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Avaliação da Acessibilidade do Parque Durante o Brincar de Crianças com Paralisia Cerebral na Escola

RESUMO

no contexto escolar, o parque infantil é um local importante para as crianças participarem de atividades lúdicas. Por meio das brincadeiras, as crianças adquirem conhecimentos, desenvolvem habilidades e capacidades, conseguem ter prazer e expressar seus sentimentos. Entretanto, para que o parque infantil possa favorecer o desenvolvimento das crianças, ele precisa estar acessível e seguro para todas as crianças, inclusive para aquelas com deficiência. O objetivo deste estudo foi o de avaliar a acessibilidade de um parque de uma escola de Educação Infantil e analisar a participação dos alunos com paralisia cerebral nas atividades lúdicas desenvolvidas nele. Participaram três crianças com paralisia cerebral, de quatro a seis anos, de uma escola de Educação Infantil de um município do interior do estado de São Paulo. A coleta de dados foi dividida em duas etapas: 1) avaliação da acessibilidade do parque infantil utilizando o Protocolo para avaliação da acessibilidade física em escolas de Educação Infantil; 2) observação das crianças com paralisia cerebral nas atividades lúdicas do parque infantil. Notou-se que o parque escolar não se encontra acessível para as crianças com paralisia cerebral; no entanto, estas participaram das atividades com o auxílio de professores e cuidadores. A falta de adequação nos equipamentos recreativos pode ter dificultado o melhor desempenho das crianças nas atividades do parque da escola. Há necessidade de formação dos profissionais para ampliar a participação da criança durante as atividades lúdicas e a adequação do parque, tornando acessível e seguro a todas as crianças, assim como é proposto pelo Desenho Universal.

PALAVRAS-CHAVE:
Educação Especial; Parque Infantil; Paralisia Cerebral; Acessibilidade

ABSTRACT:

In the school context, the playground is an important place for children to participate in recreational activities. Through play, children acquire knowledge, they develop skills and abilities, they can feel pleasure and express their feelings. However, for the playground to promote the development of children, it must be accessible and safe for all children, including those with disabilities. The aim of this research was to evaluate the accessibility of a school playground of Early Childhood Education and also to analyse the participation of children with cerebral palsy in recreational activities developed in it. The participants were three children with cerebral palsy, from four to six years old, from a school of Early Childhood Education in a municipality of São Paulo - Brazil. Data collection was divided into two stages: 1) evaluation of the accessibility of the playground using the Protocol for evaluation of physical accessibility in Early Childhood Education schools; 2) observation of children with cerebral palsy during play activities in the playground. It was noted that the playground is not accessible for children with cerebral palsy. However, they participated in activities with the help of teachers and caregivers. The lack of adequate recreational equipment may have hindered the best performance of the children in school playground activities. It is necessary to educate professionals to increase the participation of children during play activities and to adequate the playground, making it accessible and safe for all children, as it is proposed by the Universal Design.

KEYWORDS:
Special Education; Playground; Cerebral Palsy; Accessibility

1 Introdução

A infância é o momento de apropriação de imagens e representações do mundo real, na qual a criança torna-se capaz de comunicar, socializar, interagir, e assim, se desenvolver, crescer e amadurecer de forma sadia. Possibilita viver em um estado de transição entre situações concretas do cotidiano e um mundo de representações desvinculadas dos acontecimentos da vida (FERLAND, 2006FERLAND, F. O Modelo lúdico: o brincar, a criança com deficiência física e a terapia ocupacional. 3.ed. São Paulo: Roca, 2006.).

O brincar, uma atividade lúdica primeiramente da infância, é um movimento saudável, podendo ser considerado como uma ação espontânea, livre, propulsora da criatividade, para o amadurecimento da criança. É na infância, por meio do brincar, que a criança começa a conhecer o novo, ter prazer, dominar e permitir aflorar a sua criatividade. Por meio da brincadeira a criança pode expressar seus sentimentos, sejam eles positivos quanto negativos, descobrindo o mundo a sua volta e ampliar as habilidades do desenvolvimento psicomotor e social (FERLAND, 2006FERLAND, F. O Modelo lúdico: o brincar, a criança com deficiência física e a terapia ocupacional. 3.ed. São Paulo: Roca, 2006.).

A atividade lúdica utilizada no contexto escolar é de primordial importância, pois com o brincar o aluno adquire sensações e emoções fundamentais para o seu desenvolvimento, levando a criança formar sua personalidade e aprender a lidar com o mundo. Portanto, o fato de a brincadeira estar particularmente associada ao desenvolvimento infantil também deve estar inserida na Educação Infantil com o objetivo de contribuir para o processo de aprendizagem (LIRA; RUBIO, 2014LIRA, N. A. B; RUBIO, J. A. S. A Importância do brincar na educação infantil. Revista Eletrônica Saberes da Educação, São Roque, v. 5, n. 1, p. 1-22, 2014.).

