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Relatos de Séries de Casos de Adultos Institucionalizados com Deficiência Múltipla: Como Avaliar a Funcionalidade?

RESUMO:

O objetivo deste artigo é propor e aplicar uma forma de classificação neurofuncional, baseada em posicionamentos e transferências em adultos institucionalizados com deficiência múltipla grave. O método utilizado foi o estudo transversal, descritivo, em uma instituição de longa permanência de Curitiba, estado do Paraná. Foi realizada filmagem dos participantes nas posições da escala Gross Motor Function Measure (GMFM), transferências de posturas e deslocamento. A pontuação de 1 a 5 pontos foi dada a partir da escala Aquatic Functional Assessment Scale (AFAS), como uma adaptação em solo. Utilizou-se a Classificação Internacional da Funcionalidade (CIF) como ferramenta para detalhar as posições quanto aos qualificadores de facilitadores e restritores para cada participante. Foram avaliados cinco participantes com deficiência múltipla, com idades entre 21 e 29 anos, com predomínio do sexo feminino (80%). Apenas um participante tinha a marcha assistida e 3 (60%) apresentaram estereotipia de mãos ou tronco. As transferências entre as posições não foram realizadas de forma independente por nenhum participante. A maior pontuação encontrada pela AFAS foi de 14 pontos e a pior foi de 5 pontos. Os resultados indicam que a CIF foi sensível para perceber os movimentos ou posicionamentos restritores e facilitadores para cada um dos participantes, e ela pode ser capaz de auxiliar na escolha das melhores formas de avaliação.

PALAVRAS-CHAVE:
Classificação Internacional de Funcionalidade; Incapacidade e Saúde; Fisioterapia; Habilidades motoras

ABSTRACT:

The objective of this paper is to propose and apply a form of functional neurological classification, based on positioning and transference in institutionalized adults with severe multiple disabilities. The method used was the cross-sectional, descriptive study in a long-stay institution in Curitiba, state of Paraná, Brazil. Participants were filmed at the Gross Motor Function Measure (GMFM), posture transfer and displacement positions. The score from 1 to 5 points was given from the Aquatic Functional Assessment Scale (AFAS), as an adaptation to the floor. The International Classification of Functionality (ICF) was used as a toll to detail the positions regarding qualifiers of facilitators and restrictors for each participant. Five participants with multiple disabilities were evaluated, aged between 21 and 29 years, with a predominance of females (80%). Only one participant had assisted gait and 3 (60%) had stereotyped hands or upper body. Transfers between positions were not performed independently by any participant. The highest score found by AFAS was 14 points and the worst score was 5 points. The results indicate that the ICF was sensitive to perceive the movements or restrictive positions and facilitators for each of the participants and it may be able to help in choosing the best forms of evaluation.

KEYWORDS:
International Classification of Functionality; Disability and Health; Physical Therapy; Motor Skills

1 Introdução

A expectativa de vida de pessoas com deficiência (PcD) tem aumentado (Hess, Campagna, & Jensen 2017Hess, M., Campagna, E. J., & Jensen, K. M. (2017). Low bone mineral density risk factors and testing patterns in institutionalized adults with intellectual and developmental disabilities. Journal of Applied Research in Intellectual Disabilities, 31(1), 157-164. doi: 10.1111/jar.12341.
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), acompanhando o panorama mundial de aumento da expectativa de vida (Mckenzie, Ouellette-Kuntz, & Martin, 2017Mckenzie, K., Ouellette-Kuntz, H., & Martin, L. (2017). Applying a general measure of frailty to assess the aging related needs of adults with intellectual and developmental disabilities. Journal of Policy and Practice in Intellectual Disabilities, 14(2), 124-128. doi: https://doi.org/10.1111/jppi.12197.
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), porém são escassos os estudos brasileiros (Margre, Reis, Morais, & Ramos, 2011Margre, A. L. M., Reis, M. G. L., Morais, R. L. de S., & Ramos, A. D. (2011). Adultos com Paralisia Cerebral: implicações para intervenção em neuropediatria. In L. V. Castilho-Weinert, & C. D. Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (pp. 305-320). Curitiba: Omnipax.), especialmente em pessoas institucionalizadas com deficiência múltipla. Entende-se por deficiência múltipla a associação de mais de um tipo de deficiência, com impactos sobre sua funcionalidade (Rocha & Pletsch, 2018Rocha, M. G. D. S. da, & Pletsch, M. D. (2018). Comunicação alternativa como instrumento externo de compensação: Possibilidades para aprendizagens de alunos com múltiplas deficiências. Revista Interinstitucional Artes de Educar, 4(1), 174-185. doi:https://doi.org/10.12957/riae.2018.32774.
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).

