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Testes ecotoxicológicos de diferentes formulações do bioinseticida produzido na UNIVILLE submetidas ao teste de prateleira

Ecotoxicological testing of different formulations of bioinseticide produced at UNIVILLE subjected to a shelf test

Resumos

O larvicida à base de Bacillus thuringiensis var. israelensis é utilizado para combater mosquitos e simulídeos atingindo o sistema digestivo de larvas do mosquito levando-as à morte. É importante conhecer a dose letal dos produtos (DL50) para os insetos alvo, bem como seu grau de ecotoxicidade (CEC) ao ambiente durante cada fase de caracterização dos produtos para estabelecer valores que não venham a ocasionar a morte ou intoxicação de outros seres vivos. O presente trabalho objetivou a determinação da DL50 através de bioensaios com larvas de Aedes albupictus, bem como o CEC com a utilização de testes agudos com o microcrustáceo Daphnia similis para o larvicida com diferentes formulações expostas ao teste de prateleira. A amostra que apresentou melhor valor para CECfoi B1 (sem aditivos) e para DL50 foi B2 (com cafeína na composição), sendo esses valores de 3526,000 e 16,815 mg.L−1, respectivamente.

bioinseticida; bioensaios; ecotoxicologia


The larvicide based on Bacillus thuringiensis var. israelensis is used to eliminate mosquitoes and simullidaes, acting on the larvae digestive system causing death. It is important to know the lethal dose (LD50) for the target insects and the environment ecotoxicity degree (CEC) during each characterization phase of the products in order to establish values that do not cause death or intoxication for other living beings. This article aimed to find the DL50 by bioassays with larvaes of Aedes albupictus, as well as the CEC using acute tests with the microcrustacean Daphnia similis for the product with different formulations exposed to a shelf test. The sample that showed the best CEC value was the B1 (without additives) and for LD50it was the B2 (with caffeine in composition) that showed the following values: 3526.000 and 16.815 mg.L−1, respectively.

bioinsecticide; bioassay; ecotoxicology


INTRODUÇÃO

Doenças ocasionadas por vetores são consideradas uma importante causa da mortalidade no Brasil e no mundo, principalmente as ocasionadas por mosquitos. Esses insetos se reproduzem de maneira muito rápida e em grande número, podendo se tornar pragas que podem atingir diretamente a população se medidas cabíveis não forem tomadas.

Práticas para controle de insetos são muito antigas. Há registros de seu uso na China há mais de dois mil anos. Para o controle de pragas é utilizada uma classe de agrotóxicos denominada de inseticidas (DAROS et al, 2009DAROS, W.F.; RIEDER, A.; RODRIGUES, F.A.C.; MACEDO, P.C.; LEITE, M.C.; MELÃO, A.V. (2009) Classes de agrotóxicos usados nas plantações de soja (Glycine max (L.) Merr. - Fabaceae) Cáceres, Mato Grosso. In: 2a Jornada Científica da Unemat. Barra do Bugres: Universidade do Estado do Mato Grosso.). Na década de 1940 foram descobertos os inseticidas sintéticos, constituídos à base de substâncias químicas orgânicas e inorgânicas. A criação desses inseticidas foi considerada pelo mundo uma revolução no controle de mosquitos vetores de doenças. Porém, o que não se sabia é que os resultados dessas aplicações teriam como consequência a contaminação do solo, águas superficiais e águas subterrâneas, vindo a tornar esses recursos inviáveis para o uso humano e animal. Outro efeito da utilização prolongada de inseticidas sintéticos é a geração de resistência por parte dos organismos alvos, resultando na redução da eficiência do produto. Segundo Pacheco (2009)PACHECO, P. (2009) Brasil lidera uso mundial de agrotóxicos. Estadão: Economia. Disponível em: <http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-lidera-uso-mundial-de-agrotoxicos,414820>. Acesso em: 10 maio 2011.
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, no Brasil, todos os agrotóxicos devem seguir a Lei Federal n° 7.802/1989 e estar registrados obrigatoriamente na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e no Ministério da Agricultura para que seja possível um monitoramento de seus usos.