No contexto escolar, o parque infantil pode ser considerado uma área privilegiada onde é possível realizar a estimulação da criança de forma lúdica. Trata-se de um ambiente alternativo, rico de estímulos capazes de favorecer os aspectos psicomotores e as relações sociais. O parque é importante não apenas para o desenvolvimento da criança, mas também pela transmissão de valores culturais e de cidadania (BLASCOVI-ASSIS, 2009BLASCOVI-ASSIS, S. M. Lazer para deficientes mentais. In: MARCELLINO, N. C. (Org.). Lúdico, educação e educação física. 3. ed. Ijuí, RS: Unijuí, 2009. p. 101-111.).

Crianças com o diagnóstico de paralisia cerebral podem apresentar distúrbios motores e alterações posturais permanentes de origem não progressiva em um cérebro imaturo, que podem ou não ter ligação com transformações cognitivas, como por exemplo, distúrbios de linguagem, transtorno de aprendizagem. As alterações motoras tornam os movimentos voluntários, dissociados e escassos (GAUZZI; FONSECA, 2004GAUZZI, L. D. V; FONSECA L. F. Classificação da paralisia cerebral. In: LIMA, C. L. A.; FONSECA, L. F. Paralisia cerebral: neurologia, ortopedia e reabilitação. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. p. 37-44.).

Para as crianças com paralisia cerebral, o brincar ao ar livre é importante, pois, além do lúdico ser uma forma de divertimento, ele também é um modo de desenvolver habilidades motoras, cognitivas e sociais. Entretanto, para que essas crianças possam desfrutar do lazer com segurança, os equipamentos e os locais dos parques infantis devem possuir brinquedos acessíveis em vez de obstáculos aos seus usuários (LAUFER, 2001LAUFER, A. Recomendação para projetos de brinquedos de recreação e lazer existentes em playgrounds adaptados à criança com paralisia cerebral. 2001. 90 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001.). Ao pensar em adequar os equipamentos recreativos de um parque, deve-se lembrar da acessibilidade, que tem como objetivo acolher todas as pessoas, sem ocultar as particularidades de cada um, com a pretensão de eliminar a discriminação aos usuários e proporcionar a sua integração a esses brinquedos de recreação (LAUFER, 2001LAUFER, A. Recomendação para projetos de brinquedos de recreação e lazer existentes em playgrounds adaptados à criança com paralisia cerebral. 2001. 90 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001.). De acordo com a Lei Federal nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, a acessibilidade é: “[...] possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida” (BRASIL, 2000BRASIL. Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. Brasília, DF, 2000. Disponível em: <http://www.entreamigos.com.br/temas/acessibi/prjeto.htm>. Acesso em: 28 out. 2015.
http://www.entreamigos.com.br/temas/aces...
, p. 1).

A Educação Inclusiva apresenta como uma de suas propostas organizar recursos de acessibilidade que aniquilam as barreiras para a absoluta participação dos alunos, considerando as suas necessidades especiais. O acesso à Educação Inclusiva complementa e/ou auxilia o desenvolvimento dos alunos em sua independência e autonomia na escola e fora dela (BRASIL, 2008aBRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília, DF: MEC/SEE, 2008a.).

Este estudo teve como pretensão investigar como é a acessibilidade do parque e dos brinquedos durante o brincar das crianças com paralisia cerebral na Educação Infantil. Como hipótese, esperava-se que o parque infantil e os brinquedos da escola pesquisada atendessem ao que é estabelecido nas políticas públicas que regem pela inclusão do aluno com deficiência, pelo fato de ser uma escola de referência quanto à sua estrutura física do município. Além disso, a outra hipótese era de que o Protocolo para avaliação da acessibilidade física em escolas de Educação Infantil, de Corrêa (2010)CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010., fosse um instrumento importante que permite avaliar a acessibilidade para todas as crianças, inclusive as com paralisia cerebral.

2 Objetivo

O objetivo deste estudo foi o de avaliar a acessibilidade de um parque de uma escola de Educação Infantil e analisar a participação dos alunos com paralisia cerebral nas atividades lúdicas desenvolvidas nele.

3 Método

3.1 Comité de ética

O projeto de pesquisa foi submetido à avaliação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP - Campus de Marília/SP, respeitando as prerrogativas da resolução 196/96 do CONEP que versa sobre ética em pesquisa com seres humanos, tendo recebido parecer favorável, sob o protocolo nº 0841/2013.

3.2 Local da pesquisa

A pesquisa foi realizada em uma escola de Educação Infantil do município de Marília-SP. A escola foi selecionada por ser referência de estrutura física do município, ou seja, sua estrutura física em relação ao parque representa várias outras escolas do município. A escola em estudo subdividiu o parque infantil em quatro espaços, dando-lhe os nomes de parque 1, parque 2, parque 3 e parque 4. Essa divisão serviu para determinar as faixas etárias das crianças, sendo que os parques 1 e o 2 são para as crianças menores com idade de 2 a 4 anos, e os parques 3 e 4 para as crianças maiores com idade de 5 a 6 anos.

