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SELF E AUTOBIOGRAFIA EM MEMÓRIAS DO SUBSOLO E A CONSCIÊNCIA DE ZENO 1 1 Apoio e financiamento: FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação; Programa de Educação Tutorial PET- SESU; Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará.

SELF Y AUTOBIOGRAFÍA EN MEMORIAS DEL SUBSUELO Y LA CONSCIENCIA DE ZENO

Resumos

A pergunta "Quem sou eu?" remete tanto à problemática do self (a consciência de si) quanto à da autobiografia (a escrita de si). A noção de um eu que tem consciência de si mesmo e o gênero autobiográfico são construções sociais interligadas, marcadas por transformações históricas e culturais da Modernidade Ocidental e objeto de tematização filosófica, científica e literária. Este trabalho discute ambas as problemáticas em Memórias do subsolo, de Dostoiévski (1864/2009), e A consciência de Zeno, de Italo Svevo (1923/2003). Nessas obras podem-se acompanhar os dilemas modernos do entendimento do self e da escrita de si, mediante o tratamento dado por seus autores tanto à matéria quanto à forma textual. Dois eixos temáticos, a verdade de si como doença e a impossibilidade da autobiografia foram analisados comparativamente, com amparo em molduras teóricas transdisciplinares que contribuem para a revisão do conceito de self e do gênero autobiográfico. Nas obras analisadas observa-se o mesmo desafio às bases cartesianas, individualistas e racionalistas do self e da autobiografia operado pela crítica do sujeito moderno, com a figuração dessas realidades como artefatos sociais relacionais e dialógicos, ao invés de realidades individuais acabadas, privadas, estáticas ou dotadas de coesão. Ambas sublinham a condição precária do eu que ganha forma apenas na relação com e reação aos outros. Cada uma, a seu modo, descontrói a crença em concepções fundantes do eu e da autobiografia, levantando questões que hoje são objeto privilegiado de teorização de uma psicologia de linhagem narrativo-dialógica.

Self; autobiografia; dialogismo


La pregunta "¿quién soy yo?" se refiere tanto al problema del self (auto-conciencia) como de la autobiografía (la escritura de sí mismo). La noción de un yo que es consciente de sí y el género autobiográfico son construcciones sociales interconectadas, marcadas por transformaciones históricas y culturales de la modernidad Occidental y objeto de tematización filosófica, científica y literaria. Este artículo discute los dos problemas en Memorias del subsuelo, de Dostoiévski (1864/2009), y La consciencia de Zeno, de Italo Svevo (1923/2003). En estas obras se pueden acompañar los dilemas modernos de la comprensión del self y de la escritura de sí, a través del tratamiento que sus autores dan tanto al contenido como a la forma textual. Dos temas, la verdad de sí como enfermedad y la imposibilidad de la autobiografía, se analizaron comparativamente con amparo de marcos teóricos transdisciplinarios que contribuyen a la revisión del concepto de self y del género autobiográfico. En las obras analizadas, se observa el mismo desafío a las bases cartesianas, individualistas y racionalistas del self y de la autobiografía operado por la crítica del sujeto moderno, con la figuración de estas realidades como artefactos sociales relacionales y dialógicos, en lugar de realidades individuales acabadas, privadas, estáticas o dotadas de cohesión. Ambas destacan la condición precaria del yo que se concreta sólo en la relación con y reacción a los demás. Cada una, a su manera, deconstruye la creencia en las concepciones fundamentales del yo y de la autobiografía, planteando cuestiones que actualmente son objeto privilegiado de teorización de una psicología de linaje narrativo-dialógico.

Self; autobiografía; dialogismo


The question "who am I?" evokes both the problem of the self (self-conscious) and the autobiography (self writing). The notion of a self-conscious I and the autobiographical genre are interconnected social constructions, marked by historical and cultural changes of the Western modernity and object of philosophical, scientific and literary reflection. This paper discusses problems in both Dostoevsky's (1864/2009) Notes from the underground, and Italo Svevo's (1923/2003) Confessions of Zeno. In These works we can observe modern dilemmas regarding the understanding of the self and the self writing by their authors' handling of the content and texts form. Two themes, the truth of self as disease and the impossibility of autobiography were examined comparatively with the support of trans-disciplinary theoretical frames which contribute to the revision of the concept of self and the autobiographical genre. In both novels, the same analysis shows the challenge of Cartesian, individualistic and rationalist underpinnings of the self and the autobiography made by the critical debate of the modern subject, by figuring these realities as the social, relational and dialogical artifacts rather than individual, finished, private, static or coherent entities realities. Both underline the I precarious condition that emerges only in the relationship with and in reaction to others. Each novel, in its own way, disrupt the belief in the I founding conceptions and the autobiography, while raising questions that are now special object of theorization of a narrative-dialogical Psychology.

Self; autobiography; dialogism


Este trabalho nasce do interesse dos autores, participantes do Programa de Educação Tutorial (PET Psicologia) nas relações entre psicologia e literatura. O interesse vem se concretizando em atividades que permitem ler e discutir romances, contos e ensaios considerados importantes para a formação do psicólogo. De fato, o exame dessa relação descortina problemas históricos sobre a subjetivação que atravessam fronteiras científicas e estéticas, fazendo-se presentes tanto nas teorias sobre a psique quanto nas histórias ficcionais.

Um desses problemas é o do self ou da consciência de si, que recebeu grande atenção nos estudos psicossociais modernos desde o início do século XX, nos trabalhos pioneiros de William James, Charles Cooley e George Herbert Mead. Esses autores abriram caminho para uma formulação social do self, rompendo com o self transcendental e abstrato de origem iluminista (Holstein & Gubrium, 2000Holstein, J.A. & Gubrium, J.B. (2000). The self we live by: narrative identity in postmodern world. New York, Oxford: Oxford University Press.). Outro problema vinculado ao do self é o da autobiografia, uma forma confessional de apresentação do eu que emergiu no século XVIII e se afirmou no século seguinte, disseminando a prática da escrita na primeira pessoa até os dias atuais (Galle & Olmos, 2009)Galle, H. & Olmos, A.C. Apresentação. In H. Galle, A.C. Olmos, A. Kanzepolski & L.Z. Izarra. (Orgs.). Em primeira pessoa: abordagens de uma teoria da autobiografia (pp. 9-18). São Paulo:Annablume, FAPESP, FFLCH, USP.2009. O gênero autobiográfico só é possível com a expansão da noção moderna de indivíduo; aliás, participa da configuração do sujeito psicológico moderno, à medida que incita as pessoas a se compreenderem como seres singulares, dotados, cada um, de um espaço interior, íntimo e privado.

