Acessibilidade / Reportar erro

Percurso desenvolvimental dos portadores da perturbação de hiperatividade com déficit de atenção

Course of development of attention deficit hyperactivity disorder

Resumos

A Perturbação de Hiperatividade com Déficit de Atenção (PHDA) constitui uma perturbação com características desenvolvimentais de caráter crônico, que embora seja atenuada com o decorrer da idade, nomeadamente na sua componente hipercinética e impulsiva, a continuidade da presença de sintomatologia de desatenção afeta as capacidades de resposta ao meio ao longo de todo o ciclo vital. Estudos efetuados recentemente têm vindo a demonstrar que entre 50 e 80% dos sujeitos que manifestaram PHDA durante a infância, experimentam ainda dificuldades significativas relacionadas com esta perturbação durante a fase adulta. Desta forma, o presente artigo tem como objetivo apresentar o percurso desenvolvimental dos portadores desta perturbação, desde a primeira e segunda infância até à vida adulta, demonstrando como esta perturbação tem implicações cognitivas, emocionais e sociais e relevantes ao longo de todo o ciclo vital.

Educação Especial; perturbação de hiperatividade com déficit de atenção (PHDA); impulsividade; hiperatividade


The Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD) is a disorder with a chronic developmental nature. Although it attenuates with age, particularly its hyperkinetic and impulsive aspects, the continuous presence of attention deficit symptoms affects the capacity of responding to environmental stimuli throughout life. Recent studies have shown that between 50 and 80 per cent of subjects who revealed ADHD in their childhood, have experienced significant difficulties connected with this disorder in their adulthood. Thus, the present article aims to present the developmental course of subjects with ADHD, from infancy to adulthood, to demonstrate that this disorder significantly affects not only the first years but the whole life cycle.

Special Education; Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD); Impulsivity; hyperactivity


REVISÃO DA LITERATURA

Percurso desenvolvimental dos portadores da perturbação de hiperatividade com déficit de atenção

Course of development of attention deficit hyperactivity disorder

Joaquim Ramalho

Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Fernando Pessoa. Porto – Portugal. ramalho@ufp.edu.pt

RESUMO

A Perturbação de Hiperatividade com Déficit de Atenção (PHDA) constitui uma perturbação com características desenvolvimentais de caráter crônico, que embora seja atenuada com o decorrer da idade, nomeadamente na sua componente hipercinética e impulsiva, a continuidade da presença de sintomatologia de desatenção afeta as capacidades de resposta ao meio ao longo de todo o ciclo vital. Estudos efetuados recentemente têm vindo a demonstrar que entre 50 e 80% dos sujeitos que manifestaram PHDA durante a infância, experimentam ainda dificuldades significativas relacionadas com esta perturbação durante a fase adulta. Desta forma, o presente artigo tem como objetivo apresentar o percurso desenvolvimental dos portadores desta perturbação, desde a primeira e segunda infância até à vida adulta, demonstrando como esta perturbação tem implicações cognitivas, emocionais e sociais e relevantes ao longo de todo o ciclo vital.

Palavras-chave: Educação Especial, perturbação de hiperatividade com déficit de atenção (PHDA), impulsividade, hiperatividade.

ABSTRACT

The Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD) is a disorder with a chronic developmental nature. Although it attenuates with age, particularly its hyperkinetic and impulsive aspects, the continuous presence of attention deficit symptoms affects the capacity of responding to environmental stimuli throughout life. Recent studies have shown that between 50 and 80 per cent of subjects who revealed ADHD in their childhood, have experienced significant difficulties connected with this disorder in their adulthood. Thus, the present article aims to present the developmental course of subjects with ADHD, from infancy to adulthood, to demonstrate that this disorder significantly affects not only the first years but the whole life cycle.

Keywords: Special Education, Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD), Impulsivity, hyperactivity.

INTRODUÇÃO

A Perturbação de Hiperatividade com Déficit de Atenção (PHDA), pela sua natureza crônica, corresponde a uma séria problemática, devido às implicações que lhe estão associadas, nomeadamente a nível cognitivo, familiar e social, já que os comportamentos destes são caracterizados por fortes componentes de impulsividade, de desatenção e de atividade motora excessiva, que acabam por ter uma enorme repercussão em termos acadêmicos e de relacionamento interpessoal.

