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A política de educação especial no estado de Sergipe (1979-2001)

Special education policies in the State of Sergipe (1979-2001)

Resumos

O estudo teve como objetivo realizar uma avaliação da política de educação, no Estado de Sergipe, destinadas às pessoas com deficiências, no período entre 1979 até o ano de 2001. A fonte de informação central da estrutura administrativa de Governo, foi a Secretaria de Estado da Educação, e outras instituições cujo acervo documental tivesse relação com os indicadores sociais definidos para o estudo (1-Planos, programas e projetos de governo; 2-Expansão da rede física; 3-Evolução do número de matrículas; 4-Estrutura organizacional; 5-Recursos humanos, e; 6-Legislação). Foram identificados 136 diferentes documentos distribuídos pelas fontes de informação selecionadas. Os resultados indicaram que houve implementação progressiva de programas e projetos educacionais, com a intervenção de organismos internacionais; progressiva produção de normas e leis, de conseqüências práticas restritas; alterações organizacionais do Estado, envolvendo a Secretaria de Educação e criação de órgãos voltados para pessoas portadoras de deficiência; evolução contínua da rede física; expansão do índice de matrícula, acentuando-se no nível ensino pré-escolar e pouco significativo no ensino de 2º grau e na educação especial. Com relação à política de educação especial nas gestões analisadas nos últimos 22 anos, houve repasses regulares de recursos do governo federal para o governo estadual, decisivos para a política de educação especial no estado, pois os investimentos do governo do estado e dos municípios na educação de crianças e jovens com necessidades educacionais especiais pareceram mínimos ao longo dos últimos 20 anos, o que em parte explica a falta de expressividade da política de educação especial no Estado de Sergipe.

cidadania; política educacional; educação especial; deficiências


The objective of this study was to put forth an evaluation of education policies from 1979 to 2001 for the State of Sergipe, related to people with disabilities. The central source of information on the governmental administrative structure is the State Secretariat of Education, along with other institutions. Its document archives were related to the social indicators defined for the study (1-Planning, programs and governmental projects; 2-Expansion of the physical network; 3-Increase in registrations; 4-Organizational structure; 5-Human resources, and 6-Legislation). 136 different documents were identified, distributed for the sources of the information selected. The results suggested that there was a progressively more intensive implementation of certain specific educational programs and projects, where there had been intervention of international organizations. There was intensive and progressive production of legislation, restricted in scope as to practical consequences. Other changes were made to the organizational structure of the State, involving the Education Secretariat and creation of the organs relative to people with disabilities; there was on-going improvement to the physical network; registrations increased, especially at the preschool level, despite the low increase rates of high school and special education registration. With regard to special education policies, for the 22 years of administration analyzed in the study, the federal government provided for continuous dispensation of funding to the state government. This was essential for the success of the State's special education policies, since few investments were forthcoming from the State and Municipal governments for the provision of education of children and young people with special educational necessities throughout these last 20 years, which partially explain how inexpressive special education policies are for the State of Sergipe.

citizenship; educational policies; special education; disability


RELATO DE PESQUISA

A política de educação especial no estado de Sergipe (1979-2001)

Special education policies in the State of Sergipe (1979-2001)

Nelson Dagoberto de Matos

Mestre em ciência do Movimento pelo CEFD/UFSM-RS; doutorando pelo PPGEEs/UFSCar – SP - pndmatos@ufs.br

RESUMO

O estudo teve como objetivo realizar uma avaliação da política de educação, no Estado de Sergipe, destinadas às pessoas com deficiências, no período entre 1979 até o ano de 2001. A fonte de informação central da estrutura administrativa de Governo, foi a Secretaria de Estado da Educação, e outras instituições cujo acervo documental tivesse relação com os indicadores sociais definidos para o estudo (1-Planos, programas e projetos de governo; 2-Expansão da rede física; 3-Evolução do número de matrículas; 4-Estrutura organizacional; 5-Recursos humanos, e; 6-Legislação). Foram identificados 136 diferentes documentos distribuídos pelas fontes de informação selecionadas. Os resultados indicaram que houve implementação progressiva de programas e projetos educacionais, com a intervenção de organismos internacionais; progressiva produção de normas e leis, de conseqüências práticas restritas; alterações organizacionais do Estado, envolvendo a Secretaria de Educação e criação de órgãos voltados para pessoas portadoras de deficiência; evolução contínua da rede física; expansão do índice de matrícula, acentuando-se no nível ensino pré-escolar e pouco significativo no ensino de 2º grau e na educação especial. Com relação à política de educação especial nas gestões analisadas nos últimos 22 anos, houve repasses regulares de recursos do governo federal para o governo estadual, decisivos para a política de educação especial no estado, pois os investimentos do governo do estado e dos municípios na educação de crianças e jovens com necessidades educacionais especiais pareceram mínimos ao longo dos últimos 20 anos, o que em parte explica a falta de expressividade da política de educação especial no Estado de Sergipe.

Palavras-chave: cidadania; política educacional; educação especial; deficiências.

ABSTRACT

The objective of this study was to put forth an evaluation of education policies from 1979 to 2001 for the State of Sergipe, related to people with disabilities. The central source of information on the governmental administrative structure is the State Secretariat of Education, along with other institutions. Its document archives were related to the social indicators defined for the study (1-Planning, programs and governmental projects; 2-Expansion of the physical network; 3-Increase in registrations; 4-Organizational structure; 5-Human resources, and 6-Legislation). 136 different documents were identified, distributed for the sources of the information selected. The results suggested that there was a progressively more intensive implementation of certain specific educational programs and projects, where there had been intervention of international organizations. There was intensive and progressive production of legislation, restricted in scope as to practical consequences. Other changes were made to the organizational structure of the State, involving the Education Secretariat and creation of the organs relative to people with disabilities; there was on-going improvement to the physical network; registrations increased, especially at the preschool level, despite the low increase rates of high school and special education registration. With regard to special education policies, for the 22 years of administration analyzed in the study, the federal government provided for continuous dispensation of funding to the state government. This was essential for the success of the State's special education policies, since few investments were forthcoming from the State and Municipal governments for the provision of education of children and young people with special educational necessities throughout these last 20 years, which partially explain how inexpressive special education policies are for the State of Sergipe.

Keywords: citizenship; educational policies; special education; disability.