O modelo biográfico e autobiográfico moderno, de raiz iluminista, produziu a narrativa de formação, disseminando a noção da vida como aprendizagem contínua na qual o ser vai absorvendo lições até o momento de seu pleno desenvolvimento. A narrativa de formação está associada à noção alemã de Bildung (formação) e ganha forma literária no Bildungsroman (romance de formação), cuja obra mais célebre é Os anos de aprendizagem de Wilhelm Meister (1796), de Goethe. Como afirma Delory-Momberger (2009Delory-Momberger, C. (2009). Filiações e rupturas do modelo autobiográfico na pós-modernidade. In H. Galle, A.C. Olmos, A. Kanzepolski & L.Z. Izarra (Orgs.). Em primeira pessoa: abordagens de uma teoria da autobiografia (pp 95-110). São Paulo: Annablume, FAPESP, FFLCH, USP.), a vida humana aqui é representada como "um processo de formação do ser, através das experiências que vive em sua trajetória temporal, realizando suas próprias forças e disposições à medida que enfrenta os limites e possibilidades de seu ambiente" (p.101). A estrutura textual é a de um relato das etapas de desenvolvimento do herói, de sua juventude até a maturidade, passando pelos momentos significativos de aprendizagem, até quando ele "atinge um conhecimento suficiente de si próprio e de seu lugar no mundo, para viver em harmonia consigo mesmo e com a sociedade, que é a sua." (p. 101).

Assim, a pergunta "Quem sou eu?" remete tanto à problemática do self quanto à da autobiografia. A noção de um eu que tem consciência de si mesmo e que pode e deve escrever sobre si são construções sociais interligadas, marcadas por transformações históricas e culturais da Modernidade Ocidental e objeto de tematização filosófica, científica e literária. Essas questões imbricadas interessam aos psicólogos, que historicamente ocupam uma posição importante na expertise moderna da psique, participando da construção e regulação do self, "... promovendo a autoinspeção e a autoconsciência, moldando desejos, buscando maximizar as capacidades intelectuais" (Rose, 1988Rose, N. (1988). Governando a alma: a formação do eu privado. In T.T. da Silva (Org. e Trad.). Liberdades reguladas (pp. 30-45). Petrópolis: Vozes., p. 34). Atualmente a tematização do self ganha novo impulso quando se discutem os impactos das transformações econômicas, tecnológicas e culturais do capitalismo pós-industrial na experiência subjetiva, numa época em que se multiplicam tanto as formas de interação quanto os modos de identificação.

Este trabalho discute, de forma comparada, a problemática da consciência de si e da autobiografia em Memórias do subsolo, de Dostoiévski (1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864).), e A consciência de Zeno, de Italo Svevo (1923/2003Svevo, I. (2003). A consciência de Zeno (I. Barroso, Trad.). Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo. (Original publicado em 1923).). Objetiva comparar o tratamento dado a esses problemas nas duas obras, focalizando o modo como desafiam a promessa de autoconsciência contida no registro confessional e constroem o espaço do eu como múltiplo e fragmentado. A partir de suas confissões, seus protagonistas desvelam a dimensão paradoxal e irônica da tarefa de autoconhecimento. Estes são heróis estranhos e patéticos que se veem enredados nas armadilhas de dizer quem são; heróis que refletem, com diferentes graus de lucidez, sobre suas contradições e dilemas, oscilando entre se posicionar como saudáveis ou doentes, dentro ou fora dos padrões de normalidade vigentes em seus ambientes. Neste sentido, o próprio trabalho confessional dos protagonistas, que os leva a remoer, articular e conferir sentido às suas lembranças e sentimentos duvidosos, é objeto de ironia e derrisão.

Memórias do subsolo é uma das novelas que antecedem os grandes romances de Dostoiévski. Escrita entre janeiro e maio de 1864, representa o período de sua produção literária após sua libertação da pena de trabalho forçado na Sibéria imposta pelo regime czarista. Ao sair da prisão, o escritor encontra o ambiente intelectual russo marcado por ideologias deterministas, e a elas a novela procura responder. A década de 1860 também é marcada, na vida russa, por niilismo, anarquismo e agitação política, que se tornam fonte de preocupação e matéria literária para o escritor (Frank, 2002Frank, J. (2002). Dostoiévski: Os efeitos da libertação -1860-1865. (G.G. de Souza, Trad.). São Paulo, EDUSP. (Original publicado em 1986).). O texto inaugura, segundo Bakhtin (1929Bahktin, M. (1997). Problemas da poética de Dostoiévski. (P. Bezerra, Trad.). Rio de Janeiro: Forense Universitária. (Original publicado em 1929)./1997Bahktin, M. (1997). Problemas da poética de Dostoiévski. (P. Bezerra, Trad.). Rio de Janeiro: Forense Universitária. (Original publicado em 1929).), o gênero romance polifônico, uma forma romanesca marcada pelo princípio composicional da polifonia: narrativas diferentes que falam, de formas diversas, de um mesmo tema, isto é, "narrativas que se cruzam e se completam" como no contraponto musical (Brait & Machado, 2011Brait, B.; Machado, I. (2011). O encontro privilegiado entre Bakhtin e Dostoiévski num subsolo. Bakhtinianna, 6(1), 24-43., p. 27).

De modo simplificado, a novela trata das confissões de um homem de quarenta anos, morador de São Petersburgo, ex-funcionário público empobrecido na Rússia czarista, que fala de si para senhores anônimos. Dialogando com essas personagens imaginárias, o homem do subsolo revela seus rancores e culpas, porém o faz de forma contraditória, dizendo e desdizendo o conhecimento que constrói sobre si e os demais. Essa atitude compõe a própria estrutura da novela. Como diz Schnaiderman (2009Schnaiderman, B. (2009). Prefácio. In F. Dostoiévski. Memórias do subsolo (pp. 7-12). (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34.) sobre a tese de Bakhtin, este mostrou que "toda a novela ficou estruturada sobre uma confissão que se constrói sobre a expectativa da palavra do outro" (p. 8).

