservação e da capacidade volumétrica destes. Os volumes armazenados são calculados segundo critérios de projetos, tais como: demandas, vazões, entre outros. Por meio da localização das unidades de reservação e dos valores dos volumes de armazenamento (Figura 7B), foi possível gerar uma superfície contínua a partir de métodos de interpolação presentes no SIG utilizado. Essa superfície foi utilizada como critério nas análises da Alternativa 2.

Critérios e alternativas

A metodologia proposta estabelece duas alternativas baseadas em diferentes parâmetros. A Alternativa 1 realiza um diagnóstico da situação atual com relação aos riscos de desabastecimento e a Alternativa 2 considera as possibilidades de expansão do sistema e propõe localizações ótimas de novas unidades de reservação. Os critérios utilizados foram: alturas geométricas, distâncias às unidades de reservação, população residente, domicílios abastecidos pela rede geral. Esses critérios foram adequados segundo uma função de normalização, tornando possível a combinação dessas informações. A normalização transforma os planos de informação em uma mesma unidade de medida, em função da adequação de cada critério à hipótese formulada. Utilizaram-se conjuntos difusos nas análises, os quais geram possibilidades de cada célula pertencer a uma função de pertinência estabelecida.

Resultados e discussões

São apresentados a seguir os resultados obtidos na análise das Alternativas 1 e 2 por intermédio dos planos de informações espaciais que correspondem à modelagem desenvolvida. Neste trabalho serão apresentados os resultados referentes à área de influência do reservatório R9, o qual é um dos reservatórios de maior relevância no contexto do abastecimento humano em Campina Grande (PB). O reservatório R9, localizado no bairro de Santa Rosa, em Campina Grande, tem capacidade de armazenamento de 29.000 m³. É o principal centro de reserva e distribuição de água tratada do sistema de abastecimento da área urbana de Campina Grande, num total de 15 reservatórios em operação, os quais abastecem uma malha de 450 km de rede de distribuição de água, com um total de 83.500 ligações domiciliares e uma demanda média de 60.890,40 m³.dia-1. A Tabela 1 apresenta as características principais das unidades de reservação do SUDA de Campina Grande.

Tabela 1
Principais características das unidades de reservação do SUDA da cidade de Campina Grande (PB) (elaborado das informações da CAGEPA).

Alternativa 1: Diagnóstico da situação atual

A Alternativa 1 tem como proposta a realização de um diagnóstico da situação atual dos SUDA em relação às unidades de reservação da área de estudo. Toda a análise foi realizada sob o ponto de vista de riscos de desabastecimentos. Neste trabalho, um conjunto difuso é caracterizado pelo grau de pertinência que varia de 0 a 10, indicando um aumento contínuo de uma situação de não pertinência para uma de total pertinência.

A adequação foi classificada em faixas para caracterizar a hipótese formulada: baixo, médio e alto. Por conseguinte, considerando que as áreas com alturas geométricas menores são áreas susceptíveis a riscos de desabastecimento. Ou seja, quanto menor o valor da altura geométrica, mais adequada à hipótese formulada. Portanto, as funções lineares de normalização para essa hipótese são apresentadas na Figura 8A. A Figura 9Aexpõe os resultados da normalização do critério altura geométrica por meio de uma função linear decrescente aplicada em todas as células para as áreas de influência das unidades de reservação analisadas. Neste trabalho serão apresentados os resultados obtidos apenas para área de influência da unidade R9.

Figura 8
Funções de normalização para a unidade R9: (A) Linearmente decrescente do critério altura geométrica; (B) Linearmente crescente do critério distância; (C) Linearmente crescente do critério população; (D) Linearmente decrescente do critério número de domicílios atendidos.

Figura 9
Mapas para o R9 normalizados e classificados em faixas de riscos de desabastecimento: (A) Alturas geométricas; (B) Distâncias; (C) População; (D) Números de domicílios.