A partir da década de 1980 começaram a surgir pesquisas na busca de novas alternativas para o controle de insetos com diferentes modos de ação. Uma dessas alternativas foi a utilização de inseticidas biológicos à base de bactérias como Bacillus thuringiensis israelensis (Bti). Conforme descrito por Stahly et al. (2006)STAHLY, D.; ANDREWS, R.E.; YOUSTEN, AA. (2006) The genus Bacillus - insect pathogens. In: DWORKIN, M. (Ed.) The Prokaryotes. Singapore: Springer Science. vol. 4, cap. 1.2.17, p. 563-608., a descoberta do Bti foi feita em 1902 por Ishiwata, no Japão. No entanto, os primeiros registros foram escritos por Berliner em 1915, na Thuringia, Alemanha.

Bacillus thuringiensis var. israelensis (Berliner) é uma bactéria gram-positiva e entomopatogênica, aeróbica ou facultativamente anaeróbica, naturalmente encontrada no solo. Durante a fase de esporulação, as bactérias sintetizam proteínas chamadas endo-toxinas ou insectical crystal proteins (ICPs), que se acumulam na periferia dos esporos na forma de cristais em um dos polos da célula (LERECLUS, 1988; HOFTE & WHITELEY, 1989; PEFRÖEN, 1997 apud BOBROWSKI et al. 2003BOBROWSKI, V.L.; FIUZA, L.M.; PASQUALI, G.; BODANESE-ZANETTINI, M.H. (2003) Genes de Bacillus thuringiensis: uma estratégia para conferir resistência a insetos em plantas. Ciência Rural, v. 34, n. 1, p. 843-850.).

De acordo com Souza Dias (1992), os produtos mais usados à base de Bti para controle de mosquitos e simulídeos que estão disponíveis no mercado brasileiro são: Vectobac, Bactimos, Teknar e Skeetal. Já existem outros produtos no mercado, mas eles ainda não são comercializados em grande escala. O Rio Grande do Sul foi pioneiro no uso de Bti no Brasil. O Programa de Controle de Simulídeos (PCS) utilizando o bioinseticida foi iniciado em 1983 com o objetivo de controlar populações resistentes de Simulium pertinax (RUAS & MATIAS, 1985SOUZA DIAS, J.M. (1992) Produção e utilização de bioinseticidas bacterianos. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 27, p. 59-76.).

O uso do Bti se mostra muito efetivo no combate à simulídeos e mosquitos, porém possui algumas falhas. Para que o efeito sob o controle dos insetos seja eficaz é necessária a melhoria constante dos produtos no mercado. A adição de componentes que venham a auxiliar na efetividade dos bioinseticidas é uma alternativa interessante e viável, mas sempre se deve preservar a característica de segurança ao meio ambiente e ao homem que esses produtos visam oferecer. Adicionar cafeína na formulação do bioinseticida Bti é uma das alternativas. Estudos demonstram que essa substância altera a produção das esterases no organismo das larvas. Essas enzimas estão envolvidas em funções vitais do mosquito, ocasionando sua mortes. Inúmeras pesquisas com extratos de plantas produzidas em diferentes locais têm sido divulgadas pela mídia de maneira crescente, todas com o objetivo de realizar o controle do mosquito na fase larval (GUIRADO & BICUDO, 2009GUIRADO, M.M & BICUDO, H.E.M.C. (2009) Alguns aspectos do controle populacional e da resistência a inseticidas em Aedes aegypti (Diptera, Culicidae). Boletim Epidemiológico Paulista, v. 6, n. 64.). Uma das alternativas pode ser a clorofila, que é encontrada em abundância e é de fácil extração. Neste sentido, Fisher et al. (2010) classificou a adição de clorofila na composição do bioinseticida como uma alternativa favorável na busca de formulações que viessem a aumentar a efetividade do produto.

Muitos progressos têm sido feitos na área de produção de bioinseticidas, porém, antes que esses produtos cheguem ao mercado, suas características devem ser conhecidas. Uma das etapas de caracterização é o teste de prateleira, no qual o produto é estocado à temperatura ambiente e protegido da radiação solar. São observadas as reações ocasionadas por esses fatores sobre as características do produto após tempos de exposição pré-determinados, obtendo-se, assim, a melhor forma de armazenamento e o tempo de validade. Para garantir a segurança na aplicação dos novos produtos é necessário conhecer seus efeitos ao longo dos períodos de teste, tanto para o inseto alvo, determinando a dose letal (DL50), como também sua concentração crítica de ecotoxicidade (CEC).