A consciência de Zeno, livro do escritor italiano, nascido em Trieste, Italo Svevo (pseudônimo de Ettore Schmitz), publicado em 1923, é considerado uma obra-prima modernista. Svevo (1861Svevo, I. (2003). A consciência de Zeno (I. Barroso, Trad.). Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo. (Original publicado em 1923).-1928), filho de pai judeu de origem húngara e mãe italiana, começa a escrever este romance em 1919, ao fim da Primeira Grande Guerra, numa Trieste que se torna província italiana, após ser possessão austríaca. Por volta dessa época, conheceu o trabalho de Freud e chegou a traduzir parte da Interpretação dos Sonhos para o italiano. Conheceu também o escritor James Joyce, que foi seu professor de inglês e o ajudou a obter, finalmente, o reconhecimento da crítica internacional. Sua trajetória é marcada pela dupla formação italiana e alemã (estudou na Alemanha na infância) e por dedicar-se tanto à vida de homem de negócios quanto à de homem de letras, interessado em arte e filosofia (Barroso, 2010Barroso, I. (2010). Ettore Schmitz, aliás Italo Svevo: um resumo cronológico Gaveta do Ivo (Blog). Recuperado em 20 setembro, de 2014, de http://gavetadoivo.wordpress.com/2010/09/28/ettore-schmitz-alias-italo-svevo-um-resumo-cronologico/.
http://gavetadoivo.wordpress.com/2010/09...
).

O romance trata das venturas e desventuras de Zeno, um burguês triestino de meia-idade que, na tentativa de largar o vício do cigarro, submete-se a sessões de psicanálise e, a pedido do analista, à tarefa de escrever suas lembranças e sentimentos. Zeno é hipocondríaco, sem qualidades ou talentos especiais e representa uma classe social privilegiada. O relato de suas memórias subverte comicamente a pretensão de autotransparência da tradição confessional. Sua narração enganosa dispara o riso do leitor que acompanha a enorme distância entre o que Zeno pensa de si mesmo e o que todos os demais pensam dele.

São vários os pontos em comum nos dois textos. Um deles é a centralidade do tema da doença ou mal-estar, a consciência entre dolorosa e cínica que tem os protagonistas de desviar-se dos padrões socialmente aceitáveis de saúde física e mental. Aqui, os temas polares doença/saúde e normalidade/anormalidade emergem nos textos ficcionais como núcleos de significação ou metáforas, sinalizando que a consciência de si envolve tensões e mal-estar, visto que tecida entre vozes sociais e interpretações díspares irredutíveis a certezas absolutas. A consciência de si é comparada à doença em Dostoiévski, entre outros pontos, no sentido de que o imperativo de definir-se coerentemente e segundo a moral vigente é um esforço cheio de tribulações e contradições que levam a ações imprevisíveis, às vezes reprováveis e fontes de remorso. Em Svevo, nos parece que a doença também pode se referir metaforicamente à "inaptidão para ser íntegro", questão assinalada por Ramos (2001Ramos, M.C.T. (2001). Ítalo Svevo e Machado de Assis: os olhares propostos em A consciência de Zeno e Memórias póstumas de Brás Cubas. Fragmentos, 11, 193-204., p. 194), sobre sua incapacidade de ser um herói romântico, isto é, de "ter caráter e compostura" (p. 194), representar a moral e os bons costumes e se sacrificar em nome dos outros.

Em Memórias do subsolo, o amargo narrador confessa seus defeitos e dores, descrevendo-se como um "homem doente, um homem mau" (Dostoiévski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 15), provavelmente que "sofre do fígado" (p. 15). Seu sentimento e sua voz são raivosos, ainda mais dilacerantes em razão da aguda consciência que tem de suas próprias angústias e de sua radical diferença em relação aos "homens diretos e de ação" (p. 18) - daí sua queixa de que "uma consciência perspicaz é uma doença, uma doença autêntica, completa" (p. 18).

Em A consciência de Zeno (1923/2003) o tema também é central: o memorialista exibe a todo o instante sua preocupação em ser saudável e alcançar um estado de bem-estar, maturidade e serenidade que se espera de pessoas de sua idade e posição social. Como afirma Hollington (1989Hollington, M. (1989). Svevo, Joyce e o tempo modernista. In M. Bradbury & J. McFarlane. (Orgs.). Modernismo: guia geral-1890-1930 (pp. 352-362). São Paulo: Companhia das Letras.), saúde, para o protagonista, é uma questão de "critério, ordem, coerência" (p. 354), atributos que são insistentemente perseguidos e frustrados.

O segundo ponto de aproximação das duas obras é sua articulação dos temas do self e da autobiografia. De fato, Dostoiévski e Svevo, nas respectivas obras, tecem elaboradas narrativas que exploram as problemáticas do conhecimento de si, da subjetividade múltipla e da impossibilidade da autobiografia. Ambos trabalham esteticamente fenômenos e processos psicossociais complexos explorados nas psicologias, ciências sociais e filosofias: a construção narrativa e dialogada do eu, os trabalhos da memória, os critérios de verdade e autenticidade pessoal e as ilusões autobiográficas.

Algumas questões do estudo orientaram a análise comparada das obras: em que medida Memórias do subsolo e A consciência de Zeno desconstroem crenças e expectativas arraigadas sobre a estabilidade e unicidade do eu e quanto ao conhecimento e à escrita de si? Como exploram o problema da veracidade/falsidade das confissões? Que lugar ocupa a metáfora da doença na figuração da consciência de si nas duas obras? Como ambas exploram literariamente a rejeição das certezas quanto ao sujeito autônomo, autocentrado e transparente que a metafísica moderna nos legou? Entendemos que os dois textos ficcionais analisados tematizam, em particular, o caráter múltiplo e fragmentado do eu e a consequente incapacidade das pessoas de alcançar um autoconhecimento confiável de si mesmas.

Para a análise, foram selecionados dois eixos temáticos que emergiram na leitura inicial das obras: a verdade de si como doença e a impossibilidade da autobiografia. O primeiro eixo envolve os significados patológicos associados ao autoconhecimento dos protagonistas. Em sua sondagem interior, os protagonistas se exibem como doentes, mas oscilam ambivalentemente quanto à crença na realidade de suas doenças. O segundo eixo reúne os significados de descrença no próprio trabalho de narrar as suas histórias: Zeno e o homem do subsolo desconfiam de sua própria narração, pondo em suspeição suas confissões e, no caso de Zeno, a própria possibilidade de cura.

