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Estimativa do lançamento de água pluvial no sistema de coleta e transporte de esgoto sanitário por meio de práticas de aproveitamento em residências unifamiliares

Estimating disposal of rainwater on sewage system by means of rainwater harvesting practices in households

Resumo

A água pluvial de sistemas de aproveitamento (SAAP) utilizada em unidades habitacionais e comerciais provém de sistema independente da rede pública de abastecimento de água potável e não é medida diretamente por meio de hidrômetros. Assim, o volume de esgoto gerado por essa fonte de suprimento alternativa não é contabilizado. O presente artigo aborda metodologia visando estimar o volume de água pluvial lançado na rede pública de esgoto sanitário por meio da indexação ao volume de água potável medida no hidrômetro. A bacia sanitária com caixa acoplada foi adotada como objeto de estudo. Os resultados apontaram que a eficiência do sistema de aproveitamento variou de 24 a 87%, correspondentes a volumes médios ofertados de água pluvial da ordem de 8 a 370 L.hab.-1.dia-1 para 0,5 m3.hab.-1. O volume de esgoto proveniente do lançamento de água pluvial na rede coletora apresentou valores menores que 30% da demanda total para áreas específicas de cobertura de 4 a 25 m2.hab.-1, com reservação de 0,5 m3.hab.-1 para todas as faixas de consumo per capita simuladas. Por outro lado, para sistemas de aproveitamento com 3 m3 de reservatório.hab.-1, verificou-se que 15 m2 de cobertura.hab.-1 são suficientes para atender plenamente a bacia sanitária, com base no consumo de 120 L.hab.-1.dia-1. Em linhas gerais, o fator de correção situou-se entre 1 e 1,42 (1≤(f corrigido/f)≤1,42) e o fator de retorno de esgoto corrigido (fcorrigido), sobre o valor inicial arbitrado de f de 0,8, situou-se entre 0,8 e 1,14 (0,8≤fcorrigido≤1,14).

Palavras-chave:
água pluvial; esgoto sanitário; eficiência de atendimento e aproveitamento; fator de correção de esgoto.

Abstract

The rainwater (rw) of harvesting systems used in households and commercial buildings comes from independent system, i.e. disconnected of drinking water system. So, rw is not directly measured by conventional drinking water meters which are installed in pipes from public system. Therefore, the used rw volumes are not properly measured. This paper presents a methodology to estimate rainwater loading discharged in sewage systems by means of harvesting practices in households. The estimation was indexed to the drinking water meter. The toilet flush was adopted as object analysis. Results pointed out that the efficiency of rw system varies from 24 to 87%, whose correspond to values varying from 8 a 370 L.inhab.-1.dia-1 keeping fixed reservoir volume of 0,5 m3inhab.-1 for all ranges of per capita consumption. The rw in sewage represented values lower than 30% of the total demand considering specific roof from 4 to 25 m2.inhab.-1. On the other hand, for reservoir of rw harvesting systems bigger than 3 m3.inhab.-1 15 m2 of roof.inhab.-1 was enough to plenty supply the toilet flush., based on 120 L.inhab.-1 consumption. In general terms, the correction factor proposed for estimating wastewater discharge on the new scenario (considering rw harvesting), varies from 1 to 1.42 (1≤(fcorrigido/f)≤1.42). So, the new ratio, given by wastewater and inlet drinking water, varied from 0.8 to 1.14 (0.8≤fcorrigido≤1.14).

Keywords:
rainwater; sewage; efficiency of attendance and harvesting; sewage correction factor.

