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Análise de riscos potenciais associados à desinfecção de efluentes: o caso da ETE SJRP (SP)

Risk analysis applied to sewage disinfection: the case of the Sewage Treatment Plant of São José do Rio Preto (SP)

RESUMO

A avaliação de risco é um processo no qual se determinam os riscos de natureza coletiva (social) e individual associados à instalação, operação ou desativação de uma atividade perigosa, levando-se em consideração a probabilidade de ocorrência de um determinado evento e a estimativa da extensão do dano que seria causado. No caso de estações de tratamento de esgoto (ETEs), em que pese a importância do aspecto locacional para assegurar a minimização de conflitos ambientais e sociais, a análise de risco deve ser parte integrante dos estudos de alternativas locacionais quando a concepção do projeto prever a utilização de substâncias perigosas armazenadas sob pressão, notadamente os sistemas de desinfecção por cloro. Entende-se, portanto, ser necessário avaliar o potencial de dano decorrente de falhas nos equipamentos e dispositivos de segurança que possam provocar vazamentos e/ou explosões. Nesse sentido, o presente artigo discute as contribuições dos estudos de análise de risco na implantação e operação de ETEs, valendo-se de um estudo de caso aplicado ao município de São José do Rio Preto, São Paulo. Os resultados obtidos destacam a relevância do estudo de análise de risco para a definição da localização do empreendimento e de medidas de segurança aplicadas ao gerenciamento da ETE e das áreas do entorno.

Palavras-chave:
análise de risco ambiental; estações de tratamento de esgoto; cloro; estudos de localização de atividades

ABSTRACT

Risk analysis allows for the identification of social and individual risks following the installation, operation or decommissioning of a hazardous activity, taking into account the probability of occurrence and the extension of damages. Sewage Treatment Plants with disinfection systems must be informed by a risk analysis in order to integrate social and environmental conflicts in decision-making. Therefore, it is relevant to assess the potential to cause relevant damage caused by failures in equipment or security devices that could lead to leakages and/or explosions. In this sense, the present paper discuss the results of a risk assessment applied to the Sewage Treatment Plant of São Jose do Rio Preto (SP). The results show the relevance of risk analysis in defining the locational alternative and the associated security measures applied to risk and conflict management, considering the plant itself, the environment and neighboring population.

Keywords:
environmental risk analysis; sewage treatment plants; chlorine; locational alternatives

INTRODUÇÃO

A perspectiva crescente de conflitos em regiões de escassez de recursos hídricos tem pressionado pelo aumento de eficiência das medidas de gestão e controle, o que traz à tona o debate sobre os padrões de qualidade ambiental e os parâmetros de emissão de poluentes a serem estabelecidos. Nesse sentido, conforme apontam Magri et al. (2013MAGRI, M.E.; ZAGUINI, J.G.; RAMOS, S.R.A.; PHILIPPI, L.S. (2013) Otimização do processo de nitrificação com o uso de conchas de ostras como material suporte em reatores aeróbios com biomassa fixa. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 18, n. 2, p. 123-130. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-41522013000200004
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) e Lapolli et al. (2005LAPOLLI, F.R.; HASSEMER, M.E.N.; CAMARGO, J.G.; DAMÁSIO, D.L.; LOBO-RECIO, M.A. (2005) Desinfecção de efluentes sanitários através de dióxido de cloro. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 10, n. 3, p. 200-208. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-41522005000300004
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), as estratégias voltadas para a preservação de mananciais em áreas críticas devem ter como suporte básico o tratamento de esgotos sanitários em nível terciário, considerando no mínimo a remoção de nutrientes e a desinfecção do efluente.

De acordo com Lapolli et al. (2005LAPOLLI, F.R.; HASSEMER, M.E.N.; CAMARGO, J.G.; DAMÁSIO, D.L.; LOBO-RECIO, M.A. (2005) Desinfecção de efluentes sanitários através de dióxido de cloro. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 10, n. 3, p. 200-208. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-41522005000300004
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) e Jordão e Pessôa (2005JORDÃO, E.P.; PESSÔA, C.A. (2005) Tratamento de esgotos domésticos. 4. ed. Rio de Janeiro: ABES . 932 p.), a cloração constitui uma das alternativas mais comumente aplicadas no Brasil, sobretudo por conta dos custos comparados às demais formas de desinfecção. Contudo, a utilização do cloro como agente desinfetante está associada a riscos ambientais relevantes associados, principalmente, à produção de compostos potencialmente cancerígenos como os trialometanos (BAIRD, 2001BAIRD, C. (2001) Environmental Chemistry. 2. ed. Nova York: W.H. Freeman and Company.) e também aos riscos de acidentes ou falhas em seu armazenamento e utilização. Com relação à formação de trialometanos a partir do processo de desinfecção, ainda que a literatura reconheça ser essa uma problemática menos afeita ao tratamento de águas residuárias quando comparadas com as águas de abastecimento, trata-se de um efeito potencialmente preocupante também no contexto do presente trabalho.

