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Introdução ao uso do Tablet para Comunicação Alternativa por uma Jovem com Paralisia Cerebral2 2 Pesquisa com fi nanciamento PIBITI/CNPQ/UFSCar/2015-2017.

RESUMO:

Esta pesquisa teve como objetivo avaliar a transição da prancha de comunicação em papel para a prancha de comunicação no tablet para uma jovem com paralisia cerebral, tendo em vista verificar a efetividade do uso desse recurso de tecnologia assistiva como um equipamento alternativo para a comunicação. Participou do estudo uma jovem com paralisia cerebral usuária de prancha de comunicação em papel tendo como material para construção uma pasta, velcro e cartões de palavras. Foi utilizado um delineamento de comparação entre intervenções com reversão com as seguintes fases experimentais: A1. e A2. não há intervenção; B. implementação de acessibilidade ao tablet; BC. implementação de acessibilidade ao tablet somada a órtese de posicionamento; BCD1. e BCD2. implementação de acessibilidade ao tablet somada à órtese de posicionamento e às modificações na mesa de apoio. Ao investigar o uso do tablet associado aos recursos de tecnologia assistiva implementados os resultados alcançados indicam dados positivos quanto aos procedimentos de ensino estabelecidos para a implementação do tablet em substituição à prancha em papel.

PALAVRAS-CHAVE:
Educação Especial; Sistemas de Comunicação; Paralisia Cerebral

ABSTRACT:

This research aimed to evaluate the transition from communication through paperboard to communication through a tablet for an adolescent with cerebral palsy in order to verify the effectiveness of using this assistive technology resource as an alternative form of communication. The participant of this study was an adolescent with cerebral palsy who uses a paper communication board in conjunction with a folder, Velcro and word cards. A design of comparison between interventions with reversion were used with the following experimental phases: A1. and A2. Also, without intervention; B. Implementation of accessibility to the tablet; BC. Implementation of accessibility to the tablet plus the orthosis for positioning; BCD1. and BCD2, implementation of accessibility to the tablet plus the positioning orthosis and modifications in the table of support. When investigating the use of the tablet associated with the implemented resources of assistive technology the results indicated a positive data related to the teaching procedures established with the implementation of the tablet instead of the paperboard.

KEYWORDS:
Special Education; Communication Systems; Cerebral Palsy

1 Introdução

Atualmente, a Tecnologia Assistiva é reconhecida como uma área de conhecimento teórico e prático, de caráter interdisciplinar que se insere no âmbito da ampliação de diretos às pessoas com deficiência e mobilidade reduzida. Configura-se como um conjunto de práticas, instrumentos e técnicas que favorecem a realização de atividades cotidianas, auxiliando e potencializando as habilidades funcionais do sujeito, buscando promover e assegurar sua autonomia e independência, com vistas à ampliação da participação social (Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007Secretaria Especial dos Direitos Humanos (2007). Ata VII - Comitê de Ajudas Técnicas - CAT. Brasília: CORDE/SEDH/PR.). Atuando em contextos diversos, a Tecnologia Assistiva propõe estratégias para a superação das barreiras vivenciadas pelas pessoas com deficiência, atuando inclusive no acesso à comunicação por meio da implementação de recursos e sistemas alternativos (Pelosi, 2011Pelosi, M. B. (2011). Tecnologia assistiva. In L. R. O. P. Nunes (Org.), Comunicar é preciso: Em busca das melhores práticas na educação do aluno com deficiência. Marília: ABPEE .).

Esses sistemas e meios alternativos têm mostrado efetividade em possibilitar e favorecer as habilidades sociais e de comunicação ao promover o desenvolvimento da linguagem, a participação na escola e em outros ambientes, necessários para o desenvolvimento de crianças e jovens com necessidades complexas de comunicação advindos de condições como a paralisia cerebral ou os transtornos do espectro autista (Nunes, 2003Nunes, L. R. O. P. (2003). Linguagem e comunicação alternativa: Uma introdução. In L. R. O. P. Nunes (Org.), Favorecendo o desenvolvimento da comunicação em crianças e jovens com necessidades educacionais especiais (pp. 1-13). Rio de Janeiro: Dunya.; Von Tetzchner & Martinsen, 2000Von Tetzchner, S., & Martinsen, H. I. (2000). Introdução à comunicação aumentativa e alternativa. Porto: Porto Editora.; Desai, Chow, Mumford, Hotze, & Chau, 2014Desai, T., Chow, K., Mumford, L., Hotze, F., & Chau, T. (2014). Implementing an iPad-based alternative communication device for a student with cerebral palsy and autism in the classroom via an access technology delivery protocol. Computers & Education, 79, 148-158.).

Nessa direção, Pelosi (2009, p. 166)Pelosi, M. B. (2009). Tecnologias em comunicação alternativa sob o enfoque da terapia ocupacional. In D. Deliberato, M. J. Gonçalves, & E. C. Macedo (Orgs.), Comunicação alternativa: Teoria, prática, tecnologias e pesquisa (pp. 163-173). São Paulo: Memnon Edições Científicas. propõe que a Comunicação Alternativa pode ser compreendida como "[...] um grupo integrado de componentes que inclui os símbolos, os recursos, as estratégias e as técnicas adaptadas que vão auxiliar as pessoas com disfunção ocupacional a se comunicar e a participar de suas atividades diárias". Tal comunicação poderá ocorrer por meio de figuras, símbolos, representações visuais, auditivas ou táteis que sejam ensinadas com um significado para o sujeito (Pereira & Sampaio, 2011Pereira, M. F., & Sampaio, V. (2011). Parte B: Comunicação Alternativa. In V. C. Cury, M. B. Brandão (Org.), Reabilitação em Paralisia Cerebral. Rio de Janeiro: Científica MedBook LTDA.; Cook & Polgar, 2015Cook, A. M., & Polgar, J. M. (2015). Assistive technologies: Principals and practice (4a ed.). St. Louis, Missouri: Mosby.).