Estes aspectos têm legado na PHDA uma importância nunca antes sentida pela família, pela escola e pela sociedade, mas também por parte dos investigadores, passando a ser considerada como um problema com um focus de análise multidisciplinar.

Uma das primeiras referências às perturbações da atenção data de finais do séc. XIX, quando o investigador Ribot, em 1889 (BARKLEY, 1982), mencionou que são classificados de distraídos aqueles sujeitos cuja inteligência é incapaz de se centrar de uma forma estável passando incessantemente de uma ideia para outra. Refere o autor que também se aplica a casos em que os sujeitos manifestam escassa atenção em relação a acontecimentos externos.

Uma outra relevante referência surge em 1902, quando o investigador Still descreveu um grupo de 20 crianças com diversos graus de agressividade, de hostilidade, de conduta desafiante, de desatenção e de Hiperatividade (HERREROS et al. 2002), com o objetivo de conceptualizar e validar uma síndrome que possa agrupar este conjunto de sintomas (PEÑA; MONTIEL-NAVA, 2003).

As aproximações científicas ao tema da PHDA, durante os anos 30 e 40 do século XX, derivadas das investigações de caráter essencialmente bioquímico, começaram por designar esta por Disfunção Cerebral Mínima, que designa uma perturbação no desenvolvimento do cérebro infantil, na qual as associações neuronais, responsáveis por determinadas funções, não maturam de acordo com a idade da criança, estabelecendo conexões entre si, apenas de uma forma descontinuada e insatisfatória (VECIANA, 2002). Estes estudos partiam do princípio de que existe uma disfunção cerebral que está na gênese de determinados efeitos podem originar perturbações psíquicas, mais especificamente atividade motora excessiva, ansiedade, impulsividade ou falta de atenção.

Posteriormente, as aproximações à PHDA passaram particularmente a incidir sobre a tipologia comportamental de atividade motora excessiva, a qual era vista como o traço característico do sujeito, que ocorria em qualquer circunstância e com uma significatividade acentuada (BARKLEY, 1982; BLÁZQUEZ-ALMERÍA et al., 2005; PEÑA; MONTIEL-NAVA, 2003).

Nos finais dos anos 70 e inícios dos anos 80 surgem os manuais de diagnóstico e de classificação, como sejam o DSM-II (1968), a CIE-9 (1978) com o intuito de tornar a denominação consensual, como reação hipercinética da infância, para o DSM-II (1968) e como síndrome hipercinético da infância para a CIE-9 (1978), começando também a ser desenvolvidos os primeiros modelos explicativos da referida perturbação (HERREROS et al., 2002).

No decorrer da década de 80, surge, através do autor Barkley (1982), uma nova visão da PHDA. Trata-se de uma alternativa ao modelo atencional, que na sua primeira época, se baseia fundamentalmente no fenômeno da desinibição comportamental, apoiado nos trabalhos realizados por Skinner. Como consequência deste fato, no início dos anos 90, começam a ser valorizados não só os aspectos biológicos e comportamentais, mas também os aspectos mais cognitivos, nomeadamente o déficit de atenção.

Atualmente, a definição e a configuração da PHDA estão envoltas em alguma discussão. As diferentes classificações de diagnóstico como sejam a CIE-10 (1992), da Organização Mundial de Saúde, ou o DSM-IV (1996) e o DSM-IV-TR (2002), da Associação Americana de Psiquiatria, diferem na sintomatologia e diferem também no valor que os sintomas apresentam na altura de estabelecer um diagnóstico. O DSM-IV (1996) e o DSM-IV-TR (2002) consideram que os principais sintomas são o déficit de atenção, a Hiperatividade e a impulsividade, enquanto que a CIE-10 ratifica unicamente os dois primeiros sintomas. Esta conjuntura contribui, naturalmente, para que exista certa ambiguidade e desordem no modo de realizar um diagnóstico apropriado.