INTRODUÇÃO

O estado de Sergipe ao norte limita-se com o estado de Alagoas, separado em sua extensão pelo rio São Francisco; a leste, com o oceano Atlântico; e, ao sul e a oeste, com o estado da Bahia.

Possuindo cerca de 60% do seu território na zona da seca, o estado de Sergipe é a menor unidade da federação nacional brasileira, situando-se na região nordeste, uma das mais pobres do Brasil, certamente como conseqüência da história do modelo de desenvolvimento que vem sendo adotado para o país e para região. Para Almeida (1991) o modelo de desenvolvimento capitalista gestado no Século XX, produziu evidentes desigualdades no plano das nações, que se reproduziram no plano interno, provocando desníveis regionais de desenvolvimento. Seria o caso do nordeste brasileiro, por exemplo, que passou por um período de região hegemônica na economia, sofrendo depois uma desaceleração como conseqüência da expansão industrial do sudeste. Para esta autora, as razões para a pobreza relativa do nordeste são eminentemente históricas, com desdobramentos sociais, econômicos e políticos. As causas seriam:

a) formação de uma estrutura agrária caracterizada por um elevado e injusto grau de concentração da terra;

b) desarticulação do sistema produtivo regional prevalecente na Colônia e no Império - a monocultura da cana-de-açúcar, com força de trabalho escrava;

c) limitadas condições para substituir o sistema produtivo baseado na escravidão por outro com base no trabalho assalariado;

d) o processo de crescimento econômico do sudeste, tendo com eixo a economia cafeeiro-industrial, que provocou a concentração dos meios de produção nessa área, esvaziando outras do país, em particular o nordeste (o caso mais evidente é a migração da mão-de-obra regional); e

e) a tomada de decisões políticas que beneficiavam maior percentual de investimentos no sudeste.

Segundo Nascimento (1991), o desenvolvimento do nordeste tem base na exploração presente nas relações de produção e reprodução do capitalismo, que também no Brasil são caracterizados pela lógica do desigual e combinado, em que o crescimento de um determinado setor se faz às custas da estagnação ou miséria de outro.

O panorama nacional no final dos anos 70 e início dos anos 80, que corresponde ao início do período estudado, indicava conforme apontou Lobo (2002), uma crise do estado de bem-estar social, que colocou em xeque a legitimidade do governo e, por pressão das mobilizações de categorias urbanas excluídas, contra os escândalos financeiros da época, resultou num processo de abertura lenta e gradual.

Com o crescimento descontrolado da pobreza provocado pela política econômica que favoreceu a concentração do capital, entra em destaque a injunção do BIRD e do BID como parte da política para a América Latina, buscando a implantação de programas compensatórios que minimizassem as carências, acalmassem conflitos e remediassem os desequilíbrios sociais. De acordo com Dantas (2004) ainda que tenha contribuído para diminuir os desníveis regionais, a política econômica dos militares legou aos governos civis um modelo de desenvolvimento em crise, caracterizado pelo crescimento da dívida externa, cujo pagamento exigia elevados superávits. O crescimento econômico vivenciado neste período, sustentado com elevadas taxas de juros e com endividamento externo, gerou, de acordo com Silva (2002, p. 123):

a recessão, o aprofundamento da dependência, a elevação da dívida externa, e da dívida pública interna, o aumento dos índices de inflação e do desemprego e o comprometimento das políticas sociais.

É neste contexto histórico que iniciamos o estudo que teve como objetivo realizar uma avaliação da política de educação, no Estado de Sergipe, no período entre 1979 até o ano de 2001, com destaque no presente relato para as medidas destinadas às pessoas com deficiências.

MÉTODO

Definido o período de 1979 a 2001, iniciou-se a coleta de dados, estes representados por documentos oficiais, na principal fonte de informação que foi a Secretaria de Estado da Educação. Entretanto, no decorrer do estudo houve, também, busca em outros órgãos cujo acervo documental tivesse relação com os objetivos do estudo, tendo em vista a dificuldade encontrada na identificação de documentos.

A fim de identificar os documentos de interesse foram estabelecidos critérios, os quais tiveram como base os seguintes indicadores sociais para a seleção da amostra a ser investigada: 1-Planos, programas e projetos de governo; 2-Expansão da rede física; 3-Evolução do número de matrículas; 4-Estrutura organizacional; 5-Recursos humanos, e; 6-Legislação.

Tomando como base tais critérios foram identificados 136 documentos oficiais distribuídos em diferentes fontes de informação. Ressalta-se neste momento do estudo a dificuldade encontrada no processo de busca e recuperação dos documentos tendo em vista a desorganização do acervo pesquisado, principalmente com respeito aos dados estatísticos da educação especial. Os documentos foram organizados em ordem cronológica e divididos em períodos de tempo correspondentes às diferentes gestões do governo estadual de Sergipe ao longo do período estudado.

Da leitura intensiva dos documentos foram extraídas as informações sobre os indicadores sociais selecionados sendo que os dados obtidos foram organizados cronologicamente e serão sintetizados a seguir.

RESULTADOS

GOVERNO AUGUSTO DO PRADO FRANCO

Em meio aos desequilíbrios do modelo de desenvolvimento capitalista juntamente com as crises do petróleo de 1973 e 1979, com desdobramentos sobre a vida nacional, assume o governo no estado Augusto do Prado Franco, em 1979, como último governador eleito indiretamente sob a tutela dos militares. De acordo com Lobo (2002), a eleição deste aristocrata da indústria açucareira sergipana, ocorreu após três tentativas, por meio da negociação do seu partido, a ARENA, com as Forças Armadas.

No plano político, neste período ocorreu o fim do bipartidarismo que provocou o rearranjo das forças políticas. De acordo com Dantas (2004), os situacionistas se aglutinaram no Partido Democrático Social (PDS) enquanto a oposição se dividia, indo parte para o Partido Popular (PP) liderado por João Alves Filho, uma maioria filiou-se ao PMDB, enquanto os outros foram para o Partido Democrático Trabalhista e Partido dos Trabalhadores.

No plano econômico, Dantas (2004) destaca a instalação do escritório da PETROBRAS, a implantação da Petrobrás Mineração (PETROMISA) e da Fertilizantes Nitrogenados do Nordeste (NITROFERTIL), que resultaram em grande impulso à economia sergipana. Tais fatores aliados ao aporte de recursos oriundos do Banco Mundial por meio do projeto Pólo Nordeste, favoreceram a gestão de Augusto do Prado Franco, tornando o seu mandato num dos mais privilegiados no período pós-64.