Especificamente quanto aos recursos de comunicação alternativa, existe distinção entre os tipos que podem ser implementados. Podem classificar-se em símbolos que não necessitam de recursos externos (utiliza seu próprio corpo para se comunicar) e símbolos que necessitam de recursos externos (aqueles que exigem instrumentos ou equipamentos), como a prancha de comunicação em papel ou softwares para tablet e vocalizadores (Pereira & Sampaio, 2011Pereira, M. F., & Sampaio, V. (2011). Parte B: Comunicação Alternativa. In V. C. Cury, M. B. Brandão (Org.), Reabilitação em Paralisia Cerebral. Rio de Janeiro: Científica MedBook LTDA.; Pelosi, 2013Pelosi, M. B. (2013). Dispositivos móveis para comunicação alternativa: Primeiros passos. In L. Passerino, L., M. R. Bez, A. C. C. Pereira, & A. Peres (Orgs.), Comunicar para incluir (pp. 371-379). Porto Alegre: Ponto & Vírgula., 2016Pelosi, M. B. (2016). Dispositivos móveis para comunicação alternativa: Primeiros passos. In M. A. Almeida, E. G. Mendes (Orgs.), Educação especial e seus diferentes recortes (pp. 185-201). Marília: ABPEE .).

Para que ocorra o processo de implementação de um recurso de tecnologia assistiva e inclusive para os recursos e sistemas de comunicação alternativa, Manzini e Santos (2002)Manzini, E. J., & Santos, M. C. F. (2002). Portal de ajudas técnicas para a educação: Equipamento e material pedagógico para educação, capacitação e recreação da pessoa com deficiência - recursos pedagógicos adaptados (v.1). Brasília: MEC. Recuperado em 2 de Março de 2018 de http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/rec_adaptados.pdf.
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/...
operacionalizaram as etapas envolvidas para inserir, adequar e facilitar o uso do recurso escolhido para o ambiente educacional, mas que podem ser diretamente aplicadas a outros contextos, conforme apresentado a seguir:

Entender a situação que envolve o estudante: escutar seus desejos; identificar características físicas/psicomotoras; observar a dinâmica do estudante no ambiente escolar; reconhecer o contexto social.

Gerar ideias: conversar com usuários (estudante/família/colegas); buscar soluções existentes (família/catálogo); pesquisar materiais que podem ser utilizados; pesquisar alternativas para confecção do objeto.

Escolher a alternativa viável: considerar as necessidades a serem atendidas (questões do educador/aluno); considerar a disponibilidade de recursos materiais para a construção do objeto - materiais, processo para confecção, custos.

Representar a ideia (por meio de desenhos, modelos, ilustrações): definir materiais; definir as dimensões do objeto - formas, medidas, peso, textura, cor, etc.

Construir o objeto para experimentação: experimentar em situação real de uso.

Avaliar o uso do objeto: considerar se atendeu o desejo da pessoa no contexto determinado; verificar se o objeto facilitou a ação do aluno e do educador.

Acompanhar o uso: verificar se as condições do aluno mudam com o passar do tempo e se há necessidade de fazer alguma adaptação no objeto (Manzini & Santos, 2002Manzini, E. J., & Santos, M. C. F. (2002). Portal de ajudas técnicas para a educação: Equipamento e material pedagógico para educação, capacitação e recreação da pessoa com deficiência - recursos pedagógicos adaptados (v.1). Brasília: MEC. Recuperado em 2 de Março de 2018 de http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/rec_adaptados.pdf.
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, pp. 10-11).

Assim, com os cuidados necessários durante a escolha e sua proposição, os recursos de tecnologia assistiva podem compor as ações no processo de implementação de sistemas alternativos de comunicação às pessoas com deficiência e que apresentam necessidades complexas de comunicação (Manzini & Deliberato, 2006Manzini, E. J., & Deliberato, D. (2006). Portal de ajudas técnicas para educação: Equipamento e material pedagógico especial para educação, capacitação e recreação da pessoa com deficiência física: Recursos para comunicação alternativa (2a ed.). Brasília: MEC- SEESP.; Cook & Polgar, 2015Cook, A. M., & Polgar, J. M. (2015). Assistive technologies: Principals and practice (4a ed.). St. Louis, Missouri: Mosby.), com destaque para aqueles com paralisia cerebral, sujeito desta pesquisa.

Em meio à variedade de sistemas e de recursos alternativos e com o aumento da disponibilização de tecnologias que permitem o acesso aos softwares e aplicativos de comunicação alternativa, podemos perceber a mudança no modo de se comunicar por pessoas em diferentes idades (Baxter, Enderby, Evans, & Judge, 2012Baxter, S., Enderby, P., Evans, P., & Judge, S. (2012). Barriers and facilitators to the use of high-technology augmentative and alternative communication devices: A systematic review and qualitative synthesis. International Journal of Language & Communication Disorders, 47(2), 115-129.; Pelosi, 2013Pelosi, M. B. (2013). Dispositivos móveis para comunicação alternativa: Primeiros passos. In L. Passerino, L., M. R. Bez, A. C. C. Pereira, & A. Peres (Orgs.), Comunicar para incluir (pp. 371-379). Porto Alegre: Ponto & Vírgula., 2016Pelosi, M. B. (2016). Dispositivos móveis para comunicação alternativa: Primeiros passos. In M. A. Almeida, E. G. Mendes (Orgs.), Educação especial e seus diferentes recortes (pp. 185-201). Marília: ABPEE .). Esse maior acesso da população às tecnologias móveis, aliado à facilidade na aquisição de aplicativos de comunicação alternativa fez com que o público-alvo e suas famílias que anteriormente não consideravam seu uso aderissem a esse tipo de comunicação (McNaughton & Light, 2013McNaughton, D., & Light, J. (2013). The iPad and mobile technology revolution: Benefits and challenges for individuals who require augmentative and alternative communication. Augmentative and Alternative Communication, 9, 107-116.).