INTRODUÇÃO

O aproveitamento de água pluvial tem recebido especial atenção na última década. Diferentes trabalhos podem ser encontrados na literatura com diferentes abordagens, podendo-se citar alguns, entre muitos: Ghisi (2006GHISI, E. (2006) Potential for potable water savings by using rainwater in the residential sector of Brazil. Building and Environment , v. 41. p. 1544-1550.); Meera (2006MEERA, V. & AHAMMED, M.M. (2006). Water quality of rooftop rainwater harvesting systems: a review. Journal of Water Supply - Research and Technology , v. 55, n. 4, p. 257-268.); Carvalho, Oliveira e Moruzzi (2007CARVALHO, G.S.; OLIVEIRA, S.C.; MORUZZI, R.B. (2007) Cálculo do volume do reservatório de sistemas de aproveitamento de água de chuva . In: Anais...Simpósio Nacional De Sistemas Prediais, 10., 2007, São Carlos. São Carlos: UFSCar, ANTAC.); Amorim e Pereira (2008AMORIM, S. & PEREIRA, D.J.A. (2008) Estudo comparativo dos métodos de dimensionamento para reservatórios utilizados em aproveitamento de água pluvial. Ambiente Construído , v. 8, n. 2, p. 53-66.); Moruzzi e Murakami (2009MORUZZI, R.B. & MURAKAMI, M.F. (2009) Variação temporal da qualidade de água pluvial armazenada para fins de aproveitamento. Engenharia Ambiental , v. 6, n. 3, p. 243-254.); Dornelles, Tassi e Goldenfum (2010DORNELLES, F; TASSI, R.; GOLDENFUM, J.A. (2010) Avaliação das Técnicas de Dimensionamento de Reservatórios para Aproveitamento de Água de Chuva. RBRH - Revista Brasileira de Recursos Hídricos , v. 15, n. 2, p. 59-68.); Rupp, Munarim e Ghisi (2011RUPP, R.F; MUNARIM, U; GHISI, E. (2011) Comparação de métodos para dimensionamento de reservatórios de água pluvial. Ambiente Construído , v. 11, n. 4, p. 47-64.); Lee, Kim e Han (2011LEE, J.Y.; KIM, H.J.; HAN, M.Y. (2011). Quality assessment of rooftop runoff and harvested rainwater from a building catchment. Water Science and Technology , v. 63, n. 11, p. 2725-2731); Nakada e Moruzzi (2014NAKADA, L.Y.K. & MORUZZI, R.B. (2014). Variabilidade qualitativa de águas pluviais coletadas em telhado e sua importância na concepção do sistema de tratamento. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental , v. 19, n. 1, p. 1-9.); Murça, de Julio e Moruzzi (2014MURÇA, M.C.R.; DE JULIO, M.; MORUZZI, R.B. (2014) Metodologia de Otimização para o Dimensionamento de Reservatórios de Águas Pluviais. Revista Brasileira de Recursos Hídricos , v. 19, n. 2, p. 29-40.). A água pluvial tem sido aplicada em residências e condomínios multifamiliares como fonte alternativa para suprimento não potável e o assunto ganha destaque com a crise hídrica.

Parte da água consumida em residências unifamiliares retorna ao sistema de coleta pública na forma de esgoto. No projeto de sistemas de coleta e transporte de esgoto, a relação entre a parcela de água fornecida pelo sistema público e aquela que retorna como esgoto sanitário é usualmente utilizado por projetistas e pelas concessionárias de abastecimento visando a determinação das vazões de projeto, necessárias ao dimensionamento do sistema, e a determinação da parcela de esgoto coletado para fins tarifação. O monitoramento e a cobrança pelo esgoto lançado na rede de esgoto é comumente realizado com base no consumo de água da rede pública de abastecimento, medidas pela concessionária por meio de hidrômetro instalado no ramal predial. A composição de preço varia localmente, todavia a parcela de retorno da água fornecida pelo sistema público à rede de esgoto é sempre tomada como referência na cobrança.

Com a difusão de práticas de aproveitamento de águas pluviais levantam-se questões referentes à inserção de novas parcelas em sistemas de esgotamento sanitário, as quais não são medidas por hidrômetros, tal como ocorre no sistema público de abastecimento de água. Todavia, também não se sabe ao certo a parcela de água pluvial aproveitada com potencial de retorno como esgoto sanitário ao sistema público de coleta, a qual depende do tipo de uso e da capacidade do sistema de aproveitamento em supri-lo adequadamente, entre outros fatores.