Dos indicadores relacionados à Educação Especial neste período destaca-se a criação da Gerência de Educação Especial, o início da ação assistencialista da Legião Brasileira de Assistência, o levantamento das pessoas deficientes no Estado de Sergipe, e o Projeto de Educação Especial, em grande parte decorrente do Ano Internacional do Deficiente (1981).

Os dados sobre a Educação Especial do final desta gestão indicaram um aumento de matrículas de 284 para 433 (acréscimo de 52,5%), das quais 234 (54%) eram de alunos de classes especiais de escolas da rede pública e as outras 199 (46%) estavam em instituições especializadas particulares. O atendimento era exclusivo para portadores de deficiência mental. Observou-se ainda no período que o número de professores capacitados, principalmente com financiamento do CENESP, foi bem superior ao número de docentes em exercício na área.

Para Torres (1996), o governo Augusto Franco foi marcado por melhoria da qualidade de vida da população e ações populistas para garantir a sucessão estadual nas eleições diretas de 1982, para governador. Lobo (2002) observa que o governo de Augusto do Prado Franco foi um dos governos mais agraciados, na região nordeste, com recursos federais e do Banco Mundial para o desenvolvimento da política do governo militar e atendimento aos excluídos, tais recursos entretanto, parece ter sido destinados para alimentar os currais eleitorais.

A atuação política do governador envolveu o uso do poder econômico e com a aquisição do único canal televisivo, que então abria espaço para os oposicionistas, diminuiu o espaço crítico. O jogo mais pesado foi contra a oposição deu-se em direção ao empresário da construção civil João Alves Filho, que pressionado se rendeu e filiou-se ao PDS em 1981. Seria ele o candidato situacionista nas eleições de 1982, que foi revestida de profunda desigualdade, comandada pelas autoridades, beneficiando sempre os candidatos governistas e cerceando as iniciativas dos políticos oposicionistas.

GOVERNO JOÃO ALVES FILHO

O candidato situacionista João Alves Filho foi então eleito e iniciou seu mandato em 1983. Entretanto, logo depois de eleito procurou se afastar da subordinação ao grupo Franco, mas ao compor seu secretariado negociou com esta oligarquia as pastas da Fazenda e da Educação. Desligou-se do PDS em dezembro de 1984, arrematando o rompimento com o grupo historicamente dominante em Sergipe.

Neste período a crise do estado brasileiro era ainda evidente, e provocada, principalmente, pelas dificuldades enfrentadas para o pagamento da elevada dívida externa, o que levou o país a assumir acordos com as agências financeiras internacionais. De acordo com Silva (2002), em meados de 1980, diante da incapacidade econômica dos países latino-americanos honrarem o pagamento da dívida externa, abriu-se a possibilidade para o Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional, exercerem a tarefa de formuladores das políticas para educação, indicando a direção almejada e subordinando-a à racionalidade dos procedimentos econômicos.

Em Sergipe, o governador João Alves Filho recebeu o estado em situação privilegiada em relação à maioria dos estados do país, mas o deixou com dívidas de difícil rolagem em função dos contratos que se estenderiam até 2017, tendo suas contas rejeitadas no parecer de um dos conselheiros do Tribunal de Contas. Em sua gestão optou pelo clientelismo, contratando sem critérios 8.000 funcionários. Para sustentar os empreendimentos do Estado contou com recursos a fundo perdido do Ministério do Interior e com financiamentos do Pólo Nordeste.

No campo político, revelou-se cauteloso nas suas decisões, procurando tirar máximo proveito da situação, tendo sido o último governador a confirmar apoio à candidatura Tancredo Neves para a presidência da república quando esta já estava consolidada. De acordo com Dantas (1997), abriu poucos espaços para novos atores sociais revelando assim uma postura conservadora. Para Torres (1996) a eleição de João Alves Filho, aparentemente uma vitória do povo contra as oligarquias, se constituiu, na verdade, na renovação do discurso da direita para recompor o clientelismo, garantir apoio popular e desmontar o partido de oposição que era o PMDB.

Para Lobo (2002), a passagem deste governo foi marcada por repressão aos professores em passeatas, pela ação da polícia militar e pelo incentivo à liquidação do ensino básico, secundário e profissional em proveito da escola particular. Além disso este autor destaca as denúncias de má aplicação dos recursos destinados pelo MEC, a precariedade dos equipamentos escolares, o setor educacional marcado pela degradação da estrutura burocrática e do ensino, por estar a pasta ocupada, ao menos nos primeiros dois anos, por pessoas sem qualquer identificação com a área.

Em relação à política educacional percebe-se a manutenção de duas finalidades claras: a municipalização do ensino pré-escolar e de primeiro grau, mediante apoio financeiro aos municípios; e uma política assistencialista com ênfase na distribuição de material escolar, de livros, e garantia de alimentação aos estudantes, sob a justificativa de combate à subnutrição e à evasão. No tocante aos programas relacionados à Educação Especial aparece a ênfase na subvenção mediante a concessão de auxílio financeiro e pagamento de bolsas de estudo a instituições especializadas particulares.

Quanto a Educação Especial, o governo anterior terminara o mandato apontando a existência de 433 matrículas no ensino especial em 1983, das quais 54% eram de alunos de classes especiais de escolas da rede estadual e 46% eram atendidos em 3 instituições especializadas particulares, sendo o atendimento existente exclusivo para portadores de deficiência mental. Em 1986 ocorreu uma queda inexplicável no número de escolas (de 26 para 13) e de matrículas, de 433 para 331 (decréscimo de 23,5%), o que sugere a fragilidade dos dados obtidos. Destas 331 matrículas, 169 (51%) estavam na rede pública e 162 (49%) na particular. Observa-se ainda que o CENESP/MEC continuou a financiar ações de formação de professores no âmbito do estado.

GOVERNO ANTONIO CARLOS VALADARES

O governador Antonio Carlos Valadares tomou posse em março de 1987, com as finanças públicas em situação precária, agravada pela retomada da inflação no plano nacional, com o fim do plano cruzado. Além disso a então recente Constituição Federal de 1988, previa ganhos sociais que sobrecarregaram o Estado. Lobo (2002) observa que o último governador da década de 80, foi o único pertencente ao PFL, no Brasil, eleito com apoio da esquerda populista e da classe dominante, pois foi gestado politicamente pelo oligarca Augusto do Prado Franco.