A introdução do tablet e de outras tecnologias móveis têm oferecido muitos benefícios para indivíduos que necessitem de comunicação alternativa, promovendo maior funcionalidade e ampliação em seu processo comunicativo, além de impulsionar o interesse no desenvolvimento de novos recursos e na investigação sobre como utilizá-los (McNaughton & Light, 2013McNaughton, D., & Light, J. (2013). The iPad and mobile technology revolution: Benefits and challenges for individuals who require augmentative and alternative communication. Augmentative and Alternative Communication, 9, 107-116.). Ainda, estudos na área têm considerado a importância do uso dos recursos tecnológicos em comunicação alternativa no sentido de oportunizarem que seus usuários sejam cada vez mais ativos e autônomos em suas atividades, contribuindo para a qualidade da competência comunicativa (Batorowicz, 2017Batorowicz, B. (2017). Contributions of technology to communication quality: Research and practices. In D. Deliberato, D. R. P. Nunes, & M. J. Gonçalves (Orgs.), Trilhando juntos a comunicação alternativa (pp. 31-46). Marília: ABPEE.).

A possibilidade de transportar o tablet para diversos locais permite que seu usuário possa utilizá-lo em contextos distintos, promovendo sua comunicação em todos os ambientes que frequenta. O uso dos aplicativos associado à saída de voz desse dispositivo possibilita estabelecer conversas com alguém mesmo sem a pessoa permanecer ao lado, auxiliando ou prestando atenção exclusivamente na prancha de papel. Assim, com esse áudio, a criança ou jovem poderá comunicar-se a certa distância de seu interlocutor, sem que ele esteja presente no mesmo cômodo ou ao seu lado, por exemplo.

Exatamente por serem fáceis de transportar e permitirem rápida personalização da prancha por diferentes pessoas, os sistemas de comunicação alternativa utilizando os aplicativos móveis e o tablet tendem a ser preferência pelos pais, professores e os próprios usuários desse tipo de comunicação (Flores et al., 2012Flores, M., Musgrove, K., Renner, S., Hinton, V., Strozier, S., Franklin, S., & Hil, D. (2012). Comparison of communication using the apple iPad and a picture-based system. Augmentative and Alternative Communication, 28(2), 74-84.). Além de ser um importante aliado na comunicação de pessoas com deficiência, Lorah, Parnell, Whitby e Hantula (2015)Lorah, A. R., Parnell, A., Whitby, P. S., & Hantula, D. (2015). A systematic review of tablet computers and portable media players as speech generating devices for individuals with autism spectrum disorder. Journal of Autism Developmental Disorder, 45, 3792-3804., em uma revisão sistemática sobre o assunto, também apontam para a potencialidade da introdução de equipamentos como tablet para crianças com autismo.

Flores et al. (2012)Flores, M., Musgrove, K., Renner, S., Hinton, V., Strozier, S., Franklin, S., & Hil, D. (2012). Comparison of communication using the apple iPad and a picture-based system. Augmentative and Alternative Communication, 28(2), 74-84. indicam que o uso do tablet por crianças e jovens com autismo ou transtornos do desenvolvimento pode inclusive ampliar a comunicação e a motivação em relação ao uso da prancha em papel, reforçando-se a necessidade de investigação ao uso dessa tecnologia. Em Desai et al. (2014)Desai, T., Chow, K., Mumford, L., Hotze, F., & Chau, T. (2014). Implementing an iPad-based alternative communication device for a student with cerebral palsy and autism in the classroom via an access technology delivery protocol. Computers & Education, 79, 148-158., constatou-se um aumento na habilidade de comunicação e do desempenho escolar de um aluno diagnosticado com paralisia cerebral e transtorno do espectro autista quando houve a introdução de software de comunicação alternativa por meio de tablet englobando os pais, os professores e seus assistentes nesse processo. Contudo, a utilização do tablet como dos demais recursos tecnológicos para comunicação alternativa devem levar em conta o contexto do usuário e inserir de forma mais ampla possível todas as formas de comunicação que ele possa utilizar (Pinto & Gardner, 2014Pinto, M., & Gardner, H. (2014). Communicative interaction between a non-speaking child with cerebral palsy and her mother using an Ipad. Child Language Teaching and Therapy, 30(2), 207-220.; Cook & Polgar, 2015Cook, A. M., & Polgar, J. M. (2015). Assistive technologies: Principals and practice (4a ed.). St. Louis, Missouri: Mosby.), o que pode trazer desafios para o seu processo de implementação.