Ao longo dos anos, indivíduos com múltiplas desordens neurofuncionais podem apresentar declínio funcional (Quatman-Yates, Quatman, Meszaros, Paterno, & Hewett, 2012Quatman-Yates, C. C., Quatman, C. E., Meszaros, A. J., Paterno, M. V., & Hewett, T. E. (2012). A systematic review of sensorimotor function during adolescence: A developmental stage of increased motor awkwardness? British Journal of Sports Medicine, 46(9), 649-655. doi: 10.1136/bjsm.2010.079616.
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) principalmente após os 21 anos de idade e com comprometimento grave (Hanna et al., 2009Hanna, S. E., Rosenbaum, P. L., Bartlett, D. J., Palisano, R. J., Walter, S. D., Avery, L., & Russell, D. J. (2009). Stability and decline in gross motor function among children and youth with cerebral palsy aged 2 to 21 years. Dev Med Child Neurol, 51(4), 295-302.). Além disso, é esperado um prognóstico reservado para aquelas pessoas que apresentam comprometimentos associados (Voorman, Dallmeijer, Knol, Lankhorst, & Becher, 2007Voorman, J. M, Dallmeijer, A. J., Knol, D. L., Lankhorst, G. J., & Becher, J. G. (2007). Prospective longitudinal study of gross motor function in children with cerebral palsy. Arch Phys Med Rehabil, 88(7), 871-876. doi: 10.1016/j.apmr.2007.04.002.
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), como, por exemplo, alteração múltipla, fato que pode ser impactante sobre aspectos funcionais ao longo da vida (Chaney & Eyman, 2000Chaney, R. H., & Eyman, R. K. (2000). Patterns in mortality over 60 years among persons with mental retardation in a residential facility. Mental retardation, 38(3), 289-293. doi: 10.1352/0047-6765(2000)038<0289:PIMOYA>2.0.CO;2.
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).

Considerando a funcionalidade como um indicador de saúde (Stucki & Bickenbach, 2017Stucki, G., & Bickenbach, J. (2017). Functioning: The third health indicator in the health system and the key indicator for rehabilitation. European Journal of Physical and Rehabilitation Medicine, 53(1), 134-138. doi: 10.23736/S1973-9087.17.04565-8.
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), atualmente tem sido crescente o uso da Classificação Internacional da Funcionalidade, incapacidade e Saúde (CIF) (Organização Mundial de Saúde [OMS], 2015Organização Mundial de Saúde (2015). CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. São Paulo: EDUSP.) no âmbito da atenção em saúde. Tal forma de classificação busca compreender o indivíduo em seu contexto, observando suas habilidades e restrições funcionais. Assim sendo, indivíduos com o mesmo diagnóstico podem ter diferentes desfechos quando observados pela CIF. Para realização dessa classificação, é sugerido o uso de escalas de avaliação, como forma de sistematização dos dados (Cieza, Fayed, Bickenbach, & Prodinger, 2016Cieza, A., Fayed, N., Bickenbach, J., & Prodinger, B. (2016). Refinements of the ICF Linking Rules to strengthen their potential for establishing comparability of health information. Disability and rehabilitation, 17, 1-10. doi: 10.3109/09638288.2016.1145258.
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; Silva et al., 2016Silva, A. Z. D., Vojciechowski, A. S., Mélo, T. R., Yamaguchi, B., Touchan, A. S., Bertoldi, A. S., & Israel, V. L. (2016). Neuropsychomotor evaluation and functional classification in schoolchildren between the ages of 10 and 12 from the public school system. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, 27(1), 52-62. doi: http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-6149.v27i1p52-62.
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), além de observações qualitativas referentes ao indivíduo e seu entorno.

No modelo biopsicossocial (OMS, 2015Organização Mundial de Saúde (2015). CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. São Paulo: EDUSP.), fatores pessoais como características e sequelas físico-funcionais que envolvem os domínios de função e estrutura corporal (pouca mudança de posição e realização de movimentos e estímulos), dimensões de atividades e participação (reduzida estimulação por meio de atividade física e envolvimento social), além de fatores ambientais (institucionalização e tempo de permanência em cada posição e ambiente), somados ao próprio desconhecimento dos profissionais de saúde a respeito do envelhecimento, podem predispor a um maior comprometimento funcional (Margre et al., 2011Margre, A. L. M., Reis, M. G. L., Morais, R. L. de S., & Ramos, A. D. (2011). Adultos com Paralisia Cerebral: implicações para intervenção em neuropediatria. In L. V. Castilho-Weinert, & C. D. Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (pp. 305-320). Curitiba: Omnipax.). Tal fato pode levar a comorbidades e mortalidade precoces (Chaney & Eyman, 2000Chaney, R. H., & Eyman, R. K. (2000). Patterns in mortality over 60 years among persons with mental retardation in a residential facility. Mental retardation, 38(3), 289-293. doi: 10.1352/0047-6765(2000)038<0289:PIMOYA>2.0.CO;2.
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). Assim, o desenvolvimento da pessoa com deficiência múltipla deve ser compreendido de forma integrada e relacionada ao contexto (Sousa & Franco, 2012Sousa, R. D. D., & Franco, V. (2012). A investigação sobre a transição para a vida adulta e envelhecimento na população com deficiência intelectual. Revista INFAD, 3(1), 281-289.), independentemente da faixa etária, na tentativa de minimizar as alterações secundárias à deficiência primária.