Segundo Associação Americana de Psiquiatria (2002) a PHDA é uma perturbação que ocorre habitualmente na primeira e na segunda infância ou na adolescência e está inserida no quadro de perturbações disruptivas do comportamento e de déficit de atenção.

A PHDA compreende três subtipos distintos, que são: (1) PHDA, Tipo Misto (PHDA-M) onde a agitação psicomotora e o déficit de atenção estão presentes e ambos são significativos (CARDO; SERVERA-BARCELÓ, 2005; SELL-SALAZAR, 2003; VAN-WIELINK, 2005); (2) PHDA, Tipo Hiperativo-Impulsivo (PHDA-HI), onde são relevantes a Hiperatividade e a impulsividade; (3) PHDA, Tipo Desatento (PHDA-D), no qual predomina a desatenção, em que estas crianças são referidas essencialmente como distraídas (VAN-WIELINK, 2005) e onde a Hiperatividade não é significativa (DOYLE et al. 2001; SELL-SALAZAR, 2003). A estes subtipos, estão associadas, entre outras, determinadas problemáticas de cariz comportamental (desatenção, déficit de autocontrole e inquietação), social (dificuldades de relacionamento interpessoal), cognitivo (dificuldades de seleção e manutenção da codificação de estímulos), acadêmica (baixo rendimento escolar, problemas de comportamento), emocional (baixa autoestima, baixa tolerância à frustração, alterações de humor) e físicas (alergias, alterações do sono, baixa coordenação motora). (MARTINEZ, 2004).

Embora o diagnóstico da PHDA resulte, por vezes, em características difíceis de reconhecer, existe consenso científico quando se fala da sua prevalência, situando-a, na população escolar, entre os 3% e os 5% (ARTIGAS-PALLARÉS, 2003; CAPILLA-GONZÁLEZ et al., 2005; CARDO; SERVERA-BARCELÓ, 2005; MAYNARD; TYLER; ARNOLD, 1999; VECIANA, 2002).

Segundo Van-Wielink (2005), os estudos realizados em diversas comunidades indicam que existem cerca de 17 casos com PHDA em cada 100 crianças. Os alunos que estão em idade escolar apresentam uma frequência de 5 a 9 por cada 100 crianças (HERREROS et al., 2002; MAYNARD; TYLER; ARNOLD, 1999; VAN-WIELINK, 2005). Para os autores Cardo e Severa-Barceló (2005) utilizando os critérios de diagnóstico do DSM-IV, a maioria dos autores estima uma prevalência global da PHDA, nas suas diversas formas, de 3 a 7%, existindo, no entanto, uma margem de variabilidade em função da idade, do sexo, do meio sociocultural ou dos subtipos.

A respeito das diferenças entre gênero, embora exista alguma discrepância (CORNEJO et al., 2005), existe coincidência quanto ao fato de ela apresentar maior prevalência nos sujeitos do sexo masculino do que nos do sexo feminino (CARDO; SERVERA-BARCELÓ, 2005). Segundo Van-Wielink (2005), existe uma percentagem de 5:1, estando dependente da população que é estudada, podendo essa percentagem ir de 10:1, em investigações realizadas em clínicas privadas, ou em 3:1 em estudos realizados abertos e baseados na comunidade em geral.

Segundo Brown (2003) e García-Ogueta (2001), os fatores que explicam esta diferença entre os sexos devem-se a fatores como a aplicação desigual dos critérios diagnósticos habitualmente utilizados, as razões educativas e culturais e também as diferenças ao nível das características físicas, mas de igual forma se descobriu recentemente (VAN-WIELINK, 2005) que a PHDA existe em todas as populações estudadas, sendo estas muito diferenciadas ao nível da área geográfica ou estrato econômico-social.

Em relação à idade, a maioria dos estudos revela que a prevalência é maior em idades inferiores estimando-se que em 75% dos casos se verifica antes dos 5 anos (VAQUERIZO-MADRID, 2005) ou entre os 6 e os 9 anos (CARDO; SERVERA-BARCELÓ, 2005). Segundo Kooij (2009) cerca de 2 em cada 10 adultos manifesta PHDA.

