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Dimensões clínicas do ato na obesidade: compulsão por comer e sintoma na perspectiva psicanalítica1 1 Apoio e financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)

Dimensiones clínicas del acto en la obesidad: compulsión por comer y síntoma en la perspectiva psicoanalítica

RESUMO

A partir da diferenciação de algumas dimensões clínicas do ato, conceituando com Freud o ato sintomático, o acting out, o ato falho e a passagem ao ato, e da problematização da ideia de sintoma, o presente trabalho procura entender o que se trata na compulsão por comer presente nos pacientes ditos obesos. Essa diferenciação visa instruir uma nova maneira de apreender a compulsão por comer dentro do campo psicanalítico acompanhando os desenvolvimentos freudianos na segunda tópica. Tendo em vista o advento do conceito de pulsão de morte em 1920, a compulsão lato sensu não pode mais ser considerada somente como formação de compromisso, pois no caso dos pacientes ditos obesos a compulsão comporta uma satisfação que ultrapassa o princípio do prazer. Discute-se a diferenciação entre Neurose e Psicose, lançando mão da ideia de Psicose Ordinária para apontar uma possibilidade de ‘falha’ no efeito de barra ao gozo que se evidencia na insistência desses sintomas que carregam consigo um ganho secundário ao qual os sujeitos permanecem atados. A compulsão por comer constitui, portanto, uma forma de evitar a angústia que paradoxalmente produz um sofrimento, ou ainda, um ato que se funde ao eu e cobra seu preço na moeda da angústia. Sugere-se avançar no entendimento da última teoria freudiana da angústia para distinguir as diferentes maneiras de abordagem clínica do ato em suas diferentes declinações.

Palavras-chave:
Compulsão; obesidade; gozo

RESUMEN

A partir de la diferenciación de algunas dimensiones clínicas del acto, conceptuando con Freud el acto sintomático, el acting out, el acto fallido y el pasaje al acto, y de la problematización de la idea de síntoma, el presente trabajo busca entender lo que se trata en la compulsión por comer presente en los pacientes dichos obesos. Esta diferenciación pretende encamiñar la mirada hacia una nueva manera de aprehender la compulsión por comer dentro del campo psicoanalítico acompañando la segunda tópica freudiana. En vista del advenimiento del concepto de pulsión de muerte en 1920, la compulsión lato sensu ya no puede ser considerada solamente como formación de compromiso, pues en el caso de los pacientes dichos obesos, la compulsión comporta una satisfacción que va más allá de lo principio de placer. Se discute la diferenciación entre Neurosis y Psicosis, echando mano de la idea de Psicosis Ordinaria que posibilita apuntar una posibilidad de falla en el efecto e barra al goce que se evidencia en la insistencia de esos síntomas que cargan consigo una ganancia secundaria al cual los sujetos permanecen atados. La compulsión por comer constituye, por lo tanto, una forma de evitar la angustia que paradójicamente produce un sufrimiento, o aún, un acto que se funde al yo y cobra su precio en la moneda de la angustia. Se sugiere avanzar en el entendimiento de la última teoría freudiana de la angustia para distinguir las diferentes maneras de abordaje clínico del acto en sus diferentes declinaciones.

Palabras clave:
Compulsión; obesidad; goce

ABSTRACT

Starting from the differentiation of clinical dimensions of the act, conceptualizing with Freud the symptomatic act, the acting out, the faulty act and the passage to the act, and the discussion of the idea of symptom, the present work tries to understand what is involved in compulsion to eat present in so-called obese patients. This differentiation aims to instruct a new way of understanding compulsion to eat with in the psychoanalytic field by following the Freudian developments in the second topic. In view of the advent of the concept of death drive in 1920, the lato sensu compulsion can no longer be considered only as a compromise formation, because in the case of so-called obese patients, the compulsion carries a satisfaction that goes beyond the pleasure principle. The differentiation between Neurosis and Psychosis is discussed using the idea of ​​Ordinary Psychosis, which allows us to point out a possibility of ‘failure’ in the effect of barring the jouissance that is evidenced in the insistence of these symptoms that takes a secondary gain to which the subjects remain bounded. Compulsion to eat is therefore a way of avoiding the anxiety that paradoxically produces suffering, or an act that merges with the ego and charges its price with anxiety. It is suggested to advance the understanding of the last Freudian anxiety theory to distinguish the different ways of clinical approach of the act in its different declinations.