Para Figueiredo in Lobo (2002), o governador eleito encontrou o Estado em situação de miséria e desemprego. Esta situação das finanças do Estado, de acordo com Dantas (2004), levou o executivo a extinguir 10 das 25 secretarias com que iniciara o governo, além de autarquias, empresas e fundações. No campo político, sentiu-se pressionado a atender os compromissos da campanha e enfrentou manifestações de rua dos movimentos sociais e greve dos professores.

No campo educacional, Dantas (2004) informa que a situação do ensino era de degradação, marcada por greves sucessivas e demanda reprimida, especialmente no 2º grau. O Secretário da Educação, Marcos Prado Dias enfrentou a greve de professores, reagindo com demissões. A evasão escolar atingia 60% e a população de analfabetos era de 47%.

Os dados sobre a Educação Especial indicam decréscimo do quadro docente, a manutenção das três instituições especializadas, e redução no número de matrículas de 331 para 314 (decréscimo de 5%). Destas, 196 (62,5%) estavam na rede pública e as outras 118 (37,5%) na rede particular. A despeito da diminuição nas matrículas e também no número de funções docentes na Educação Especial, um grande contingente de professores, bastante superior ao número de docentes em exercício, fez curso de atualização promovido pelo MEC ao longo desta gestão. Destaca-se ainda neste período o esboço de uma política para a Educação Especial baseada no princípio de normalização, integração e interiorização, com metas tais como: descentralização para todas as Diretorias Educacionais Regionais (DRE's) e implantação do "Centro de Educação Especial", em Aracaju. No campo legal, este período foi marcado pela criação de um aparato legal para assegurar determinados direitos sociais, como por exemplo, a educação das pessoas com deficiências, em decorrência da outorga da Constituição Federal de 1988, das Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais.

GOVERNO JOÃO ALVES FILHO

O governador João Alves Filho assumiu pela segunda vez o governo do estado em março de 1991. A situação das finanças do Estado teria melhorado até o final de 1991, como resultado das transferências de recursos como o Fundo de Participação dos Estados e Municípios, além dos investimentos patrocinados pelo governo federal. De acordo com Dantas (2004), mais uma vez o governador teve suas contas, referentes a 1992, rejeitadas por um dos conselheiros do Tribunal de Contas. Este governador deixou posteriormente o Estado ainda mais endividado, com compromissos a serem honrados pelo seu sucessor.

No plano político, o governo montou a equipe com pessoas de sua administração anterior, na maioria, e gozava de ambiente favorável no Senado, na Câmara e na Assembléia Legislativa, embora nesta última, o apoio tenha sido restrito.

Com relação à educação, para Dantas (2004), teria atribuído a ela lugar fundamental, mas na verdade daria mais atenção a projetos de maior visibilidade. Desta forma, limitou-se a realizar obras na estrutura física, sem implementar ações que indicassem a crença na educação como meio de assegurar a cidadania.

Quanto às normas e legislações, no tocante à garantia dos direitos das pessoas portadoras de deficiências, várias leis são aprovadas neste período, sendo a maioria delas destinada a regulamentar a legislação federal sobre acessibilidade física, reserva de vagas em concursos públicos e atendimento preferencial em serviços públicos. Outras leis que dispunham sobre o direito das pessoas portadoras de deficiências aprovadas neste período, e que parecem ser iniciativa específica do estado, foram destinadas a criar o programa de amparo à formação de profissionais, proporcionar a entrega de livros nas residências para favorecer atividades de leitura e pesquisa, conceder bolsa de estudos para estudantes do ensino superior que fossem portadores de deficiências e comprovadamente carentes.

Na Educação Especial embora se observe uma diminuição de 13 para 11 escolas com serviços de ensino especial, ocorreu uma ampliação do número de matrículas de 314 para 731 (acréscimo de 417%), sendo 294 (40%) na rede pública e 437 (60%) na iniciativa privada, cujo número de matrículas quadruplicou neste período. Quanto às ações de formação de pessoal para a educação especial chama a atenção a quantidade grande de pessoas que recebeu qualificação em 1991 e em 1992 para uma população relativamente pequena de alunos matriculados.

Dados encontrados em alguns documentos apontaram que os índices de repetência e evasão no ensino de 1º grau, em 1988, era de 38,3% e 22%, respectivamente, e que no ano de 1995, estavam situados em 30% e 21%, o que demonstrava pouca evolução ao longo dos sete anos em questão.

GOVERNO ALBANO PIMENTEL DO PRADO FRANCO

O governo Albano Pimentel do Prado Franco foi instalado em janeiro de 1995, coincidindo esta gestão com a da Presidência de Fernando Henrique Cardoso, que retomou as reformas liberalizantes iniciadas por Fernando Collor de Melo, caracterizadas pela redução do papel do Estado na industrialização e no controle dos meios de produção. Desta forma, em nível nacional, este período foi fortemente marcado pelas idéias do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional. No campo educacional houve a mudança da ênfase no ensino universitário para o ensino básico, buscando maior eficiência nos gastos por meio da criação do Fundo Escola e o FUNDEF.

Em Sergipe, Albano do Prado Franco, premido pelas dificuldades das finanças do Estado, agravadas pelas promessas de campanha, ofereceu o Plano de Demissões Voluntárias, terceirizou serviços, renegociou a dívida com a União, assinando protocolo de Acordo, e evitou a intervenção no Banco do Estado de Sergipe com recursos obtidos pela privatização da Energipe.

No Plano político, de acordo com Dantas (2004), obteve maioria na Assembléia Legislativa e conseguiu alianças políticas que o ajudaram a derrotar dois ex-governadores nas eleições de 1998. Gozou de influência junto do Judiciário, fazendo com que a atuação deste para o avanço da democracia ficasse aquém do esperado, o que resultou em pouco empenho na apuração de denúncia contra autoridades influentes.

No plano educacional, implementou o Programa de Qualificação Docente em parceria com a Universidade Federal de Sergipe, e diminuiu o índice de reprovação, embora o tenha conseguido por meio da redução da média mínima de 5,00 para 4,1.