PERCURSO DESENVOLVIMENTAL DOS PORTADORES DA PHDA

Apesar de alguns dos estudos longitudinais realizados terem vindo a procurar demonstrar que embora a sintomatologia da PHDA venha, tendencialmente, a diminuir com o avançar da idade, este tipo de perturbação tem vindo a receber um caráter particularmente crônico (MIRANDA-CASAS et al., 2000). Segundo Kooij (2009), a PHDA é uma perturbação de origem seguramente pré-natal, que se manifesta cedo, tipicamente no início da idade escolar e cujas consequências se prolongam, quase sempre, por toda a vida.

Estudos recentemente efetuados têm vindo a demonstrar que entre 50 e 80% dos sujeitos que manifestaram PHDA durante a infância, experimentam ainda dificuldades significativas relacionadas com esta perturbação durante a fase adulta (CARDO; SERVERA-BARCELÓ, 2005; VAQUERIZO-MADRID, 2005). Desta forma, procura-se, de seguida, apresentar o percurso desenvolvimental dos sujeitos com PHDA desde a primeira infância até à vida adulta, demonstrando como esta perturbação tem implicações cognitivas, emocionais e sociais e relevantes ao longo de todo o ciclo vital.

Primeira infância

Segundo Vaquerizo-Madrid (2005), em cerca de 75% dos casos, a PHDA é produzida e demonstrada antes dos 3 ou 4 anos de idade. A informação oferecida por histórias clínicas, indica que uma significativa percentagem destes sujeitos fora bebês com enormes dificuldades em realizar novas adaptações, criando contínuas resistências a tudo que alterava a rotina diária.

Segundo Miranda-Casas, Luz e Fernández (2001), os pais recordam estes bebês como reagindo de um modo despropositado perante os estímulos do meio, como sendo irritáveis, com uma necessidade de atenção contínua, com uma excessiva atividade psicomotora e com uma baixa tolerância à frustração.

Outros autores consideram que estes bebês manifestam dificuldades nos padrões do sono (BETANCOURT-JIMÉNEZ; JIMÉNEZ-LEÓN; JIMÉNEZ-BETANCOURT, 2006) e na alimentação (GARCÍA-OGUETA, 2001). Estes bebês dormem, comprovadamente, menos do que os bebês com a mesma idade, tendo noites bastante instáveis, com choro e gritos frequentes, manifestando também padrões irregulares de respiração e de batimentos cardíacos na fase REM. No que respeita à alimentação, são relatados bastantes casos de bebês com dificuldades de transição e adaptação aos alimentos sólidos depois do abandono do biberão, particularmente em bebês que em fase posterior foram diagnosticados com PHDA (CHEON et al., 2003; MIRANDA-CASAS et al., 2006; VAQUERIZO-MADRID, 2005).

Este padrão tipificado de comportamentos de sujeitos com PHDA durante a sua primeira infância origina, inclusive nos pais mais competentes e responsáveis, sentimentos de impotência pessoal, frustração, o que acaba por afetar a sua relação com os filhos, conduzindo à aplicação de normas disciplinares, nuns casos, bastante permissivas e bastantes punitivas noutros (ROGERS, et al. 2009).

Segunda infância

Na segunda infância é difícil estabelecer a distinção entre crianças com e sem sintomatologia PHDA, já que existem diversos padrões comuns entre ambos. No entanto, naqueles em cujo diagnóstico revela a presença desta perturbação patenteiam-se comportamentos significativos de ansiedade, déficit de atenção e de excessiva atividade motora.

Uma das principais indicações da presença da PHDA está relacionada com as capacidades de focalização e manutenção da atenção perante as tarefas. Estes sujeitos, especialmente quando estão perante tarefas mais monótonas e com períodos mais alongados de tempo (FERNÁNDEZ, 2003), procuram desistir da realização da tarefa ou alterná-la com a realização de outras tarefas.