Segundo Dornelles, Tassi e Goldenfum (2012DORNELLES, F; TASSI, R.; GOLDENFUM, J.A. (2012). Metodologia para Ajuste do Fator de Esgoto/Água para Aproveitamento de Água de Chuva. Revista Brasileira de Recursos Hídricos , v. 17, n. 1, p. 111-121.), a não contabilização das frações de água pluvial lançadas na rede de esgoto sanitário tem causado resistência ao aproveitamento por parte das companhias de saneamento. Os autores supramencionados apresentam metodologia para ajuste do fator de esgoto (f ) em função da ­eficiência do sistema de aproveitamento de água pluvial. Todavia a eficiência do sistema é de difícil determinação e os resultados estão sujeitos a essas imprecisões.

Visando iniciar a discussão sobre essa questão, esse artigo buscou apresentar metodologia e estimar o volume de água pluvial descarregado no sistema de coleta e transporte de esgoto sanitário, por meio de práticas de aproveitamento em residências unifamiliares, com foco no atendimento e no uso de bacia sanitária com suprimento híbrido, ou seja, abastecida por água pluvial e por água potável do sistema público de abastecimento.

A análise buscou generalizações por meio do uso de conceitos de eficiências de atendimento e de aproveitamento, de área específica de telhado e de volumes específicos de reservatórios, ou seja, parametrizados em função do número de habitantes por unidade domiciliar. Por fim, a avaliação foi estendida ao fator de esgoto (f) , ou coeficiente de retorno, o qual representa o quociente do volume de esgoto gerado pelo volume de água efetivamente consumido, proveniente do sistema público de abastecimento, conforme definição da NBR 9649/86 (ABNT, 1986ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS- ABNT. (1986). NBR 9649/1986: Projeto de redes coletoras de esgoto sanitário. Rio de Janeiro: ABNT.).

MÉTODOS

A bacia sanitária hipotética utilizada nesse estudo é do tipo caixa acoplada e recebe água tanto do sistema de aproveitamento de água pluvial, quanto do sistema público de abastecimento. Esse último ocorre somente quando não há água pluvial disponível. Assim, o lançamento de água da bacia sanitária na rede de esgoto provém de frações que variam de 0 a 1 de água pluvial. Como somente o sistema público possui medição, é necessário avaliar o percentual de água pluvial que atende a bacia sanitária, os quais variam conforme precipitação, área de telhado (onde ocorre a captação da chuva), volume do reservatório de aproveitamento e número de habitantes atendidos/domicílio.

Assim, para avaliar o atendimento à bacia sanitária por meio do aproveitamento de água pluvial, foram empregados os conceitos de eficiência de aproveitamento e de atendimento apresentados por Moruzzi, Oliveira e Garcia (2012MORUZZI, R.B.; OLIVEIRA, S.C.; GARCIA, M.L. (2012). A proposal for reservoir volume calculation in rainwater harvesting systems. Journal of Civil Engineering and Architecture , v. 5, p. 707-714.), o qual fundamenta-se na maximização do uso do sistema de aproveitamento instalado, para o atendimento parcial da demanda em áreas urbanas plenamente abastecidas pelo sistema público. Tal conceito visa minimizar o tempo de amortização do investimento, aumentar a disponibilidade do volume de espera do tanque de armazenamento de água pluvial e minimizar o volume extravasado.

As simulações foram realizadas considerando o balanço de massa diário para o período consecutivo de um ano hidrológico, com base nos registros diários de precipitação do município de Rio Claro (SP), em 40 anos de medições. Os resultados foram parametrizados em relação ao número de habitantes por domicílio.

As Equações 1, 2, 3, 4 explicitam as relações empregadas entre as variáveis envolvidas no aproveitamento de água pluvial.

onde: Eficiência de Atendimento (Ea, 0< Ea<1 ); Va (i) representa o volume utilizado; D (i) , a demanda diária; Eficiência de Aproveitamento (Eh, 0<Eh<1 ); Vp (i) representa o volume de água pluvial; S (i), S(i-1) representam o volume de água no reservatório; Vp (i) representa o volume de água pluvial; P (i) representa a precipitação média; C , o coeficiente de escoamento superficial ("runoff ") adotado 0,8; A , a área para captação de água pluvial; η , a eficiência do sistema de captação, adotado 1,0 e f, o first-flush, adotado 0mm . Assim, os resultados buscam refletir o máximo potencial de lançamento.