Sabe-se que quanto maiores são as distâncias entre os usuários e as unidades de reservação, maiores são os riscos a desabastecimento, pois as pressões na rede de distribuição diminuem ao longo das distâncias alcançadas. Além disso, em áreas situadas a grandes distâncias, a rede secundária de distribuição pode ser ausente ou apresentar problemas de continuidade de abastecimento. Assim, quanto maiores as distâncias, mais adequada à hipótese formulada. As funções de normalização do critério supracitado para as unidades de reservação analisadas são apresentadas na Figura 8B. A Figura 9B mostra os valores normalizados utilizados na análise por meio de uma função linear crescente aplicada em todas as células para as áreas de influência das unidades de reservação, porém foram apresentados resultados apenas para a área de influência da unidade R9.

Outro critério avaliado na modelagem foi a população residente. Assumindo-se que em áreas com maior população resultam em maiores demandas de água, supõe-se, portanto, maiores riscos de desabastecimento. De tal modo, a normalização desse critério pode ser efetuada por meio de uma função linear crescente (Figura 8C). Os resultados para a normalização do critério população, realizada por meio de uma função linear crescente aplicada em todas as células para as áreas de influência das unidades de reservação analisadas, podem ser visualizados para a área de influência do reservatório R9 (Figura 9C).

O número de domicílios atendidos pela rede geral de distribuição de água também influenciará no risco a desabastecimento. A não existência de ligação dos domicílios à rede geral também apontará problemas gerais no abastecimento de água, dentre os quais estão incluídos a descontinuidade do abastecimento ou a oferta local de fontes alternativas de captação. Deste modo, a normalização deste critério será realizada por intermédio de uma função linear decrescente (Figura 8D). Após normalização, foram obtidos os resultados para todas as células nas unidades de reservação analisadas, os quais podem ser visualizados na Figura 9D.

Obtida a geração de todos os planos de informações, realizou-se a análise multicriterial, que se caracteriza como uma combinação ponderada entre os critérios normalizados. A análise se limita à restrição estabelecida, ou seja, nas áreas urbanas ocupadas (lotes). O critério restritivo pode ser visualizado na Figura 6A. A contribuição (pesos) de cada critério à análise foi avaliada segundo métodos heurísticos e está representada algebricamente pela Equação 1.

Ressalta-se que foram realizados diversos testes para aferir a eleição dos pesos de cada critério. A análise de sensibilidade dos resultados encontrados contou com a participação de pesquisadores especialistas em redes hidráulicas e com ampla experiência de consultoria nessa área na cidade de Campina Grande. A aferição de pesos e ponderação dos mesmos baseia-se em conhecimento especializado, e pode-se dizer que esta é uma modelagem baseada em conhecimento (do inglês Knowledge-based Modelling), uma abordagem utilizada por diversas áreas de conhecimento e muito aplicada nas geotecnologias como o SIG (DAILY et al., 2002DAILY, C; GIBSON, W; TAYLOR, G. H; JOHNSON, G. L; PASTERIS, P. (2002). A knowledge-based approach to the statistical mapping of climate. Climate Research, v. 22, p. 99-113.).

{[(0,4 x altura geométrica)(0,2 x distância) (0,2 x população)(0,2 x nº de domicílios)] x lotes}(1)

Os resultados obtidos identificam áreas ocupadas submetidas a risco de desabastecimento de água, apresentadas segundo faixas que indicam em ordem crescente o risco avaliado, a saber: baixo, médio, alto (Figura 10). Os resultados espacializados de riscos de desabastecimento de água segundo múltiplos critérios tornam-se um interessante artifício no processo de tomada de decisão.

Figura 10
Riscos de desabastecimento de água segundo análise multicriterial para a unidade de reservação R9.