Os acidentes industriais de origem tecnológica ocorridos ao longo dos anos têm contribuído de forma significativa para despertar a atenção de autoridades governamentais, empreendedores e sociedade no sentido de buscar mecanismos para a prevenção de episódios que comprometam a segurança de indivíduos e a qualidade do meio ambiente (WANG et al., 2012WANG, H.; YAN, Z.; LI, H.; YANG, N.; LEUNG, K.M.Y.; WANG, Y.; YU, R.; ZHANG, L.; WANG, W.; JIAO, C.; LIU, Z. (2012) Progress of environmental management and risk assessment of industrial chemicals in China. Environmental Pollution, v. 165, p. 174-181. https://doi.org/10.1016/j.envpol.2011.12.008
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).

No caso brasileiro, a gestão de empreendimentos perigosos é direcionada por uma legislação que não estimula a adoção de medidas estratégicas voltadas para a localização das atividades, e o risco passa a ser tratado pela lógica da mitigação e controle (MONTAÑO & SOUZA, 2008MONTAÑO, M.; SOUZA, M.P. (2008) A viabilidade ambiental no licenciamento de empreendimentos perigosos no Estado de São Paulo. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 13, n. 4, p. 435-442. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-41522008000400012
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; KIRCHHOFF et al., 2007KIRCHHOFF, D.; MONTAÑO, M.; RANIERI, V.E.L.; OLIVEIRA, I.S.D.; DOBERSTEIN, B.; SOUZA, M.P. (2007) Limitations and drawbacks of using Preliminary Environmental Reports (PERs) as an input to Environmental Licensing in São Paulo State: a case study on natural gas pipeline routing. Environmental Impact Assessment Review, v. 27, p. 301-318. http://dx.doi.org/10.1016/j.eiar.2006.11.003
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).

A literatura relacionada ao risco tecnológico/industrial é repleta de proposições de modelos para análise de risco e medidas de controle, monitoramento e gestão de eventos catastróficos (ZHAO et al., 2015ZHAO, Y.; CAO, L.; ZHOU, Q.; QUE, Q. (2015) Effects of oil pipeline explosion on ambient particulate matter and their associated polycyclic aromatic hydrocarbons. Environmental Pollution, v. 196, p. 440-449. https://doi.org/10.1016/j.envpol.2014.11.012
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; CRISTALE et al., 2013CRISTALE, J.; KATSOYIANNIS, A.; SWEETMAN, A.J.; JONES, K.C.; LACORTE, S. (2013) Occurrence and risk assessment of organophosphorus and brominated flame retardants in the River Aire (UK). Environmental Pollution, v. 179, p. 194-200. https://doi.org/10.1016/j.envpol.2013.04.001
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; WANG et al., 2012WANG, H.; YAN, Z.; LI, H.; YANG, N.; LEUNG, K.M.Y.; WANG, Y.; YU, R.; ZHANG, L.; WANG, W.; JIAO, C.; LIU, Z. (2012) Progress of environmental management and risk assessment of industrial chemicals in China. Environmental Pollution, v. 165, p. 174-181. https://doi.org/10.1016/j.envpol.2011.12.008
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; ITURBE et al., 2010ITURBE, R.; FLORES-SERRANO, R.M.; CASTRO, A.; FLORES, C.; TORRES, L.G. (2010) Subsoil TPH contamination in two oil pipeline pumping stations and one pipeline right-of-way in north Mexico. Journal of Environmental Management, v. 91, p. 2396-2402. http://dx.doi.org/10.1016/j.jenvman.2010.07.003
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). Por outro lado, os estudos voltados para atividades e empreendimentos com perfil de risco menos evidente ainda se mostram incipientes. Uma das exceções, no caso brasileiro, remete ao trabalho de Fontanive (2005FONTANIVE, S. (2005) Estudo de análise de risco do cloro em estações de tratamento de água. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Paraná, Curitiba.), que reporta os perigos associados aos equipamentos e processos de desinfecção por cloro em estação de tratamento de água (ETA), demonstrando que os riscos do empreendimento devem ser levados em consideração no momento da definição da localização de atividades similares.

Desse modo, e tendo em vista a perspectiva de incremento da utilização do cloro como agente desinfetante em estações de tratamento de esgoto (ETEs) no Brasil, o presente artigo é voltado para a avaliação do risco potencial associado à utilização de cloro gasoso em estações de tratamento de efluentes, aplicado ao caso da ETE do município de São José do Rio Preto, São Paulo.

Riscos associados ao uso e armazenamento de cloro

A desinfecção do esgoto tratado constitui um processo inevitável para o enfrentamento dos conflitos relacionados à escassez hídrica, tendo em vista a necessidade de manutenção da qualidade dos mananciais e, de modo complementar, a possibilidade de diminuição da demanda por água tratada em função da introdução do reuso. Tendo em vista a grande demanda por tratamento de esgoto no país - conforme dados do Sistema Nacional de Indicadores sobre Saneamento, organizado pelo Ministério das Cidades (BRASIL, 2017BRASIL. (2017). Diagnóstico dos serviços de água e esgoto - 2015. Brasília: Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental/Ministério das Cidades. 212 p.), em 2015 somente 42,7% do esgoto gerado no Brasil recebia algum tipo de tratamento -, é importante que a desinfecção, juntamente com o tratamento terciário de efluentes, seja considerada desde a concepção dos sistemas de tratamento de esgotos.