Keywords:
Compulsion; obesity; jouissance

Introdução

A presença frequente de pessoas ditas obesas nos consultórios de psicanálise e nas instituições de saúde evidencia a importância de se pensar criticamente a direção desses tratamentos e construir um percurso teórico que sistematize parte de uma reflexão mais ampla sobre a prática clínica com diferentes formas de sintoma relacionados à alimentação. Tal empreitada evidencia, igualmente, o pouco investimento de estudos psicanalíticos relativos à obesidade, problemática complexa que vem ocupando de modo contundente o cenário da saúde pública e exigindo discussões que ainda se mostram incipientes.

Do ponto de vista das ciências humanas e sociais, a obesidade mostra-se como um fenômeno de difícil abordagem que não se presta a generalizações ou explicações simplificadoras. Segundo Morin (2011Morin, E. (2011). Introdução ao pensamento complexo (4a ed., E. Lisboa, trad.). Porto Alegre, RS: Editora Sulina.), a solução de problemas complexos não reside em sua simplificação ou na descoberta de uma verdade última em um único campo de saber, mas na potencialização das contradições que lhe concernem.

Nesse sentido, o próprio termo obesidade se mostra problemático o que implica tomá-lo aqui de modo contextualizado: não se trata de considerá-lo sob um referencial biomédico, mas de destacar os aspectos subjetivos implicados nesse sintoma como um modo de reorganizar a apreensão dessa condição corporal. De modo geral, podemos considerar a obesidade como uma característica orgânica, em que o excesso de peso se apresenta de forma crônica, promovendo uma permanente insatisfação com o corpo. Porém, para além desse referencial organicista, levamos em consideração, sobretudo, a queixa discursiva desses pacientes, a partir da qual podemos destacar sua inscrição num espectro mais amplo de condutas relacionadas à impulsividade, em que a dimensão do ato tem grande importância.

Maria Helena Fernandes (2004Fernandes, M. H. (2004). Transtornos alimentares. São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.) resgata importante diferenciação entre compulsão e impulsão a partir da análise realizada por Brusset do caso Ellen West, quando afirma que no caso dos acessos bulímicos não se poderia falar em compulsão stricto sensu, uma vez que não se observa, nesses casos, o mecanismo de defesa típico do obsessivo, mas um evidente sentimento de vazio. Ressalta, ainda, que não parecia haver no caso o recurso à substituição e ao deslocamento típicos das neuroses, e que seria, portanto, mais adequada a utilização do termo impulsão para caracterizar o comportamento alimentar das bulímicas.

Seguindo essas indicações, adotamos com Jeammet (2003Jeammet, P. (2003). Desregulações narcísicas e objetais na bulimia. In B, Brusset, C, Couveur; & A., Fine. A bulimia(M. Seincman, trad.). São Paulo, SP: Escuta.) uma concepção que distancia-se das definições dos manuais de diagnósticos, enfatizando a perspectiva que cada sujeito tem sobre seu ato ou seu corpo. Jeammet (2003Jeammet, P. (2003). Desregulações narcísicas e objetais na bulimia. In B, Brusset, C, Couveur; & A., Fine. A bulimia(M. Seincman, trad.). São Paulo, SP: Escuta., p. 106, grifo nosso) explicita que

[...] não é o caso de retomar o conjunto das definições da síndrome bulímica, com seus critérios respectivos mais ou menos restritivos. Aqui, referir-nos-emos a qualquer ‘conduta sentida pelo sujeito como uma obrigação de comer’ de modo julgado por ele excessivo, evoluindo por crises ou acessos, desenvolvendo-se sem interrupção uma vez desencadeada e podendo se repetir em uma frequência muito variável. Serão inclusos tanto os casos que não se acompanham de nenhuma medida de restrição alimentar nem de controle de peso pelos vômitos, por exemplo, e que levam a um ganho excessivo de peso, quanto aos casos normoponderais ou associados à anorexia.