Para a discussão desses temas buscamos apoio em molduras teóricas transdisciplinares, por exemplo, algumas formulações de orientação bakhtiniana sobre o self dialógico (Hermans, Kempen & van Loon, 1992; Hermans, 2001Hermans, H.J.M., Kempen, H.J.G. & van Loon, R.J.P.(1992). The dialogical self: beyond individualism and rationalism. American Psychologist, 47(1), 1992, 23-33., 2002Bahktin, M. (1997). Problemas da poética de Dostoiévski. (P. Bezerra, Trad.). Rio de Janeiro: Forense Universitária. (Original publicado em 1929).) e uma discussão contemporânea sobre a desconstrução do espaço autobiográfico (Arfuch, 2010Arfuch, L. (2010). O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2010.; Duque-Estrada, 2009Duque-Estrada, E. M. (2009). Devires autobiográficos: a atualidade da escrita de si. Rio de Janeiro: NAU/Editora PUC-Rio.). Uma das vertentes teóricas recentes mais promissoras na Psicologia, inaugurada por Hermans e seus colaboradores, parte dos trabalhos de Bakhtin sobre a poética de Dostoiévski para propor o conceito de self dialógico. A formulação do self dialógico inspira-se na tradição de William James (a distinção entre I/me), de Bakhtin (romance polifônico) e no conceito de posicionamento (Davies & Harré, 1990/2007Davies, B. & Harré, R. (2007). Posicionamento: la producción discursiva de la identidad (C.A.C. Puebla, Trad.) Athenea Digital, 12, 242-259. (Original publicado em 1990). Recuperado em 20 setembro, de 2014, de http://atheneadigital.net/article/view/445.
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), explorando uma noção mais espacial da psique como multiplicidade de posições do eu no cenário da mente. Entendemos que essa formulação permite compreender as contradições dos eus que habitam o indivíduo - e que são bem ilustradas nos textos de Dostoiévski e Svevo aqui selecionados.

Contra a ideia do cogito cartesiano que formula o eu como instância única centralizada, o self dialógico pressupõe que há várias posições do eu que podem ser ocupadas por uma mesma pessoa. Hermans (2001Hermans, H.J.M. (2001).Dialogical self: toward a theory of personal and cultural positioning. Culture & Psychology, 7(3), 243-281.) concebe o self como uma "multiplicidade dinâmica e relativamente autônoma de posições do eu." (p. 248). Em conversações reais ou imaginadas, o eu move-se entre posições de acordo com as circunstâncias, tendo "... a capacidade de dotar imaginativamente cada posição com uma voz de modo a estabelecer relações dialógicas entre as posições. As vozes aqui funcionam como personagens interagindo numa história, envolvidos num processo de pergunta e resposta, acordo e desacordo" (p. 248).

A análise dos textos também se apoiou numa discussão crítica sobre o gênero autobiográfico, que assinala os equívocos de entender a autobiografia como o relato que um autor faz de sua própria vida com a intenção de contar a verdade. Fugindo dos limites estreitos desse tipo de conceituação, procurou-se mostrar como os textos aqui analisados contribuem para dissolver a pretensão de uma escrita de si baseada no pressuposto de um sujeito autocontido capaz de contar-se a si mesmo (Arfuch, 2010Arfuch, L. (2010). O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2010.; Duque-Estrada, 2009Duque-Estrada, E. M. (2009). Devires autobiográficos: a atualidade da escrita de si. Rio de Janeiro: NAU/Editora PUC-Rio.).

Os textos selecionados, ao tematizarem a consciência e a escrita de si, constroem-nas como fenômenos ou realidades dialógicas, relacionais, ao invés de realidades individuais acabadas, privadas, estáticas e dotadas de coesão. Sublinham a condição precária do eu, que ganha forma apenas na relação com e reação aos outros. Argumentamos que as obras de Dostoiévski e Svevo aqui analisadas, cada uma a seu modo, perturbam a crença em concepções fundantes do eu e da autobiografia, levantando questões sobre o self que hoje são objeto privilegiado de teorização na psicologia de linhagem narrativo-dialógica.

MINHA DOENÇA, MINHA VERDADE: CONSCIÊNCIA DE SI E MAL-ESTAR NO DISCURSO DO HOMEM DO SUBSOLO E DE ZENO

Um tema que se destaca na leitura comparada das obras é a polaridade entre normalidade/anormalidade, entre o que o homem do subsolo e Zeno julgam ser, por um lado, um comportamento comum e saudável e, por outro, um comportamento patológico - portanto, fonte de mal-estar. Na consciência dos protagonistas, empenhados no autoexame e na narração de si, a doença, a neurose e o vício ocupam um lugar central, levando-os ao reconhecimento, mais ou menos direto, culpado ou inocente, de sua condição de outsiders, de pessoas estranhas que não agem de acordo com as expectativas ou padrões de civilidade e saúde dominantes em seu meio social. São seres que se julgam, de algum modo, fora das normas, portadores de algum desvio de ordem psíquica e moral, que não conseguem tocar o cotidiano descontraidamente, como (pensam que) as pessoas ordinariamente o fazem. A própria definição do que desejam, de seus objetivos e metas, é atravessada por estranhamento, incerteza e sensação de fracasso.

Não obstante, a construção da doença e do mal-estar dos protagonistas nas duas obras recebe diferentes nuanças. Em Memórias do subsolo, o protagonista oscila entre dizer e desdizer os seus defeitos e os atos feios que comete, frisando especialmente como uma consciência hipertrofiada igual à sua configura uma verdadeira doença: "Juro-vos, senhores, que uma consciência muito perspicaz é uma doença, uma doença autêntica, completa." (Dostoiévski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 18). A consciência aguda de si mesmo separa-o dos "homens diretos e de ação" (Dostoiévski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 29), sem dilemas, seguros de suas verdades e de como se comportar. É a própria reflexão sobre si - processo que se dá de forma dialogada - que dispara no narrador do subsolo a consciência das contradições insolúveis, experimentadas como sofrimento. Assim, o mal-estar está associado à dificuldade de posicionar-se entre vozes conflitantes e eloquentes que lutam no terreno da consciência. Nessa visão, as pessoas que se definem positivamente (isso é, não cientes dos antagonismos e paradoxos do desejo, dos interesses, valores), aceitando verdades monológicas sobre o mundo ou sobre si mesmas, são mais saudáveis e sofrem menos.

Em A Consciência de Zeno, o motivo doença/cura e sua relação com o self do protagonista são fulcrais. A adição ao fumo e a tentativa de livrar-se da dependência são reatualizadas a cada situação que exige a iniciativa, a capacidade e a decisão do narrador no campo pessoal (por exemplo, na vida amorosa) ou profissional (na administração dos negócios). Neste sentido, as promessas do último cigarro de Zeno, registradas com rigor em suas anotações, mas nunca efetivamente cumpridas, antecipam a desejada conquista sobre o vício e seus benefícios: o mundo de escolhas sadias, serenidade, sobriedade e realização que podem advir ao narrador nos vários domínios da sua vida. Como diz Zeno, tal promessa representa a "esperança de um futuro de força e de saúde" (Svevo, 1923/2003Svevo, I. (2003). A consciência de Zeno (I. Barroso, Trad.). Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo. (Original publicado em 1923)., p. 14).