3.3 Participantes

Os critérios para participação no estudo foram: crianças de quatro a seis anos com paralisia cerebral, classificadas no Nível I ao V do Gross Motor Function Measure Classification System (GMFCS), matriculadas em salas de aula da Educação Infantil. O GMFCS classifica o nível de função motora grossa e se baseia na movimentação voluntária, destacando a transferência, o sentar e a locomoção da criança. Esse instrumento caracteriza-se como escala ordinal de cinco níveis que retrata, em ordem decrescente, o nível de independência e funcionalidade das crianças (PALISANO et al., 1997PALISANO, R. et al. Development and reliability of a system to classify gross motor function in children with cerebral palsy. Developmental Medicine & Child Neurology, v. 39, n. 4, p. 214-223, 1997.).

Foram excluídas do estudo crianças com paralisia cerebral com deficiências associadas, como, por exemplo, deficiência visual, deficiência auditiva, entre outras. Assim, os participantes deste estudo foram três crianças com paralisia cerebral. O quadro 1 identifica a idade, o ano escolar que a criança está matriculada e também a classificação por meio do GMFCS, verificando em qual nível a criança melhor evidencia suas habilidades e limitações nesta área da função motora grossa.

Quadro 1
Caracterização dos participantes

As crianças 1 e 2 apresentam hemiparesia com comprometimento do hemicorpo direito. A Criança 1 faz o uso de órtese no membro inferior direito e a Criança 2 faz o uso de uma órtese no membro superior direito. Segundo a avaliação do GMFCS as crianças 1 e 2 apresentaram classificação no nível II, que identifica que elas são capazes de sentar no chão sem auxílio, mas podem mostrar dificuldade quanto ao equilíbrio de segurar um objeto com as duas mãos. Elas conseguem sair do chão ou de uma cadeira para a posição em pé, mas usualmente requerem de um espaço estável para empurrar-se ou impulsionar-se para cima com os membros superiores. São capazes de andar sem utilizar um dispositivo manual de mobilidade, sobem escadas segurando as mãos no corrimão, mas são incapazes de correr e pular (PALISANO et al., 1997PALISANO, R. et al. Development and reliability of a system to classify gross motor function in children with cerebral palsy. Developmental Medicine & Child Neurology, v. 39, n. 4, p. 214-223, 1997.).

A Criança 3 é quadriparética e faz o uso de uma cadeira de rodas manual. Em relação a avaliação GMFCS, a classificação que ela apresentou foi o nível V. Crianças com a idade entre quatro e seis anos, referente ao nível V apresentam um controle voluntário do movimento limitado e não são capazes de manter posturas antigravitacionais de cabeça e tronco. As áreas de função motora estão completamente restringidas, sendo compensadas por intermédio do uso de equipamentos adaptativos e de tecnologia assistiva. Nesse nível, as crianças acabam não tendo meios para se locomover independentemente, sendo, assim, transportadas (PALISANO et al., 1997PALISANO, R. et al. Development and reliability of a system to classify gross motor function in children with cerebral palsy. Developmental Medicine & Child Neurology, v. 39, n. 4, p. 214-223, 1997.).

3.4 Coleta de dados

A coleta de dados foi dividida em duas etapas.

3.4.1 Etapa 1 - avaliação de acessibilidade do parque infantil

Foi realizada a avaliação da acessibilidade do parque infantil, por meio do Protocolo para avaliação da acessibilidade física em escolas de Educação Infantil de Corrêa (2010)CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010., que pretende investigar os seguintes itens:

  1. O alcance aos equipamentos do parque: se são constituídos por passarelas para facilitar a locomoção das crianças, principalmente as que se locomovem por cadeira de rodas.

  2. Aspectos dos equipamentos: se a altura dos brinquedos está adequada à faixa etária; se são constituídos por cinto de segurança.

  3. A segurança dos brinquedos: se as condições dos brinquedos estão aptas para o uso sem causar danos às crianças.

3.4.2 Etapa 2 - observação das crianças nas atividades no parque

Os dados foram coletados a partir da observação livre das crianças durante as atividades nos parques escolares 1 e 2, em dois momentos distintos, com duração aproximada de 30 minutos cada encontro, combinados previamente com a professora. Todos os momentos que as crianças realizaram atividades no parque elas foram acompanhadas por um cuidador.

A atividade das crianças foi registrada por meio da filmagem realizada pelo assistente de pesquisa, de modo dinâmico, a fim de acompanhar o deslocamento das crianças pelo parque. A pesquisadora também realizou o registro contínuo das informações durante a atividade em um diário de campo.

