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Decomposição, liberação e volatilização de nitrogênio em resíduos culturais de mucuna-cinza (Mucuna cinerea)

Decomposition, release and volatilization of nitrogen from velvet bean (Mucuna cinerea) residues

Resumos

As leguminosas possibilitam a incorporação biológica de nitrogênio aos sistemas de produção. Contudo, existe pouco conhecimento sobre a decomposição, liberação e volatilização de nitrogênioassociados à diferentes doses de seus resíduos. Objetivouse, neste trabalho avaliar a decomposição, a liberação e a volatilização de nitrogênio de diferentes doses de mucuna-cinza (Mucuna cinerea Piper & Tracy). O experimento constou de tratamentos com 12 (C12) ou 25 (C25) Mg ha-1 de composto orgânico: C12AV0 (sem leguminosa); C12AV4 (4 Mg ha-1 de resíduo); C12AV8 (8 Mg ha-1); C12AV12 (12 Mg ha-1); C25; AV12 (12 Mg ha-1) e testemunha absoluta. Adotou-se o delineamento de blocos casualizados e cinco repetições. Foram determinadas as taxas de decomposição do adubo verde e liberação de N, o teor de N-mineral no solo e a volatilização de N-NH3. A liberação de N (t½=28 dias) foi mais rápida que a decomposição do resíduo (t½=38 dias). Essa liberação de N eleva rapidamente os teores de N-mineral do solo e resulta também em maior elevação da volatilização de N-NH3. O incremento das doses de 8 para 12 Mg ha-1 de mucuna resultou em aumento mais que proporcional da volatilização acumulada de N-NH3, atingindo 30 kg ha-1 após 30 dias.

Adubação verde; N-mineral; N-NH3


The use of leguminous species allows the biological incorporation of nitrogen into cropping systems. Nevertheless, there is little knowledge about the decomposition, release and volatilization of nitrogen associated with the decomposition of different quantities of residues. The objective of this study was to evaluate the decomposition of the biomass, the release and volatilization of nitrogen from different doses of velvet bean (Mucuna cinerea Piper & Tracy) residues. The treatments were established either with 12 (C12) or 25 (C25) Mg ha-1 of organic compost: C12AV0 (without residue); C12AV4 (4 Mg ha-1 of residue); C12AV8 (8 Mg ha-1); C12AV12 (12 Mg ha-1); C25; AV12 (12 Mg ha-1) and a control. The randomized block design was adopted with five repetitions. Mass dry matter decomposition and N release rate, the soil N-mineral content and N-NH3 volatilization were determined. N mineralization (t ½= 28 days) was faster than the decomposition of dry matter (t ½=38 days). This mineralization rapidly increased the soil mineral-N content and resulted in higher N-NH3 volatilization. However, the increase from 8 to 12 Mg ha-1 of velvet bean mass resulted in an overproportional increase of N-NH3 volatilization, which reached 30 kg ha-1 after 30 days.

Green manure; soil N-mineral; N-NH3


CIÊNCIAS AGRÁRIAS

Decomposição, liberação e volatilização de nitrogênio em resíduos culturais de mucuna-cinza (Mucuna cinerea)

Decomposition, release and volatilization of nitrogen from velvet bean (Mucuna cinerea) residues

Rodolfo Gustavo Teixeira RibasI; Ricardo Henrique Silva SantosII; Rosileyde Gonçalves SiqueiraIII; Ellen Rúbia DinizIII; Luiz Alexandre PeternelliIV; Gilberto Bernardo de FreitasIII

IEMATER - Esloc "A" - Colorado do Oeste, RO

IIUniversidade Federal de Viçosa/UFV - Departamento de Fitotecnia/DFT- Avenida P.H. Rolfs - s/n - 36570-000 - Viçosa, MG - rsantos@ufv.br

IIIUniversidade Federal de Viçosa/UFV - Departamento de Fitotecnia/DFT - Viçosa, MG

IVUniversidade Federal de Viçosa/UFV - Departamento de Informatica/DPI - Viçosa, MG