Enquanto no panorama nacional se vivia uma a fase final de elaboração e aprovação da nova LDB, destaca-se uma grande quantidade de programas, planos e projetos no âmbito da educação do sistema estadual. A Educação Especial aparece contemplada, desde os programas mais abrangentes até em projetos específicos, e aparece um plano aparentemente inédito da Secretaria de Educação para a Secretaria de Educação Especial que foi submetido a SEESP/MEC, cuja proposta básica envolvia estabelecer convênio com o CELAEE (Centro de Educação Latino-Americano de Educação Especial) de Cuba, para implantar três centros de referências em Educação Especial no âmbito do Estado, a saber: "Centro de Referência das Classes Especiais", "Centro de Educação Especial João Cardoso Nascimento Junior", e o "Centro de Referência em Educação Especial do Estado de Sergipe".

Os programas e projetos encontrados para a área de Educação Especial, evidenciam que as propostas de ações no âmbito do Estado pareciam distantes das garantias legais da Constituição Federal de 1988 que explicitava que a escolarização deveria ocorrer preferencialmente no ensino regular, e alheia ao debate todo que antecedeu a aprovação da que seria a nova LDB, e que iria reforçar no âmbito legal a perspectiva política da inclusão escolar. Os documentos evidenciam que as propostas pareciam visar à descentralização das ações da capital para as demais regiões, com a mediação dos chamados "centros de referências", mas mantendo o modelo de escolarização existente, baseado nas classes especiais nas escolas estaduais e escolas especiais privadas. Pelas propostas específicas evidencia-se ainda que o atendimento era pautado numa abordagem assistencialista e clínica, com a preocupação com o diagnóstico para classificação e ênfase na assistência e não necessariamente na educação.

Em 1996, o governo concretiza a implantação do "Centro de Referência em Educação Especial do Estado de Sergipe" (CREESE), resultante de convênio com o CELAEE de Cuba, e no projeto original o CREESE é apresentado como órgão articulador e executor de todas as ações pertinentes à educação especial no estado, numa função que claramente coincidente com a do DIEESP.

Com relação ao ensino especial observou-se uma expansão da rede física em termos de número de escolas, com a quase que a duplicação de escolas (de 11 para 20) com serviços de ensino especial. Observa-se ainda pela primeira vez ao registro de escolas municipais (2) com oferta de serviços de ensino especial. Entretanto, a despeito do crescimento da rede física houve uma grande diminuição no número de matrículas de alunos da Educação Especial em toda a rede, de 731 matrículas em 1994 para 494 em 1998 (decréscimo de 237%). Destas, 385 (78%) estavam na rede pública e 109 (22%) nas instituições privadas. Novamente se observa neste período um grande investimento na capacitação de professores com recursos oriundos do MEC.

GOVERNO ALBANO PIMENTEL DO PRADO FRANCO

Com a reeleição de Albano Franco, configurou-se um quadro político carente de alternância no poder, pois grupos conservadores continuaram a controlar o executivo do Estado de Sergipe. O governo Albano do Prado Franco, na sua segunda administração, iniciou-se em 1º de janeiro de 1999 e encerrou-se em 31 de dezembro de 2002, embora esta análise tenha se encerrado em 2001, ou seja, um ano antes do término desta gestão.

Em relação aos planos, programas e projetos, constatou-se, como no governo anterior, a ocorrência de uma aparente hiperformulação de propostas com o intuito provável de ampliar a captação de recursos financeiros para o estado, que seriam provenientes do governo federal e organismos internacionais. Novamente percebe-se que a área de Educação Especial parece ter sido bastante contemplada tantos nos planos e programas mais gerais do estado quanto nos específicos da área de educação. As propostas específicas da área passam a ser encaminhadas para captar recursos via FNDE, e no período aparecem voltados para preocupações tais como a alfabetização de jovens e adultos, a necessidade de municipalização e a capacitação de professores via Educação à Distância.

No Plano de Trabalho Anual 1999, aparece pela primeira vez a referência à filosofia de inclusão escolar, embora a questão seja superficialmente tratada. De modo geral, percebe-se que os documentos não parecem avançar quanto à definição das implicações dos pressupostos da inclusão escolar para o sistema educacional do estado.

Em dezembro de 2000, o Conselho Estadual de Educação aprovou a Resolução nº 119/2000, em 21 de dezembro de 2000, que estabeleceu as normas para a educação especial no Sistema Estadual de Ensino. A princípio percebe-se que a resolução, quando especifica que a educação dessa parcela da população deve ser oferecida preferencialmente na rede regular, mas acrescenta os termos "pública ou privada de ensino", está dificultando o pleno cumprimento do que está disposto na Constituição Federal. No conjunto, apesar de reforçar o princípio de que as crianças e jovens com necessidades educacionais especiais devam ser educadas preferencialmente no ensino regular, há dispositivos que favorecem a manutenção do sistema paralelo de serviços porque garante explicitamente as várias possibilidades de colocação (tais como classes comuns, classes de recursos, classes e escolas especiais).

Uma outra iniciativa legal a ser destacada nesta gestão foi a aprovação do Projeto de Lei nº 09/01, em novembro de 2001, que dispunha sobre a Constituição do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiências – CEDPD, um órgão colegiado, de caráter deliberativo, consultivo e fiscalizador das ações políticas voltadas a promover a assistência ao portador de deficiência, programas da área social desenvolvidos pelo governo do estado, vinculado à Secretaria de Estado da Ação Social e do Trabalho.

Quanto à evolução dos indicadores da Educação Especial neste período observou-se o maior índice de crescimento já registrado, comparando-se todas as gestões, indicando que dobrou o número de escolas e triplicou o número de alunos entre 1999 a 2001. O aumento de escolas ocorreu principalmente nas redes municipal e estadual, e em menor escala na rede privada, enquanto que no tocante às matrículas, o maior aumento foi na rede privada, e em menor escala pelas redes estadual e municipal. Entretanto, a despeito do crescimento observado, a proporção de alunos com necessidades educacionais especiais na população total do ensino básico continuou sendo ínfima.

No tocante à formação de recursos humanos, observa-se que a área de educação especial foi contemplada com vários programas de atualização, destacando-se ainda o início de outras modalidades de formação continuada tais como o ensino à distância e a capacitação em serviço, e o fato de que pelo menos um dos cursos foi destinado para professores regulares das séries iniciais do ensino fundamental.