Com efeito, Zeno é convicto de sua própria doença "a doença é uma convicção, e eu nasci com esta convicção" (Svevo, 1923/2003Svevo, I. (2003). A consciência de Zeno (I. Barroso, Trad.). Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo. (Original publicado em 1923)., p. 15). Ao longo da narrativa, podemos acompanhar a cadeia de sintomas que passa a exibir em momentos significativos da sua vida, levando-o aos sucessivos tratamentos na direção da saúde e da felicidade. O ideal de saúde é personificado na própria mulher, alguém que "tudo consegue alcançar dentro da lei e da ordem" (p. 139) ou que a "tudo renuncia" (p. 140).

Em Memórias do subsolo, a articulação doença-verdade é explorada de modo dialógico, sempre em resposta às narrativas socialmente disponíveis que posicionam de forma contraditória o narrador. Essas envolvem discursos hegemônicos associados ao polo da saúde e da normalidade - razão, ciência, bom senso, beleza, prosperidade, moralidade - que são, ao mesmo tempo, combatidos e apropriados pelo narrador ao falar de si. O narrador refuta o imperativo da racionalidade e do bom senso, afirmando tanto a dimensão criadora da humanidade, quanto seu amor pela destruição e pelo caos, que leva o homem a desejar e procurar, paradoxalmente, o reprovável e o sofrimento; mas o repúdio é ambivalente e confessado como mentira. O diálogo com essas verdades contraditórias, apresentado numa perspectiva de autodiálogo, dramatiza como outras pessoas e discursos ocupam posições no self multivocal do narrador, o posicionando de modo incerto:

O fim dos fins, meus senhores: o melhor é não fazer nada! O melhor é a inércia consciente! Pois bem, viva o subsolo! Embora eu tenha dito realmente que invejo o homem normal até a derradeira gota da minha bílis, não quero ser ele, nas condições em que o vejo (embora não cesse de invejá-lo. Não, não, em todo o caso, o subsolo é mais vantajoso!). Ao menos se pode.... Eh! Mas estou mentindo agora também. Minto porque eu mesmo sei, como dois e dois, que o melhor não é subsolo, mas algo diverso, absolutamente diverso, pelo qual anseio, mas que de modo algum hei de encontrar! Ao diabo o subsolo! (Dostoiévski, 1864/2009, pp. 50-51)

O eu do narrador oscila entre narrativas díspares que seguem paralelas, sem fechamento. O efeito na leitura é de destruir a expectativa de uma visão coerente do eu do narrador: o leitor acompanha a argumentação vacilante sem que possa construir dele uma imagem coesa e global, nem mesmo se pode aceitar sua autodescrição como doente, desviante e sofredor.

Zeno e o homem do subsolo enfrentam suas doenças valendo-se de um recurso que eles mesmos dão evidências de desacreditar: a escrita livre e sincera de suas memórias e confissões. A confissão mediante o registro das próprias recordações é, a princípio, o caminho para a cura, meio privilegiado de autoconhecimento e purgação, para logo tornar-se objeto de descrença e derrisão.

Em Memórias, o indagador, ao responder imaginariamente aos senhores, sugere que "é possível que as anotações lhe tragam alívio" (Dostoievski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 54). Com isso, antecipa a confissão de um pecado e remete à catarse que a narração pode produzir. Trata de reconhecer uma verdade dolorosa sobre si mesmo que se torna acessível apenas na autonarração. A purgação envolve um jogo de alteridade, isto é, "experimentar a si próprio como outro e o outro como a si próprio" (Kearney, 2012Kearney, R. (2012). Narrativa. Educação & Realidade, 37(2), 409-438., p. 419); mas ao fim da novela, quando revela sua crueldade com Lisa, suas oscilações entre maldade e arrependimento, entre rancor e compaixão, seu juízo ambivalente sobre sua própria pessoa, o paradoxalista questiona o processo e o resultado (desagradável) de sua escrita de si, mais próximo de "um castigo correcional" (Dostoiévski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 147): "Muita coisa lembro agora realmente como um mal, mas... não será melhor encerrar aqui as 'Memórias'?" (Dostoiévski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 145). De fato, essa questão reticente e a argumentação final sobre a relação entre os livros e "vida viva" (Dostoiévski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 142) figura os limites da autobiografia que, originando mais perguntas que respostas, mostra-se sempre projeto inconcluso.

Em A consciência de Zeno, na tematização do mal-estar, é objeto privilegiado a própria psicanálise, cuja teorização é posta constantemente à prova, de forma paradoxal e irônica. Um dos paradoxos é a relação de Zeno com a psicanálise, saber de que se vale para entender a origem de sua doença e o significado dos seus sintomas, mas que também ironiza, descrendo de sua validade e eficácia. Zeno, de fato, lê um compêndio de psicanálise e mantém seu propósito de escrever suas recordações do passado seguindo a orientação de seu analista, mas a convicção quanto ao arcabouço freudiano e ao processo terapêutico é sempre objeto de dúvida, traindo a intenção autobiográfica de Zeno e a confiança no autorretrato que poderá advir desse narrador não fidedigno.

Ao fim, Zeno atribui a cura de sua doença não à psicanálise, mas ao acaso, à desordem, enfim, à própria vida em sua imprevisibilidade. A guerra, sua velhice e o sucesso inesperado nos negócios é que lhe restituem a saúde e o bem-estar, não as sessões de psicanálise. Para Zeno, agora convicto de sua saúde (para ele, caso de persuasão e não de tratamento), "a vida assemelha-se um pouco à enfermidade, à medida que proceda por crises e deslizes e tem seus altos e baixos cotidianos. À diferença das outras moléstias, a vida é sempre mortal. Não admite tratamento." (Svevo, 1923/2003Svevo, I. (2003). A consciência de Zeno (I. Barroso, Trad.). Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo. (Original publicado em 1923)., p. 582). O binômio confissões-cura - o aspecto heurístico e terapêutico do falar de si - é progressivamente posto em suspeição nas duas obras.