De acordo com Soares (1991 apud BOTELHO, 2010BOTELHO, R.G. (2010) Toxicidade de herbicidas para Escherichia coli e alevinos de Ctenopharyngodon idella. Dissertação (Mestrado em Ciências Biológicas) - Universidade Vale Do Rio Doce, Governador Valadares.), a preocupação em monitorar a ação antrópica levou à criação da ecotoxicologia, ciência que estuda os efeitos tóxicos das substâncias químicas e dos agentes físicos sobre os organismos vivos, especialmente nas populações e nas comunidades de um ecossistema definido, incluindo os caminhos da transferência desses agentes e sua interação com o ambiente. Nos estudos de ecotoxicologia, organismos representativos do ambiente são expostos a várias concentrações do efluente ou da substância potencialmente tóxica a ser testada, por um período determinado.

Como uma ferramenta em ecotoxicologia, ensaios ecotoxicoló-gicos consistem em fornecer informações relevantes e fiáveis sobre os efeitos de produtos químicos e biológicos sobre essas comunidades. Biotestes ou bioensaios são baseados na resposta de um estímulo a um organismo vivo, o que poderia ser, por exemplo, a exposição a uma determinada toxina. É possível usar algas, protozoários, bactérias, peixes e invertebrados como organismos-teste (HÄDER & RICHTER, 2009HÄDER, D.P. & RICHTER, P. (2009) Curso avançado de biologia marinha: experimentos ecofisiológicos. São Francisco do Sul: Universidade da Região de Joinville (Univille).).

Em testes agudos são observadas a letalidade e a imobilidade em um curto período de tempo, geralmente de 24 a 48 horas. O resultado do teste é expresso em concentração efetiva inicial mediana (CE50) e DL50, que corresponde à concentração da amostra no início do ensaio que causa efeito agudo a 50% dos organismos expostos em 48 horas, nas condições de teste (MAGALHÃES & FERRÃO FILHO, 2008MAGALHÃES, D.P. & FERRÃO FILHO, A.S. (2008) A ecotoxicologia como ferramenta no biomonitoramento de ecossistemas aquáticos. Oecologia Brasiliensis, v. 12, n. 3, p. 355-381.).

Segundo consta no manual da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB, 2007), a escolha adequada do método a ser utilizado em cada estudo dependerá dos objetivos do trabalho, pois em alguns casos é necessário introduzir modificações no procedimento padronizado ou desenvolver outro mais específico. Os testes devem ser feitos em pelo menos três níveis tróficos para que se possa ter um parâmetro abrangente de avaliação.

No presente trabalho objetivou-se determinar a DL50 por meio de bioensaios, com larvas do organismo Aedes albupictus. Também buscou-se definir o grau de ecotoxicidade (CEC) com a utilização de testes agudos com o microcrustáceo Daphnia similis, do produto bruto cen-trifugado (B1), do produto formulado com adição de cafeína (B2) e do produto formulado com adição de clorofila (B3) expostos ao teste de prateleira.

METODOLOGIA

O produto utilizado nos testes, denominado Bti-Univille, foi obtido em laboratório utilizando o processo de fermentação em biorreator, aperfeiçoado anteriormente pelo grupo de pesquisa.

O microrganismo utilizado no cultivo foi o Bacillus thuringiensisvar. israelensis IPS 82, sortipo H14.

O meio de cultivo utilizado no fermentador foi o meio GYS proposto por Saar (1996)SAAR, J.H. (1996) Biotestes para efluentes industriais: ameaça ou solução? Artigo Técnico. Blumenau: UMWELT Ltda. Disponível em: <http://www.tratamentodeagua.com.br/R10/Lib/Image/art_629651847_umwelt.pdf> Acesso em: 10 jun. 2011.
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, modificado, contendo extrato de levedura, (NH4)2SO4CaCl2.2H2O, MgSO4.7H2O, MnSO4.H2O, K2.HPO4, KH2PO4 e glicose.