O processo de tomada de decisão com múltiplos critérios pode ser entendido como aproximações de modelos e métodos para auxiliar gestores, especialistas, técnicos, entre outros, a descrever, avaliar, ordenar, selecionar objetos com base em uma avaliação expressa por valores, de preferência de acordo com vários critérios (MALCZEWSKI, 1996MALCZEWSKI, J. (1996). A GIS-based approach to multiple criteria group decisionmaking. Int. J. Geographical Information Systems. v. 10, n. 8, p. 955-971.). Nesse sentido, a indicação da disposição espacial de unidades de reservação dos sistemas urbanos de água tem como propósito promover diversos aspectos sociais e econômicos presentes nos planos e programas relacionados aos SUDA. Tratando-se de planejamento de sistemas de distribuição de água, verifica-se um alto volume de variáveis envolvidas, implicando grande número de decisões a serem tomadas.

O zoneamento de áreas classificadas de acordo com o possível risco de desabastecimento pode auxiliar os gestores do SUDA na expansão e ampliação do sistema, priorizando áreas de maior risco e, ao mesmo tempo, estimulando medidas mitigadoras do consumo acelerado nestas áreas.

Alternativa 2: Simulação de zonas para localizar novas unidades

A proposta da Alternativa 2 é realizar simulações que indiquem melhores zonas para localizar novas unidades de reservação com vistas à necessidade de ampliação da rede de distribuição de água ocasionada, principalmente, pela expansão urbana. As análises foram realizadas utilizando como limites o zoneamento de pressões: Zona A, Zona B, Zona C e Zona D. O critério restritivo são os vazios urbanos.

Com a hipótese formulada: encontrar zonas ótimas para localizar novas unidades de reservação, os critérios utilizados foram normalizados e ponderados, assim como na Alternativa 1. O grau de pertinência variou de 0 a 10 e foram classificados em faixas que caracterizam a hipótese formulada: áreas não recomendadas e áreas ótimas. Nesse sentido, a normalização do critério altimetria é alcançada por meio de uma função linearmente crescente (Figura 11A), pois áreas que possuem altos valores altimétricos se tornam mais adequadas para uma disposição espacial otimizada das unidades de reservação. A adequação espacial obtida por meio das funções de normalização, determinadas para o critério de altimetria, foi aplicada às quatro zonas analisadas, porém são apresentados na Figura 12A os resultados para Zona A.

Figura 11
(A) Funções de normalização do critério altimetria para as zonas analisadas; (B) Funções de normalização do critério distâncias à rede geral (Zona A); (C) Funções de normalização do critério volume armazenado (Zona A).

Figura 12
Mapas normalizados e classificados em áreas para a disposição espacial de novas unidades de reservação para a Zona A. (A) Altimetria; (B) Distâncias.

Na implantação de novas unidades de reservação, um critério que pode ser considerado são as distâncias da rede geral aos eventuais usuários do serviço (Figura 12B). Nesse sentido, as áreas mais adequadas à hipótese formulada são aquelas que estão pouco distantes do usuário. Assim, as funções de normalização para esse critério são linearmente decrescentes (Figura 11B).

Outro critério utilizado na análise da Alternativa 2 foi o volume armazenado nas unidades operadas do sistema estudado. Esse critério representa uma tendência da necessidade de implantação de novas unidades, tendo em vista que é possível visualizar zonas com pouca ou nenhuma capacidade de armazenamento de água. Valores menores de volumes armazenados são mais adequados à hipótese formulada. Logo, a normalização é realizada por uma função linearmente decrescente (Figura 11C). O mapa obtido por meio da função de normalização encontrada pode ser visualizado na Figura 13.

Figura 13
Mapa de volumes armazenados normalizado classificado em áreas para a disposição espacial de novas unidades de reservação para a Zona A.

A operação para a análise multicriterial está representada na Equação 2. Assim como na Alternativa 1, a escolha dos pesos de cada critério foi confirmada após distintos testes.