Uma outra sintomatologia diz respeito ao comportamento e posição perante atividades lúdicas. As crianças com PHDA manifestam uma maior curiosidade perante jogos novos, no entanto aborrecem-se com enorme facilidade, mudando de jogo de forma constante. Quando jogam com as outras crianças, procuram alterar as regras, têm dificuldades em lidar com a derrota, apresentam dificuldades em atividades de grupo que impliquem cooperação e procuram discutir com os companheiros de atividade, acusando-os, por vezes, da sua própria derrota (BROWN, 2003; GARCÍA-OGUETA, 2001; GRATCH, 2000; MIRANDA-CASAS; LUZ; FERNÁNDEZ, 2001; MIRANDA-CASAS et al., 2006). São ainda denotados comportamentos de base de conduta desobediente, desafiador e oposicional (RAMALHO, 2009).

Em nível afetivo e emocional, as crianças com PHDA manifestam dificuldades em estabelecer relações afetivas com outros sujeitos, tendo também dificuldades em reconhecer posturas, que é resultante de déficit de reconhecimento de aspectos relevantes da comunicação não-verbal (MIRANDA-CASAS; LUZ; FERNÁNDEZ, 2001) e imaturidade da linguagem expressiva (FERNÁNDEZ, 2003; GARCÍA-OGUETA, 2001).

Etapa escolar

Quando a criança com PHDA entra formalmente na fase escolar começam a ser mais patenteadas as dificuldades posturais, como sejam, o ter que permanecer sentado durante longos períodos de tempo.

Nesta fase, são evidenciadas dificuldades de caráter cognitivo, que resultam de fatores diversos como a impulsividade e deficientes capacidades de focalização e manutenção da atenção (RAMALHO, 2009). Estes aspectos acabam por acarretar situações negativas em termos de funcionamento acadêmico e comportamental (CHAPMAN; TUNMEER; PROCHNOW, 2000), já que estes sujeitos acabam por dedicar menos tempo às atividades escolares, utilizam menor esforço para conseguirem alcançar os seus objetivos e utilizam estratégias de aprendizagem com níveis de elaboração e execução mais simples (BROWN, 2003).

Segundo Gratch (2000), os sujeitos com PHDA manifestam padrões executivos bastante variáveis ao longo do tempo, de forma que por vezes são até capazes de realizar as tarefas de uma forma correta, terminá-las no tempo previamente estabelecido e com uma postura adequada e, noutras vezes não só não conseguem terminar, como, por vezes, nem iniciam as tarefas. Estas crianças perdem também, muitas vezes, derivado de alguma desorganização, o seu material escolar, como sejam, por exemplo, os livros.

São latentes também as dificuldades de caráter socioemocional. Estes sujeitos apresentam fracos padrões de relacionamento com os pares e com as figuras significativas (RAMALHO, 2009), dificuldades de partilha, de cooperação e interação com os seus colegas (GARCÍA-OGUETA, 2001).

Segundo García-Ogueta (2001), como consequência das dificuldades de rendimento escolar e de aceitação social, os sujeitos com PHDA vão passar a manifestar sentimentos de frustração e incompetência, dificuldades de aceitação pessoal e vão desenvolver níveis de autoconceito bastante baixos.

É decorrente de todos estes fatos que os professores começaram a procurar razões para o fato de estas crianças apresentarem um baixo rendimento escolar (BENASSINI, 2005; MIRANDA-CASAS; LUZ; FERNÁNDEZ, 2001). Daí que seja, nesta fase, que mais se procura a realização de um diagnóstico que comprove a presença da PHDA.

Adolescência

A fase da adolescência é marcada por fortes mudanças a nível físico, perceptivo e emocional e todas estas mudanças podem provocar alterações internas, nomeadamente ao nível da autoestima e o autoconceito, mas também alterações externas, como sejam, o relacionamento familiar e com os pares (ROGERS et al., 2009).