IMPOSSIBILIDADES DA AUTOBIOGRAFIA: REFIGURAÇÕES DO CONHECIMENTO DE SI EM MEMÓRIAS DO SUBSOLO E A CONSCIÊNCIA DE ZENO

Mediante formas confessionais, Memórias do subsolo e A Consciência de Zeno exploram a temática dos limites ou mesmo da impossibilidade da autobiografia, refigurando literariamente a descrença em concepções fundantes do autoconhecimento e da escrita de si. De fato, a tradição autobiográfica que remonta às Confissões, de Rousseau, será abalada nos textos modernistas de Dostoiévski e de Svevo. Segundo Duque-Estrada (2009Duque-Estrada, E. M. (2009). Devires autobiográficos: a atualidade da escrita de si. Rio de Janeiro: NAU/Editora PUC-Rio.), Dostoiévski, em Memórias do subsolo, realiza a protodesconstrução de um conjunto de crenças que atravessou os séculos na linhagem dos escritos autobiográfcos desde as Confissões, de Santo Agostinho. Esse conjunto de crenças abrange a

... suposição de que cada indivíduo é um eu único e autoidêntico, a crença numa "humanidade" que ao mesmo tempo reúne e diferencia os indivíduos, a presunção de uma exterioridade entre o eu e a linguagem, entendida como apenas o meio de expressão e de transmissão de sentido de experiências pré-linguísticas e, finalmente, o caráter de exemplaridade das experiências que pretendem ter validade universal. (Duque-Estrada, 2009, p. 61).

A ruptura com os fundamentos da autobiografia tradicional em Memórias é acompanhada de um deslocamento nas formas de entendimento da relação verdade/mentira e ficção/realidade. Um suposto substrato do eu do homem do subsolo torna-se, então, fugidio e instável, malogrando na promessa de um autorretrato pessoal confiável. Distanciando-se tanto da racionalidade cientifica preconizada pelo Iluminismo (simbolizada na recusa da ordem, do sistema e da certeza de que "dois e dois são quatro") e duvidando da sensibilidade e sinceridade perseguidas por Rousseau, o texto de Dostoiévski sugere que a sondagem do eu leva apenas a uma "forma vazia" (Dostoiévski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 53); a autobiografia é mais produto de um modo de contar (o estilo) do que instrumento de representação do eu. A novela antecipa, assim, a reflexão acerca do vazio do sujeito autônomo, que pode conhecer a si mesmo e dar-se a conhecer. Esse vazio será ocupado, na teorização contemporânea do sujeito, por estratégias discursivas (Arfuch, 2010Arfuch, L. (2010). O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2010.). O eu descentrado e desconstruído só poderá ser abordado em sua relação estreita com as ordens e práticas discursivas que produzem a individualidade e a pessoalidade (selfhood).

Na esteira da reflexão contemporânea, resultante das viradas linguística, discursiva e narrativa, as formulações acerca do self tendem a ganhar um acento cada vez mais dialógico, discursivo e performático, recaindo sobre os fatores sociais e relacionais mais que sobre os fatores individuais que moldam a pessoalidade. Nesse sentido, o texto de Dostoievski constrói uma visão do eu que será explorada nas perspectivas teóricas que entendem o self como "fracamente individual e densamente relacional ou social" (Smith & Sparkes, 2008Smith, B. & Sparkes, A.C. (2008). Contrasting perspectives on narrating selves and identites: an invitation to dialogue. Qualitative research, 8(1), 5-35., p. 5) e que se regem por uma epistemologia relativista, descrente de que se possam estabelecer fundamentos ou critérios definitivos de verdade e conhecimento. Essas perspectivas enfatizam ora os modos como as pessoas se valem de recursos narrativos social e culturalmente disponíveis para articular uma noção de si mesmas, ora o jogo de posições e vozes produzido dialogicamente, ou ainda as circunstâncias práticas e trocas conversacionais que diluem o self em construções situadas e contingentes. Em sintonia com tais formulações, em Memórias, a natureza dialógica da sondagem interior do herói revela sua indeterminação (que é a indeterminação do passado contado) e as oscilações entre a continuidade e a descontinuidade de si. Com isso, a novela desequilibra a escrita de si que aspira ao acabamento da personagem e de sua história.

Os efeitos perturbadores, inaugurados no romance polifônico de Dostoiévski e também presentes no paradoxo cômico de Svevo, atravessam o conteúdo e a forma dessas ficções, contribuindo para destruir as certezas que os narradores e também os seus leitores - podem ter acerca desses sujeitos. A resposta dos autobiógrafos à indagação "Quem sou eu?" é dada de forma contraditória, dialogada e multivocal, sem que sobrevenha o alívio de uma resposta certa e segura.

De que forma Memórias do subsolo e A Consciência de Zeno abordam o problema da autoconsciência dividida de seus protagonistas? Bakhtin (1929Bahktin, M. (1997). Problemas da poética de Dostoiévski. (P. Bezerra, Trad.). Rio de Janeiro: Forense Universitária. (Original publicado em 1929)./1997) explica como Dostoiévski inaugura o "romance polifônico inteiramente dialógico" (p. 46) e uma nova forma de construir as personagens. Em vez de compor a personagem como determinada, dotada de traços sociais típicos e objetivos (traços que permitiriam responder à questão "Quem é ele?"), ela é composta como "ponto de vista específico sobre o mundo e sobre si mesma, enquanto posição racional e valorativa do homem em relação a si mesmo e à realidade circundante". (Bakhtin, 1929Bahktin, M. (1997). Problemas da poética de Dostoiévski. (P. Bezerra, Trad.). Rio de Janeiro: Forense Universitária. (Original publicado em 1929)./1997, p. 46). Quanto ao herói, praticamente tudo que sabemos a seu respeito é apresentado por ele mesmo em seu diálogo interior e nas suas antecipações da palavra do outro. Nessa nova poética, a autoconsciência torna-se o princípio artístico dominante da construção da personagem, não mais um traço que a determina e conclui, como ocorre na representação do romance realista tradicional, em que o autor detém uma imagem una, estável e sólida - isto é, monológica - de seus personagens. Nesse sentido, a visão artística de Dostoiévski realça o inacabamento e insolubilidade da personagem, cuja imagem integral mantém-se inconclusiva pelo autor: a personagem é quem se dá a conhecer em sua polêmica com os senhores anônimos.

A perspectiva bakhtiniana sobre o gênero polifônico em Dostoiévski e sua problemática do dialogismo ultrapassam, como é sabido, o campo dos estudos literários, influenciando significativamente as perspectivas psicossociais e culturais acerca da formação do eu e da autoconsciência. Como dito anteriormente, a poética de Dostoiévski tal como formulada por Bakhtin inspira a elaboração da teoria do self dialógico, de Hermans (2001Hermans, H.J.M. (2001).Dialogical self: toward a theory of personal and cultural positioning. Culture & Psychology, 7(3), 243-281., 2002Hermans, H.J.M. (2002). The dialogical self as a society of mind: Introduction. Theory & Psychology, 12(2), 147-160.), que compreende a consciência de si como um movimento dinâmico de posições do eu (I-positions). Nessa teoria, a realidade existencial é entendida como relacional e dialógica: a possibilidade de conhecimento das coisas e de si mesmo dá-se sempre na relação comunicacional e negociada entre um eu e um outro. O autoconhecimento implica a ação de posicionar-se em relação a vozes (presentes e ausentes), e não à noção de um eu singular e central.