Os índices do sistema educacional público do estado para o ano de 1995, estavam situados em 30% de repetência e 21% de evasão. Em 2001, tais índices foram de, respectivamente 25,1% e 13,37%, sendo mais elevados nas redes públicas municipal e estadual (28,9% e 24,5%, respectivamente). No ensino médio, os índices de repetência e evasão situaram-se em 12,3% e 16,9% (SINES/SEED, 2002).

Comparando-se os dados do IBGE sobre o perfil da população escolarizável constata-se que em 1980 havia 637.202 habitantes demandantes por escola (58,2% do total). A população escolarizável, por sua vez, em 2000, passou para 791.708 (44,4%). No último período de governo estudado, no ano de 2000, o sistema de ensino de todo o estado absorvia 579.921 (73,2%), sendo que a rede pública foi responsável pela oferta de 521.014 matrículas (89,8%).

No campo das pessoas portadoras de deficiência o número de matrículas passou de 494 para 1715 (acréscimo de 247%), sendo 775 (45%) na rede pública e 940 (55%) na rede privada. O Censo 2000 revelou a existência de 300.583 (16,5%) pessoas que apresentavam algum tipo de deficiência. Considerando-se apenas as informações referentes àquelas pessoas que estão incluídas nas categorias de deficiências (Censo/IBGE,2000), na faixa de idade situada entre 0 e 19 anos, a população na faixa de idade escolarizável do estado seria de 58.088 (19,3%), sendo quem em 2001, destes apenas 1.715 (3%) eram assistidos pelo sistema educacional. Este número foi extremamente inferior ao de 1981, que ficou em 19%. No caso das escolas públicas estaduais e municipais, os números são ainda menos expressivos, pois ficaram próximos a 1%.

Comparando-se ainda o primeiro e último governo abrangido pelo nosso estudo, (1979 e 2001) constata-se também que a população estimada total teve uma taxa de um crescimento de 66,7% (passou de 1.072.800 para 1.824.432 habitantes), enquanto que a oferta de oportunidades educacionais no sistema de ensino passou de 269.767 para 600.125 matrículas, portanto, uma expansão de 122,4%. Entretanto, todos os relatórios de governo indicavam um grande número de crianças e jovens fora do sistema de ensino.

No campo da educação especial, dados divulgados pelo MEC/INEP apontavam que, em 2001, havia 196 professores atuando nesta área, sendo 109 com curso específico e 87 sem curso específico. Com relação aos professores com curso específico, 73,4% estavam na rede pública e 26,6% na particular. Esta situação se invertia quando se considerava a formação não específica, estando 54% na rede particular e 46% na rede pública.

CONCLUSÕES

O período temporal do presente estudo compreendeu 22 anos (1979/2001), e exigiu um exercício de idas e vindas na historiografia da educação de Sergipe. A opção pela pesquisa bibliográfica se mostrou um método adequado para retratar a história e contribuiu para compor o cenário educacional que se apresenta no Sergipe atual. Entretanto, há que se ressaltar as dificuldades encontradas, decorrentes do fato de que o estado cuida muito pouco de preservar os documentos que contam sua história.

O estudo inicia-se em 1979 e se prolonga pela década de 80 , que foi um período de instabilidade econômica, no qual que o país se submeteu aos planos de estabilização e ajustes estruturais prescritos pelos países credores às nações devedoras, a um elevado custo social. Estes ajustes, segundo Silva (2002), se assentavam nas políticas de liberalização, desregulamentação e de privatização, e tinham a finalidade de tornar o capital financeiro mais livre para auferir lucros no plano internacional, marcando o desaparecimento da economia nacional voltada para o mercado doméstico.

Assim, foi por meio da fragilização estrutural dos países do terceiro mundo, entre eles o Brasil, que foram criadas as condições para implementação das políticas intervencionistas de organismos internacionais como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, nos anos 1980 e 1990. Tais políticas, contando sempre com o consentimento do governo federal, tiveram repercussões sobre a educação básicas pública, representadas pela preconização da privatização progressiva deste direito. De acordo com Neves (2000), tal concepção dos organismos interventores, claramente se distanciava das propostas da sociedade civil e entidades organizadas e se aproximavam dos interesses dos empresários nacionais da educação, os quais viam nela a oportunidade de lucros na exploração do que denominavam serviços educacionais.

Segundo Lobo (2002), nos anos 80 a educação se tornaria um meio para a equalização social, sendo os programas compensatórios para a área educacional, previstos no III Plano Setorial de Educação - III PSECD - cujas diretrizes não foram executadas, em decorrência da falta de verbas. Segundo esta autora, grande parte dos recursos era repassada para as escolas particulares e empresas privadas, reduzindo o investimento do setor público.

A segunda metade dos anos 80 foi marcada pelas discussões dos direitos sociais, em diversas esferas, inclusive na Constituinte, e o país começa a viver seu processo de redemocratização. A despeito de todas as mudanças observadas no país ao longo do período do estudo, de acordo com relatos de alguns documentos coletados que refletem análise de literatura sobre a questão educacional do país, prevalece ainda um alto índice de analfabetismo, de evasão e repetência, que tem sido os grandes entraves para a escolaridade plena. Por outro lado, não se pode relevar o fato de que o próprio modelo de desenvolvimento capitalista não tem isto como perspectiva, pois assim como estabelece para o campo do trabalho, onde o pleno emprego contraria totalmente os princípios capitalistas, para o sistema educacional a escolaridade deve ser também parcial e seletiva.

Um aspecto bastante negativo para o setor educacional evidenciado neste estudo, tem sido o trato político dado às secretarias de educação. Nos diversos períodos ficou claro a falta de compromisso para com a educação no estado, expressa pelas barganhas realizadas entre as elites políticas para ocupação da pasta da educação, de forma a favorecer o clientelismo e a conservação do poder político. Este palco de tensões e disputas, parece favorecer a alta rotatividade de secretários, sendo as mudanças sempre encaminhadas de maneira a atender acomodações de aliados políticos, o que pode ter imposto sérias limitações à efetividade das políticas neste setor.