{[(0,4 x altimetria) (0,25 x distância) (0,25 x volume armazenado)] x vazios urbanos}(2)

Os resultados da análise da Alternativa 2 foram previstos, a princípio, para as áreas em expansão urbana consideradas (região sudoeste da cidade de Campina Grande). No entanto, optou-se em analisar todo o limite urbano através do zoneamento abordado. Essas áreas foram avaliadas no momento em que se considerou a Zona A, pois as mesmas estão abrigadas, quase totalmente dentro desta zona. Outra zona que possui áreas urbanas em expansão é a Zona D. Ressaltamos que o critério de riscos de desabastecimentos não foi utilizado na análise das áreas ótimas, pois o limite geográfico utilizado nas Alternativas 1 e 2 é diferente, não sendo possível realizar as operações por meio da álgebra de mapas.

Obteve-se resultados da otimização de áreas para localização de unidades de reservação para as quatro zonas analisadas, a exemplo da Zona A (Figura 14).

Figura 14
Indicação de áreas para a disposição espacial de novas unidades de reservação na Zona A.

De acordo com SENDRA & JIMÉNEZ (2007)SENDRA, J.B. & JIMÉNEZ, A.M. (2007). Localización-asignación y justicia/equidad espacial con Sistemas de información geográfica. In: Conferência Iberoamericana de SIG, 11 Anais... Departamento de Ciencias Sociales, Universidad de Lujan, p. 95-115. ISBN: 978-9285-33-6, Lujan. Disponível em: <www.geogra.uah.es>. Acesso em: 20/01/2009
Disponível em: <www.geogra.uah.es>...
, um dos principais benefícios da localização ótima de equipamentos urbanos é o benefício econômico, haja visto que o investimento em áreas com maior viabilidade técnica certamente acarretará custo menor de manutenção e maior eficiência. Para a área de expansão do sistema de abastecimento de Campina Grande, espera-se que trabalhos como este sejam considerados, além de outras análises que possam vir a dar melhor suporte técnico para implantação de novas unidades de reservação.

Os SIG oferecem uma série de vantagens diante da gestão habitual dos serviços de distribuição de água. Uma vez que esses sistemas são capazes de servir como um SADE, eles possibilitam a realização de tarefas complexas de serem efetuadas de maneira manual. Além disso, a realização dessas tarefas pode incrementar de modo notável a eficácia e equidade do atendimento à população a esses serviços. A implantação dos SIG na tarefa de otimizar a localização de equipamentos que constituem os SUDA parece altamente recomendável.

Conclusões

O mapeamento de lotes com riscos de desabastecimento pode funcionar como indicador para ações de gestão e planejamento, visto que sugere que uma parcela dos usuários de água encontra-se em áreas com regime deficiente de abastecimento, seja por questões operacionais, demográficas ou geográficas. Os resultados das áreas ótimas para a disposição de novas unidades de reservação auxiliam na tomada de decisão, trazendo diretrizes de planejamento em virtude da expansão do sistema estudado (o estudo não alcançou a etapa de definir dados em microescala acerca da localização exata dos novos reservatórios e quanto seriam seus volumes). A obtenção dessas diretrizes para o planejamento dos SUDA na área de estudo escolhida visa minimizar custos, aumentando a eficiência e alcance social do serviço prestado.