RESUMO

As leguminosas possibilitam a incorporação biológica de nitrogênio aos sistemas de produção. Contudo, existe pouco conhecimento sobre a decomposição, liberação e volatilização de nitrogênioassociados à diferentes doses de seus resíduos. Objetivouse, neste trabalho avaliar a decomposição, a liberação e a volatilização de nitrogênio de diferentes doses de mucuna-cinza (Mucuna cinerea Piper & Tracy). O experimento constou de tratamentos com 12 (C12) ou 25 (C25) Mg ha-1 de composto orgânico: C12AV0 (sem leguminosa); C12AV4 (4 Mg ha-1 de resíduo); C12AV8 (8 Mg ha-1); C12AV12 (12 Mg ha-1); C25; AV12 (12 Mg ha-1) e testemunha absoluta. Adotou-se o delineamento de blocos casualizados e cinco repetições. Foram determinadas as taxas de decomposição do adubo verde e liberação de N, o teor de N-mineral no solo e a volatilização de N-NH3. A liberação de N (t½=28 dias) foi mais rápida que a decomposição do resíduo (t½=38 dias). Essa liberação de N eleva rapidamente os teores de N-mineral do solo e resulta também em maior elevação da volatilização de N-NH3. O incremento das doses de 8 para 12 Mg ha-1 de mucuna resultou em aumento mais que proporcional da volatilização acumulada de N-NH3, atingindo 30 kg ha-1 após 30 dias.

Termos para indexação: Adubação verde, N-mineral, N-NH3.

ABSTRACT

The use of leguminous species allows the biological incorporation of nitrogen into cropping systems. Nevertheless, there is little knowledge about the decomposition, release and volatilization of nitrogen associated with the decomposition of different quantities of residues. The objective of this study was to evaluate the decomposition of the biomass, the release and volatilization of nitrogen from different doses of velvet bean (Mucuna cinerea Piper & Tracy) residues. The treatments were established either with 12 (C12) or 25 (C25) Mg ha-1 of organic compost: C12AV0 (without residue); C12AV4 (4 Mg ha-1 of residue); C12AV8 (8 Mg ha-1); C12AV12 (12 Mg ha-1); C25; AV12 (12 Mg ha-1) and a control. The randomized block design was adopted with five repetitions. Mass dry matter decomposition and N release rate, the soil N-mineral content and N-NH3 volatilization were determined. N mineralization (t ½= 28 days) was faster than the decomposition of dry matter (t ½=38 days). This mineralization rapidly increased the soil mineral-N content and resulted in higher N-NH3 volatilization. However, the increase from 8 to 12 Mg ha-1 of velvet bean mass resulted in an overproportional increase of N-NH3 volatilization, which reached 30 kg ha-1 after 30 days.

Index terms: Green manure, soil N-mineral, N-NH3.

INTRODUÇÃO

Leguminosas utilizadas como adubos verdes possibilitam por um processo biológico a incorporação de nitrogênio no sistema de produção.Trabalhos com leguminosa tem demonstrado seu potencial com fonte de N (Nunes, et al., 2009; Perin et al., 2007). O gênero Mucuna destaca-se pelo grande potencial de produção e adaptabilidade às variadas condições do solo. A mucuna-cinza (Mucuna cinerea Piper & Tracy) pode acumular mais de 130 kg ha-1 de nitrogênio, apresentando rápida decomposição (Cobo et al., 2002a,b). Nas condições de primavera em Viçosa-MG, após 24 dias da incorporação da mucuna cinza, 50% do nitrogênio contido inicialmente já não estavam mais presentes nos resíduos, ao passo que 50% da massa seca foi decomposta com 35 dias (Diniz et al., 2007). Pouco se sabe sobre a liberação, imobilização e possíveis perdas por lixiviação ou volatilização de NO3-ou NH3 dos adubos verdes. Tais processos dependem de fatores ambientais além da qualidade dos resíduos (Thönnissen et al., 2000; Cobo et al., 2002a,b; Lahti & Kuikman, 2003).