3.5 Transcrição das filmagens

Após o registro das informações, as filmagens foram transcritas na íntegra. Em seguida, foi realizada a organização das informações identificadas por meio do registro contínuo enfatizando os seguintes aspectos: os recursos utilizados durante o brincar no parque da escola, as estratégias utilizadas pela professora e pela cuidadora, o desempenho do aluno durante o brincar, as habilidades e as dificuldades do aluno, a descrição do aspecto motor, a interação do aluno com a atividade, a cuidadora e os demais alunos e os parques escolares.

As informações obtidas a partir das transcrições das filmagens e do registro contínuo foram compiladas em um único documento a partir da sequência temporal das atividades.

3.6 Análise de conteúdo

Em relação à 1ª Etapa da coleta de dados, após a avaliação da acessibilidade do parque por meio do Protocolo para avaliação da acessibilidade física em escolas de Educação Infantil (CORRÊA, 2010CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010.), os dados identificados foram compilados e, posteriormente, analisados a fim de identificar a quantidade de equipamentos recreativos que atendem aos itens de acessibilidade propostos pelo Protocolo.

Posteriormente, na Etapa 2, por se tratar de um estudo de caráter qualitativo, foi utilizada a análise de conteúdo proposta por Bardin (2004)BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2004.. Após as transcrições das filmagens e das estruturações do texto escrito, foram estabelecidas categorias de análise. Bardin (2004)BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2004. definiu categoria como um conjunto, um grupo ou uma divisão que apresenta características semelhantes, mas que se diferenciam pela natureza. Segue o Quadro 2 com as categorias e as subcategorias estabelecidas:

Quadro 2
Categorias e subcategorias de análise de conteúdo

A categoria participação no parque definiu-se como o envolvimento das crianças durante as atividades realizadas no parque. A categoria auxílios oferecidos refere-se aos auxílios que os cuidadores e professores ofereceram na hora de brincar no parque com as crianças. E a categoria desempenho da criança foi definida como a qualidade da ação da criança com paralisia cerebral durante a participação nas atividades realizadas no parque.

Após estabelecer as categorias e subcategorias de análise, com o intuito de seguir um rigor conceitual e metodológico de pesquisa, foram adotadas as recomendações de Carvalho (1996)CARVALHO, A. M. P. O uso do vídeo na tomada de dados: pesquisando o desenvolvimento do ensino em sala de aula. Pro-posições, Campinas, v. 7, n. 1, p. 5-13, 1996., sendo o material submetido à análise de juízes com experiência na área. O índice de concordância entre o pesquisador e o juiz 1 foi de 84%, entre o pesquisador e o juiz 2 foi de 87% e entre os dois juízes o índice de concordância foi de 85%. Dessa forma, as categorias e subcategorias, e seus respectivos exemplares de fala, apresentaram o grau de representatividade segundo Carvalho (1996)CARVALHO, A. M. P. O uso do vídeo na tomada de dados: pesquisando o desenvolvimento do ensino em sala de aula. Pro-posições, Campinas, v. 7, n. 1, p. 5-13, 1996.. Após a realização do índice de concordância, analisou-se o material apreciado pelos juízes.

4 Resultados e discussões

4.1 Caracterização da acessibilidade dos parques

Em primeiro lugar, antes de analisar o brincar das crianças com paralisia cerebral no parque infantil, foi realizado, por meio do Protocolo formulado por Corrêa (2010)CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010., a avaliação dos equipamentos recreativos existentes no parque. Como foi relatado anteriormente, a escola avaliada possuía quatro parques divididos por faixa etária. Para melhor entendimento, os resultados serão apresentados por meio de tabelas que identificam a quantidade de parques que estavam adequados ou não em relação à acessibilidade. A Tabela 1 mostra os resultados obtidos durante a avaliação em relação ao acesso aos equipamentos recreativos.

Tabela 1
Acesso aos equipamentos recreativos

Com relação aos resultados apresentados na Tabela 1, é possível verificar que a superfície do parque infantil em grande parte é constituída por gramado em volta dos equipamentos recreativos; entretanto, um dos parques é composto por areia em toda sua superfície. Conforme a NBR 9050/1994 (ABNT, 2004ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 9050: acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro: ABNT, 2004. ), a superfície, por onde as crianças circulam, deve ser firme, estável e antiderrapante. E o piso favorável a isso é o gramado ao redor dos brinquedos, por ser um material que amortece durante uma possível queda da criança.

Já em relação a necessidade de o parque ser constituído por uma superfície plana, este estudo identificou que o parque estudado possui algumas irregularidades, principalmente em volta dos equipamentos recreativos, dando destaque para os brinquedos de balanço. No entanto, há alguns locais que possuem mudanças abruptas de nível, principalmente entre a separação de um parque e outro. Corrêa (2010)CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010. descreveu que as irregularidades ou as mudanças abruptas de nível do parque infantil podem prejudicar ou até impossibilitar as crianças cadeirantes ou que fazem o uso de andadores de locomover-se pelas superfícies do local. Além do mais, as irregularidades ou as mudanças de nível podem se transformar em perigo para as crianças, especialmente porque é nesse espaço que elas experimentam correr livremente.