Na avaliação de PcD, especialmente em casos de deficiência múltipla, o grau de comprometimento da deficiência, a etiologia, o sexo dos sujeitos (visto que mulheres têm maior sobrevida), o tipo de residência em que vivem e o estímulo recebido consistem variáveis a serem investigadas (Sousa & Franco, 2012Sousa, R. D. D., & Franco, V. (2012). A investigação sobre a transição para a vida adulta e envelhecimento na população com deficiência intelectual. Revista INFAD, 3(1), 281-289.). E ainda hoje são diversas as formas de avaliação funcional (Castaneda, Castro, & Bahia, 2014Castaneda, L., Castro, S. S. de, & Bahia, L. (2014). Construtos de incapacidade presentes na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD): Uma análise baseada na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Revista Brasileira de Estudos de População, 31(2), 419-429. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-30982014000200009.
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) e pouco discutido sobre tais avaliações no contexto de pessoas com PcD adultas e institucionalizadas.

Faltam escalas de avaliação funcional padronizadas para essa população e orientações de como melhor atender e tratar cada um deles. Para auxiliar nesse processo, a CIF abre novos horizontes e possibilidades para o entendimento da funcionalidade humana em todas as suas manifestações como um indicador de saúde (OMS, 2015Organização Mundial de Saúde (2015). CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. São Paulo: EDUSP.).

A literatura aponta resultados controversos quanto à institucionalização de PcD. Alguns relatam piora funcional (Quatman-Yates et al., 2012Quatman-Yates, C. C., Quatman, C. E., Meszaros, A. J., Paterno, M. V., & Hewett, T. E. (2012). A systematic review of sensorimotor function during adolescence: A developmental stage of increased motor awkwardness? British Journal of Sports Medicine, 46(9), 649-655. doi: 10.1136/bjsm.2010.079616.
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), menor autonomia (OMS, 2015Organização Mundial de Saúde (2015). CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. São Paulo: EDUSP.) e maiores problemas de saúde (Chaney & Eyman, 2000Chaney, R. H., & Eyman, R. K. (2000). Patterns in mortality over 60 years among persons with mental retardation in a residential facility. Mental retardation, 38(3), 289-293. doi: 10.1352/0047-6765(2000)038<0289:PIMOYA>2.0.CO;2.
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); enquanto outros estudos ainda são inconclusivos, não sabendo exatamente se, pelos pacientes serem mais graves, acabam sendo institucionalizados, ou, por serem institucionalizados, acabam com limitações mais severas (Sousa & Franco, 2012Sousa, R. D. D., & Franco, V. (2012). A investigação sobre a transição para a vida adulta e envelhecimento na população com deficiência intelectual. Revista INFAD, 3(1), 281-289.).

Associado aos achados inconclusivos sobre o efeito da institucionalização sobre a funcionalidade, há a própria questão da dificuldade de avaliação e acompanhamento de PcD com deficiência múltipla na transição da infância e da adolescência para a vida adulta, no que se relaciona aos cuidados de sua condição de saúde e inserção social (Binks, Barden, Burke, & Young, 2007Binks, J. A., Barden, W. S., Burke, T. A., & Young, N. L. (2007). What do we really know about the transition to adult-centered health care? A focus on cerebral palsy and spina bifida. Archives of Physical Medicine and Rehabilitation, 88(8), 1064-1073. doi: 10.1016/j.apmr.2007.04.018.
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; Haak, Lenski, Hidecker, Li, & Paneth, 2009Haak, P., Lenski, M., Hidecker, M. J. C., Li, M., & Paneth, N. l. (2009). Cerebral palsy and aging. Developmental Medicine & Child Neurology, 51, 16-23. doi: 10.1111/j.1469-8749.2009.03428.x.
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). Dessa forma, como podemos pensar em avaliar e acompanhar o desenvolvimento de adultos com deficiência múltipla institucionalizados?