Apesar de existir o aumento no acesso e no uso desse tipo de recurso para comunicação, há necessidade de realizarem-se estudos que evidenciem a implementação e a continuidade do uso após a aquisição pelos usuários, investigando possíveis barreiras e facilitadores desse tipo de tecnologia no cotidiano (Baxter et al., 2012Baxter, S., Enderby, P., Evans, P., & Judge, S. (2012). Barriers and facilitators to the use of high-technology augmentative and alternative communication devices: A systematic review and qualitative synthesis. International Journal of Language & Communication Disorders, 47(2), 115-129.; Flores et al., 2012Flores, M., Musgrove, K., Renner, S., Hinton, V., Strozier, S., Franklin, S., & Hil, D. (2012). Comparison of communication using the apple iPad and a picture-based system. Augmentative and Alternative Communication, 28(2), 74-84.), principalmente no âmbito nacional.

A partir dessas informações, este estudo teve como objetivo avaliar a transição da prancha de comunicação em papel para a prancha de comunicação no tablet, focando no processo e nas etapas de implementação de um aplicativo para comunicação alternativa com uma jovem de 18 anos, com diagnóstico de paralisia cerebral, a fim de identificar as etapas da metodologia utilizada para essa transição.

2 Método

2.1 Procedimentos éticos

O estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética. Os procedimentos aplicados possuem orientação pautada nos princípios do Conselho Nacional de Saúde em relação às Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos (Resolução Nº 466/2012).

2.2 Local da pesquisa

As atividades práticas foram realizadas na residência da participante da pesquisa, mais especificamente na sala de estar, onde os responsáveis disponibilizaram mesa e cadeira.

2.3 Instrumentos para a caracterização do participante

Roteiro de Caracterização do Participante, Gross Motor Function Classification System for Cerebral Palsy - GMFCS R & E (Palisano, Rosenbaum, Bartlett, & Livingston, 2007Palisano, R., Rosenbaum, P., Bartlett, D., & Livingston, M. (2007). Gross Motor Function Classification System - GMFCS. McMaster University: CanChild Centre for Childhood Disability Research.), Manual Abilities Classification System - MACS (Eliasson et al., 2006Eliasson, A. C., Krumlinde-Sundholm, L., Rösblad, B., Beckung, E., Arner, M., Ohrvall, A. M., & Rosenbaum, P. (2006). The Manual Ability Classification System (MACS) for children with cerebral palsy: Scale development and evidence of validity and reliability. Developmental Medicine and Child Neurology, 48(7), 549-554.) e Communication Function Classification System for Individuals with Cerebral Palsy - CFCS (Hidecker et al., 2011Hidecker, M. J. C., Paneth, N., Rosenbaum, P. L., Kent, R. D., Lillie, J., Eulenbergh, J. B. … Taylor, K. (2011). Developing and validating the Communication Function Classification System (CFCS) for individuals with cerebral palsy. Developmental Medicine and Child Neurology, 53(8), 704-710.).

2.4 Participante

Uma jovem denominada S., de 18 anos, com diagnóstico de paralisia cerebral com pontuações em nível IV no GMFCS, IV no MACS e IV no CSCF com comunicação não verbal e, por vezes, ineficiente, ainda que com o uso da prancha/álbum. A participante ingressou na escola com quatro anos de idade. No período de realização do estudo (fevereiro a junho de 2015), a jovem cursava o terceiro ano do Ensino Médio em uma escola privada. Frequentou semanalmente a fisioterapia, psicopedagogia e psicologia. Utilizava órteses de posicionamento funcional para punho e para ambos os tornozelos devido à espasticidade e hipertonia. Especificamente quanto ao uso da prancha, a jovem foi introduzida a esse sistema ao final de sua primeira infância em intervenções específicas com fonoaudiólogo e terapeuta ocupacional.

2.5 Equipamentos

Apple iPad® - Dispositivo de 9,7 polegadas; software/aplicativo para confecção de prancha de comunicação alternativa: com licença para o uso do Vox4All® para sistema IOS; filmadora digital; órtese; ponteira para acionamento do tablet; plano inclinado confeccionado em madeira.

2.6 Instrumentos para a coleta de dados

Protocolo de registro descritivo: Utilizado para anotação das observações situacionais ocorridas no decorrer das sessões de intervenção. Teve como objetivo conhecer o participante e observar seu repertório comportamental de entrada com relação à utilização de prancha de comunicação alternativa.

Protocolo de registro de eventos: Elaborado a partir das observações iniciais e tinha o intuito de verificar se houve mudança nos comportamentos dos participantes a partir da implementação das intervenções planejadas, o registro dos níveis de ajuda necessários para ensino de cada comportamento contemplava 6 pontuações, sendo: 0 (não realiza); 1 (dica física total); 2 (dica física parcial); 3 (demonstração); 4 (dica verbal); e 5 (realização independente).

2.7 Programa de ensino

O programa de ensino foi elaborado a partir dos dados da fase A, na qual a pesquisadora tomou conhecimento do repertório de entrada da participante do estudo na realização da atividade de uso da prancha de comunicação e domínio do tablet. Vale ressaltar que a tomada de decisão para intervenção e implementação dos recursos foi de acordo com o ritmo e a resposta da participante, impossibilitando a previsão de todas as etapas do programa de ensino, adequando-se então unicamente a cada sessão segundo as necessidades e as demandas apresentadas.

Foram utilizados os procedimentos de ajuda descritos no protocolo de registro de eventos para ensino das atividades à participante. Após análise do repertório de entrada e elaboração do programa, iniciaram-se as sessões de intervenção. O Quadro 1 demonstra a descrição das habilidades envolvidas nas atividades propostas.