A fermentação foi feita por meio do método proposto por Silva (2007)SILVA, M. (2007) Alternativas para a produção de bioinseticida Bti: uso do processo semicontínuo e do processo em estado sólido. Dissertação (Mestrado em Engenharia Química) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis., com cultivo submerso em regime semicontínuo. O sistema inclui as instalações necessárias para o controle de pH (mantido em 7,0), temperatura (30°C), agitação (450 a 750 rpm) e aeração (0,5 vvm). O caldo fermentado foi submetido ao processo de centrifugação.

As formulações foram feitas a partir da formulação base proposta por Fisher et al. (2010), que contém quantidades pré estabelecidas de óxido de zinco (Aerosil®), éster de sorbitol e lecitina de soja, conforme expresso na Tabela 1.

Tabela 1
Componentes da formulação base.

Para a amostra B2, foi adicionado 40 g.L−1 de cafeína pura, em pó. Para a amostra B3, foi adicionado 5 mL de clorofila líquida, concentração de 3 μg.mL−1.

Os bioensaios para determinação da DL50 foram realizados com larvas de 4° ínstar do mosquito Aedes albopictus. Os ovos desse inseto foram cedidos pelo Laboratório de Parasitologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). O método utilizado para os bioensaios foi o proposto por Draft (WHO, 1999), descrito em Guideline Specifications for Bacterial Larvicides for Public Healt Use.

Através do programa estatístico Probit determinou-se a DL50, concentração letal do produto para matar 50% da população larval empregada em cada análise.

Para os testes de ecotoxicidade aguda foi utilizado o procedimento recomendado pela NBR 12713 (ABNT, 2004), sendo o organismo teste o microcustáceo Daphnia similis. A CEC (concentração crítica de eco-toxicidade para eliminar 50% da população) foi determinada através de métodos estatísticos utilizando o programa Probit. Os organismos utilizados nos testes de CECforam cultivados no laboratório de eco-toxicologia da UNIVILLE.

Os testes de prateleira foram divididos em duas etapas:

  • Primeira etapa: amostras de 80 mL de produto formulado com cafeína (B2) e clorofila (B3), como também o produto bruto cen-trifugado (B1) foram acondicionadas em frascos transparentes, de plástico, e armazenados em prateleiras disponíveis no Laboratório de Pesquisa da UNIVILLE, em temperatura ambiente, sem antes passar por nenhum processo de desinfecção. As amostras foram retiradas de cada frasco e conduzidas aos testes para determinação da DL50 e CEC. Os testes foram realizados em três períodos: no primeiro dia de formulação (T0.1), 30 dias após a formulação (T1.1) e 60 dias após a formulação (T2.1). Sendo que o T0.1 significa o tempo zero (T0) da primeira etapa.

  • Segunda etapa: para cada produto formulado com cafeína (B2), clorofila (B3) e produto bruto centrifugado (B1), foram feitas 3 amostras de 20 mL cada, acondicionadas em frascos brancos, de plástico e estéreis. Todos os frascos foram submetidos ao processo de pasteurização (em banho-maria a 70°C) após a etapa de formulação e envolvidos por papel laminado para que não recebessem incidência de luz. Para cada teste de DL50 e CEC uma nova amostra era aberta, para que a interferência de microrganismos externos fosse remota. Nessa etapa, os testes também foram realizados em três períodos: no primeiro dia de formulação (T0.2), 30 dias após a formulação (T1.2) e 60 dias após a formulação (T2.2). Sendo que o T0.2 significa o tempo zero (T0) da segunda etapa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Primeira etapa do teste de prateleira

Os testes de DL50 não demonstraram nenhuma efetividade do produto, sendo que não foi constatada a ocorrência de morte das larvas mesmo após um período de 48 h de exposição. Em relação aos testes de ecotoxicidade, os valores muito divergentes de morte dos organismos-teste não permitiram uma análise dos resultados através do programa Probit. Devido aos fatores acima mencionados, acredita-se que as amostras possuíam características tóxicas aos organismos no teste de CEC e não possuíam nenhuma característica tóxica aos organismos alvo nos testes de DL50, fator esse que pode ter ocorrido devido, principalmente, à baixa produção de toxinas Cry no momento da produção do bioinseticida, como também, à decomposição do produto. Quanto às características físicas das amostras, no momento da formulação, B1 e B2 apresentavam odor característico e coloração marrom claro, já B3 apresentava coloração esverdeada, característica da clorofila. Após 30 e 60 dias na prateleira, os produtos mostraram grande alteração na cor e odor. Ficando B1 e B2 amarelo ocre e B3 marrom.