Muitas vezes a PcD, após a idade adulta, apresenta estagnação e queda do seu estado funcional (Haak et al., 2009Haak, P., Lenski, M., Hidecker, M. J. C., Li, M., & Paneth, N. l. (2009). Cerebral palsy and aging. Developmental Medicine & Child Neurology, 51, 16-23. doi: 10.1111/j.1469-8749.2009.03428.x.
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), e, por não haver um instrumento específico de avaliação funcional de adultos com deficiência múltipla, a Gross Motor Function Measure (GMFM), amplamente utilizada para paralisia cerebral (PC), para crianças, adolescentes e ainda jovens adultos (Nelson, Owens, Hynan, Iannaccone, & AmSMART Group, 2006Nelson, L., Owens, H., Hynan, L. S., Iannaccone, S. T., & AmSMART Group (2006). The gross motor function measure™ is a valid and sensitive outcome measure for spinal muscular atrophy. Neuromuscular Disorders, 16(6), 374-380. doi: 10.1016/j.nmd.2006.03.005.
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; Margre et al., 2011Margre, A. L. M., Reis, M. G. L., Morais, R. L. de S., & Ramos, A. D. (2011). Adultos com Paralisia Cerebral: implicações para intervenção em neuropediatria. In L. V. Castilho-Weinert, & C. D. Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (pp. 305-320). Curitiba: Omnipax.), foi selecionada, neste estudo, como forma de mensurar as habilidades motoras dos adultos com deficiência múltipla.

Selecionada pelos posicionamentos funcionais, a GMFM pode ser uma forma de acompanhamento da pessoa com deficiência múltipla. E, como forma de pontuação, a Aquatic Functional Assessment Scale (AFAS) pode ser utilizada como ferramenta de pontuação de cada uma dessas posições, uma vez que esta observa as habilidades individuais e não apenas as restrições funcionais. Tal escala classifica componentes motores de forma quali/quantitativa (Israel & Pardo, 2014Israel, V. L., & Pardo, M. B. L. (2014). Hydrotherapy: Application of an Aquatic Functional Assessment Scale (AFAS) in Aquatic Motor Skills Learning. American International Journal of Contemporary Research, 4(2), 42-52.).

Nesse sentido, a fim de propor novas formas de observação de habilidades posturais em PcD adultas, o objetivo deste estudo foi aplicar uma forma de classificação neurofuncional, baseada em posicionamentos e transferências em adultos com deficiência múltipla institucionalizadas e apresentar os possíveis facilitadores e restritores por meio da CIF em cada posicionamento.

2 Métodos

Trata-se de um estudo transversal descritivo (Abily-Donval et al., 2015Abily-Donval, L., Pinto-Cardoso, G, Chadie, A., Guerrot, A.-M., Torre, S., Rondeau, S., & Marre, S. (2015). Comparison in outcomes at two-years of age of very preterm infants born in 2000, 2005 and 2010. PloS one, 10(2), e0114567. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0114567.
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), a partir do modelo biopsicossocial da CIF realizado em uma instituição de longa permanência que abriga cerca de 200 pessoas com deficiência cognitiva e/ou múltipla de Curitiba, estado do Paraná. Essa instituição funciona como casa lar para os moradores, conta com educação escolar e serviço de atenção à saúde. Também é apoiada por uma igreja e não tem fins lucrativos. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Instituto Brasileiro de Therapias e Ensino CAAE: 53310116.8.0000.5229, Parecer nº 1.429.717, com registro clínico RBR-2st594.

A demanda por tal investigação surgiu da própria instituição e equipe pedagógica no sentido de obter uma forma de avaliação e acompanhamento de evolução funcional e da aprendizagem (Rocha & Pletsch, 2018Rocha, M. G. D. S. da, & Pletsch, M. D. (2018). Comunicação alternativa como instrumento externo de compensação: Possibilidades para aprendizagens de alunos com múltiplas deficiências. Revista Interinstitucional Artes de Educar, 4(1), 174-185. doi:https://doi.org/10.12957/riae.2018.32774.
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) de moradores com deficiências múltiplas, considerando a funcionalidade como indicador de relevância. Contudo, nesse primeiro momento, foram feitas avaliações que envolveram apenas as questões de mobilidade funcional.

Foram incluídos, no estudo, moradores de uma instituição de longa permanência para pessoas com deficiência múltipla de Curitiba com mais de 20 anos, que pudessem realizar atividades físicas fora da cadeira e do leito. Foram excluídos moradores com alterações psiquiátricas associadas e idosos. Participaram do estudo cinco moradores da instituição, com idades variando entre 21 e 29 anos, com predomínio do sexo feminino (80%), sendo apenas um (20%) do sexo masculino. A coleta de dados por meio de uma avaliação funcional dos comportamentos motores espontaneamente observados e/ou facilitados aconteceu na mesma instituição, sempre em uma sala equipada com tatames, tablado alto, rolo e/ou bolas, e realizada por profissionais especialistas fisioterapeutas na área neurofuncional.