O algoritmo empregado para routing no reservatório pode ser visualizado por meio do fluxograma apresentado na Figura 1.

Figura 1:
Fluxograma esquemático para rooting do reservatório do sistema de aproveitamento de água pluvial.

Para solução do conjunto de Equações 1, 2, 3, 4, foi aplicado método de otimização numérica visando minimização da extravasão para cada situação específica e determinação da soma da demanda diária no intervalo de tempo de 1 a 365 dias, para cada volume arbitrado, sujeita a restrição de Ea=Eh. Com isso, pode-se obter demanda ótima diária (V a ) capaz de atender plena ou parcialmente o uso pretendido, bem como a eficiência associada a seu atendimento.

De posse desses dados, foi possível estimar o volume médio ofertado (V mo ) de água pluvial em m3/hab.dia e, por sua vez, determinar o percentual de atendimento em relação a diferentes valores de consumo per capita (C pc de 120; 150; 180 e 250 L.hab.-1.dia-1) e diferentes volumes específicos de reservatório, conforme Equações 5 e 6. Dessa forma, a eficiência média da bacia sanitária pode ser estimada e seu valor máximo correspondente a 30% do consumo diário total, adotado conforme dados de Pura (1999PURA (1999). Uso racional da água - USP, 1999. EPUSP - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - Programa de Uso Racional da Água da Universidade de São Paulo - PURA. São Paulo: LSP/PCC/EPUSP. (Relatórios nº 1 a 5 e Retrospectivas 1999, 2000, 2001 e 2002)).

Na Figura 2, apresenta-se o esquema ilustrativo utilizado para elaboração do balanço de massa das parcelas de entrada correspondentes ao volume de água pluvial (V a ), ao volume efetivamente consumido do sistema público (V AT ), bem como o volume de saída (V e ) com referência ao volume de controle (V c ), representado pelo retângulo tracejado. Nessa mesma figura é apresentado o reservatório (S ), cujo balanço foi realizado para diferentes valores iniciais arbitrados e resolvidos pelo conjunto de Equações 1, 2, 3, 4, conforme algoritmo apresentado na Figura 1. O fator de retorno de esgoto na rede coletora (f ) foi avaliado a partir de sua definição clássica (NBR 9649/86), dada pelo quociente do volume de esgoto (V e ) pelo volume de água efetivamente consumido do sistema público (V AT ), conforme Equação 7. O valor corrigido de f, denominado por f corrigido , é apresentado na Equação 8. O volume total que abastece a descarga pode ser representado conforme Equação 9. A relação entre e , x , V a e V AT pode ser representada pela Equação 10. Outra hipótese adotada para a concepção das equações apresentadas é que não há criação de nova demanda devido ao uso de água pluvial, ou seja, o volume total consumido será sempre igual ao consumo per capita (C pc ) multiplicado pelo número de habitantes por domicílio antes da implantação do sistema de aproveitamento de água pluvial. Assim, foi possível aplicar a correção no valor total inicialmente arbitrado de f , no caso 0,8 conforme NBR 9649/86, em função da eficiência e , conforme Equação 11. A relação entre as eficiências total (e ) e da bacia sanitária (e BS ) é apresentada na Equação 12.

Figura 2:
Esquema ilustrativo utilizado para elaboração do balanço de massa das parcelas de entrada (Va e VAT ) e de saída (Ve ) do volume de controle (Vc ), representado pelo retângulo tracejado.

onde: x representa um coeficiente de redução no valor fornecido pelo sistema público de abastecimento (V AT ), visando atender a hipótese da não criação de nova demanda devido a implementação do sistema de aproveitamento de água pluvial, sendo observada as seguintes condições: Para V a = D BS , x = 0,7; Para V a = 0, x = 1, V AT = hab.C pc ; Sendo x + e = 1.