Segunda etapa do teste de prateleira

Como os resultados obtidos anteriormente não foram satisfatórios e as amostras apresentaram características de decomposição, foram analisados possíveis fatores que poderiam ter influenciado diretamente nas características do produto. Foi considerado que a incidência de luz e a interferência de microrganismos externos poderiam estar agindo e acelerando a decomposição das amostras. Por isso, foram feitos novos ensaios com a pasteurização do produto e proteção da luz solar.

O resultado para os ensaios no primeiro tempo de amostragem, logo após a formulação, não apresentaram os mesmos problemas verificados na primeira etapa. A amostra que apresentou melhor resultado para CEC em T0.2, T1.2 e T2.2 foi a do produto bruto centri-fugado (B1), conforme a Tabela 2, na qual encontram-se expostos os resultados da CEC para os produtos testados, observando-se um aumento constante da CEC ao longo do teste de prateleira, com uma diferença de aproximadamente 610% entre 0 e 60 dias de estocagem. Após 30 e 60 dias de estocagem (T1.2 e T2.2), a CEC de B2 aumentou aproximadamente em 36 e 880% e de B3 em 29 e 189%, respectivamente, em relação ao T0.2.

Tabela 2
Resultados do teste de concentração crítica de ecotoxicidade, segunda etapa do teste de prateleira.

Observando-se, assim, que o maior aumento da concentração específica (CEC) após 60 dias foi na amostra B1, porém todas as amostras apresentaram grande porcentagem de aumento, o que evidencia que a toxicidade do produto para o organismo Daphnia similis diminuiu ao longo do teste, demonstrando que o mesmo oferecerá segurança em sua aplicação dentro de um prazo de 60 dias estocado em prateleira, porém protegido da incidência de luz e de microorganismos externos.

Os resultados do teste de DL50 expressos na Tabela 3 demonstram que para o produto B1, a DL50 aumentou aproximadamente 58,76% comparando o T1.2em relação ao T0.2 e diminuiu 17,31% em T2.2. Já para B2 e B3, ocorreu uma diminuição de 36,5 e 18,4%, respectivamente, após os 30 dias de armazenamento na prateleira e 14,75 e 7,92% após 60 dias.

Tabela 3
Resultado dos testes de dose letal, segunda etapa do teste de prateleira.

Em T0.2 o produto que apresentou melhor valor da DL50 foi B1, porém os produtos B2 e B3 apresentaram melhoras na efetividade do produto entre T0.2 e T2.2, no qual B1 chegou a apresentar aumento nos valores. No entanto, ao final dos testes a melhor DL50 observada foi a do produto B2. É importante salientar que quanto menor a DL50do produto, melhor é a ação dele contra o organismo alvo.

Compilando os dados acima, pode-se observar que ocorre um decréscimo relativamente pequeno na efetividade do produto ao longo do tempo de estocagem, demonstrando, assim, que mesmo não apresentando sinais de decomposição, a amostra sofre alterações em suas características tóxicas ao organismo alvo.

Na segunda etapa do teste de prateleira, no tempo T1.2, após 30 dias na prateleira, as amostras não mostraram alteração no odor, que permaneceu característico do produto, assim como no momento da formulação. Quanto à cor, a única amostra que apresentou modificação foi a B3, que passou de verde para marrom. Acredita-se ter havido decomposição da clorofila, já que essa amostra (B3) apresentou os piores resultados para DL50. Já no tempo T2.2, após 60 dias na prateleira, todas as amostras demonstraram alteração no odor e na consistência, ficando ambas com cheiro perceptivelmente mais forte, a amostra B1 mais líquida e B2 e B3 mais consistentes. A cor das amostras não sofreu alteração perceptível.

Com os resultados expressos nas Tabelas 2e 3 e os resultados da primeira etapa de testes, pode-se observar que a incidência de luz e a interferência de microrganismos externos afetam as características do produto, acelerando a decomposição das amostras e interferindo em suas características tóxicas.

Segundo Praça et al. (2004), a DL50 do produto bruto, sem formulação, de estirpes de Bacillus thuringiensis israelensis para larvas de Aedes aegypti é de 0,001 mg.L−1. Conforme pesquisa realizada por Beltrão (2006), a DL50 de Bti nativo, liofilizado padrão IPS-82, sob larvas do mosquido Aedes aegypti, foi de 0,002 mg.L−1.