A decomposição pode assumir importante papel no manejo da fertilidade do solo, possibilitando a elaboração de técnicas de cultivo que melhorem a absorção e utilização de nutrientes contidos nos resíduos vegetais, visando o fornecimento às culturas (Gama-Rodrigues et al., 2007). A utilização combinada de composto e adubo verde pode influenciar na disponibilidade de N, nos teores de N-mineral no solo e na volatilização do N-NH3 ao longo do tempo. Silva & Menezes (2007), demonstraram que a incorporação de esterco associado à adubação verde pode promover uma mineralização mais sincronizada com a demanda de nutrientes para a batata.

A maioria dos trabalhos avalia a volatilização de N-NH3 a partir da aplicação de fertilizantes minerais ou estercos. Informações sobre a volatilização de amônia diretamente dos adubos verdes são raros, como as contribuições de Janzen & McGinn (1991), Rana & Mastrorilli (1998) e Marsola et al. (2000). A volatilização do nitrogênio dos adubos verdes é influenciada pela forma de aplicação do resíduo, características do material, do solo e condições climáticas (Lara Cabezas et al., 1997; Rana & Mastrorilli, 1998; Costa et al., 2003; Huijsmans et al., 2003; ROS et al., 2005). Apesar da rápida decomposição, as perdas de nitrogênio por volatilização na mucuna são pequenas quando comparadas com outras leguminosas (Marsola et al., 2000). Esses autores ressaltam que, consequentemente, não há necessidade de incorporar este adubo verde.

No entanto, a massa de leguminosas pode ser utilizada em diferentes quantidades e pouco se conhece sobre o efeito de diferentes doses na taxa de decomposição, liberação e volatilização de nitrogênio proveniente desses materiais. Objetivou-se, no presente trabalho, avaliar a decomposição do adubo verde, a liberação e a volatilização do N-NH3 com diferentes doses de adubo verde associado a composto orgânico.

MATERIAL E MÉTODOS

Os experimentos foram realizados no campo experimental 'Horta Velha' do Departamento de Fitotecnia da Universidade Federal de Viçosa, em Viçosa-MG, com localização geográfica 20º 45' sul e 42º 51' oeste, a 650 m.s.n.m., entre 27/10/04 e 26/12/04. A umidade relativa e a temperatura média desse período foram de 80% e 21ºC respectivamente (Figura 1). O solo da área experimental foi classificado como Cambissolo, e estava sob manejo orgânico há cinco anos. As características químicas na camada de 0-20 cm foram as seguintes: pH em H2O (1:2,5) = 6,0; MO = 3,97 dag kg-1; V = 61,3%, Al+3 = 0,0 cmolc kg-1; Ca+2 = 4,5 cmolc kg-1; Mg+2 = 1,0 cmolc kg-1; K+ = 136 mg kg-1; P2O5 = 94,1 mg kg-1 e CTC = 9,6 cmolc kg-1 de solo.


Foram definidos sete tratamentos: (1) C12AV0, (2) C12AV4, (3) C12AV8, (4) C12AV12, (5) C25, (6) AV12, e (7) TA. Os tratamentos de (1) a (4) receberam a adição de 12 Mg ha-1 de composto em massa seca. Nos tratamentos (2), (3) e (4) adicionou-se também o adubo verde, nas doses de 4, 8 e 12 Mg ha-1 em massa seca. O tratamento (5) constou da aplicação de 25 Mg ha-1 de composto, enquanto o tratamento (6) constou da distribuição de 12 Mg ha-1 de adubo verde e o tratamento (7) não recebeu qualquer insumo.