Toda a avaliação ocorreu de forma individual, durou cerca de uma hora e foi acompanhada por três fisioterapeutas devidamente treinadas. Todas as posições corporais avaliadas nos participantes foram extraídas da GMFM. Esse sistema de avaliação é dividido em cinco dimensões de A E, sendo elas: A= deitar e rolar, B= sentar, C= engatinhar e rolar, D= em pé e= andar, correr e pular. Essas dimensões somam 88 itens, e o participante pode pontuar de 0 a 3, sendo: 0 = não inicia, 1= inicia, 2= completa parcialmente e 3= completa totalmente (Russell, Rosenbaum, Wright, & Avery, 2002Russell, D. J., Rosenbaum, P. L., Wright, M., & Avery, L. M. (2002). Gross motor function measure (GMFM-66 and GMFM-88) user’s manual. Cambridge University Press.; Mélo, 2011Mélo, T. R. (2011). Escalas de avaliação do desenvolvimento e habilidades motoras: AIMS, PEDI, GMFM e GMFCS. In L. V. Castilho-Weinert, & C. D. Forti-Bellani (Eds.), Fisioterapia em Neuropediatria (pp. 23-42). Curitiba: Omnipax .). Como forma de classificação e pontuação das habilidades motoras, dentro de cada posicionamento corporal utilizado pela GMFM, foi utilizado e adaptado o escore da AFAS (Israel & Pardo, 2014Israel, V. L., & Pardo, M. B. L. (2014). Hydrotherapy: Application of an Aquatic Functional Assessment Scale (AFAS) in Aquatic Motor Skills Learning. American International Journal of Contemporary Research, 4(2), 42-52.).

A AFAS classifica o desempenho funcional, por níveis de aprendizagem, nas atividades em pontuação que varia de 1 (0%) até a pontuação 5 (100%) e quanto maior a pontuação melhor é a capacidade motora e a independência (Israel & Pardo, 2014Israel, V. L., & Pardo, M. B. L. (2014). Hydrotherapy: Application of an Aquatic Functional Assessment Scale (AFAS) in Aquatic Motor Skills Learning. American International Journal of Contemporary Research, 4(2), 42-52.). Dessa forma, para cada uma das posições e transferências em solo, foram feitas a adaptação e a graduação da seguinte forma: 1 - Não Faz (NF): corresponde à habilidade de 0%; 2 - com ajuda total (CAT): mais de dois pontos de apoio, corresponde à habilidade de 25%; 3 - com ajuda parcial (CAP): 1 ou 2 pontos de apoio, corresponde à habilidade de 50%; 4 - faz sem ajuda (FSA): com domínio menor/parcial, corresponde à habilidade de 75%; 5 - totalmente alcançada (TA): com domínio maior/completo, corresponde à habilidade de 100%.

Foi utilizado o modelo biopsicossocial da CIF (Figura 1) para melhor compreensão funcional em cada uma dessas posições e observando, além da própria posição, a sua transferência e o contexto dos facilitadores (domínio de fatores ambientais) e restritores (domínio de participação). Nessa perspectiva, foi observado o que cada participante conseguia fazer e o que o limitava na realização de cada postura e transferência. Foram apontadas quais as funções e as estruturas corporais estavam com maior comprometimento que influenciavam na ação do posicionamento corporal.

Figura 1
Proposição do Modelo Integrador da CIF considerando a institucionalização de adultos com deficiência múltipla

Para a avaliação e posterior pontuação, foi realizada filmagem dos participantes nas posições: dorsal, ventral, lateral, transferências para estes decúbitos, sedestação e transferência para a posição sentada, posição gatas e ajoelhada, posição ortostática e em pé com deslocamento, com base na GMFM e AFAS. Para isso, cada pessoa avaliada era posicionada inicialmente na sua posição de melhor conforto e incentivada com objetos e/ou comando verbal pelos avaliadores a mudar de posição. Foram observados seus comportamentos motores voluntários e espontâneos e, na ausência deles, facilitados e guiados pelos terapeutas em mudanças de postura assim como na sua manutenção.

Como complementos às avaliações realizadas, foram retirados do prontuário físico da instituição a data de nascimento e o diagnóstico clínico de cada participante. Foi realizada uma análise descritiva das observações realizadas, após análise dos vídeos, e relatado, de forma qualitativa descritiva, os fatores de facilitadores e restritores da CIF.

3 Resultados

3.1 Avaliação a partir das posturas da GMFM

Foi possível notar que apenas um participante tem a marcha assistida e 3 (60%) apresentam estereotipia de mãos ou tronco. A interação entre o terapeuta e participante foi limitada em todas as avaliações, e as transferências entre uma posição corporal e outra superior não foram realizadas de forma independente por nenhum participante. Todos (n=5) necessitaram de apoio ou estímulo para sair da posição deitada para sentada, sentada para gatas, gatas para ajoelhada e em pé.