Em que: D BS é a demanda da bacia sanitária. D BS ≤ 0,3hab.C pc

onde: V AT é o volume de água tratada fornecida pelo sistema público em complemento ao sistema de aproveitamento; e é a eficiência no atendimento da demanda total; V e é o volume de esgoto; e BS é a eficiência de atendimento da bacia sanitária.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A relação entre os volumes reservados para uma dada área, as demandas e a eficiência de atendimento e de aproveitamento, definidas pelo método apresentado em Moruzzi, Oliveira e Garcia (2012MORUZZI, R.B.; OLIVEIRA, S.C.; GARCIA, M.L. (2012). A proposal for reservoir volume calculation in rainwater harvesting systems. Journal of Civil Engineering and Architecture , v. 5, p. 707-714.) podem ser visualizadas a título de exemplo na Figura 3. Nessa figura, apresentada estritamente para ilustrar o método descrito em Moruzzi, Oliveira e Garcia (2012MORUZZI, R.B.; OLIVEIRA, S.C.; GARCIA, M.L. (2012). A proposal for reservoir volume calculation in rainwater harvesting systems. Journal of Civil Engineering and Architecture , v. 5, p. 707-714.), foram avaliadas diferentes demandas e volumes de reservatórios, mantidos fixos a área de telhado, responsável pela captação da precipitação, para diferentes volumes de reservatórios inicialmente arbitrados. Com isso, pode-se avaliar a evolução das diferentes eficiências (Ea e Eh ) com a demanda, dadas pelas Equações 1 e 2, em diferentes valores de demanda simuladas para balanço em um ano hidrológico com chuvas diárias médias, conforme fluxograma apresentado na Figura 1, conjugado a aplicação das Equações 3 e 4. A linha tracejada paralela ao eixo das abcissas indica a máxima demanda (demanda ótima diária), que pode ser atingida pelo sistema de aproveitamento em função do regime pluviométrico local, mantidos fixos os demais parâmetros mencionados. As linhas tracejadas verticais marcam os pontos de convergência entre Ea e Eh . Nesses pontos de convergência verificou-se que o tempo de amortização do investimento, determinado pelo método do pay-back descontado medido em anos, atingiu valor mínimo para cada volume de reservatório arbitrado. Assim, o método apresentado em Moruzzi, Oliveira e Garcia (2012) pressupõe a maximização do potencial instalado, permitindo definir a eficiência em que essa ocorre.

Figura 3:
Exemplo de comportamento de curvas de eficiência de atendimento e de aproveitamento frente as demandas e a diferentes volumes arbitrados para uma residência hipotética de 60 m2 de área de telhado.

Na Figura 4, foram compilados resultados de 1.080 simulações (1≤hab.≤10; 40≤m2 de telhado≤300) combinados um a um com volumes de reservatório arbitrados de 0,5 a 3 m3.hab.-1 e resolvidas por meio de método de otimização numérica Assim, os valores de eficiência apresentados na Figura 4 referem-se somente ao ponto de convergência exemplificado e destacado na Figura 3.

Figura 4:
Eficiências de atendimento e de aproveitamento para diferentes áreas de cobertura, volumes específicos de reservatório e suas relações com a demanda ótima diária.

Por meio da análise da Figura 4, verifica-se, claramente, que o aumento da área específica de cobertura (m2.hab.-1) incorre em aumento da demanda ótima diária, embora o valor da eficiência (Ea e Eh ) tenha sofrido decréscimo, já que essa é determinada para cada demanda otimizada em termos relativos, conforme Equações 1 e 2.