As situações de uso dos ambientes e dos equipamentos referem-se à possibilidade de as atividades serem realizadas por todas as pessoas com deficiência ou não. São importantes as adequações de todas as características físicas dos equipamentos, tais como o formato, as dimensões, o relevo e, também, sua acomodação nos ambientes para possibilitar que sejam acessados por todos (BURJATO, 2004BURJATO, A. L. P. F. Parques acessíveis: um direito de cidadania. Aplicação de procedimentos para avaliação do projeto implantado: o caso do Parque Villa-Lobos. 2004. 248 f. Dissertação (Mestrado em Estruturas Ambientais Urbanas) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004.). A Tabela 2 identifica as características em relação à acessibilidade dos equipamentos recreativos.

Tabela 2
Características dos equipamentos recreativos

Diante dos resultados identificados na avaliação realizada no parque, todos os equipamentos recreativos em estudo são divididos por faixas etárias, assim como é sugerido por Corrêa (2010)CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010.. A escola realiza uma subdivisão do parque em quatro parques, diferenciando-os pelas idades das crianças, sendo dois deles para crianças de 2 a 4 anos e os outros dois para crianças de 5 a 6 anos. Esta divisão atende as necessidades identificadas por Laufer (2001)LAUFER, A. Recomendação para projetos de brinquedos de recreação e lazer existentes em playgrounds adaptados à criança com paralisia cerebral. 2001. 90 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001. e Burjato (2004)BURJATO, A. L. P. F. Parques acessíveis: um direito de cidadania. Aplicação de procedimentos para avaliação do projeto implantado: o caso do Parque Villa-Lobos. 2004. 248 f. Dissertação (Mestrado em Estruturas Ambientais Urbanas) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004. que destacaram que os parques infantis devem ser compostos por equipamentos recreativos para variadas faixas etárias, considerando que cada criança pode ter uma determinada necessidade na utilização desses brinquedos; por exemplo, a altura dos escorregadores, que devem ser diferentes entre as crianças menores e as maiores.

Os escorregadores da escola avaliada não se encontram constituídos por dupla altura no corrimão da escada e não possuem sua superfície emborrachada conforme recomendado pelo Protocolo de Corrêa (2010)CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010.. O brinquedo também não é composto por grades de proteção tanto na escada como na prancha de deslizar. Dois dos quatros escorregadores que se encontram no parque possui degraus fechados, porém sem material antiderrapante. Já os outros dois não são constituídos por degraus fechados e nem por material antiderrapante. Entretanto, a distância entre os degraus de todos os escorregadores está adequada. Em relação a largura da prancha de deslizar do escorregador, dois deles estavam adequados, entre uma largura de 35 cm a 60 cm, contudo os outros dois apresentam uma largura inferior a 35 cm. Laufer (2001)LAUFER, A. Recomendação para projetos de brinquedos de recreação e lazer existentes em playgrounds adaptados à criança com paralisia cerebral. 2001. 90 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001., em seu estudo, constatou que as proteções laterais das pranchas de deslizar não são suficientes. Em vista disso, constatou que deve ser dado uma continuidade do corrimão da escada para toda a prancha de deslizar, formando desse modo grades de proteção. Em relação à altura do corrimão na escada do escorregador, o pesquisador afirmou que o mesmo deve ser formado por dupla altura de corrimão para que assim beneficie crianças de várias faixas etárias. A Figura 1 refere-se ao escorregador da escola pesquisada.

Figura 1
Escorregador da escola

Quanto aos equipamentos recreativos balanço e gira-gira, foi identificado que nenhum deles apresentaram adequação quanto as normativas propostas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas - NBR 14350-1 (ABNT, 1999ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 14350-1: segurança de brinquedos de playground. Parte 1: requisitos e métodos de ensaio. Rio de Janeiro: ABNT, 1999.). O equipamento recreativo gira-gira não possui acesso por meio de rampas para as crianças cadeirantes e também não possui grades de proteção ou barreiras de segurança para evitar possíveis colisões. Em relação ao balanço, foi identificado que o mesmo não apresenta encosto, grade de proteção para evitar possíveis colisões, descanso para os pés e cintos de segurança para proteger a criança de possíveis acidentes. Segundo a ABNT (1999)ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 14350-1: segurança de brinquedos de playground. Parte 1: requisitos e métodos de ensaio. Rio de Janeiro: ABNT, 1999., todos os assentos dos balanços devem ser constituídos por encosto, e também é recomendado que os balanços para as crianças de até 3 anos tenham o assento em formato de “calça” para a proteção da coluna dorsal. Em relação ao descanso para os pés no balanço, as normativas da ABNT (1999)ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 14350-1: segurança de brinquedos de playground. Parte 1: requisitos e métodos de ensaio. Rio de Janeiro: ABNT, 1999. estabelecem que este é necessário para possibilitar o apoio adequado e também prover maior estabilidade para a criança na hora de brincar. A Figura 2 refere-se ao balanço da escola pesquisada.