De acordo com Jordão e Pessôa (2005JORDÃO, E.P.; PESSÔA, C.A. (2005) Tratamento de esgotos domésticos. 4. ed. Rio de Janeiro: ABES . 932 p.), a cloração tem sido a principal forma de desinfecção praticada nas ETEs. A vantagem da cloração em relação às demais alternativas usualmente empregadas para a desinfeção reside no custo e em sua razoável simplicidade. Mesmo assim, considerando as alternativas para a desinfecção de esgotos descritas por Von Sperling (2005VON SPERLING, M. (2005) Princípios do tratamento biológico de águas residuárias. 3. ed. Minas Gerais: DESA - UFMG. 456 p. v. 1.), é nítida a desvantagem da cloração (em termos ambientais) em relação à ozonização, radiação ultravioleta e ultrafiltração por membranas.

Alguns dos efeitos da cloração sobre a matéria orgânica presente no esgoto têm recebido maior atenção, tais como os efeitos associados à formação de compostos organoclorados, como por exemplo trialometanos (THM), e suas eventuais propriedades carcinogênicas (GONÇALVES, 2003GONÇALVES, R.F. (Org.). (2003) Desinfecção de efluentes sanitários. Rio de Janeiro: ABES. 438 p.). Além disso, as alternativas de desinfecção por ozonização e por radiação ultravioleta chegam a ser competitivas e até mesmo mais vantajosas em determinadas condições. A ultrafiltração por membranas ainda constitui uma opção restrita (GONÇALVES, 2003GONÇALVES, R.F. (Org.). (2003) Desinfecção de efluentes sanitários. Rio de Janeiro: ABES. 438 p.). No entanto, os riscos de acidentes perigosos associados à utilização do cloro ainda são pouco estudados.

Em sistemas de desinfecção por cloro, esse é usualmente fornecido sob a forma de gás liquefeito sob alta pressão para ser aplicado diretamente como gás ou como solução aquosa. A dosagem é estabelecida de tal modo que um mínimo residual seja conseguido após um determinado tempo de contato, tendo em vista que a necessidade de desinfecção está relacionada à inativação imediata dos microrganismos presentes, com menor residual de cloro livre e combinado (PIANOWSKI & JANISSEK, 2003PIANOWSKI, E.H.; JANISSEK, P.R. (2003) Desinfecção de efluentes sanitários com uso de cloro: avaliação da formação de trihalometanos. Sanare: Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v. 20, n. 20, p. 6-17.). Os autores mencionados recomendam que o tempo de contato na cloração deva ficar abaixo de 30 minutos para concentrações de cloro de até 12 mg/L, de modo a evitar a formação indesejada de THMs.

Os principais riscos associados ao uso e armazenamento de cloro relacionam-se a deficiências no gerenciamento das instalações do sistema de cloração (que requerem constante supervisão), tendo em vista o potencial corrosivo e tóxico do cloro e seus vapores (que podem ser letais quando inalados em determinadas condições de concentração e tempo de exposição). Conforme Montes et al. (2002MONTES, A.L.; BARBARÍN, C.R.; CATILLO, J.M.B.; GRANADOS, O.H. (2002) Análisis de riesgo ambiental y su aplicación al almacenamiento y manejo de cloro industrial. Ciência UANL, v. 5, n. 2.), em concentrações superiores a 30 ppmv o cloro provoca efeitos severos à saúde humana quando inalado, sendo fatal após 30 minutos de exposição para concentrações acima de 430 ppmv.

O caso da Estação de Tratamento de Esgoto São José do Rio Preto

O estudo de análise de riscos para o sistema de cloração da ETE São José do Rio Preto (ETE SJRP) envolveu as etapas de caracterização do empreendimento, levantamento das condições climáticas relevantes, estabelecimento e modelagem dos cenários acidentais e determinação das consequências de eventos.

A área onde está implantada a ETE SJRP foi indicada pelo Plano Diretor do Sistema de Esgotamento Sanitário do Município de São José do Rio Preto. Tendo em vista a dinâmica de expansão do município, a área encontra-se em região de grande potencial para a expansão urbana, o que, para efeito da análise de riscos, implica considerar que a área do entorno da ETE deverá apresentar uma densidade populacional compatível com a média da cidade.

Em sua primeira etapa de implantação, a ETE deve atender aos seguintes objetivos:

  • lançamento de efluente com demanda bioquímica de oxigênio (DBO5) entre 20 e 30 mg/L;

  • oxigênio dissolvido (OD) mínimo de 5,0 mg/L;

  • concentração máxima de coliformes fecais de 1.000 número mais provável (NMP)/100 mL;

  • produção de lodo com concentração mínima de sólidos de 30%, para disposição final em aterros sanitários.