Na Figura 5, são apresentados os volumes diários médios per capita disponibilizados de água pluvial, obtidos a partir da rotina apresentada no fluxograma da Figura 1 e corrigidos pela eficiência de atendimento apresentados para diferentes áreas unitárias de cobertura, conforme pode ser visto na Figura 4, aplicados sobre a demanda ótima diária. Assim, verifica-se que o potencial de aproveitamento depende das áreas de cobertura específicas, bem como dos volumes específicos dos reservatórios. O volume per capita disponibilizado é tão mais sensível ao volume per capita de reservatório quanto maior a área de telhado/habitante.domicílio, sendo o valor de 100 m2.hab.-1 o ponto de inflexão identificado. Considerando que o volume de reservatório é o item mais custoso do sistema de aproveitamento, tal como apresentado por Tomaz (2003TOMAZ, P. (2003) Aproveitamento de água de chuva para áreas urbanas e fins não potáveis 2. ed. São Paulo: Navegar Editora.) e Moruzzi, Oliveira e Garcia (2012MORUZZI, R.B.; OLIVEIRA, S.C.; GARCIA, M.L. (2012). A proposal for reservoir volume calculation in rainwater harvesting systems. Journal of Civil Engineering and Architecture , v. 5, p. 707-714.), esses resultados indicam que o aumento do volume reservado acarreta pouco incremento na disponibilidade per capita (de 0,03 m3.hab.-1.dia-1 com 0,5 m3.hab.-1 para 0,04 m3.hab.-1.dia-1 com 5 m3.hab.-1) para baixos valores de área (área per capita ≤15 m2.hab.-1), sugerindo que pequenos volumes de reservatório podem atender satisfatoriamente residências de baixa renda (baixa relação m2.hab.-1), desde que o sistema possa apresentar falhas, ou seja, desde que exista fonte de suprimento proveniente do sistema público de abastecimento.

Figura 5:
Volume médio diário de água pluvial ofertada e sua relação com a área específica de cobertura e o volume específico de reservatório.

Nas Figuras 6, 7, 8, e 9, pode-se verificar o atendimento das descargas em bacias sanitárias, cujo valor pleno correspondente a 30% do consumo diário total (hab.C pc ). Nota-se que a eficiência varia relativamente com a área específica de cobertura (m2.hab.-1) e com o volume específico do reservatório (m3.hab.-1) e que o valor pleno não ocorre em todas configurações investigadas.

Figura 6:
Eficiência média de atendimento pleno da demanda de 120 L.hab.-1 dia-1.

Figura 7:
Eficiência média de atendimento pleno da demanda de 150 L.hab.-1.dia-1.

Figura 8:
Eficiência média de atendimento pleno da demanda de 180 L.hab.-1.dia -1.

Figura 9:
Eficiência média de atendimento pleno da demanda de 250 L.hab.-1.dia-1.

Assim, não se pode inferir que todo o uso correspondente à descarga em bacia sanitária seja imediatamente transferido para o sistema de coleta e transporte de esgoto sanitário. Verifica-se que o lançamento de água pluvial na rede coletora de esgotamento sanitário apresenta valores menores que 30% para áreas específicas de cobertura de 4 a 25 m2.hab.-1, com reservação de 0,5 m3.hab.-1 para todas as faixas de consumo per capita simuladas, indicando que a descargas em bacias sanitárias não são plenamente atendidas nessas condições.

Para o volume de reservatório correspondente a 3 m3.hab.-1, o atendimento pleno da bacia sanitária ocorre a partir de valores da ordem de 15 m2 de cobertura.hab.-1. Esses valores sofrem alterações com o consumo per capita , uma vez que a referência adotada possui valor relativo. Para 150 L.hab.-1.dia-1, a descarga em bacia foi plenamente atendida a partir de áreas específicas de cobertura de 20 e 35 m2.hab.-1, para 3 e 0,5 m3 de reservatório.hab.-1, respectivamente.

Assim, de posse da área de cobertura, do volume de reservatório e do número de habitantes por domicílio, pode-se estimar a eficiência do sistema de aproveitamento e o lançamento de água pluvial na rede de esgoto sanitário.