Figura 2
Balanço da escola

Os parques infantis e seus brinquedos podem apresentar riscos para as crianças quando não estão adequadamente estruturados. Todavia, verifica-se que, na maioria das vezes, esses episódios poderiam ser evitados com modelos simples de prevenção (HARADA; PEDREIRA; ANDREOTTI, 2003HARADA, M. J. C. S.; PEDREIRA, M. L. G.; ANDREOTTI, J. T. Segurança com brinquedos de parques infantis: uma introdução ao problema. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 11, n. 3, p. 383-386, 2003.). A Tabela 3 apresenta itens em relação a segurança dos equipamentos recreativos.

Tabela 3
Segurança dos equipamentos recreativos

Em relação a segurança dos equipamentos recreativos, um dos escorregadores que se encontra no parque, possuía trincas, deformação e conexão frouxa. Entretanto, os brinquedos de recreação constituído por madeira, possuem acabamentos lisos, livre de lascas, rebarbas ou farpas. Os equipamentos recreativos que são compostos por pinos, porcas, parafuso pontiagudos, possuem acabamentos de proteção, para que assim não apareçam cantos afiados, evitando que ferimentos sejam causados.

Por fim, é possível verificar que no total de 29 itens apresentados apenas 6 itens atendem a proposta de acessibilidade do Protocolo. Desta forma, os parques da escola encontram-se inadequados em relação acessibilidade física dos equipamentos recreativos para todas as crianças, principalmente para as crianças com paralisia cerebral que estão matriculadas na escola. Os parques da Educação Infantil necessitam ser seguros, facilitar o acesso e permitir que as crianças tenham autonomia quanto ao uso dos equipamentos recreativos, mesmo as crianças com deficiência física. Caso contrário, a atividade de brincar no parque infantil pode ser limitada ou até inviável para algumas crianças, distanciando assim, a efetiva inclusão das crianças com deficiência (CORRÊA, 2010CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010.).

4.2 Caraterização da criança com paralisia cerebral durante as atividades lúdicas no parque

Entre os objetivos deste estudo, foi proposto avaliar a criança com paralisia cerebral durante as atividades lúdicas no parque. Soler, Rezende e Blascovi-Assis (2011)SOLER, A. P. S. C.; REZENDE, L. K.; BLASCOVI-ASSIS, S. M. Utilização do playground por crianças com paralisia cerebral tipo diparética espástica: preferências e dificuldades relatadas pelas mães. Revista Terapia Ocupacional, São Paulo, v. 22, n. 1, p. 19-26, 2011. relataram que o parque infantil é um ambiente estimulador para as crianças com paralisia cerebral, pois por meio do brincar no parque elas tem a oportunidade de explorar todo o ambiente e experienciar seus limites, movimentando todo o corpo e a mente. Além disso, junto com outras crianças, as crianças com paralisia cerebral vivenciam novas perspectivas de humanização em suas relações sociais.

A partir da análise dos dados, foram identificadas as categorias a fim de caracterizar o brincar das crianças com paralisia cerebral nas atividades do parque infantil da escola. A primeira categoria estabelecida foi a participação no parque, entendida como o envolvimento da criança durante as atividades realizadas no parque. Essa categoria foi dividida em duas subcategorias. Em primeiro lugar, analisou-se a participação no parque com a iniciativa da criança observando se ela tinha autonomia na escolha do brinquedo. Com relação a essa subcategoria, foi identificado, neste estudo, que o fato de os equipamentos recreativos não estarem adequados não impediu que as crianças com paralisia cerebral brincassem nesse ambiente e demostrassem iniciativa em relação à escolha dos brinquedos. Os trechos das transcrições, a seguir, descrevem as crianças brincando no parque e exemplifica essa afirmação:

Criança 1 estava escorregando no brinquedo da casinha com escorregador e ao se levantar do escorregador já foi direto para o brinquedo de túnel em formato de trenzinho, para passar no túnel.

Criança 2 está no brinquedo da casinha com o escorregador e logo que escorrega, a criança já aponta novamente para o brinquedo.

Para Ferland (2006)FERLAND, F. O Modelo lúdico: o brincar, a criança com deficiência física e a terapia ocupacional. 3.ed. São Paulo: Roca, 2006., as crianças com deficiência física partilham de múltiplos elementos do comportamento lúdico, como as demais crianças, como, por exemplo, a curiosidade, o gosto pelo prazer e a iniciativa, interessando-se por qualquer tipo de brincadeira. Dessa forma, acredita-se que as crianças deste estudo demonstraram os elementos necessários para o comportamento lúdico, porém, durante as brincadeiras no parque escolar, a falta de elementos de acessibilidade e de segurança podem prejudicar o desempenho e expor as crianças em riscos de acidentes.