Estas alterações provocam, não raras vezes, manifestações comportamentais de cariz desafiador e oposicional, particularmente face às figuras de autoridade (GARCÍA-OGUETA, 2001). Nos sujeitos com PHDA, todas estas mudanças aumentam bruscamente, já que para além de manifestarem as alterações associadas à idade, manifestam também as alterações associadas à perturbação e os comportamentos desafiadores e oposicionais e os transtornos da conduta são ainda mais notórios (BENASSINI, 2005).

Segundo Miranda-Casas et al. (2006), os problemas que os sujeitos com PHDA manifestavam em nível social quando eram mais jovens, são agora ainda mais preocupantes, já que para além de apresentarem problemas de conduta bem mais severos, trazem da infância a presença de um estatuto social de rejeição.

Os sujeitos com PHDA manifestam também problemas ao nível do rendimento escolar, uma vez que são reveladas mais dificuldades ao nível da execução, da destreza manual, da aritmética e da compreensão da leitura. Apresentam também um número significativamente maior de expulsões e suspensões escolares, de reprovações e de abandono escolar (BROWN, 2003; MIRANDA-CASAS; LUZ; FERNÁNDEZ, 2001).

Desta forma e, decorrente do fato da formação do autoconceito depender, nesta fase, quase exclusivamente dos sucessos escolares, sociais, artísticos e/ou desportivos, domínios em que os sujeitos com PHDA manifestam claras dificuldades de afirmação, uma percentagem elevada destes adolescentes não têm autoconfiança, crescendo com sentimentos de autodesvalorização, de indefesa e com sintomatologia depressiva (MIRANDA-CASAS; LUZ; FERNÁNDEZ, 2001; VAN-WIELINK, 2005).

Vida adulta

A falta de reconhecimento e o subdiagnóstico de PHDA nos adultos é tanto mais preocupante quanto se trata de uma perturbação tratável e, mais ainda, quando o tratamento adequado se pode traduzir numa melhoria extraordinária da qualidade de vida de quem dela padece e dos que lhe são próximos (KOOIJ, 2009).

Na generalidade, os comportamentos com características predominantemente hiperativas e impulsivas vão sendo atenuados até à fase da vida adulta (BROWN, 2003), no entanto continuam a persistir padrões comportamentais de déficit de atenção, associados a comportamentos ansiedade e inquietude, de falta de premeditação, de descuido e falta de verificação, de desorganização, de falta de planificação, de baixa memória a curto prazo e de dificuldades em estabelecer e manter uma rotina diária adequada, particularmente ao nível laboral.

Diversos autores têm também vindo a ser encontrados padrões de relação entre a PHDA e o déficit de realização cognitiva (ROSE et al., 2009), porque não utilizam o seu potencial da melhor forma.

Os dados clínicos revelam que os adultos que continuam a manifestar alguma da sintomatologia da PHDA, têm menos escolaridade, uma procura constante de elevada estimulação externa têm uma pior capacidade de gestão monetária, organizam com lacunas as suas tarefas domésticas, têm dificuldades em realizar atividades com os filhos, são menos autônomos, menos organizados, pelo que têm dificuldades em realizar tarefas sem uma supervisão eficiente e manifestam também uma progressão no estatuto educativo e ocupacional significativamente mais lenta (MIRANDA-CASAS; LUZ; FERNÁNDEZ, 2001).

Segundo Rose et al. (2009), os sujeitos com PHDA, na fase adulta, manifestam uma procura constante de elevada estimulação externa, mudanças frequentes de humor sem razão aparente e baixa autoestima.

CONCLUSÃO

Este artigo procurou fornecer um melhor conhecimento do percurso dos sujeitos com PHDA ao longo da vida, de forma a contribuir para atenuar algumas das comorbilidades resultantes desta perturbação.

Com os dados revelados, é importante que se perceba que é importante, cada vez mais, tratar eficazmente e melhorar a qualidade de vida destes sujeitos ao longo do ciclo vital. É essencial o desenvolvimento de instrumentos de diagnóstico e de intervenção na PHDA para adultos.