O gráfico apresentado na Figura 10 reflete o comportamento das variáveis V a e V e e os respectivos valores associados de f corrigido/f e f , indexados ao volume de água potável medido no hidrômetro (V AT ), para eficiências (e ) de 0 a 1, conforme Equações 10 e 11. Para eficiência (e ) de 0,5, correspondentes a quociente V a/VAT de 1, o fator de correção (f corrigido/f) é igual a 2, ou seja f corrigido de 1,6 (para f de 0,8). Para e de 0,75, V a/VAT de 3, implica f corrigido/f de 4 e, para o valor de e de 0,95, com V a/VAT de 19, implica f corrigido/f de 40. Pode-se verificar que quando o valor de e é igual a 1, ou seja, todo abastecimento é feito por meio do aproveitamento de água pluvial, ocorre uma discrepância matemática que conduz o fator de correção ao infinito. Tal resultado concorda com aqueles obtidos por Dornelles, Tassi e Goldenfum (2012DORNELLES, F; TASSI, R.; GOLDENFUM, J.A. (2012). Metodologia para Ajuste do Fator de Esgoto/Água para Aproveitamento de Água de Chuva. Revista Brasileira de Recursos Hídricos , v. 17, n. 1, p. 111-121.), quando da avaliação dos volumes pelas demandas. Evidentemente, a discrepância que leva o fator de correção (f corrigido/f, explicito em V e/x.VAT.f) ao infinito é uma abstração matemática, visto que não encontra respaldo na prática, pois os domicílios com sistema de aproveitamento para fins não potáveis são de abastecimento híbrido por definição, ou seja, abastecidos por água proveniente do aproveitamento pluvial e por água proveniente do sistema público de abastecimento.

Figura 10:
Comportamento do fator de correção, dado pelo quociente Ve/x.VAT.f, e da relação do volume de água pluvial aproveitado e do volume proveniente do sistema público de abastecimento (Va/VAT ) pela eficiência de atendimento (e) do sistema de aproveitamento.

Na Figura 11, são apresentados os resultados das simulações que visam avaliar o efeito do aproveitamento de água pluvial estritamente para uso na bacia sanitária, conforme esquema apresentado na Figura 2, e seu efeito no fator de retorno de esgoto (f ). No eixo das abcissas foram apresentadas as eficiências médias total (e ) e a eficiência referente ao atendimento da bacia sanitária com caixa acoplada (e BS ), conforme relações apresentadas na Equação 12. No eixo das ordenadas são apresentados os valores do coeficiente de correção (f corrigido/f), o valor corrigido do fator de esgoto (f corrigido ) e o coeficiente de redução (x ), aplicado ao valor fornecido pelo sistema público de abastecimento (V AT ). Nota-se que, quando V a é igual a zero, o que corresponde a domicílio sem aproveitamento de água pluvial, o coeficiente de correção é igual a unidade (1) e o fator de retorno de esgoto (f ) mantém seu valor original arbitrado, no caso 0,8.

Figura 11:
Relações entre o quociente dado pelo coeficiente de retorno corrigido (fcorrigido ) e o coeficiente de retorno (f) de 0,8, o valor de fcorrigido , o coeficiente de redução no valor fornecido pelo sistema público de abastecimento (VAT) dado por x, a eficiência com base na demanda total (e) e a eficiência com base na bacia sanitária (eBS ).

Para valores de e menor ou igual a 30%, verifica-se que o fator de correção situa-se entre 1 e 1,42 (1≤f corrigido/f≤1,42) e o fator de retorno de esgoto corrigido (f corrigido ) , sobre o valor inicial arbitrado de f de 0,8, situa-se entre 0,8 e 1,14 (0,8≤f corrigido ≤1,14).