O adubo verde mucuna-cinza (M. cinerea) foi cultivado em área anexa. As plantas foram cortadas ao nível do solo, retiradas do campo e levadas à área experimental no mesmo dia. Em seguida, foram coletadas amostras desse resíduo e determinado o teor de umidade após secagem em estufa a 60ºC. A massa do adubo verde apresentou a seguinte composição: C:N= 16,8; N= 26,64 g kg-1; P= 2,18 g kg-1; K= 43,25 g kg-1; Ca= 7,20g kg-1; Mg= 2,26g kg-1; S= 1,07g kg-1. Foi determinado o teor de nitrogênio pelo método Kjeldhal, descrito por Bremner & Mulvaney (1982) e dos demais nutrientes segundo métodos de Malavolta et al. (1997). O adubo verde (massa fresca) foi distribuído superficialmente nas parcelas, cobrindo toda a área conforme a dose do tratamento. As parcelas experimentais mediram 2,4 m x 2,4 m.

O composto orgânico foi produzido no local tendo como matéria prima capim napier (Pennisetum purpureum Schumach.) e cama de aviário. O composto apresentava 48,36% de umidade e densidade de 0,66 kg L-1 e as seguintes características: C:N=11,50; N=14,15 g kg-1; P=13,32 g kg-1; K=4,49 g kg-1; Ca=8,15 g kg-1; Mg=3,42 g kg-1; S=5,60 g kg-1 sendo determinado o teor de nitrogênio pelo método Kjeldhal, descrito por Bremner & Mulvaney (1982) e os demais nutrientes segundo Malavolta et al. (1997).

A decomposição e a liberação de nitrogênio dos resíduos de mucuna-cinza foram determinadas utilizando malha de nylon de 2 x 2 mm com dimensão de 20 x 40 cm. A massa de adubo verde foi colocada diretamente sobre o solo e coberta a malha de nylon. Cada parcela continha 20 g de massa seca do adubo verde. Manteve-se a mesma relação talo:folha do adubo verde colhido em campo. As amostras foram coletadas no momento da instalação do experimento e após 3, 7, 11, 15, 20, 30, 45 e 60 dias. Após a coleta, as amostras foram secas em estufa a 60ºC, até atingir massa constante e determinado o teor de nitrogênio pelo método Kjeldhal, descrito por Bremner & Mulvaney (1982).

Aos resultados de decomposição da mucuna-cinza e do nitrogênio remanescente ajustou-se um modelo exponencial simples, segundo a função: Y=Y0.e-kt, onde Y é a massa ou N final das amostras (t60); Y0, a massa ou o N inicial (t0); t, o tempo decorrido na experimentação (60 dias) e k, a constante de decomposição ou liberação de N das amostras e o tempo de meia vida t(1/2) das duas variáveis (Thomas & Asakawa, 1993).

A disponibilidade de nitrogênio no solo foi avaliada semanalmente pela determinação do teor de N-mineral na camada de 0-20 cm e definido como a soma do nitrogênio nas formas de NO3- e NH4+, determinados por espectrofotometria pelos métodos descritos por Yang et al. (1994) e Kempers & Zweers (1986), respectivamente.

A volatilização de N-NH3 foi determinada utilizando coletores fechado-estáticos adaptados daqueles descritos por Lara Cabezas et al. (1999). Os coletores constituíramse de tubos de PVC com diâmetro de 254 mm e 400 mm de comprimento, com tampa de PVC e base enterrada a 5 cm no solo. A captação do N volatilizado foi feita por uma espuma de polietileno, do mesmo diâmetro do coletor, com 10 mm de espessura, contendo 30 mL de H2SO4 0,05 M + glicerina 3% (v/v). O N-NH3 contido na espuma correspondeu ao total de nitrogênio volatilizado. As espumas foram fracionadas , digeridas em ácido sulfúrico e colocadas diretamente em destiladores microKjeldahl, onde se determinou o N-total segundo Bremner & Mulvaney (1982). Os tubos coletores foram instalados um dia após a aplicação do adubo verde. A coleta e troca da espuma ocorreu aos 3, 7, 11, 15, 20 e 30 dias após a instalação dos coletores. As doses de mucuna-cinza e de composto em cada tubo coletor foram proporcionais aos tratamentos. Os tratamentos para a determinação da volatilização estão descritos como: (1) C12AVO (340 g de composto), (2) C12AV4 (340 g de composto + 80 g de adubo verde), (3) C12AV8 (340 g de composto + 160 g de adubo verde) e (4) C12AV12 (340 g de composto + 240 g de adubo verde). Os dados foram expressos em volatilização acumulada de NNH3(kg ha-1).