Segundo Ferreira e Glat (2003), as referências à educação escolar de alunos com necessidades educacionais especiais são fenômeno relativamente recente em nossas leis e políticas educacionais, e foi a partir da segunda metade da década de 60 que começou a circular a idéia de uma Educação Especial escolar integrada aos sistemas regulares de ensino, no contexto de expansão do acesso ao ensino primário, e seu desenvolvimento deu-se de forma integrada com as diferentes políticas compensatórias dirigidas para as crianças pobres e com o quadro de crescente fracasso escolar da escolarização inicial.

Em 1973 foi criado o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), no Ministério da Educação e Cultura, como órgão responsável pela formulação e acompanhamento de uma política nacional de Educação Especial, sendo que a partir de então começaram a ser criados setores especializados nas secretarias de educação e a serem oferecidos regularmente cursos de formação de professores especialistas que institucionalizaria a Educação Especial em nível nacional ao longo da década de 70 (Ferreira e Glat, 2003).

No presente estudo documentos da gestão de 1975-1979 indicam que pelo menos desde 1975 o CENESP/MEC já enviava auxílio financeiro ao estado para financiar bolsas de estudos para os alunos, financiar instituições especializadas filantrópicas e capacitar recursos humanos. Em 1977 começariam a ser criadas as primeiras classes especiais nas escolas públicas estaduais e em 1979 seria criado o setor especializado no âmbito da secretaria estadual de educação, que foi denominado como Gerencia de Educação Especial, que seria responsável pela implementação da qualificação dos recursos humanos.

Alinhado às tendências mundiais o CENESP preconizava uma política baseada no princípio de normalização e integração que partia do pressuposto de que pessoas com deficiência tinham direito de usufruir as mesmas condições de vida consideradas comuns, devendo sua educação e reabilitação acontecer em ambientes menos segregados possíveis. Na prática, no âmbito do estado a filosofia de normalização e integração implicou na criação de classes especiais nas escolas estaduais.

Assim, as diretrizes da política de educação especial no âmbito do estado durante a década de 80, pareciam seguir as diretrizes da política nacional, também porque o governo federal era a única fonte de financiamento para este fim. Enquanto que na Educação Regular a política do estado visava à municipalização e ampliação do acesso, principalmente no âmbito do nível pré-escolar, na educação especial havia o incentivo à privatização, à implantação de classes especiais nas escolas públicas e o enfoque na capacitação de recursos humanos. Tal política foi mantida independente das oscilações negativas dos indicadores da rede física e das matrículas no ensino especial que ocorreriam na segunda metade da década de 80.

No ano de 1986, em que o CENESP seria redimensionado e se transformaria na Secretaria de Educação Especial –SESPE, e no qual seria criada a Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, no âmbito do estado aconteceu uma diminuição de ¼ das matrículas de alunos e de ½ das escolas com serviços de ensino especial. Surgem evidências, a partir da criação da SESPE, de novas linhas de financiamento para a Educação Especial do estado, agora voltadas para reformas e adaptações na rede física, aquisição de material de consumo e de equipamentos necessários para beneficiar alunos portadores de deficiência, ao lado da já tradicional meta de capacitação de recursos humanos.

Na Constituição Federal de 1988, seriam aprovados vários dispositivos referentes aos direitos das pessoas com deficiência. Em 1990, no ano em que a SESPE foi extinta e a Secretaria Nacional de Educação Básica assumiria a responsabilidade pela implementação da política de educação especial no âmbito nacional, no estado de Sergipe, seria criado o "Centro de Educação Especial Prof. João Cardoso Nascimento Júnior",como órgão estadual com função de planejamento, coordenação e incentivo às ações governamentais direcionadas às pessoas com necessidades educacionais especiais, que assumiria as funções da antiga Gerência de Educação Especial.

A despeito das mudanças observadas, os dados sobre a educação especial no estado indicariam decréscimo no índice de evolução do quadro docente tanto nas escolas regulares quanto nas instituições especializadas e redução no número de matrículas no término da gestão do governo entre 1987-1991.

Na gestão entre 1992-1996 os documentos evidenciam que os recursos para o financiamento da educação especial no estado seriam oriundos da CORDE (Coordenação Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência), e destinados para a melhoria das instalações físicas das unidades que realizavam atendimento para as pessoas deficientes. Apesar da recriação no MEC da Secretaria de Educação Especial (rebatizada como SEESP) no ano de 1992, não foram encontradas referências à atuação deste órgão nos documentos encontrados. Neste período haveria uma pequena evolução das matrículas de alunos especiais em todo o estado.

Ferreira e Glat (2003) apontam que o cenário pós-LDB induziu a crescente transferência de responsabilidades da União e estados para os municípios, no processo de desconcentração iniciado a partir da Constituição e que atingiu não só a educação, mas outras políticas sociais (saúde, assistência). A Emenda Constitucional (EC) nº 14/96, definiu de modo mais preciso as responsabilidades orçamentárias com relação à Educação Básica da União (função redistributiva e supletiva), Estados (Ensinos Fundamental e Médio) e Municípios (Educação Infantil e Ensino Fundamental). Posteriormente, a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), regulamentado pela Lei 9.424/96, ao qual coube o papel determinante de vincular 60% do orçamento da educação para o Ensino Fundamental, ajudou a induzir a municipalização desse nível de ensino.

Provavelmente em decorrência das mudanças legais que alteraram o sistema de financiamento da educação observa-se neste período a maior taxa de crescimento dos indicadores da rede física, no número de matrículas e de funções docentes, tanto na Educação Regular quanto na Especial. Observa-se também pela primeira vez o registro documental de escolas municipais com oferta de serviços de ensino especial.

Os documentos deste período que fazem referência à Educação Especial, evidenciam que as propostas de ações no âmbito do Estado se distanciavam das discussões sobre a política de inclusão escolar que ocorreu no país principalmente na segunda metade da década de 90. Sergipe planejava um modelo de serviços baseado na idéia de "centros de referências", mas mantendo o modelo de escolarização existente, que eram as classes especiais nas escolas estaduais e escolas especiais privadas. Pelas propostas específicas evidencia-se ainda que o atendimento era pautado numa abordagem assistencialista e clínica, com a preocupação com o diagnóstico para classificação e ênfase na assistência e não necessariamente na educação.