Referências

  • BAU, J. (2000). Abastecimento de água e saneamento: uma nova visão e uma nova cultura para serviços essenciais. Lisboa: Empresa Portuguesa das Águas Livres.
  • BRAGA, B. & GOBETTI, L. (1997). Análise multiobjetivo. In: Porto, R.L. et al. (1997). Técnicas quantitativas para o gerenciamento de recursos hídricos. Porto Alegre: Ed. UFRGS/ABRH.
  • BRASIL (2000). Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas - IBGE. Setores censitários de 2000. Disponível em: <www.ibge.gov.br>. Acesso em: 10 fev. 2009.
    » Disponível em: <www.ibge.gov.br
  • BRASIL (2008). Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas - IBGE. Contagem da população para o ano de 2008. Disponível em: <www.ibge.gov.br>. Acesso em: 10 fev. 2009.
    » Disponível em: <www.ibge.gov.br
  • BRITTO, D.A. & ORIÁ, V.B.B. (2000). A utilização das ferramentas de geoprocessamento na Embasa. Bahia Análise & Dados, v. 10, n. 2, p. 43-46.
  • BUZETI, C.; CASAGRANDE, A.P.; BAGGIO, M.A. (2000). Rede de distribuição de água: por que não a operamos?. In: Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental, 27 Anais... Porto Alegre: ABES, CD-ROM.
  • CARRIJO, I.B. & REIS, L.F.R. (2005). Obtenção de estratégias operacionais ótimas de sistemas de distribuição de água utilizando algoritmos evolucionários, aprendizado de máquina e ordem de preferência. In: Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 16 Anais... João Pessoa. CD-ROM. 15 p.
  • CURTIN, K.M. & CHURCH, R.L. (2006). A family of location models for multiple-type discrete dispersion. Geographical Analysis, v. 38, p. 248-70.
  • DAILY, C; GIBSON, W; TAYLOR, G. H; JOHNSON, G. L; PASTERIS, P. (2002). A knowledge-based approach to the statistical mapping of climate. Climate Research, v. 22, p. 99-113.
  • DEVERTEUIL G. (2000). Reconsidering the legacy of urban public facility location theory in human geography. Progress in Human Geography, v. 24, p. 47-69.
  • GREEN, K. (1999). Development of the spatial domain in resource management. In: STAIN, M. (1996). GIS solution in natural resource management: balancing the technical political equation. Santa Fe: Word Press.
  • LOPES, L H.A.; LOCH, C.; BÄHR, H.P. (2004). Modelo de gestão urbana baseado na capacidade de atendimento do sistema de abastecimento de água. In: Congresso Brasileiro de Cadastro Técnico Multifinalitário, Anais... Florianópolis: Ed. UFSC. CD-ROM.
  • MALCZEWSKI, J. (1996). A GIS-based approach to multiple criteria group decisionmaking. Int. J. Geographical Information Systems. v. 10, n. 8, p. 955-971.
  • ORMSBEE, L.E. & LANSEY, K.E. (1994). Optimal Control of Water Supply Pumping Systems. Journal of Water Resources Planning and Management, ASCE, v. 120, n. 2, p. 237-252.
  • RIGHETTO, A.M. (2002). Operação ótima de sistema urbano de distribuição de água. In: Seminário de planejamento, projeto e operação de redes de abastecimento de água: o estado da arte e questões avançadas. João Pessoa. 16p. CD-ROM.
  • SENDRA, J.B. & JIMÉNEZ, A.M. (2007). Localización-asignación y justicia/equidad espacial con Sistemas de información geográfica. In: Conferência Iberoamericana de SIG, 11 Anais... Departamento de Ciencias Sociales, Universidad de Lujan, p. 95-115. ISBN: 978-9285-33-6, Lujan. Disponível em: <www.geogra.uah.es>. Acesso em: 20/01/2009
    » Disponível em: <www.geogra.uah.es>
  • SENDRA, J.B.; PALM, F.; GÓMEZ, M.D. (2007). LOCALIZA: una herramienta SIG para resolver problemas de localización óptima. In: Jornadas de SIG libre, 1 Anais... Girona. Disponível em: <www.sigte.udg.es/jornadassiglibre2007/comun>. Acesso em: 05/07/2008
    » Disponível em: <www.sigte.udg.es/jornadassiglibre2007/comun>
  • SIMÃO, A.C.R. & RODRIGUES, J.M.C. (2003). Um SI protótipo para apoio à gestão de sistemas urbanos de abastecimento de água. Coimbra: Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores de Coimbra, ISSN: 1645-2631, Portugal.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    July-Sept 2013

Histórico

  • Recebido
    14 Dez 2011
  • Aceito
    22 Jul 2013
Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental - ABES Av. Beira Mar, 216 - 13º Andar - Castelo, 20021-060 Rio de Janeiro - RJ - Brasil - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: esa@abes-dn.org.br