Quadro 1
Apresentação das habilidades básicas contidas no protocolo de avaliação

2.8 Procedimentos de implementação e avaliação

Para implementação e avaliação, as situações de ensino foram separadas em: 1. utilização da prancha de comunicação alternativa em papel e; 2. utilização do tablet. O desenvolvimento das situações de ensino foi realizado em diferentes momentos com a participante, indicando a ordem de implementação das seguintes fases experimentais A, B, BC e BCD. Vale ressaltar que cada uma das letras das fases experimentais representa um modelo de procedimento, desde a ausência de intervenção (A) ou disponibilização de recursos de tecnologia assistiva, até a utilização dos recursos de forma isolada (B) ou em conjunto aos demais recursos (BC, BCD).

Fase experimental A1: Inicialmente, foram realizados encontros com a participante e sua mãe, a fim de observar como ocorria o uso da prancha de comunicação em papel já implementada. Essa fase permitiu que a pesquisadora tomasse conhecimento do repertório de entrada do participante quando exposta às diferentes formas de uso do recurso. Concomitantemente, apresentou-se o tablet à participante sem instruções ou intervenções para levantamento do seu repertório de entrada quanto ao uso desse recurso. A partir das características da participante identificadas com o MACS e CSCF e as demandas levantadas pela família e pela própria participante, foram delineadas as intervenções que seriam úteis em um futuro próximo e auxiliariam no desenvolvimento de sua autonomia. Na Figura 1, podemos observar como se dava o uso da prancha de papel para comunicação alternativa, sendo necessário auxílio em 100% das vezes que a participante tinha intenção de se comunicar, uma vez que o interlocutor deveria segurar e posicionar o álbum de comunicação e virar as páginas conforme solicitação da participante. Podemos observar também a dificuldade em acessar a tela touch do tablet por conta da deformidade física - flexão das articulações metacarpofalangianas, hiperextensão das articulações interfalangianas proximais e flexão das articulações interfalangianas distais dos dedos.

Figura 1
Imagens das situações de comunicação alternativa com a prancha de papel e utilização do tablet antes da implementação da intervenção

Fase experimental B: Iniciou-se essa fase de intervenção expondo a participante à primeira situação de ensino, apresentando-lhe o programa de intervenção com orientações para uso da prancha, as quais deveriam auxiliar o uso do tablet (por exemplo: formas alternativas de apontar os símbolos). Em seguida, foi iniciado o uso do tablet com orientações específicas para entendimento de seu funcionamento e formas alternativas de acesso. Tal uso contemplava o acesso ao aplicativo que possibilitava a replicação das pranchas de comunicação que o participante tinha em papel, porém com interação dinâmica entre os símbolos e os temas.

Para possibilitar que a participante acessasse fisicamente o tablet de maneira independente para seleção das imagens, foram propostas duas órteses de posicionamento para acomodar uma caneta de acionamento do touch. A primeira em formato de oito que proporciona a estabilização da articulação interfalangiana proximal permitindo, com isso, sua flexão (Schaf & Silva, 2003Schaf, S., & Silva, P. G. (2003). Pausa entre consultas: Órtese para pescoço-de-cisne. Revista Brasileira de Reumatologia, 43(3), 171.). A segunda órtese que promovia o bloqueio das mesmas articulações, mas seu formato consistia em uma tala posicionada na parte palmar do dedo e estabilizada com velcro. A participante optou pelo uso da segunda proposta, com a fixação da caneta adaptada para acionamento (Figura 2).

Figura 2
Caneta para tablet adaptada para as condições específicas da participante do estudo elaborada pela pesquisadora principal para a condição experimental B

Esta fase experimental teve como critério a participante atingir 70% de independência para realização das atividades ensinadas. Ao atingir tal critério, passou-se à próxima fase experimental.

Fase experimental BC: Para a segunda fase de intervenção, manteve-se a órtese adaptada (B) e inseriu-se o plano inclinado confeccionado em madeira (C) (Figura 3). A inserção desse recurso teve como intuito aumentar a autonomia para utilização dotablet, promover mais estabilidade do aparelho para que a participante tivesse firmeza ao utilizá-lo e pudesse fazer isso independentemente de terceiros.

Figura 3
Imagens do plano inclinado adaptado para as condições específicas da participante do estudo elaborada pela pesquisadora principal para a condição experimental BC

Fase experimental BCD1: Após as sessões com os recursos de tecnologia assistiva implementados nas fases B e BC, realizaram-se, novamente, sessões com desbloqueio automático, a fim de verificarmos a usabilidade da participante da pesquisa com total independência. Como nas outras sessões, utilizou-se o plano inclinado na mesa da sala de estar, posicionou-se a cadeira de rodas de S. frente ao plano inclinado, colocou-se a caneta adaptada em seu dedo e retirou-se o bloqueio automático do tablet. Posteriormente, colocou-se o tablet no plano inclinado e foi solicitada a participante que utilizasse o dispositivo. Ao atingir autonomia superior a 90%, passou-se à fase seguinte.

Fase experimental A2: A sessão de reversão pautou-se na retirada de todas as adaptações instauradas e na utilização do tablet sem os recursos de tecnologia assistiva e configurações anteriormente oferecidas à participante. Assim, com a diminuição abrupta da independência de S. ao utilizar o dispositivo tecnológico para comunicação, seria garantida a maior validade da intervenção e dos recursos construídos, comprovando sua efetividade. Com os mesmos procedimentos da Fase Experimental A, foi solicitado à participante que utilizasse o dispositivo, sem oferecer os recursos de tecnologia durante três sessões consecutivas.

Fase experimental BCD2: Após as sessões de reversão (Fase experimental A2), realizaram-se três sessões com todos os recursos de tecnologia assistiva implementados (caneta adaptada, plano inclinado e desbloqueio automático) para verificar a usabilidade da participante da pesquisa com total independência.