Em outra pesquisa, Souza Dias (1992) realizou testes para determinação de DL50 utilizando larvas de Culex, a DL50 obtida foi de 0,0599 mg.L−1. Todos esses resultados são muito superiores à média do produto B1, que apresentou melhor valor de DL50 nos testes realizados por este trabalho.

Já em ensaios realizados pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) (DIAS et al., 2002DIAS, D.G.S.; SILVA, S.F.; MARTINS, E.S.; SOARES, C.M.S.; FALCAO, R.; GOMES, A.C.M.M.; PRACA, L.B.; DIAS, J.M.C.S.; MONNERAT, R.G. (2002) Boletim de pesquisa e desenvolvimento 30: prospecção de estirpes de Bacillus thuringiensis efetivas contra mosquitos. Brasília: EMBRAPA. 23 p.) utilizando Bti, a DL50 para larvas de Aedes aegypti foi de 1,06 mg.L−1, resultado que mais se aproximou do valor de DL50 médio obtido pelo produto B1. Os autores não apresentaram valores de CEC para nenhum dos compostos, não sendo possível fazer a avaliação com relação à segurança ambiental dos produtos testados na literatura com relação às amostras do trabalho.

Embora a DL50 de B1, B2 e B3 estejam bem abaixo das analisadas pelos autores, essas amostras demonstram efetividade do produto contra o inseto alvo sem, contudo, afetar o ecossistema local. A diferença pode ocorrer devido às diversas formas de obtenção do produto, à origem das cepas, e às formulações nas quais podem ser utilizados produtos que otimizem a eficiência do produto final, como por exemplo compostos químicos. Porém, o uso desses aditivos pode alterar diretamente a toxicidade do produto agregando características negativas a ele com relação à segurança do homem e do meio ambiente.

CONCLUSÃO

Após a observação dos resultados, pode-se observar que a decomposição das amostras interfere diretamente em suas propriedades, diminuindo a ação do bioinseticida sob as larvas do mosquito Aedes albupictus. Muitos podem ser os fatores que podem ter levado à ocorrência dos erros no primeiro teste de prateleira, como contaminação das amostras por outros microrganismos ou até mesmo a incidência de luz. Outro aspecto relevante pode ser a quantidade de cristais protéicos presentes nas amostras, responsáveis pela morte das larvas. A quantidade desses cristais está diretamente ligada ao processo de fermentação de onde o produto é originado, como também à integridade da cepa, abrindo assim uma gama de fatores que podem ter influenciado diretamente nos resultados.

Outro fator relevante é a influência da temperatura, pois ambas as amostras não foram refrigeradas, ficando em ambiente com temperatura entre 20 e 25°C, temperatura esta que não impede que o Bti continue ativo e provavelmente fermentando a amostra.

Observou-se que a esterilização dos frascos, pasteurização das amostras e proteção contra a incidência de luz apenas reduzem a decomposição das amostras ou até mesmo amenizam os efeitos que a decomposição acarreta, porém não modificam o fato das amostras entrarem em decomposição. Devido a isso, devem ser realizados posteriormente testes de geladeira, onde as amostras sejam acondicionadas após esterilização com proteção contra incidência de luz sob temperaturas baixas para verificação da interferência direta da temperatura na estocagem do produto.

Com relação à efetividade do produto e seu grau de ecotoxicidade para organismos da cadeia alimentar, pode-se observar que, apesar de ocorrer um aumento nos valores de DL50 após 60 dias na prateleira, eles ainda demonstram valores positivos, determinando a eficiência da ação dos produtos sob as larvas do mosquito Aedes albupictus. Para ambas as amostras, a diferença entre os valores finais de DL50: B1 (22,343), B2 (16,815) e B3 (78,669); e CEC: B1 (3.526), B2 (950) e B3 (706) é relativamente grande para todos os compostos testados, assegurando, assim, uma boa margem de segurança, ou seja, sem oferecer riscos ao meio ambiente com relação à toxicidade do produto quando a aplicação for feita em até 60 dias de estocagem sob condições adequadas.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    20 Out 2012
  • Aceito
    11 Jul 2014
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