A PHDA, durante anos a mais, foi encarada como uma perturbação apenas da infância e adolescência, sem que fossem devidamente estudadas e aprofundadas as suas implicações futuras, nomeadamente na fase adulta. Os dados que não enaltecem os seus comprometimentos durante todo o ciclo vital estão absoluta e comprovadamente errados, já que, como foi explicitado por diferentes autores e perspectivas científicas, esta perturbação acarreta problemáticas significativas e desajustantes ao longo de toda a vida.

Para finalizar e segundo o autor Joselevich (2000), ficam alguns dados relevantes, que comprovam a pertinência de estudos neste âmbito: cerca de 30 a 50% dos sujeitos com PHDA têm grandes probabilidades de repetir o ano de escolaridade, nem que seja por uma só vez; mais de 20% têm forte probabilidade de serem suspensos ou mesmo expulsos da escola; 50% destes apresentam dificuldades de relacionamento com os colegas de escola e/ou de trabalho; 35% não completam os estudos secundários; 70% apresentam muitas dificuldades no controlo dos impulsos e na resistência à frustração durante todo o ciclo vital; e cerca de 60% continuam a apresentar, durante a vida adulta, problemas psicossociais resultantes da existência da perturbação durante a infância.

Recebido em: 20/04/2010

Reformulado em: 17/07/2010

Aprovado em: 19/07/2010

  • APA. DSM-IV: manual de diagnóstico e estatística das perturbações mentais Lisboa: Climepsi Editores. 1996.
  • ______. DSM-IV-TR: manual de diagnóstico e estatística das perturbações mentais 4. ed. Texto revisto. Lisboa: Climepsi Editores. 2002.
  • ARTIGAS-PALLARÉS, J. Comorbilidad en el trastorno por déficit de atención y hiperactividad. Neurología, v.36 (supl. 1), S68-S78, 2003.
  • BARKLEY, R. Guidelines for defining hyperactivity in children. Attention Deficit Disorder with Hyperactivity. In: LAHEY B. B.; KAZDIN (Eds.). Advances in Clínical Child Psychology New York: Plenum Press. 1982.
  • BENASSINI, O. Trastornos de la atención: origen, diagnóstico, tratamiento y enfoque psicoeducativo. Sevilla: Editorial Eduforma. 2005.
  • BETANCOURT-JIMENEZ, Y., JIMENEZ-LEON, J. ; JIMENEZ-BETANCOURT, C. Trastorno por déficit de atención e hiperactividad y trastornos del sueño. Neurología, v.42, n.2, S37-S51, 2006.
  • BLÁZQUEZ-ALMERÍA, G. et al. Resultados del cribado de la sintomatología del trastorno por déficit de atención con o sin hiperactividad en el ámbito escolar mediante la escala EDAH. Neurología, v.41, n.10, p.586-590, 2005.
  • BROWN, T. Trastornos por déficit de atención y comorbilidades en niños adolescentes y adultos Barcelona: Editora Masson. 2003.
  • CAPILLA-GONZÁLEZ, A. et al. Nuevas aportaciones a la neurobiología del trastorno por déficit de atención con hiperactividad desde la magnetoencefalografia. Neurología, v.40 (Supl 1), S43-S47, 2005.
  • CARDO, E.; SERVERA-BARCELÓ, M. Prevalencia del trastorno de déficit de atención e hiperactividad. Neurología v.40 (supl1), S11-S15. 2005.
  • CORNEJO, J. et al. Prevalencia del trastorno por déficit de atención-hiperactividad en niños y adolescentes colombianos. Neurología, v.40, n.12, p.716-722, 2005.
  • CHAPMAN, J.; TUNMEER, W.; PROCHNOW, J. Early reading-related skills and performance, reading self concept and the development of academic self-concept: a longitudinal study. Journal of Educational Psychology, v.92, n.4, p.703-708, 2000.
  • CHEON, K. et al. Dopamine transporter density in the basal ganglia assessed with IPT-SPET in children with attention Deficit Hyperactivity Disorder. Eur J Nucl Med Mol Imaging, v.30, p.306-311, 2003.