3.2 Observação a partir dos facilitadores e restritores do modelo biopsicossocial da CIF

Quanto à observação dos facilitadores e dos restritores da CIF, foi possível perceber que as alterações secundárias à própria deficiência múltipla muitas vezes foram barreiras para a realização dos movimentos. Em contrapartida, como os padrões de movimento, como as estereotipias e escolioses são presentes há muito tempo nos participantes, em alguns casos, são esses os recursos utilizados para realização de alguma movimentação. Foram então essas alterações secundárias, em vários momentos, os facilitadores de movimento, conforme descrito na Tabela 1.

Tabela 1
Classificação dos participantes na perspectiva da CIF

O ambiente em que os participantes passaram a maior parte do tempo também foi considerado restritor, pois, em longos períodos do dia, todos os moradores da instituição ficam em cadeiras de roda ou camas em quartos compartilhados, saindo desses locais apenas no curto período da Fisioterapia. Tal fator acaba por limitar a mobilidade ainda mais e reduzir o relacionamento social dos participantes. Esses aspectos acabam por torná-los dependentes para todas as demandas do dia a dia, talvez promovendo maiores restrições e incapacidades.

4 Discussão

4.1 Avaliação a partir das posturas da GMFM

Este estudo buscou aplicar uma forma de avaliação funcional em pessoas adultas com deficiência múltipla, a partir de instrumentos adaptados, e perceber pela CIF os restritores e os facilitadores de cada posicionamento para cada participante. Com relação ao sexo, nos participantes do presente estudo, houve um predomínio do sexo feminino, e isso se relaciona à literatura no que diz respeito a melhores condições de saúde, atendimento e longevidade feminina (Sousa & Franco, 2012Sousa, R. D. D., & Franco, V. (2012). A investigação sobre a transição para a vida adulta e envelhecimento na população com deficiência intelectual. Revista INFAD, 3(1), 281-289.). Entretanto, da expectativa de vida, nem sempre se associa a ganhos de funcionalidade, entre os indivíduos com deficiência múltipla, o que acaba por influenciar as taxas de mortalidade quando se agregam limitações e outras doenças, como no caso da PC e Síndrome de Down (Sousa & Franco, 2012Sousa, R. D. D., & Franco, V. (2012). A investigação sobre a transição para a vida adulta e envelhecimento na população com deficiência intelectual. Revista INFAD, 3(1), 281-289.). Esse fato torna-se relevante, uma vez que a amostra do estudo aqui apresentado tem essas características e grandes comprometimentos funcionais.

Fazendo uma comparação do processo envelhecimento da pessoa típica, espera-se também um declínio funcional na PcD, e essas perdas podem ser maiores ou menores dependendo do ambiente onde vivem, tipo de estímulo recebido, grau das deficiências e residência institucional (Sousa & Franco, 2012Sousa, R. D. D., & Franco, V. (2012). A investigação sobre a transição para a vida adulta e envelhecimento na população com deficiência intelectual. Revista INFAD, 3(1), 281-289.). Dificuldades funcionais em atividade e participação já foram mencionadas em estudo anterior, com crianças e adolescentes nessa mesma instituição de longa permanência (Mélo, Yamaguchi, Silva, & Israel, 2017Mélo, T. R., Ferreira, M. P., Yamaguchi, B., & Israel, V. L. (2017). Fisioterapia Neurofuncional: atualização de intervenções na infância. In L. B. D. V. L. Araujo, &, V. L. Israel (Eds.), Desenvolvimento da criança: família, saúde e escola (pp. 53-87). Curitiba: Omnipax.). Dessa forma, pode-se notar que a redução funcional na fase adulta é resultado de um processo de anos de redução em estímulos e envolvimento social.

Observaram-se, pela adaptação das escalas da GMFM e AFAS, escores baixos relacionados às atividades funcionais em todas as posturas e, principalmente, para a realização de transferências. Tais observações foram justificadas pelas restrições que os participantes apresentaram em decorrência das complicações secundárias, como deformidades, encurtamentos, contraturas e estereotipias, mesmo sendo essa amostra composta por adultos jovens. Essas complicações musculoesqueléticas são relatadas em outros estudos (Binks et al., 2007Binks, J. A., Barden, W. S., Burke, T. A., & Young, N. L. (2007). What do we really know about the transition to adult-centered health care? A focus on cerebral palsy and spina bifida. Archives of Physical Medicine and Rehabilitation, 88(8), 1064-1073. doi: 10.1016/j.apmr.2007.04.018.
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; Haak et al., 2009Haak, P., Lenski, M., Hidecker, M. J. C., Li, M., & Paneth, N. l. (2009). Cerebral palsy and aging. Developmental Medicine & Child Neurology, 51, 16-23. doi: 10.1111/j.1469-8749.2009.03428.x.
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), o que reforça a necessidade de medidas de atenção à essa população.