O delineamento experimental foi o de blocos casualizados com cinco repetições. Quando necessário, os dados foram avaliados por meio de análise de variância, pelo teste F (p<0,05), e teste de médias. As análises foram realizadas no Sistema para Análises Estatísticas e Genéticas (SAEG versão 9.1), segundo métodos descritos por Ribeiro Júnior (2001).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A liberação de nitrogênio foi mais rápida do que a decomposição da massa da mucuna-cinza (Figura 2), à semelhança de resultados relatados por Cobo et al. (2002a,b). O t(1/2) da massa seca foi de 38 dias, enquanto que 50% do nitrogênio estava liberado do resíduo em 28 dias. Resultados similares foram obtidos em um trabalho conduzido em área próxima, que resultou em t(1/2) de 35 e 24 dias respectivamente para massa seca e nitrogênio em resíduos de mucuna-cinza (Diniz et al., 2007).


As elevadas concentrações de nutrientes do solo na área experimental e a baixa relação C:N do adubo verde sugerem que não houve impedimentos químicos à decomposição do adubo verde. O elevado teor de matéria orgânica e do pH podem inclusive ter favorecido a volatilização do N-NH3 que alcançou o solo (Fillery, 2001).

O período inicial de decomposição dos resíduos estaria associado à perda de frações de nutrientes solúveis em água (Aita & Giacomini, 2003). Os fatores ambientais também exercem grande influência sobre o processo de decomposição (Fillery, 2001). No presente caso, as altas temperaturas e a elevada fertilidade do solo certamente contribuíram para uma rápida decomposição da massa e liberação de nitrogênio, assim como a alta concentração de N nos tecidos da mucuna cinza, pois uma das características que podem predizer o potencial da taxa de liberação do N é a relação C:N do resíduo. Quanto menor a relação C:N maior a liberação desses nutrientes por ação dos micro-organismos decompositores. Desse modo, a relação C:N expressa o grau de recalcitrância do substrato no processo de decomposição (Gama-Rodrigues et al., 2007).

Considerando a quantidade inicial de nitrogênio e a curva de liberação de massa seca do adubo verde (Figura 2), estimou-se que as doses de 4, 8 e 12 Mg ha-1 liberaram em 28 dias, 52, 104 e 156 kg ha-1 de N, respectivamente. Essa rápida liberação inicial de nitrogênio do resíduo pode ter influenciado diretamente o teor de N-mineral no solo (Figura 3). Os dados de volatilização dos demais tratamentos constam na Figura 4.




A liberação de 50% do N presente na mucuna (t1/2 equação na Figura 2) ocorreu por volta da quarta semana e, na Figura 3, a partir dessa data observa-se redução nos teores de N-mineral no solo com a aplicação das doses de 4 ou 8 Mg ha-1 de adubo verde, mas com comportamento inverso com a dose de 12 Mg ha-1. Como não ocorreram nem temperaturas nem umidade baixa nesse período (Figura 1) e houve liberação de quantidades expressivas de N (Figura 2), a redução das concentrações de N-mineral podem também decorrer de sua imobilização temporária no solo, conforme demonstrado por Matos et al. (2008), em trabalho conduzido na mesma região. Os dados da Figura 3 sugerem que, da 4ª à 6ª semanas a imobilização do N liberado foi maior que sua mineralização, reduzindo a concentração de N-mineral no solo. Esse processo ocorreria inclusive com a aplicação somente de composto orgânico (Figura 3), em menor escala. No mesmo sentido da discussão anterior, após a 6ª semana a mineralização teria sido superior à imobilização até a 7ª semana, seguida de redução nas concentrações de N-mineral a partir de então, decorrente da baixa liberação de N a partir desta data, quando cerca de 73% do nutriente já haviam deixado a massa do adubo verde.