A segunda subcategoria de participação no parque estabelecida foi a participação da criança no parque com a iniciativa da cuidadora, que pretendeu identificar momentos que a criança não teve autonomia quanto à escolha do equipamento recreativo do parque. Com relação a essa subcategoria, observa-se que ainda existe a falta de preparação dos cuidadores em relação à criança com paralisia cerebral, pois eles acabam não percebendo a capacidade da criança e não respeitando os seus desejos durante as atividades lúdicas. O trecho a seguir identifica a cuidadora da criança 2 privando-a de ter autonomia na escolha da atividade no parque.

Criança 2 aponta para o brinquedo de escorregador, após cuidadora ter a tirado dele e a levado para o brinquedo de cavalinho.

É fundamental a formação dos profissionais que atuam com as crianças com deficiência física na escola a fim de estimular as habilidades da criança e ampliar a sua participação nas atividades desse contexto. Segundo Brasil (2008b)BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Guia prático do cuidador. Brasília, DF, 2008b. Disponível em: <http.bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_pratico_cuidador.pdf.htm>. Acesso em: 11 nov. 2015.
http.bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/...
, a função do cuidador na rede regular de ensino é possibilitar a participação no cotidiano escolar de alunos com dificuldades de comunicação, intelectuais, cognitivas, de mobilidade, de locomoção ou outras limitações específicas. Neste estudo, identificou-se ser necessária a formação desse profissional para que ele realmente exerça suas funções de modo a permitir que a criança utilize suas habilidades e tenha autonomia durante as atividades lúdicas.

Outra categoria identificada na análise da coleta de dados foi em relação aos auxílios oferecidos, de forma a verificar quais são os auxílios que os profissionais oferecem na hora de brincar no parque com as crianças. Rothschild, Swaine e Norris (2001)ROTHSCHILD, N.; SWAINE, J.; NORRIS, L. Augmentative and alternative communication: management of severe communication disorders in children and adults. Brazil: Workshop, 2001. discutem a necessidade de pessoas capacitadas e envolvidas na rotina de sala de aula a fim de apoiar as atividades do aluno com deficiência e identificar as necessidades de auxílio. Essa categoria foi dividida em três subcategorias: o auxílio verbal, o auxílio não verbal e o auxílio motor. Em relação ao auxílio verbal, entende-se os momentos que os profissionais oferecem ou a criança solicita auxílio por meio da oralidade. O trecho a seguir identifica um momento que uma das crianças recebe auxílio verbal:

Criança 1 está no brinquedo do castelinho com o escorregador e cuidadora auxilia falando e mostrando qual degrau a criança deve pisar, pois os degraus não são sequenciados um a frente do outro e também pelo brinquedo não apresentar corrimão.

O auxílio verbal pode ser utilizado como um instrumento que facilita a participação do aluno nas atividades e é considerado uma estratégia eficaz para estimular o envolvimento da criança durante as atividades lúdicas. Nunes (2003)NUNES, L. R. O. P. Linguagem e comunicação alternativa: uma introdução. In: NUNES, L. R. O. P. (Org.). Favorecendo o desenvolvimento da comunicação em crianças e jovens com necessidades educacionais especiais. Rio de Janeiro: Dunya, 2003. p. 1-13. discute que as estratégias de ensino que utilizam a instrução verbal para levar a informação à criança apresentam diferentes características, de acordo com as necessidades da criança, sendo necessário considerar sua idade, sua compreensão e suas habilidades motoras e sensoriais. Nessa perspectiva, Rocha (2013)ROCHA, A. N. D. C. Recursos e estratégias da tecnologia assistiva a partir do ensino colaborativo entre os profissionais da saúde e educação. 2013. 211 f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2013. relata ser preciso garantir a compreensão do auxílio verbal, sendo necessário refletir sobre o seu conteúdo e extensão.

Outro auxílio oferecido pelos profissionais neste estudo foram os não verbais, que diz respeito sobre quando os profissionais oferecem ou a criança solicita auxílio por meio de gestos e/ou expressões faciais.

Criança 2 fica na frente do balanço olhando para cuidadora. Cuidadora auxilia a criança a sentar no balanço.

Quando para de balançar, a criança olha para a cuidadora para que ela o empurre novamente.

Os resultados do estudo de Rocha (2013)ROCHA, A. N. D. C. Recursos e estratégias da tecnologia assistiva a partir do ensino colaborativo entre os profissionais da saúde e educação. 2013. 211 f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2013. destacam a necessidade de os profissionais identificarem quais auxílios são necessários para a criança com deficiência física, estando entre os auxílios não verbais os gestos indicativos e as expressões faciais. É essencial oferecer à criança apenas o auxílio que ela necessita, possibilitando, assim, o desenvolvimento de habilidades. Nesse exemplo, a mediação da cuidadora por meio do auxílio não verbal foi importante para a criança participar efetivamente da atividade.