Com a finalidade de ilustrar a aplicação da proposta apresentada nesse artigo, pode-se supor, a título de exemplo, uma residência unifamiliar com padrão de consumo de 150 L/hab.dia, área de cobertura de telhado de 20 m2.hab.-1 e reservatório do sistema de aproveitamento (S ) de 1 m3.hab.-1 Nessas condições, a eficiência de atendimento ou aproveitamento (Ea ou Eh , sujeito a: Ea = Eh) é da ordem de 56% (Figura 4), correspondente ao volume médio anual de água pluvial ofertada de 0,036 m3.hab.-1.dia-1. (Figura 5). Assim, a eficiência média de atendimento pleno (e ) do sistema é da ordem de 24%, conforme gráfico da Figura 7. Por meio da Figura 11, pode-se verificar que o fator de correção, correspondente ao quociente f corrigido/f, a ser aplicado sobre o valor original do fator de esgoto f é da ordem de 1,31. Assim, caso o valor arbitrado inicialmente a f seja de 0,8, o valor corrigido (f corrigido ) deve ser de 1,05. Nesse caso, o volume de esgoto lançado na rede de coletora passa de 44% do volume total (V AT + V e ) para 51%, ou seja, incremento de 7% na contribuição de esgoto em relação a contribuição total, tendo o valor medido no hidrômetro (V AT ) como referência. Tais percentuais podem entrar na composição tarifária aplicada pela concessionária local. Diferentes exemplos podem ser construídos utilizando os mesmos procedimentos descritos.

Evidentemente, as hipóteses simplificadoras lançadas devem ser atentamente avaliadas para cada caso específico antes da extrapolação dos resultados obtidos, considerando inclusive que os dispositivos que integram o sistema de aproveitamento bem como sua operação interferem nas eficiências de atendimento, aproveitamento e no atendimento ao uso requerido. Ademais, os resultados apresentados nesse manuscrito são restritos ao município de Rio Claro, local em que os dados de precipitação foram obtidos. Todavia, a metodologia empregada pode ser estendida, desde que respeitadas as especificidades de cada local.

Espera-se que o presente artigo possa auxiliar projetistas e administradores de sistemas de água e esgoto na avaliação do efeito do aproveitamento de água pluvial na geração do volume de esgoto lançado na rede coletora de esgoto sanitário.

CONCLUSÕES

Os resultados apontaram que a eficiência do sistema de aproveitamento de água pluvial (SAAP) variou de 24 a 87% para áreas de cobertura de telhado de 4 a 300 m2.hab.-1 e volumes de reservatórios de 0,5 a 3,0 m3.hab.-1, os quais corresponderam a volumes ofertados médios de água pluvial da ordem de 8 a 370 L/hab.dia para a demanda média otimizada, para 0,5 m3.hab.-1.

O lançamento de água pluvial na rede coletora de esgotamento sanitário apresenta valores menores que 30% para áreas específicas de cobertura de 4 a 25 m2.hab.-1, com reservação de 0,5 m3.hab.-1 para todas as faixas de consumo per capita simuladas (120, 150, 180 e 250 L.hab.-1.dia-1), indicando que a descargas em bacias sanitárias não são plenamente atendidas nessas condições.

Para 3 m3 de reservatório.hab.-1, valores da ordem de 15 m2 de cobertura.hab.-1 são suficientes para atender plenamente a bacia sanitária, com base no consumo de 120 L.hab-1.dia-1. Para 150 L.hab-1.dia-1, a descarga em bacia foi plenamente atendida a partir de áreas específicas de cobertura de 20 e 35 m2/hab., para 3 e 0,5 m3 de reservatório.hab.-1, respectivamente.

Para valores de e menor ou igual a que 30%, referentes ao atendimento da bacia sanitária, verifica-se que o fator de correção situa-se entre 1 e 1,42 (1≤f corrigido/f≤1,42) e o fator de retorno de esgoto corrigido (f corrigido ) , sobre o valor inicial arbitrado de f de 0,8, situa-se entre 0,8 e 1,14 (0,8≤f corrigido ≤1,14).

O método apresentado nesse artigo permitiu estimar a eficiência do SAAP, tendo os dados da área de cobertura e do volume de reservatório parametrizados por habitantes por domicílio e, a partir desses dados, estimar o atendimento ao uso pretendido e o lançamento de água pluvial aproveitada na rede de esgoto sanitário sendo possível construir as novas relações e valores a serem atribuídos ao fator de esgoto (f ), considerando a medição somente por meio do hidrômetro da água proveniente do sistema público de abastecimento.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    23 Out 2014
  • Aceito
    27 Abr 2015
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