Um dos possíveis motivos para tantas alterações secundárias nos participantes do presente estudo pode relacionar-se ao baixo número de cuidadores contratados pela instituição, que necessitam cuidar de mais de uma pessoa ao mesmo tempo e nem sempre tem qualificação específica para cuidar de pessoas com deficiência múltipla.

O pouco envolvimento social, imobilismo e a institucionalização por vezes acabam por aprofundar o declínio funcional de pessoas com deficiência múltipla (Hanna et al., 2009Hanna, S. E., Rosenbaum, P. L., Bartlett, D. J., Palisano, R. J., Walter, S. D., Avery, L., & Russell, D. J. (2009). Stability and decline in gross motor function among children and youth with cerebral palsy aged 2 to 21 years. Dev Med Child Neurol, 51(4), 295-302.). Isso leva ao envelhecimento precoce, com maiores chances de fragilização e dependência, antecipando fatores do processo do envelhecimento e agravando o quadro desses indivíduos (Mckenzie et al., 2017Mckenzie, K., Ouellette-Kuntz, H., & Martin, L. (2017). Applying a general measure of frailty to assess the aging related needs of adults with intellectual and developmental disabilities. Journal of Policy and Practice in Intellectual Disabilities, 14(2), 124-128. doi: https://doi.org/10.1111/jppi.12197.
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). As pessoas com deficiência múltipla acabam adotando posturas e padrões de movimentos, como evidenciado neste estudo, que dificultam sua funcionalidade, comprometendo suas atividades e participação. Essas alterações funcionais impactam em atividades de vida diária, como também nos processos pedagógicos e de adaptação de diferentes funções em contextos diversos. Incluem-se, aqui, a tecnologia assistiva e a comunicação alternativa que acabam por necessitar de adaptações praticamente individuais, dadas as restrições e os comprometimentos secundários.

Corroborando com Wanderer e Pedroza (2013)Wanderer, A., & Pedroza, R. L. S. (2013). Adultos com deficiência na psicologia: Desafios para uma investigação psicológica politicamente consciente. Revista Psicologia Política, 13(26), 147-164., a amostra estudada composta de pessoas com deficiência múltipla têm maiores limitações funcionais que aquelas com apenas DI, sendo mais evidente esse maior comprometimento nos casos de indivíduos com PC e outras comorbidades agregadas (Wanderer & Pedroza, 2013Wanderer, A., & Pedroza, R. L. S. (2013). Adultos com deficiência na psicologia: Desafios para uma investigação psicológica politicamente consciente. Revista Psicologia Política, 13(26), 147-164.), com destaque também para as estereotipias que limitam a função e foram presentes em mais da metade dos participantes.

A verificação de alterações funcionais pela GMFM pode ser difícil em casos de PcD com alterações múltiplas, ao considerar que mudanças do escore 1 para o escore 2 exigem grandes ganhos e só são detectados se a pessoa avaliada o faz sem facilitação do avaliador. Isso se torna difícil em pessoas que, além das dificuldades motoras, apresentam limitações cognitivas associadas. Além disso, não foram identificadas curvas normativas e escores para idades acima de 21 anos. Nesse sentido, o uso da AFAS parece permitir maiores possibilidades de identificação de tais graduações, mesmo se tratando de ambiente diferente, como o solo.

Quanto à funcionalidade dos adultos com deficiência, muitas pesquisas apontam para diferentes caminhos, envolvendo vida profissional, sexual, qualidade de vida e mobilidade físico-funcional. Nessa perspectiva, diversas áreas da saúde propõem possibilidades de assistência com intervenções médicas, fisioterapêuticas, psicológicas, fonoaudiológicas com o foco em avaliar e propor novas terapias ou possibilidades para ganhos funcionais em diferentes contextos em que o adulto pode estar inserido (Wanderer & Pedroza, 2013Wanderer, A., & Pedroza, R. L. S. (2013). Adultos com deficiência na psicologia: Desafios para uma investigação psicológica politicamente consciente. Revista Psicologia Política, 13(26), 147-164.).

4.2 Observação a partir dos facilitadores e restritores do modelo biopsicossocial da CIF

A institucionalização por si só pode representar um facilitador no que diz respeito ao fator ambiental e de proteção à vida, se comparado à realidade anterior do sujeito que provavelmente foi institucionalizado por serem necessários maiores cuidados para a manutenção da sua vida e por dificuldades familiares. No entanto, o que é visto é uma realidade de difícil controle, pois são muitas as demandas que a pessoa com deficiência múltipla exige, poucos os recursos físicos e de pessoas e baixos os estímulos motores e sensoriais.

Ao observarem-se, sob o ponto de vista da CIF, os restritores e as facilitações destacados pela CIF, foi possível notar que as participantes do sexo feminino obtiveram melhores habilidades e facilitadores quando comparadas com o participante do sexo masculino.