Para o atendimento desses objetivos é proposto, na fase líquida da ETE, o tratamento composto de gradeamento grosseiro, recalque de esgoto bruto, gradeamento fino, medição de vazão, desarenação, reatores anaeróbios de fluxo ascendente (UASB) e um sistema de lodos ativados formado por tanques de aeração, decantação, recirculação, seguido de cloração e pós-aeração.

A ETE, cuja licença de operação foi emitida pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) em janeiro de 2011, foi projetada para uma capacidade máxima para tratamento de 1.650 L/s. Em sua primeira etapa, tem capacidade para atender às seguintes contribuições:

  • população = 481 mil habitantes;

  • vazão média = 1.096,71 L/s;

  • carga orgânica = 29.400 kg DBO5/dia.

Caracterização do sistema de cloração e gerenciamento de riscos

A dosagem de cloro é efetuada por dois cloradores do tipo de gabinete, sendo um de reserva. Essa dosagem é ajustada manualmente no clorador e mantida automaticamente em função da vazão no gradeamento grosseiro. Um injetor, instalado próximo ao ponto de aplicação do cloro, produz o vácuo necessário à operação do sistema de cloração, promovendo a mistura de água com o cloro gasoso aplicada em um difusor instalado na linha de alimentação do tanque de contato do esgoto tratado.

O sistema de cloração é formado por 12 cilindros de cloro em estoque; 2 cilindros de cloro em operação ligados a um manifold e 2 cilindros em reserva; 1 sistema de troca automática dos cilindros ligados ao manifold; 2 evaporadores, sendo 1 reserva; e 2 bombas centrífugas, sendo 1 reserva, que alimentarão o injetor de cloro.

Como item de segurança, a sala de cilindros conta com um sistema destinado a minimizar os efeitos de um eventual vazamento de cloro gasoso para o ambiente. A sala é dotada de um sistema de exaustão mecânica constituído por exaustores axiais instalados no nível inferior da lateral da sala. Esses exaustores são operados por função temporizada. O sistema de exaustão tem capacidade para realizar no mínimo 20 renovações de ar a cada hora.

A sala de cilindros conta com três sensores de cloro instalados em extremidades opostas. Os sensores, providos de uma célula química com elemento sensível ao cloro, acusam e transmitem a presença do gás ao receptor, mesmo em quantidades muito inferiores àquelas percebidas pelo olfato. O receptor dos sinais emitidos pelos sensores está localizado na sala de dosagem, para não sofrer risco de corrosão por cloro.

O conjunto receptor está previamente ajustado para o valor de set-point de 3 ppmv, que, uma vez atingido, acionará um alarme no sistema de supervisão e controle e simultaneamente ligará a bomba de circulação de solução de NaOH do lavador. O conjunto conta com uma bomba reserva.

O gás vazado é sugado da sala através de dutos de polipropileno e encaminhado ao lavador de ar contaminado do tipo hidro-venturi, também executado com esse material. Antes de alcançar o equipamento de lavagem, o ar contaminado com cloro sofrerá, no trecho final do duto de admissão, uma pré-lavagem por meio de sprays instalados na parte interna do duto. Ao entrar no lavador pela parte superior, o ar contaminado com cloro ficará em contato com nova carga de solução de soda cáustica lançada por uma série de ejetores sprays em uma garganta interna.

O cloro gasoso que reage com a soda cáustica será recolhido na forma de hipoclorito de sódio no reservatório de fundo do lavador e, por meio de um extravasor, retornará ao tanque de recirculação de soda cáustica. A operação de lavagem do ar será interrompida automaticamente, assim que o sensor de cloro acusar uma concentração admissível na sala dos cilindros, e ventilação normal (exaustores) será reativada, também automaticamente. O valor fixado como concentração admissível é 1 ppmv.

Caracterização das condições climáticas relevantes

Os dados de direção dos ventos, intensidade dos ventos, temperatura média e umidade relativa do ar, necessários para a aplicação dos modelos de dispersão, foram obtidos junto ao Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos/Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/INPE), pela plataforma de coleta de dados de Votuporanga (a mais próxima à ETE SJRP entre as plataformas disponíveis). Nas Tabelas 1 e 2 são apresentados os dados coletados para os períodos noturno e diurno.

Tabela 1:
Dados climáticos obtidos junto à plataforma Votuporanga, valores médios para direção e velocidade de ventos, durante o período de 2008 a 2010.
Tabela 2:
Dados climáticos obtidos junto à plataforma Votuporanga, valores médios para temperatura e umidade relativa do ar, durante o período de 2008 a 2010.

Por meio da análise dos dados, percebe-se que há grandes diferenças quanto à condição climática durante os períodos diurno e noturno. Durante o dia predominam os ventos na direção leste (E). Em contrapartida, durante o período noturno, a predominância dos ventos durante o ano se dá para as direções norte e noroeste (N e NW, respectivamente).

A intensidade dos ventos também varia de acordo com a direção. De maneira geral, durante o período diurno os ventos são mais intensos. Considerando o período dos dados empregados, a intensidade mínima média foi de 5,04 m/s (para a direção sul, período noturno) e a intensidade máxima média foi de 7,04 m/s (para a direção nordeste, período diurno).