Na aplicação de 12 Mg ha-1 de adubo verde ocorreu comportamento diferente quanto às concentrações de Nmineral no solo (Figura 3) e volatilização de N-NH3 (Figura 5). Com essa dose houve concentrações mais baixas de Nmineral no solo até a 4ª semana, com elevação desses valores até a 7ª semana, com queda posterior. Esse comportamento pode ser atribuído, ao menos em parte, ao grande volume de massa de adubo verde desse tratamento, o que teria retardado seu contato com o solo e o processo de mineralização o que, apesar das grandes quantidades de N, inicia mais tardiamente que com a aplicação de doses menores. Esse mesmo pouco contato com o solo também pode ser responsável pelo aumento desproporcional da volatilização de N-NH3 com as doses mais alta de mucuna (Figura 5). Assim, uma maior proporção de N da leguminosa teria como destino o ar e não o solo, comparativamente às menores doses.


Há ainda a possibilidade de o processo de liberação de N ser um pouco diferente entre os tratamentos, em função também dos diferentes volumes de adubo verde aplicados. No presente trabalho, as equações de decomposição e liberação de N (Figura 2) foram obtidas em experimento com dose correspondente a 2,5 Mg ha-1 de adubo verde, inferiores portanto àquelas aplicadas nos experimentos de determinação de N-mineral e volatilização. Certamente pesquisas futuras podem sanar essa lacuna de conhecimento.

A Figura 3 indica que o tratamento C12AV12 tendeu a manter mais baixos os teores de N-mineral nas primeiras semanas do que os demais tratamentos com adubo verde, entretanto resultou em teores mais elevados entre a quinta e a oitava semanas superando os demais tratamentos. Nos tratamentos combinados (Figura 3), apesar da menor relação C:N do composto, esses tratamentos tenderam a manter teores mais elevados de N-mineral do que na ausência do composto (AV12) (Figura 4), possivelmente devido ser um material mais estável, homogêneo e menos lábil que o adubo verde. A tendência na elevação dos teores de N-mineral verificada entre a sexta e a oitava semana após o corte da leguminosa pode estar associada a um incremento na decomposição dos resíduos, ocasionado pela elevação da umidade do ar e da temperatura (Figura 1). Tais resultados tendem a demonstrar o efeito da adubação verde com leguminosas em elevar rapidamente os teores de N-mineral no solo, conforme relatos de Thönnissen et al. (2000) e Cobo et al. (2002a,b), sugerindo um alto potencial das leguminosas para a fertilização de culturas.

Os tratamentos C25, AV12 e TA também resultaram em diferentes teores de N-mineral no solo (Figura 4). No solo da testemunha absoluta (TA) até a segunda semana o teor de N-mineral ficou estável, porém após esse período apresentou considerável redução. O solo que recebeu AV12 apresentou elevação do N mineral até a segunda semana, entretanto após a segunda semana, o teor de N-mineral apresentou queda acentuada, permanecendo seus valores próximos ao tratamento TA até ao final das coletas. O teor de N-mineral no solo que recebeu 25 Mg ha-1 de composto elevou-se rapidamente no início, tendendo a permanecer com valores de N-mineral mais alto que AV12 até o final das coletas. Os teores de N-mineral, encontrados no presente trabalho, foram em geral mais elevados do que aqueles relatados por Thönnissen et al. (2000) e Cobo et al. (2002a,b). O aporte de resíduos vegetais associado à adubação orgânica e rotação de culturas em solo sob manejo orgânico, possivelmente contribuiu nos resultados devido à preservação da fração orgânica do solo, consequentemente resultando em maior quantidade de nitrogênio no sistema.

Os tratamentos C25 e AV12 continham quantidades relativamente próximas de nitrogênio (respectivamente 354 e 320 kg ha-1), proporcionando uma liberação inicial rápida desse nutriente. Tais resultados podem indicar que, tanto o adubo verde quanto o composto podem elevar de maneira diferenciada os teores de N-mineral no solo, embora sejam materiais de origem biológica.