2.9 Concordância interobservadores

A concordância interobservadores deste estudo foi realizada por meio de testes de fidedignidade em 25% das observações de cada fase experimental, nos quais se obteve concordância superior a 75% entre os registros da pesquisadora principal e da auxiliar de pesquisa.

2.10 Procedimento de análise dos dados

Considerando que é uma intervenção que pode produzir uma mudança comportamental, foi utilizado o delineamento de comparação entre intervenções com reversão, com as seguintes fases experimentais: A1 B BC BCD1 A2 BCD2 (Gast & Leadford, 2014Gast, D. L., Ledford, J. R. (2014). Single case research methodology: Applications in special educational and behavioral sciences. New York: Routledge.). Por meio do delineamento proposto, foram sistematizadas informações sobre cada etapa do processo de implementação de um recurso de tecnologia, podendo demonstrar os efeitos de cada decisão do terapeuta ocupacional a partir das respostas comportamentais emitidas pela participante do estudo.

Os resultados obtidos por meio da intervenção realizada nessa pesquisa provêm da observação e análise das filmagens realizadas na residência da participante e das anotações dos diários de campo e protocolos construídos especialmente para a pesquisa.

3 Resultados

A Figura 4 apresenta a porcentagem de independência da participante no uso do tablet a partir da inserção e retirada de recursos de tecnologia assistiva. Já a Figura 5 apresenta a porcentagem dos níveis de ajuda que a pesquisadora principal ofereceu para a participante em cada sessão anterior à intervenção e durante a implementação dos recursos de tecnologia assistiva. Importante destacar que, nas fases experimentais A1 e A2, não eram ofertados níveis de ajuda, mas era apenas observada a ausência da conduta ou total independência para sua realização.

Figura 4
Porcentagem de independência da participante para realizar as atividades solicitadas no decorrer das fases experimentais do estudo

Figura 5
Porcentagem dos níveis de ajuda ofertados pelo pesquisador à participante para realizar as atividades solicitadas no decorrer das fases experimentais do estudo

Ao analisarmos os dados apresentados nas Figuras 4 e 5, pudemos constatar que o fato de a participante ter a deformidade em seu 2º dedo a impedia de realizar as atividades propostas na fase experimental A1, demonstrando dependência de 78%. A partir da segunda sessão da fase experimental B, com a inserção do primeiro dispositivo de tecnologia assistiva para facilitar o acesso, a participante obteve 89% do total de independência nas atividades propostas que incluem o uso do tablet para comunicação. Contudo, para a participante atingir 100% de independência, havia dois itens na lista de comportamentos do protocolo de registro que necessitavam serem pensados. As atividades "Desbloquear o tablet" e "Selecionar figura desejada com a mão, dedos, utilizando órtese ou caneta para tablet" pontuavam níveis de ajuda 2 e 3, consecutivamente, indicando auxílio externo ofertado para a jovem referente a 20% de porcentagem de ajuda fornecida pela pesquisadora.

Então, a Fase experimental BC compõe o plano inclinado somado à ponteira utilizada na fase anterior. Após esse novo recurso ser inserido na intervenção, a participante pôde comunicar-se sem necessitar de outra pessoa segurando o tablet, favorecendo sua autonomia e independência, proporcionando uma postura correta ao utilizar o tablet, possibilitando que o utilizasse por mais tempo.

Em relação à pontuação 3 da atividade "Selecionar figura desejada com a mão, dedos, utilizando órtese ou caneta para tablet", a participante necessitava de demonstração para realizá-la. Tal auxílio resultava em 10% de ajuda da pesquisadora para realizar a atividade, conforme mostram as Figuras 4 e 5 no decorrer da Fase experimental BC. Com o decorrer das sessões de ensino do funcionamento do software para a participante e das demonstrações de uso oferecidas, ela pôde compreender as funções e utilizá-las sem necessitar de demonstrações nas demais sessões, indicando a necessidade de adaptação ao software e a sua interface e funcionamento, pois apenas o acesso à tela não foi suficiente para estabelecer a pontuação máxima de independência.

Com esse resultado, podemos perceber que, para a participante alcançar 100% de independência no uso do tablet e do software, ela necessitava de auxílio para desbloquear o equipamento com independência. Como opção, foi conversado com a participante e sua família sobre a possibilidade de retirarmos o bloqueio da tela, iniciando o dispositivo assim que a capa protetora fosse retirada. Ambos concordaram em fazermos um teste e verificarmos a eficácia dessa intervenção.

Após ser retirada a opção de bloqueio (fase experimental BCD1 - órtese e adaptação para caneta + plano inclinado de madeira + retirada de bloqueio), a participante passou da pontuação "2 - Dica Física Parcial" para "5 - Independente", facilitando seu uso e favorecendo sua independência.

Entretanto, para validarmos os resultados, fez-se necessário realizar a Fase experimental A2 nomeada "reversão". Na reversão, todos os equipamentos de tecnologia assistiva e de acesso utilizados foram retirados e foi observado o desempenho da participante na ausência das tecnologias. As sessões de reversão pontuaram 22% de independência nas atividades propostas, pontuação idêntica à alcançada na fase experimental A1. Esse resultado permite dizer que os recursos de tecnologia assistiva e de acesso foram essenciais para o uso independente do tablet e do software Vox4All pela participante.

Após a reversão, iniciou-se outra etapa agora denominada "fase experimental BCD2", em que novamente todos os dispositivos de tecnologia assistiva e de acesso para favorecer o uso do tablet pela participante foram disponibilizados (tala e caneta adaptada para tablet, plano inclinado e desbloqueio). Ao inserirmos novamente todos esses materiais, verificamos que os resultados voltaram a atingir 100% independência (Figuras 4 e 5).