A última subcategoria de participação foi o auxílio motor que está relacionado quando a cuidadora oferece ou a criança solicita auxílio por meio de uma ação motora. O trecho descrito a seguir exemplifica um momento que a cuidadora oferece auxílio motor para o aluno durante as atividades no parque:

Criança 3 necessitou de auxílio da cuidadora para sentar no acesso à rampa do escorregador, pois ele apresenta uma separação de nível entre o castelinho e a rampa do escorregar, e, logo em seguida, escorregou com a ajuda da cuidadora.

A participação do aluno neste caso descrito dependia do auxílio motor da cuidadora, mesmo o ambiente onde ela desenvolvia a atividade ser próprio para a sua faixa etária. A necessidade do auxílio pode ter sido acentuada pelo fato do parque não atender as propostas do desenho universal. Ferland (2006)FERLAND, F. O Modelo lúdico: o brincar, a criança com deficiência física e a terapia ocupacional. 3.ed. São Paulo: Roca, 2006. e Blanche (2002)BLANCHE, E. I. Play and process: adult play embedded in the daily routine. In: ROOPNARIRE, J. (Org.). Conceptual, social-cognitive, and contextual issues in the fields of play. Conn: Ablex Publishing, 2002. p. 249-278. discutiram que o brincar é essencial para o desenvolvimento da criança, e é uma atividade de fácil acesso para as crianças sem deficiências, porém a criança com deficiência física necessita de recursos específicos que favoreçam o brincar em seus ambientes naturais, como no caso equipamentos recreativos acessíveis e o auxílio motor do cuidador.

Para finalizar, foi verificado o desempenho das crianças com paralisia cerebral, sendo que nesta categoria foi identificado a qualidade da ação da criança durante a participação nas atividades realizada no parque, ou seja, os resultados obtidos pelo aluno por meio do brincar no parque da escola. Os resultados obtidos identificaram que todas as crianças do estudo tiveram prejuízos no desempenho, porém a criança 3 foi a mais prejudicada possivelmente pelo seu maior comprometimento motor identificado no GMFCS. Também foi possível verificar que a falta de adequação nos equipamentos recreativos pode ter dificultado o melhor desempenho das crianças nas atividades do parque da escola; esta situação é exemplificada nos trechos a seguir:

Até no meio da rampa, a Criança 1 anda sem auxílio da cuidadora, porém, depois, necessitou da ajuda da cuidadora para terminar de subir a rampa. Tem dificuldades em fletir o joelho e fazer a dorsiflexão e escorrega em um determinado trajeto.

Criança 2 está no balanço de barriga para baixo, com o apoio só da barriga no acento e a criança não tem controle de tronco e acaba se desequilibrando e cai para frente, batendo com o rosto contra a areia.

No estudo de Araújo e Galvão (2007)ARAÚJO, A. E.; GALVÃO, C. Desordens Neuromotoras. In: CAVALCANTI, A.; GALVÃO, C. Terapia Ocupacional: fundamentação e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. p. 328-337., as crianças com deficiência física apresentaram dificuldades nas atividades lúdicas, advindas da própria patologia. Diante disso, é necessário proporcionar e/ou manter o auxílio ou adaptar os equipamentos recreativos, promovendo estratégias que facilitem a participação da criança, criando situações em que esta possa experimentar, agir; enfim, brincar. A escolha do brinquedo necessita ser adequada à faixa etária, proporcionar segurança e motivação à criança (ARAÚJO; GALVÃO, 2007ARAÚJO, A. E.; GALVÃO, C. Desordens Neuromotoras. In: CAVALCANTI, A.; GALVÃO, C. Terapia Ocupacional: fundamentação e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. p. 328-337.).

5 Conclusão

A utilização do Protocolo para avaliação da acessibilidade física em escolas de Educação Infantil proposto por Corrêa (2010)CORRÊA, P. Elaboração de um protocolo para avaliação de acessibilidade física em escolas da educação infantil. 2010. 174 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2010. foi eficiente para identificar as necessidades em relação às adequações dos equipamentos recreativos e do ambiente do parque. Notou-se que, mesmo identificando que o parque escolar não se encontra acessível para as crianças com paralisia cerebral, elas participam das atividades realizadas nesse ambiente com o auxílio de cuidadores e de professores.

Observou-se a necessidade de formação dos profissionais que acompanham a criança no parque, a fim de capacitá-los a utilizarem estratégias para ampliar a participação da criança durante as atividades lúdicas realizadas nesse ambiente. Ademais, é fundamental que profissionais capacitados realizem uma proposta de adequação do parque infantil, tornando-o acessível e seguro a todas as crianças, assim como é proposto pelo Desenho Universal.

Sugere-se para estudos futuros a ampliação deste estudo por meio da avaliação de acessibilidade de outros parques escolares, estudos que proponham adaptações para os equipamentos recreativos e ambiente do parque, bem como propostas de formação para os profissionais que acompanham as crianças nesse ambiente.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    02 Nov 2016
  • Revisado
    29 Maio 2017
  • Aceito
    19 Jun 2017
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