Estabelecimento de cenários acidentais

A partir da caracterização do sistema de cloração da ETE, foram estabelecidos cenários acidentais, posteriormente simulados considerando-se a hipótese do rompimento acidental da tubulação flexível e a hipótese de rompimento do cilindro ou válvula de saída.

Cenário A: furo no cilindro - vazamento na saída para o flexível

Nesse cenário foi considerado que o vazamento de cloro ocorre pelo rompimento do cilindro (considerando um furo de diâmetro de 3/8”) ou falha na válvula de saída do tanque. Nessas condições há formação de nuvem tóxica por vazamento completo de um cilindro que ultrapassa a barreira do sistema de segurança.

Cenário B: ruptura do flexível - vazamento de um cilindro

Nesse cenário foi considerado que o vazamento de cloro ocorre pela ruptura total da tubulação do flexível do tanque (diâmetro de 3/8”) com falha simultânea das barreiras implementadas pelo sistema de segurança. Foi considerado que o escoamento do gás ocorreria na forma horizontal, havendo formação de nuvem tóxica.

Modelagem e simulação dos cenários

A modelagem quantitativa e a simulação dos cenários acidentais foram realizadas utilizando-se o modelo Area Location of Hazardous Atmospheres (ALOHA) 5.4, software de domínio público desenvolvido pela Agência de Proteção ao Meio Ambiente (EPA) dos Estados Unidos. O programa incorpora o modelo de dispersão SLAB, considerado apropriado para o estudo da dispersão de gás cloro, bem como modelos de formação e vaporização das poças eventualmente formadas.

A modelagem da dispersão do gás foi realizada com condições de estabilidade atmosférica e valores médios para temperatura, umidade e velocidade do vento para os períodos diurno e noturno. Os níveis de concentração de cloro foram estabelecidos com base nas consequências sobre a saúde humana. Conforme a orientação da CETESB (2003COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB). (2003) Manual de orientação para elaboração de estudos de análise de risco. Documento P4.261. São Paulo: CETESB.), foi estudada a dispersão da nuvem de cloro para concentrações que atingissem letalidade de 50 e 1% (DL50% e DL1%, respectivamente) para o tempo de exposição igual a 10 minutos. Para tal efeito tem-se que:

  • DL50% = 1.620 mg/m3 (concentração com probabilidade de letalidade de 50% para o tempo de exposição igual a 10 minutos);

  • DL1% = 591 mg/m3 (concentração com probabilidade de letalidade de 1% para o tempo de exposição igual a 10 minutos).

Para simulação da dispersão da nuvem de cloro sobre a vizinhança, nos períodos diurno e noturno, adotou-se a densidade de 25 habitantes por hectare para o período diurno e 75 habitantes por hectare para o período noturno, conforme recomendação da CETESB (2003COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB). (2003) Manual de orientação para elaboração de estudos de análise de risco. Documento P4.261. São Paulo: CETESB.) para áreas residenciais de baixa densidade.

Um resumo dos parâmetros de entrada para a simulação da dispersão do gás cloro é apresentado na Tabela 3, considerando os dados levantados e adotados.

Tabela 3:
Parâmetros de entrada utilizados nas simulações de análise de risco de vazamento de gás cloro.

Determinação do risco social

O risco social oferecido pelo empreendimento é decorrente da frequência de ocorrência e da severidade dos eventos, expresso pelo número associado de fatalidades.

Para a determinação do risco social é preciso conhecer a frequência de ocorrência do evento inicial, valendo-se de registros históricos para os diferentes tipos de eventos perigosos. A partir daí, estima-se a probabilidade de ocorrência dos eventos associados para se determinar a frequência final da ocorrência de um acidente. No presente caso, a frequência de um evento é dada pela Equação 1:

F i = F E I x P s p x P v (1)

Em que:

  • Fi  = frequência de ocorrência do cenário acidental i;
  • FEI  = frequência de ocorrência do evento inicial;
  • Psp  = probabilidade do sistema de segurança falhar;
  • Pv  = probabilidade da ocorrência do vento na direção da simulação.

O cálculo para obter a frequência de cada evento foi baseado em uma árvore de eventos, levando-se em consideração os dois cenários acidentais simulados nos períodos diurno e noturno, adotando-se probabilidades de ocorrência para os eventos baseadas em dados históricos e discussões entre a equipe técnica responsável pela análise de riscos. A partir de então, calculou-se a frequência total acumulada (Tabela 4).

Tabela 4:
Árvore de eventos para a ocorrência de vazamento por furo no cilindro.

O risco social é expresso, então, pela frequência total acumulada em função do número de fatalidades, considerando-se a probabilidade de um evento ocorrer em determinado ponto, a probabilidade de fatalidade no ponto específico e a distância atingida pela nuvem tóxica. Com os resultados de frequência acumulada e número provável de fatalidades, pode-se representar e analisar o risco social através de uma curva F-N (frequência de ocorrência de n ou mais fatalidades x número de fatalidades).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta seção são apresentados e discutidos os resultados da análise de risco, a partir da simulação para os cenários de dispersão do gás cloro e os valores obtidos para o risco individual e risco social. O comportamento da dispersão do gás tóxico, a distância de risco e a estimativa de fatalidades serão apresentadas em forma de gráficos e tabelas. Ao final, serão apresentados os resultados para os riscos estudados.