Quanto à validade social do estudo, os registros descritos dos eventos e diálogos com a participante e seus pais indicaram que todos avaliaram a pesquisa como muito produtiva, facilitando a comunicação da jovem com os familiares. Além disso, expandiu as possibilidades de S. utilizar as diferentes tecnologias implementadas para aumentar sua autonomia e potencializar efetiva comunicação em diferentes ambientes, como a escola e a comunidade.

4 Discussão

A intervenção descrita na pesquisa teve como objetivo propor um treinamento para o início do uso de um aplicativo móvel de comunicação alternativa associado ao uso do tablet para uma jovem com paralisia cerebral usuária de álbum de comunicação alternativa no intuito de investigar as demandas e as etapas específicas para esse processo. Conforme descrito no método e nos resultados, foi realizado um total de 19 sessões ao longo do estudo, sendo 10 de intervenção propriamente dita, o que traz indicativos de que a introdução ao uso do tablet ocorreu em um curto espaço de tempo. Compreendemos que o delineamento aplicado foi determinante para essa questão, tendo em vista que a cada sessão proposta era possível mensurar o nível de independência alcançado pela jovem e programar as orientações e os recursos necessários para o encontro seguinte, com vistas à ampliação da autonomia no uso do tablet.

O raciocínio para a escolha dos recursos de tecnologia assistiva seguiram as etapas sugeridas por Manzini e Santos (2002)Manzini, E. J., & Santos, M. C. F. (2002). Portal de ajudas técnicas para a educação: Equipamento e material pedagógico para educação, capacitação e recreação da pessoa com deficiência - recursos pedagógicos adaptados (v.1). Brasília: MEC. Recuperado em 2 de Março de 2018 de http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/rec_adaptados.pdf.
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, principalmente para gerar ideias e buscar exemplos na literatura no sentido de favorecer o acesso ao uso do tablet pela participante. Ao observarmos os resultados obtidos nesta pesquisa, pudemos perceber o progresso da participante em relação ao uso do tablet com os recursos de tecnologia assistiva para comunicação alternativa. Nas fases experimentais, há a pontuação mínima no gráfico ao seu início, e, após iniciarmos a intervenção, pudemos perceber o aumento de sua autonomia no uso do tablet e, também, em sua comunicação com outras pessoas, além de poder externalizar suas necessidades.

Assim, de acordo com os resultados alcançados nesta pesquisa, podemos validar a necessidade da inserção de recursos de tecnologia assistiva para o acesso aos sistemas que viabilizem a comunicação alternativa, tendo em vista que houve a necessidade da implementação dos recursos para favorecer o acionamento da tela touch e o seu posicionamento (Pelosi, 2009Pelosi, M. B. (2009). Tecnologias em comunicação alternativa sob o enfoque da terapia ocupacional. In D. Deliberato, M. J. Gonçalves, & E. C. Macedo (Orgs.), Comunicação alternativa: Teoria, prática, tecnologias e pesquisa (pp. 163-173). São Paulo: Memnon Edições Científicas.; Cook & Polgar, 2015Cook, A. M., & Polgar, J. M. (2015). Assistive technologies: Principals and practice (4a ed.). St. Louis, Missouri: Mosby.), principalmente em casos da presença de comprometimentos motores que impossibilitem o manuseio dos materiais e dos equipamentos com segurança como na paralisia cerebral. Especificamente quanto à órtese, as características motoras referentes ao punho e aos dedos da participante traziam indicativos da proposição de uma órtese também para estabilização e alinhamento do punho. Contudo, por escolha de S. e de sua família, para a pesquisa, a função alvo da órtese deveria ser o acionamento do tablet.

A órtese proposta na intervenção aqui descrita tinha exclusivamente o objetivo de apoiar o dedo e o uso da caneta para a seleção na tela, sem prever o posicionamento do punho, e a jovem foi encaminhada ao serviço do município para essa outra intervenção. Sobre o plano inclinado, sua proposição auxiliou no sentido de propiciar o apoio ao tablet para favorecer o alcance manual da participante na seleção dos itens (Manzini & Deliberato, 2006Manzini, E. J., & Deliberato, D. (2006). Portal de ajudas técnicas para educação: Equipamento e material pedagógico especial para educação, capacitação e recreação da pessoa com deficiência física: Recursos para comunicação alternativa (2a ed.). Brasília: MEC- SEESP.). Ainda, aliadas aos recursos confeccionados, a possibilidade de novas configurações do dispositivo e as orientações sobre o uso do aplicativo favoreceram o uso autônomo do tablet e do aplicativo pela participante, ampliando sua independência durante as interações com a pesquisadora.

O uso do álbum e das pranchas de comunicação pela participante era realizado sempre com o auxílio do interlocutor, que posicionava o recurso para a jovem poder apontar com o dedo as palavras selecionadas. Além disso, o interlocutor virava as páginas conforme solicitação da jovem, enquanto que o aplicativo utilizado permitia a configuração das pranchas em sistema dinâmico, conferindo mais autonomia da jovem na construção e emissão de frases, uma das vantagens apresentadas pela literatura no uso dos dispositivos móveis para comunicação alternativa (Light & McNaughton, 2013McNaughton, D., & Light, J. (2013). The iPad and mobile technology revolution: Benefits and challenges for individuals who require augmentative and alternative communication. Augmentative and Alternative Communication, 9, 107-116.; Cook & Polgar, 2015Cook, A. M., & Polgar, J. M. (2015). Assistive technologies: Principals and practice (4a ed.). St. Louis, Missouri: Mosby.; Batorowicz, 2017Batorowicz, B. (2017). Contributions of technology to communication quality: Research and practices. In D. Deliberato, D. R. P. Nunes, & M. J. Gonçalves (Orgs.), Trilhando juntos a comunicação alternativa (pp. 31-46). Marília: ABPEE.).