Como nos romances polifônicos do escritor russo, a psique humana seria composta por vários autores ou perspectivas em jogo, cada uma com uma voz distinta, contando, assim, diferentes narrativas sobre certas experiências pessoais. A noção de voz aproxima-se da de personagem; a psique seria um diálogo complexo entre tais personagens e suas respectivas histórias. No caso de Memórias, acompanhamos as formas conflituosas como o homem do subsolo se apresenta, à medida que imagina o que pensam e o que poderiam dizer seus interlocutores: por exemplo, sua afirmação de ser e não ser mau e seu reconhecimento dos "elementos contraditórios fervilhando em mim" (Dostoievski, 1864/2009Dostoiévski, F. (2009). Memórias do subsolo. (B. Schnaiderman, Trad.). São Paulo, Editora 34. (Original publicado em 1864)., p. 16). Essa flutuação entre posições subjetivas em desacordo permite que o narrador de Memórias possa desacreditar as palavras que pouco antes usara para descrever-se, enfraquecendo a confiança na autobiografia sincera, capaz de revelar alguém em sua inteireza:

Eis que seria melhor mesmo: que eu próprio acreditasse, um pouco que fosse, no que acabo de escrever. Juro-vos, meus senhores, que não creio numa só palavrinha de tudo quanto rabisquei aqui! Isto é, talvez eu creia, mas ao mesmo tempo, sem saber por quê, sinto e suspeito estar mentindo como um desalmado (Dostoiévski, 1864/2009, p. 51).

O romance de Svevo aqui analisado também aborda as múltiplas vozes e posições do eu que podem ser ocupadas pelo self de Zeno, à medida que o protagonista-narrador se constrói como personagem, dialogando com outro Zeno de décadas atrás. A construção autobiográfica é marcada por perspectivas distintas que o narrador adota em relação ao passado e ao presente, nenhuma das quais reivindica o estatuto de verdade sobre sua pessoa. Quando fala do passado, Zeno distancia-se do jovem que foi, mediante o uso de expressões como "sei hoje que", "pareceu-me que", "hoje que estou mais velho" e outras que revelam o movimento de um eu dinâmico; mas esse distanciamento não significa necessariamente que o memorialista maduro alcance finalmente um conhecimento superior ou acabado sobre si mesmo, após uma vida passada a limpo. O capitulo final muda bruscamente a narrativa, com Zeno agora escrevendo um diário, e não mais suas memórias. Nessa nova escrita de si, Zeno admite que "uma confissão escrita é sempre mentirosa" (Svevo, 1923/2003Svevo, I. (2003). A consciência de Zeno (I. Barroso, Trad.). Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo. (Original publicado em 1923)., p. 354) e que inventar "é uma criação, não uma simples mentira" (p. 355). Suas afirmações irônicas a seu respeito mantêm-se incertas como antes.

Zeno não crê na sinceridade das confissões, do que disse antes e hoje; não se justifica (como na tradição confessional de Rousseau) e parece rejeitar o juízo que se possa ter sobre ele. Além disso, não se vislumbram epifanias ou revelações após a revisão de sua vida, como se espera na tradição confessional. As confissões de Zeno acabam revelando as artimanhas do trabalho autobiográfico e a impropriedade de uma chave de leitura segura para entender o narrador. Seria Zeno fantasista, mentiroso, ingênuo, socialmente inábil, irônico, cínico?

Zeno antecipa dialogicamente os discursos e modos de pensar de seus interlocutores a fim de ser aceito, orientar-se socialmente e alcançar seus interesses, porém sua ação não decorre como o esperado: Zeno não é, nem faz o que outros esperam dele, nem o que ele mesmo aparentemente espera de si. Zeno não consegue equacionar o diálogo com as distintas vozes sociais que o posicionam ambivalentemente, resultando em contradições não apenas lógicas, mas performativas, que elevam o efeito cômico. Ele, por exemplo, almeja ser reconhecido como pessoa séria, mas o efeito de suas interpretações é justamente o de ser reconhecido como doido. Uma cena ilustrativa se dá quando Zeno corteja Ada e procura justificar sua volubilidade nos estudos, que imagina ter sido comentada na família de sua pretendida. No trecho abaixo, é notável como o leitor procura as verdadeiras razões para Zeno pular de curso em curso, incerto de estar contando uma mentira ou uma verdade camuflada:

Tentei explicar: quando a gente se limita a uma única universidade, a maior parte do conhecimento nos passa despercebida...

Depois só por graça, comentei que achava curioso o fato de que abandonava a faculdade exatamente na época dos exames.

Por puro acaso - dizia com um sorriso de quem quer fazer crer que está contando uma mentira. A verdade, porém, é que eu havia mudado de objetivos nas ocasiões mais diferentes.

Parti assim na conquista de Ada e continuei sempre no propósito de fazê-la rir-se de mim ou à minha custa, sem lembrar que a havia escolhido por sua seriedade. Não deixei de ser um tanto estranho, mas devo ter-lhe parecido perfeitamente desequilibrado. (Svevo, 1923/2003, p. 68)

Dividido entre dar conta das vozes imperativas do psicanalista (o pretenso leitor de suas confissões), de Augusta, a mulher amorosa e traída, da religião e do seu desejo, Zeno produz um relato marcado por inconstância e não confiabilidade. Uma ilustração é sua quase confissão à esposa de que tinha uma amante e que esteve a ponto de passar uma noite inteira nos braços da outra:

Eu me sentia muito cansado, e durante o pouco tempo que ela conseguiu ficar comigo, lutei para não dormir. Sentia-me também muito inocente por não tê-la traído, passando toda uma noite longe do domicílio conjugal. Tão bela era minha inocência que tentei aumentá-la. Comecei a pronunciar palavras que pareciam uma confissão. Disse-lhe que me sentia fraco e culpado, e, como neste ponto ela olhasse para mim, pedindo explicações, logo tirei o corpo fora e, mergulhando na filosofia, argumentei que o sentimento de culpa perseguia todos os meus pensamentos e cada uma de minhas respirações. (Svevo, 1923/2003, p. 68)

Zeno julga-se culpado ou inocente? É verdadeiro ou mente? A quem Zeno responde e se justifica? Seu retrato é uma descrição precisa de si, oriunda de uma autoanálise e ou da resistência à análise? O desfecho dessa cena é que a esposa, aparentemente ignorante das aventuras do marido, interpreta suas palavras como as de um religioso que resignadamente crê na punição de culpas que desconhece. A descrição e a resposta de Zeno levam a questionar de onde Zeno fala, que posições de eu estão sendo ocupadas neste instante:

Pareceu-me que ela não compreendera bem a diferença do meu pensamento e o dos religiosos, mas não quis discutir, e ao som monótono do vento recrudescido, com a tranquilidade que me dera o ímpeto da confissão, peguei num sono longo e restaurador. (Svevo, 1923/2003, p. 215).