Ao utilizar adubos orgânicos de decomposição lenta, Silva & Menezes (2007) sugerem que é importante adicionar um adubo orgânico rico em N e de rápida decomposição, como resíduo de crotalária, visando evitar a imobilização de N do solo durante o ciclo de cultivo, de maneira que a aplicação combinada possa minimizar a deficiência de N do solo, em razão da maior labilidade do adubo verde.

À medida que se elevaram as doses de adubo verde não houve tendência em aumentar proporcionalmente a volatilização no nitrogênio. Ao final de 30 dias após a distribuição do adubo verde, a perda de N-NH3 com o incremento dos tratamentos C12AV4 para C12AV8 (7,0 kg ha-1 de N), não foi a mesma verificada para os tratamentos C12AV8 para C12AV12 (17 kg ha-1 de N) (Figura 5). As perdas mais elevadas foram verificadas com a aplicação da maior dose de mucuna, provavelmente pela formação de amônia diretamente na massa vegetal em decomposição, devido à sua alcalinização resultando em volatilização sem passar pelo solo, como relatado por Janzen & McGinn (1991).

Os valores de N volatilizado estão próximos à emissão acumulada de amônia em solos que receberam incorporação de até 78 Mg ha-1 de massa de feijão (13 kg ha-1), em região de clima mediterrâneo (Rana & Mastrorilli, 1998). Contudo, os métodos diretos de captação de NH3 subestimam a quantidade real perdida de N por volatilização (Lara Cabezas et al., 1999; Port et al., 2003), devido à volatilização de NO2 que ocorre conjuntamente à volatilização de NH3. No presente trabalho foi determinado o N-NH3 total volatilizado. Lara Cabezas et al. (1999) estimando a calibração do tubo coletor semiaberto estático observaram que neste método havia uma perda média 0,26 mg dia-1 de N, subestimando a perda em mais de 40 % quando comparado com o método de 15N. Com isso podemos inferir que as quantidades reais de N perdidas foram maiores que as medidas no coletor.

Embora perdas de N já tenham sido detectadas na primeira amostragem, as maiores taxas de volatilização ocorreram no intervalo entre 7 e 11 dias (Figura 5), em que descontando-se os valores obtidos no tratamento C12AV0, as taxas foram de 0,25, 0,47 e 1,30 kg N ha-1 dia-1, respectivamente nas doses de 4, 8 e 12 Mg ha-1 de mucuna. Esses resultados diferem daqueles de Rana & Mastrorilli (1998), em que 70 % da volatilização de N ocorreu nos dois primeiros dias após a incorporação da massa de plantas de feijão no solo. Tal fato pode ser devido à não incorporação do material vegetal no solo e à mucuna-cinza resultar em menor volatilização de amônia que outras leguminosas (Marsola et al., 2000). À semelhança das perdas de N por volatilização verificadas em cama de aviário nova (0,838%) ou reutilizada (0,574%), relatadas por Oliveira et al. (2003), as perdas de N por volatilização, no composto neste trabalho podem ser consideradas muito baixas. Tal resultado era esperado, pois as perdas são maiores no início da decomposição, processo ocorrido anteriormente durante a compostagem.

CONCLUSÕES

A liberação de N dos resíduos de mucuna-cinza é mais rápida que a decomposição de sua massa. Essa liberação de N elevou rapidamente os teores de N-mineral do solo e resultou, também, em maior volatilização de amônia. A aplicação de altas doses de resíduo de adubo verde resulta em aumento mais que proporcional da volatilização de amônia.

AGRADECIMENTOS

À CAPES (bolsa de Mestrado), pela FAPEMIG (CAG-1819/05) e CNPq (Bolsa Produtividade em Pesquisa).

(Recebido em 8 de outubro de 2008 e aprovado em 3 de março de 2010)

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Ago 2010
  • Data do Fascículo
    Ago 2010

Histórico

  • Recebido
    08 Out 2008
  • Aceito
    03 Mar 2010
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