Estudo da dispersão da nuvem tóxica

Cenário A: furo no cilindro - vazamento na saída para o flexível

As simulações foram efetuadas de acordo com o proposto na seção anterior. Foram obtidos os comprimentos máximos das nuvens tóxicas equivalentes à DL50% e DL1%. As nuvens tóxicas foram estudadas para todas as direções de ventos, respeitando as condições atmosféricas do local, conforme os procedimentos descritos anteriormente.

A taxa de vazamento média utilizada para as simulações de avanço das nuvens tóxicas foi estimada pelo programa ALOHA, através de modelos matemáticos aplicados às características do sistema descritas na Tabela 3. Os resultados obtidos para o evento proposto no cenário A se encontram na Tabela 5.

Tabela 5:
Parâmetros característicos para simulação de vazamento por ruptura do cilindro ou falha na válvula de saída do tanque.

Para as características do tanque de cloro encontrado na ETE SJRP, a estimativa da taxa de vazamento foi de 115 kg/min, para um furo com diâmetro de 3/8” na parede do cilindro ou na sua válvula de saída.

A partir dos dados de vazamento e das características climáticas locais, foi possível executar a modelação das nuvens tóxicas empregando-se o modelo ALOHA. Na Tabela 6 são apresentados os resultados obtidos para os comprimentos das nuvens em cada simulação efetuada.

Tabela 6:
Comprimentos máximos da nuvem tóxica para cada simulação.

De maneira geral, as nuvens que representam a concentração de 1.620 mg/m3 (DL50%) variaram de 180 a 185 m a partir da fonte. As nuvem que representam a concentração 591 mg/m3 (DL1%) variaram entre 342 e 385 m a partir da fonte.

Cenário B: ruptura do flexível - vazamento de um cilindro

Da mesma maneira que as simulações feitas para o cenário A, foram obtidos os comprimentos máximos das nuvens tóxicas equivalentes à DL50% e DL1%. As nuvens tóxicas foram estudadas para todas as direções de ventos, respeitando as condições atmosféricas do local, conforme os procedimentos descritos nas sessões anteriores.

A taxa de vazamento média utilizada para as simulações de avanço das nuvens tóxicas foi estimada pelo programa ALOHA, através de modelos aplicados às características do sistema dispostas na Tabela 3. Os resultados obtidos para o evento proposto no cenário B se encontram na Tabela 7.

Tabela 7:
Parâmetros característicos para simulação de vazamento por ruptura do flexível.

Pelas características do cilindro de cloro instalado na ETE SJRP, a estimativa da taxa de vazamento foi de 45 kg/min, para a situação de ruptura total do flexível, causando um furo de escape com diâmetro de 3/8”.

A partir dos dados de vazamento e das características climáticas locais, foi possível a modelação das nuvens tóxicas. Os resultados obtidos para os comprimentos das nuvens em cada simulação efetuada são apresentados na Tabela 8.

Tabela 8:
Comprimentos máximos da nuvem tóxica para cada simulação.

De maneira geral, as nuvens que representam a concentração de 1.620 mg/m3 (DL50%) variaram de 116 a 122 m a partir da fonte. As nuvens que representam a concentração 591 mg/m3 (DL1%) variaram entre 217 e 248 m a partir da fonte.

Analisando os resultados para os dois cenários acidentais, percebe-se que há formação de nuvens tóxicas com maior comprimento para o cenário A. Considerando que a massa de cloro vazada nas duas situações seja a mesma, conclui-se que a diferença na formação das nuvens se dá pelas características do vazamento. A perda de carga estimada para um vazamento ocasionado pela ruptura do flexível é maior, comparada à perda de carga por ruptura direta da parede do tanque, por exemplo. Dessa maneira, a taxa de vazamento estimada para o cenário B foi menor que a estimada no cenário A, ocasionando as diferenças no avanço das nuvens tóxicas.

Determinação das áreas de risco

A determinação das áreas de risco (Figuras 1 e 2) foi feita a partir dos dados de dispersão calculados para o período noturno, por apresentarem comprimento de pluma maior e, portanto, maior área de risco de fatalidades. Interessante notar que, para as condições de dispersão assumidas na modelagem, a distância alcançada pela nuvem tóxica é inversamente proporcional à velocidade do vento por conta, possivelmente, de uma menor diluição do gás

Figura 1:
Indicação das áreas de risco para rompimento do cilindro ou falha da válvula de saída: cenário A.

Figura 2:
Indicação da área de influência máxima para rompimento da tubulação flexível: cenário B.

Conforme recomendação da CETESB (2003COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB). (2003) Manual de orientação para elaboração de estudos de análise de risco. Documento P4.261. São Paulo: CETESB.), as zonas de risco foram delimitadas pelos comprimentos estimados das plumas com concentração 1.620 mg/m3 (DL50%) e 591 mg/m3 (DL1%), equivalentes às probabilidades de 75 e 25% de ocorrência de fatalidade da população exposta.