A análise comparada do tema confessional nas duas obras parece reveladora do ceticismo moderno quanto aos termos que compõem a clássica definição de autobiografia: autós (próprio), bíos (vida), gráphein (escrever). A vida pode ser contada? Pode alguém escrever sobre a própria vida? O eu que conta essa história é verdadeiro, uno e coerente? O narrador que recorda seu passado pode ser identificado ao personagem de quem fala? É a história contada que produz a própria vida, o próprio senso do eu?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Memórias do subsolo, de Dostoiévski e A consciência de Zeno, de Svevo, esteticamente dramatizam os limites da consciência de si e os problemas da narração na primeira pessoa. Ambas colocam em dúvida a autoevidência de algumas concepções e termos herdados da filosofia da consciência que permanecem, ainda que fragilizados, nos olhares e sensibilidades modernos em declínio: pessoa, self, vida, sujeito, identidade, autobiografia.

Podemos arriscar que nas obras analisadas há uma tematização irônica do modelo da autobiografia moderna e da narrativa de formação. Esse modelo não deixa de impregnar as práticas biográficas e autobiográficas de hoje, ainda identificadas com uma noção de "percurso orientado e finalizado pelo qual o narrador recorda a gênese do ser que ele se tornou." (Delory-Momberger, 2009Delory-Momberger, C. (2009). Filiações e rupturas do modelo autobiográfico na pós-modernidade. In H. Galle, A.C. Olmos, A. Kanzepolski & L.Z. Izarra (Orgs.). Em primeira pessoa: abordagens de uma teoria da autobiografia (pp 95-110). São Paulo: Annablume, FAPESP, FFLCH, USP., p. 101). Ainda lemos e escrevemos autobiografias segundo esse esquema dominante, muitas vezes aspirando a tirar lições de vida que nos levem a um estádio de maior sabedoria e maturidade; mas as transformações da sociedade moderna, especialmente a partir da segunda metade do século XX, impuseram rupturas e descontinuidades nos padrões biográficos modernos, levando as ciências sociais e as humanidades a analisarem tais impactos, identificando o que permanece e o que muda na forma como narramos nossa vida e a vida alheia.

Ora, é justamente o conjunto de pressupostos encarnados nos modelos individualistas e racionalistas sobre o self e da formação humana que parece ser minado por Dostoiévski e Svevo nesses dois romances filosóficos: a perspectiva teleológica, a noção de desenvolvimento progressivo, a realização do humano como valor universal, o sujeito como ser autônomo e responsável que deve fazer seu caminho na vida e que, após uma jornada de aprendizagem, pode conscientemente relatar a sua própria história. As pessoas não podem compreender inteiramente a si mesmas, conhecer com segurança os motivos que orientam suas ações, controlar o estranho e imprevisível que as habitam e emergem nas suas relações com a alteridade. Neste sentido, essas obras mantêm sua atualidade e seu fascínio para os leitores contemporâneos, que vivem num mundo a colocar em xeque os pilares da modernidade - razão, progresso, sujeito autônomo e responsável por seus atos - e, consequentemente, a revisar a tentação autobiográfica, a de escrever a verdade de uma vida.

Que implicações a figuração estética do self e da autobiografia promovida por Memórias do subsolo e A consciência de Zeno pode ter para o campo psicológico, para a compreensão de seu objeto e suas práticas? Algumas respostas provisórias se apresentam. O primeiro diz respeito ao modo como essas obras tornam visíveis as relações dialógicas entre o campo psicológico e o literário. A teoria do self dialógico inspira-se em Bakhtin que trata de Dostoiévski que desnuda o modelo autobiográfico de Rousseau; a ficção de Svevo tematiza a psicanálise, que por sua vez dialoga com romances e mitos. Mais do que o aspecto dialógico na reflexão sobre o eu e a escrita de si, as obras desvelam o princípio dialógico presente nas próprias relações entre ciência e literatura, o modo como os discursos não científicos e científicos se reconhecem e se separam, justificando, inclusive, a exploração de ambos como recursos na formação do psicólogo.

Um segundo ponto, mais central, refere-se às implicações de se pensar o self como resultante de posicionamentos multivocais do eu. De fato, o caráter indeterminado e contingente do eu nessas obras e também nas teorizações dialógicas do self e da autobiografia realça a linguagem como prática social e o fato de que nos valemos de narrativas, gêneros e repertórios socialmente disponíveis para negociar quem somos. Nessa negociação intersubjetiva podemos aceitar ou confrontar certas histórias e pontos de vista no esforço de conferir sentido a nós mesmos e ao mundo.

Um desdobramento dessa visão de que o self é uma "pergunta aberta com uma reposta cambiante que depende das posições disponíveis entre as práticas discursivas próprias e alheias" (Davies & Harré, 1990/2007Davies, B. & Harré, R. (2007). Posicionamento: la producción discursiva de la identidad (C.A.C. Puebla, Trad.) Athenea Digital, 12, 242-259. (Original publicado em 1990). Recuperado em 20 setembro, de 2014, de http://atheneadigital.net/article/view/445.
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, pp. 244-245) dá-se no campo clínico em propostas psicoterápicas que buscam colaborar para o reposicionamento pessoal diante de posições do self dominantes. Entende-se que o sofrimento psíquico que leva à psicoterapia pode advir da rigidez com que se adere a certas posições do self, numa situação que enfraquece a multiplicidade dialógica do eu. Essa adesão monológica a certas posições dominantes mantém o self afastado de outras posições subordinadas que forneceriam alternativas para a autodescrição e orientação no mundo. Trata-se aqui de importante compromisso ético-político no campo da pesquisa e intervenção psicológicas, pois implica identificar histórias hegemônicas assumidas por indivíduos e grupos que têm o efeito de subjugá-los, posicionando-os desfavoravelmente, para então promover, também em diálogo, outras narrativas de si que lhes permitam resistir a essas verdades opressoras.

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    Apoio e financiamento: FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação; Programa de Educação Tutorial PET- SESU; Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    26 Jun 2014
  • Aceito
    03 Nov 2014
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