  • DOYLE, A. et al. Separating attention deficit hyperactivity disorder and learning disabilities in girls: a familial risk analysis. Am J Psychiatry, v.158, p.1666-1672, 2001.
  • FERNÁNDEZ, A. Problemas de lenguaje con estudiantes con déficit atencional Valencia: Servei de Publicacions. 2003.
  • GARCÍA-OGUETA, M. Mecanismos atencionales y síndromes neuropsicológicos. Neurología, v.32, n.5, p.463-467, 2001.
  • GRATCH, L. El trastorno por déficit de atención: clínica, diagnóstico y tratamiento en la infancia, la adolescencia y la adultez. Buenos Aires: Editorial Medica Panamericana. 2000.
  • HERREROS, O. et al. Evaluación de niños y adolescentes con trastorno por déficit de atención con hiperactividad/ Trastornos hipercinéticos. Psiquiatría Infanto-Juvenil, v.19, n.4, p.199-214, 2002.
  • JOSELEVICH, E. Síndrome de déficit de atención con o sin hiperactvidad Buenos Aires: Editorial Paidós. 2000.
  • KOOIJ, S. A perturbação de hiperactividade com déficit de atenção em adultos Lisboa: Medicina XXI. 2009.
  • MARTINEZ, M. Dificultades ligadas a la hiperactividad y al deficit de atención Necessidades Educativas Especiales. Madrid: McGraw-Hill. 2004.
  • MAYNARD, J.; TYLER, J.; ARNOLD, M. CoOcurrence of attention deficit disorder and learning disability: an overview of research. Journal of Instructional Psychology 1999.
  • MIRANDA-CASAS, A et al. Dificultades en el aprendizaje de matemáticas en niños con trastorno por déficit de atención e hiperactividad. Neurología, v.42, p.2, S163-S170, 2006.
  • MIRANDA-CASAS, A. et al. Intervención psicoeducativa en estudiantes con trastorno por déficit de atención con hiperactividad. Neurología Clínica, v.1, p.203-216. 2000.
  • MIRANDA-CASAS, A.; LUZ, L.; FERNÁNDEZ, S. Trastornos por déficit de atención con hiperactividad: una guía práctica Málaga: Ediciones Aljibe. 2001.
  • PEÑA, J.; MONTIEL-NAVA, C. Trastorno por déficit de atención/hiperactividad: żmito o realidad? Neurología, v.36, n.2, p.173-179, 2003.
  • RAMALHO, J. Psicologia e psicopatologia da atenção Braga: Edições APPACDM, 2009.
  • ROGERS, M. et al. Parental involvement in children's learning: Comparing parents of children with and without Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder (ADHD). Journal of School Psychology, v.47, p.167185, 2009.
  • ROSE, E. et al. Neuropsychological characteristics of adults with comorbid ADHD and borderline/mild intellectual disability. Research in Developmental Disabilities, v.30, p.496502, 2009.
  • SELL-SALAZAR, F. Síndrome de hiperactividad y déficit de atención. Neurología, v.37, n.4, p.353-358, 2003.
  • VAN-WIELINK, G. Déficit de atención con hiperactividad: estrategias, habilidades, diagnóstico y tratamiento. México: Editorial Trillas. 2005.
  • VAQUERIZO-MADRID, J.; ESTÉVEZ-DÍAZ, F.; DÍAZ-MAÍLLO, I. Revisión del modelo de alerta e intervención psicolinguística en el trastorno por déficit de atención e hiperactividad. Neurología, v.42, n.2, S53-S61, 2006.
  • VECIANA, J. Los trastornos de la atención y la hiperactividad: diagnóstico y tratamiento neurofuncional y causal. Barcelona: Ediciones Lebón, 2002.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Out 2010
  • Data do Fascículo
    Ago 2010

Histórico

  • Aceito
    19 Jul 2010
  • Revisado
    17 Jul 2010
  • Recebido
    20 Abr 2010
Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial - ABPEE Av. Eng. Luiz Edmundo Carrijo Coube, 14-01 Vargem Limpa, CEP: 17033-360 - Bauru, SP, Tel.: 14 - 3402-1366 - Bauru - SP - Brazil
E-mail: revista.rbee@gmail.com