A partir da determinação das áreas de influência das plumas de contaminante, podem-se identificar as áreas externas à ETE passíveis de ocupação futura e, portanto, caracterizadas como áreas de riscos. Para o cenário mais crítico, ilustrado pela Figura 2, é possível verificar que boa parte das instalações da ETE está sujeita às zonas de 75 e 25% de fatalidade, indicando a importância de um bom plano de gerenciamento de riscos e contingências/atendimento a emergências, de modo a garantir condições seguras de trabalho para os funcionários da estação.

Por sua vez, nas áreas externas à ETE, verificam-se duas situações distintas: riscos de contaminação e morbidade em áreas naturais (fragmentos de vegetação nativa em áreas de preservação permanente e corpos d’água); e risco de eventos catastróficos e morte de habitantes nas áreas passíveis de novas urbanizações.

Com relação ao primeiro aspecto levantado, é relevante destacar que os cálculos para estimativa dos riscos individual e social foram elaborados com base em parâmetros determinados para a toxicidade à saúde humana, sendo necessário verificar quais efeitos seriam esperados a partir do contato da nuvem de cloro sobre a fauna e flora aquática e terrestre, o que não é objeto do presente estudo.

Considerando os eventos propostos para o cenário A, o risco de exposição tóxica da população em áreas externas à ETE se estende por uma área de 94,2 ha. Por sua vez, no cenário B, a exposição à nuvem tóxica seria distribuída em uma área equivalente a 9,73 ha.

Conforme verificado no Plano Diretor do Município de São José do Rio Preto, a zona urbana apresenta crescimento acelerado em direção à área da ETE e, portanto, foi considerada a possibilidade de ocupação futura por loteamentos urbanos. Sendo assim, a população sujeita ao risco foi estimada a partir de parâmetros de densidade populacional recomendados pela CETESB (2003COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB). (2003) Manual de orientação para elaboração de estudos de análise de risco. Documento P4.261. São Paulo: CETESB.): 25 pessoas por hectare para o período diurno e 75 pessoas por hectare para o período noturno.

Com base nas áreas de riscos identificadas anteriormente, estimou-se o total de fatalidades para os cenários propostos (Tabela 9). É possível observar que o número estimado de fatalidades, no caso da ocorrência de qualquer evento/cenário acidental, não pode ser considerado desprezível. Ainda assim, cabe salientar que tal estimativa expressa o número total de fatalidades, ou seja, a soma de todos os eventos possíveis de acontecer dentro de um cenário acidental.

Tabela 9:
Estimativa do total de fatalidades para os cenários A e B.

Para expressar as consequências de um único evento, a estimativa de fatalidades de um cenário foi distribuída considerando-se o regime de ventos no local (que estabelece, por sua vez, a direção de espalhamento da nuvem tóxica) e, ainda, a possibilidade de ocupação com habitações (que excluem a área da ETE e as áreas de preservação permanente). Nesse caso, no cenário A foram consideradas apenas as direções noroeste, norte, nordeste, leste e sudeste, enquanto para o cenário B foram consideradas apenas as direções norte e nordeste.

Na Tabela 10 são apresentadas as consequências estimadas para cada evento considerado.

Tabela 10:
Estimativa do número de fatalidades por evento simulado.

Risco social

A partir da estimativa da população de risco e da estimativa de ocorrência dos eventos perigosos, é possível calcular o risco social referente à instalação e operação da ETE SJRP. A partir do estudo inicial de identificação de perigos, foi calculada a frequência de ocorrência de todos os eventos identificados como perigosos à população externa à área da ETE. Dessa maneira, para cada evento obteve-se frequência final de ocorrência, expressa em ano-1 e a estimativa das consequências do evento, expressa em número provável de fatalidades (Tabela 11). Vale destacar o baixo valor para frequências apresentadas, decorrentes da baixa probabilidade de ocorrência dos eventos iniciais e falhas que levariam ao evento catastrófico (com perda de vidas) simulado nos cenários A e B.

Tabela 11:
Estimativa do número de fatalidades e frequência final dos eventos perigosos.

Percebe-se que para os cenários acidentais propostos, as frequências dos eventos variam em torno de 2 a 8 × 10-10 ano-1. A estimativa das consequências, expressa pelo número de fatalidades, varia de acordo com o período do evento e o alcance na nuvem tóxica. Por apresentar um maior número de pessoas expostas ao risco, o período noturno apresentou as piores consequências, comparado aos mesmos eventos ocorridos durante o dia.

A partir dos dados apresentados na Tabela 11, foi possível estimar a frequência dos eventos, classificado-as de acordo com o número de vítimas fatais associadas ao acidente. Na Tabela 12 são apresentadas, para cada faixa de consequência, a probabilidade de ocorrência dos eventos considerados.

Tabela 12:
Probabilidade de ocorrência de eventos de acordo com o número estimado de fatalidades.