. Ao aproximar a CIF das formas de classificação das PcD, passou-se a observar o indivíduo em um contexto multidisciplinar, internacional com incorporação do contexto de cada um, além de buscar entender o estado de saúde real dos sujeitos, sem distinção de faixa etária (Di Nubila & Buchalla, 2008Di Nubila, H. B. V., & Buchalla, C. M. (2008). O papel das Classificações da OMS-CID e CIF nas definições de deficiência e incapacidade. Revista Brasileira de Epidemiologia, 11(2), 324-335. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2008000200014.
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). Dessa forma, sob a perspectiva da CIF, passou-se a observar, também, a deficiência como limitações na função ou estrutura do corpo, como apontadas nas restrições detalhadas neste estudo, e a funcionalidade passou a ser as funções e o desempenho de ações como testadas pelas posturas da GMFM.

A partir das observações feitas dos facilitadores e dos restritores da CIF dentro de cada posicionamento dos participantes, a Fisioterapia poderia contribuir na forma de manutenção e de prevenção de novas complicações em saúde com métodos e técnicas como: Cinesioterapia, Fisioterapia Aquática, Equoterapia, uso de órtese, Snoozelen/ambientes multissensoriais, Terapia Neuromotora Intensiva (TNMI), PenguimSuit®, AdeliSuit®, Pedia Suit®, TheraSuit® e as Terapias manuais (Mélo, Ferreira, Yamaguchi, & Israel, 2017Mélo, T. R., Ferreira, M. P., Yamaguchi, B., & Israel, V. L. (2017). Fisioterapia Neurofuncional: atualização de intervenções na infância. In L. B. D. V. L. Araujo, &, V. L. Israel (Eds.), Desenvolvimento da criança: família, saúde e escola (pp. 53-87). Curitiba: Omnipax.).

Muitas vezes, para mensurar uma doença, são utilizados os prejuízos funcionais causados por ela e suas limitações na qualidade de vida. De acordo com McKenzie et al. (2017)Mckenzie, K., Ouellette-Kuntz, H., & Martin, L. (2017). Applying a general measure of frailty to assess the aging related needs of adults with intellectual and developmental disabilities. Journal of Policy and Practice in Intellectual Disabilities, 14(2), 124-128. doi: https://doi.org/10.1111/jppi.12197.
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, poucas estratégias para avaliação de adultos com deficiências intelectuais e fragilidade surgiram. Dessa forma, mais pesquisas são necessárias para replicação das estratégias e validação de instrumentos.

Nesse sentido, é importante ressaltar que, assim como no estudo aqui apresentado, quando se fala em avaliações de adultos com deficiência múltipla, envolvendo a deficiência intelectual, faltam escalas padronizadas e existem dúvidas quanto a melhor forma de análises. Contudo, a diversidade dessa população, muitas vezes inviabiliza a padronização de escalas, pois há necessidade de descrições individuais de padrões e posturais - fatores que só são abrangidos em sua totalidade por meio de descrições qualitativas. Normalmente, o que ocorre então é a exclusão desses indivíduos da pesquisa, porém eles existem no contexto de inclusão e seus aspectos funcionais precisam ser debatidos (Wanderer & Pedroza, 2013Wanderer, A., & Pedroza, R. L. S. (2013). Adultos com deficiência na psicologia: Desafios para uma investigação psicológica politicamente consciente. Revista Psicologia Política, 13(26), 147-164.), até porque estes têm vivido mais e cada vez com maiores limitações funcionais.

A utilização da GMFM como forma de analisar os comportamentos motores, com associação da AFAS, mostram-se complementares. Também podem ser uma forma alternativa para equipe de reabilitação e pedagógica acompanhar e mensurar os aspectos relacionados à funcionalidade, considerando que ganhos funcionais impactam diretamente em possibilidade de maior autonomia. A falta de ferramentas de avaliação para adultos com deficiência múltipla também pode ser destacada. Além disso, foram poucos os participantes encontrados para o estudo devido à diversidade funcional de adultos institucionalizados com deficiência

5 Conclusões

Foi possível aplicar uma forma de avaliação funcional e perceber as principais barreiras e facilitadores de adultos institucionalizados com deficiência múltipla. Também se notou uma grande quantidade de moradores com deficiência múltipla em instituições de longa permanência sem acompanhamento de avaliação e programas de intervenção padronizados.

Notou-se a dificuldade em encontrar escalas padronizadas para tal população. Entretanto, destaca-se a possibilidade de relatos qualitativos de pessoas com deficiência. Foi percebido que a CIF pode ser um instrumento capaz de auxiliar na escolha das melhores formas de classificação e posterior avaliação, de maneira a compreender a funcionalidade desses indivíduos e ressaltar suas capacidades e suas limitações, orientando, inclusive, condutas terapêuticas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2019

Histórico

  • Recebido
    12 Set 2018
  • Revisado
    26 Out 2018
  • Aceito
    28 Out 2018
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