Neste período é criada a CORDE/SE, e no campo da educação especial é criado em 1996 o "Centro de Referência em Educação Especial do Estado de Sergipe" (CREESE), e a Divisão de Ensino Especial o DIEESP. Em 1998, destaca-se ainda o encaminhamento da minuta de Lei, que dispunha sobre a criação do Conselho Estadual de Acompanhamento e Controle do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (CONDEVAM).

Assim, apesar das iniciativas políticas observadas na Década de 90, tais como a LDB, em nível nacional, e como a criação do CREESE, no caso específico de Sergipe, que poderiam promover a melhoria da atenção para com este segmento da população, tal pretensão não se configurou na prática, apesar das boas intenções legais e dos esforços daquele centro de referência.

Revive-se aqui a mesma situação apontada por Nunes (1999) com relação a LDB/61 e a Lei nº 5692/71, em que as pretensões legais não foram suficientes para alterar decisivamente os rumos da educação nacional, descoladas que foram de elementos estruturais essenciais presentes nas relações sociais para a materialização de qualquer transformação significativa.

No caso dos textos legais do estado, coletados em nosso estudo, propostos e aprovados com fartura na década de 90, tendo com referência a legislação nacional, representaram avanços para as pessoas portadoras de deficiência, mas que por contrariarem interesses localizados, na sociedade, enfrentaram e enfrentam dificuldades para serem colocados em prática.

Usufruir os direitos legais representa, na maioria das vezes, um desgaste adicional para este segmento da população, o que pode ser atestado por diversas ações interpostas por entidades representativas destas pessoas junto às instâncias do judiciário.

No caso do CREESE, cuja criação teve aparentemente uma repercussão positiva para as pessoas portadoras de deficiência, tal a intensa ação deste centro atestada pelos projetos identificados, há um ponto interessante a ser destacado. Trata-se de um projeto cujo embasamento teórico, explicitado em documentos já no nascedouro daquela unidade, e que orientam sua ação, é marcado por princípios políticos totalmente opostos aos do nosso país e do estado de Sergipe, pois recebeu assessoria de profissionais cubanos. Isto no mínimo coloca em cheque a concepção de educação encampada pelo CREESE, pois tenta ajustar e acomodar no âmbito de suas ações princípios políticos antagônicos.

Um outro ponto a ser considerado é o fato de que a Educação Especial de Sergipe recebeu ao longo dos 22 anos do período estudado financiamento regular do MEC para atividades de capacitação que muito provavelmente beneficiou mais os professores do ensino regular do que do ensino especial.

Adicionalmente, o fato de que os financiamentos para os projetos do estado na área de Educação Especial continuaram a ser religiosamente liberados, a despeito da falta de mudanças mais positivas nos indicadores, ou da inconsistência de princípios filosóficos entre as ações da secretaria educacional e do ministério da educação, coloca em xeque as próprias diretrizes políticas anunciadas pelo Ministério da Educação para a área ao longo dos últimos 20 anos. Em que pese a necessidade de respeitar o contexto local e de se preservar as especificidades dos diferentes estados e regiões, seria preciso assumir um mínimo de uniformidade, para se obter uma política setorial mais efetiva.

Bergo (2000) ao analisar a situação da Educação Especial no estado de Sergipe, aponta primeiramente que há uma carência grande de professores nas escolas, que em grande parte é suprida pela contratação de estudantes universitários que funcionam como professores substitutos, que não têm o devido apoio para atuar na área. Em relação à política do estado, a autora aponta que:

mantendo um centro de referência inspirado no modelo cubano de suporte às deficiências, não inclui quando devolve apenas alguns alunos ao ensino regular sem dar o devido suporte e acompanhamento ao professor que irá receber a crianças. (Bergo, 2000, p.27)

Em relação aos programas de formação de recursos humanos o presente estudo produziu evidências que corroboram a conclusão de Bergo (2000) que aponta no âmbito de Sergipe:

grandes somas foram investidas em cursos para auditórios imensos e cheios de professores que mal entendem o sotaque de profissionais esforçados que expõem métodos que são pouco compreendidos. (Bergo, 2000, p.28)

Um outro ponto que tem contribuído decisivamente para a desqualificação da escola pública é a disputa por recursos públicos pelos empresários da educação, através dos seus representantes nas câmaras, assembléias e conselhos estaduais. Por este mecanismo, de acordo com Cunha (2001), as escolas privadas têm sobrevivido graças à intervenção governamental por meio de subsídios em detrimento da cobertura da escola pública.

No caso da educação especial em Sergipe, os dados apontam claramente o predomínio da área privada sobre a pública de forma que as pretensões da escola inclusiva preconizada pelas deliberações de Jomtien, caminham lentamente. Por outro lado, seria ingenuidade política esperar que a escola pública pudesse realizar transformações que convergissem para a permanência da criança em uma escola de qualidade, universal e gratuita, extinguindo a repetência e a evasão; para o reconhecimento do trabalho pedagógico na formação de um povo autônomo, livre e feliz.

Tal escola só é possível em uma sociedade onde as relações sociais sejam mais de cooperação do que competição; onde os homens não estejam embrutecidos pela miséria e pela indignidade; onde o trabalho seja libertador e não alienante; onde a riqueza produzida esteja ao alcance de todos e não de uma minoria que detém o poder econômico e político.

Aí, centra-se o papel da escola e dos profissionais da educação, os quais devem reconhecer-se como classe trabalhadora, contribuindo para desmistificar as relações sociais, utilizando seu objeto de trabalho que é o conhecimento, para combater a pobreza política, responsável pelo quadro de acomodação e aceitação dos despossuídos.

Esta é a tarefa reservada aos intelectuais pela tese gramsciana, na direção da contra hegemonia, que se contraponha aos valores dominantes das elites na sociedade civil, reservando ao Estado não mais o papel de estrutura coercitiva a serviço da classe dominante, mas como elemento de satisfação das demandas sociais.

Desta forma é possível a construção de uma escola verdadeiramente democrática, cuja qualidade se refletirá na educação especial, transformando-a de depositária dos problemas originados na educação regular em educação de qualidade e não segregadora das pessoas portadoras de deficiência.

Recebido em 09/02/2007

Reformulado em 30/04/2007

Aprovado em 30/04/2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Ago 2007
  • Data do Fascículo
    Abr 2007

Histórico

  • Recebido
    09 Fev 2007
  • Revisado
    30 Abr 2007
  • Aceito
    30 Abr 2007
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