A aceitabilidade dos riscos estimados é verificada por meio do estabelecimento de uma curva F-N, confrontando-se com os parâmetros de aceitabilidade estabelecidos pelos órgãos ambientais. No caso do estado de São Paulo, os limites de aceitabilidade dos riscos associados à implantação de um empreendimento fixo, aplicados pela CETESB (2003COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB). (2003) Manual de orientação para elaboração de estudos de análise de risco. Documento P4.261. São Paulo: CETESB.) durante o processo de licenciamento ambiental, estão dispostos na Figura 3 juntamente com os riscos estimados para a operação da ETE SJRP.

Figura 3:
Curva de frequência versus número de fatalidades e limites de aceitabilidade adotados pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo.

O comportamento da curva F-N, demonstrado pela Figura 3, mostra que o risco social associado à implantação da ETE SJRP está muito abaixo do limite de riscos aceitáveis adotado pelo órgão ambiental. No entanto, de acordo com a CETESB (2003COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (CETESB). (2003) Manual de orientação para elaboração de estudos de análise de risco. Documento P4.261. São Paulo: CETESB.), a comprovação de “baixos” riscos associados ao empreendimento não exclui a obrigatoriedade da elaboração de um programa de gerenciamento de riscos e de um plano de ação emergencial.

Deve-se salientar que as simulações foram realizadas para um cenário de vazamento de todo o conteúdo do tanque de cloro gasoso. No entanto, o tempo necessário para o vazamento de todo o gás é de 8 minutos para o cenário A e 22 minutos para o cenário B. É de se esperar, evidentemente, que o tempo de resposta da equipe responsável pela contenção do vazamento seja menor que o tempo necessário para o vazamento de todo o gás no cenário B e, portanto, as ações de contingência se mostrem eficazes.

Além disso, é válido resgatar as considerações realizadas por Montaño e Souza (2008MONTAÑO, M.; SOUZA, M.P. (2008) A viabilidade ambiental no licenciamento de empreendimentos perigosos no Estado de São Paulo. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 13, n. 4, p. 435-442. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-41522008000400012
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-41522008...
) a respeito da baixa efetividade desses limites empregados no estado de São Paulo, em relação à baixa influência da análise de riscos sobre os aspectos locacionais de um empreendimento perigoso. No presente caso, as informações necessárias para a realização do estudo de análise de riscos são, em sua grande maioria, relacionadas à tipologia de ocupação do entorno do empreendimento e às características atmosféricas da região. As informações do sistema de cloração estudado no presente caso podem ser facilmente estimadas e utilizadas em um estudo prévio/preliminar.

Da mesma forma, considerando-se as conclusões de Fontanive (2005FONTANIVE, S. (2005) Estudo de análise de risco do cloro em estações de tratamento de água. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Paraná, Curitiba.) relacionadas à ocorrência de concentrações superiores às aceitáveis fora dos limites de um empreendimento perigoso em determinadas condições atmosféricas, podendo provocar danos irreversíveis à população exposta à zona afetada, entende-se que os estudos de análise de riscos devem ser explorados de modo mais intenso, deixando de ser apenas documentos meramente informativos de planos de gerenciamento de riscos e de ações emergenciais.

CONCLUSÕES

Com base nos resultados obtidos da simulação de cenários hipotéticos de vazamentos acidentais de cloro, pode-se concluir que existem riscos significativos associados à instalação de operação de unidades de cloro em estações de tratamento de água e esgoto. No entanto, de acordo com os limites orientadores estabelecidos pelas normas aplicáveis, os riscos podem ser considerados gerenciáveis, de forma a minimizar os impactos consequentes de eventos acidentais.

Para os cenários acidentais considerados, as nuvens tóxicas atingiriam comprimento máximo da ordem de 385 metros para o limite de DL1%. A nuvem tóxica com concentração de DL50% atingiu comprimento máximo de 185 metros. Em ambos os casos, considerando-se a possibilidade de fatalidades, a frequência de ocorrência calculada ficou abaixo de 6,88 × 10-9 ano-1, considerada aceitável pelos critérios adotados no estado de São Paulo.

Por causa do padrão de ocupação em seu entorno, a instalação e operação do sistema de cloração não apresentava riscos imediatos à população externa à ETE SJRP à época de sua implantação. No entanto, se considerado o potencial de ocupação apresentado pela área, nota-se a relevância das medidas de gerenciamento e contingência estabelecidas em um plano de gestão de riscos. Além disso, a existência de áreas naturais de interesse ambiental (que abrigam espécies importantes de flora e fauna aquática e terrestre) implica estender o escopo da análise de risco efetuada no presente estudo de tal modo a considerar também os efeitos sobre a saúde dos ecossistemas aquático e terrestre, o que não foi objeto do presente estudo.

As evidências geradas no presente artigo reforçam a necessidade de que o estudo de análise de risco deva ser incluído no licenciamento prévio de um empreendimento, de modo a se estabelecerem as bases para a sua inclusão na discussão das alternativas locacionais de empreendimentos similares.

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    Reg. ABES: 158247

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2018
  • Data do Fascículo
    Out 2018

Histórico

  • Recebido
    04 Jan 2016
  • Aceito
    10 Jul 2017
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