Cabe destacar que a jovem participante já era usuária de um sistema de comunicação alternativa previamente implementado por profissionais da fonoaudiologia e da terapia ocupacional que a acompanhavam ao longo dos anos e que a intenção da pesquisa foi propiciar um treinamento para a transição da prancha em papel para o tablet. Desse modo, o programa de ensino descrito não teve como intenção propor e avaliar a introdução a um sistema de comunicação alternativa em si, mas, sim, em favorecer sua ampliação para outros tipos de recursos e estratégias. Nesse sentido, a especificidade da prancha no tablet em emitir os sons e vozes selecionados pela participante atua como um diferencial importante nessa oferta de novos recursos e novas possibilidades, permitindo ao parceiro de comunicação a oportunidade de ouvi-la dizer algo, e não apenas observá-la apontar as palavras no papel, além de viabilizar que a jovem seja ouvida por mais pessoas que estejam próximas. Podemos dizer, portanto, que a tecnologia atuou como uma aliada ao processo de comunicação alternativa estabelecida com a jovem, no sentido de compor como mais uma de suas estratégias, de modo a conferir maior qualidade comunicativa (Batorowicz, 2017Batorowicz, B. (2017). Contributions of technology to communication quality: Research and practices. In D. Deliberato, D. R. P. Nunes, & M. J. Gonçalves (Orgs.), Trilhando juntos a comunicação alternativa (pp. 31-46). Marília: ABPEE.; McNaugthon & Light, 2013Light, J., & McNaughton, D. (2013). Putting people first: Re-thinking the role of technology in augmentative and alternative communication intervention. Augmentative Alternative Communication, 29(4), 299-309.).

Esse destaque torna-se importante principalmente quanto à preocupação de pesquisadores da área em apontarem que, apesar do caminho promissor no avanço da oferta de dispositivos tecnológicos cada vez maior, o foco das intervenções deve se manter em ações sobre como viabilizar a ampliar a comunicação em si de seus usuários e a disponibilidade de seus interlocutores, e não terem como alvo primário o uso do recurso tecnológico (Baxter et al., 2012Baxter, S., Enderby, P., Evans, P., & Judge, S. (2012). Barriers and facilitators to the use of high-technology augmentative and alternative communication devices: A systematic review and qualitative synthesis. International Journal of Language & Communication Disorders, 47(2), 115-129.; Nunes & Walter, 2014Nunes, L. R. O. P., & Walter, C. C. F. (2014). A comunicação alternativa para além das tecnologias assistivas. Arquivos Analíticos de Políticas Educativas, 22(83), 1-16.; Light & McNaughton, 2013McNaughton, D., & Light, J. (2013). The iPad and mobile technology revolution: Benefits and challenges for individuals who require augmentative and alternative communication. Augmentative and Alternative Communication, 9, 107-116.). Implicações dessa natureza incidem diretamente nos serviços e nos profissionais atuantes com a população de crianças e jovens com deficiência e necessidades complexas de comunicação, de modo a se manterem atualizados nas alternativas disponíveis, porém atentos às práticas que realmente favoreçam à ampliação da competência comunicativa.

5 Conclusões

Os dados forneceram indicativos sobre a aplicabilidade do tablet associado a softwares para comunicação alternativa e ampliada como um recurso a compor as estratégias utilizadas por crianças com paralisia cerebral não-verbais para comunicação. A partir dos resultados e das discussões, é possível concluir que o uso do tablet para a comunicação da participante mostrou-se viável e de rápida implementação tendo em vista o número de sessões necessárias para a intervenção, favorecendo sua independência em manipulá-lo e iniciar diálogos com a pesquisadora. Entretanto, devido às características da jovem participante e da forma de acionamento do tablet, recursos de tecnologia assistiva foram imprescindíveis para garantir o seu uso.

Com a descrição de cada procedimento realizado, houve a sistematização das estratégias empregadas em cada um dos casos quanto ao ensino do uso de um novo recurso para comunicação alternativa. Observar e analisar as estratégias utilizadas e o comportamento da jovem em relação ao uso do tablet permitiu que fosse compreendida a real necessidade dos recursos de tecnologia assistiva utilizados e do tablet como opção à prancha de comunicação alternativa em papel já utilizada pela jovem.

Nessa direção, considera-se que os procedimentos de coleta e análise dos dados com a utilização de delineamentos experimentais permitiram as tomadas de decisão e ajustes nas instruções e nos recursos fornecidos ao longo da intervenção conforme a resposta da própria participante, o que pode servir de exemplo a outros terapeutas ocupacionais ou demais profissionais que venham a intervir nessa área.

Por fim, aponta-se que se faz necessária a continuidade de estudos que se debrucem sobre o uso de tablet e aplicativos para comunicação alternativa por crianças e jovens com paralisia cerebral no âmbito nacional, inclusive de ampliar o escopo das investigações sobre sua implementação em múltiplos contextos de vida de seus usuários.

  • 2
    Pesquisa com fi nanciamento PIBITI/CNPQ/UFSCar/2015-2017.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    18 Dez 2017
  • Revisado
    08 Mar 2018
  • Aceito
    12 Mar 2018
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