Essa ampliação no modo de entender e estudar a bulimia nos interessa à medida que amplia o modo de apreender as condutas relacionadas à compulsão por comer, permitindo-nos enfocar mais os momentos de descontrole alimentar do que a própria dimensão do excesso de peso, enfocada pela biomedicina. Essa ‘conduta sentida pelo sujeito como uma obrigação de comer’ pode se apresentar em pacientes com obesidade ou sobrepeso, mas que devido à cronicidade da relação problemática com a alimentação e com o corpo tendem a ficar obesos a longo prazo. Podem até mesmo incidir sobre sujeitos que não apresentam sobrepeso ou obesidade, configurando aí um modo particular de relação com o corpo em que há alteração da imagem corporal, impondo uma severidade incomparável na rigidez da prática dietética que leva muitas vezes a casos graves de anorexia e bulimia.

Objetivamos, assim, delinear elementos que possam subsidiar a clínica psicanalítica em diferentes contextos clínicos, situando não somente as dificuldades da entrada em análise, mas sobretudo os momentos do tratamento em que a aderência à satisfação oral se mostra particularmente difícil de contornar, momentos esses em que a dimensão do ato ganha maior pregnância. Para tanto se faz necessário analisar as dimensões do ato em suas diferentes apresentações, articulando-as às formações sintomáticas e certa modalidade de gozo à qual os pacientes ditos obesos estão aderidos.

A demanda e a escuta psicanalítica

A problemática do corpo se inscreve no campo psicanalítico de modo singular. Desde o século XIX com o enigma colocado pela conversão histérica, a psicanálise é confrontada ao real do corpo em suas articulações com a cultura, não escapando dessa forma à incidência da linguagem. Sem qualquer margem de dúvida, para a psicanálise não se trata do corpo biológico ou cultural, mas do corpo pulsional, do qual não se pode isolar o puro organismo vivo e instintual. A pulsão foi um dos conceitos fundamentais que permitiram a fundação do campo psicanalítico em oposição ao campo médico e que marca de forma indelével a especificidade das formações sintomáticas relacionadas ao corpo.

Nos casos em que se baseiam nossas apreensões fica evidente que a busca pelo emagrecimento e pela recuperação de um controle sobre seus atos compulsivos ocupam lugar privilegiado e que, por esse motivo, essas pessoas apresentam determinada discursividade, cujos traços podem repetir-se. Segundo Birman (2012Birman, J. (2012). O sujeito na contemporaneidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira., p. 84), a compulsão

[...[ é uma modalidade de agir caracterizada pela repetição, já que o alvo da ação não é jamais alcançado. Daí a sua repetição incansável, sem variações e modulações, que assume o caráter de imperativo, isto é, impõem-se ao psiquismo sem que o eu possa deliberar sobre o impulso que se impõe.

Dessa repetição discursiva destacamos, primeiramente, a posição passiva com que os pacientes ditos obesos se apresentam em relação não só à obesidade, mas a uma série de aspectos da vida. Essa passividade fica evidente em excessivas referências corporais, num corpo de que o obeso parece não se apropriar, buscando permanentemente uma separação ou recusa (Recalcati, 2002Recalcati, M. (2002). O “demasiado cheio” do corpo: por uma clínica psicanalítica da obesidade. Latusa, 7, 51-74.).

Outro aspecto que se decanta da escuta desses pacientes é a exigência estética a que são lançados cotidianamente e que se mostra inclemente quanto ao olhar que vem do outro: este dirige-se inevitavelmente como crítico e acusador, demonstrando o caráter claramente superegoico até mesmo dos pensamentos conscientes. A exigência de perfeição que escutamos como traço predominante nesses casos também se relaciona a esse imperativo, levando muitas vezes à descontinuidade das tentativas de emagrecimento por um pequeno deslize cometido durante uma dieta.

Em um contexto cultural de consumo irrefreável, em que o sujeito está invariavelmente submetido às exigências de saúde, beleza e bem-estar, a obesidade mostra-se também como um paradoxo: o ideal de corpo magro opera como exigência sempre inalcansável, reforçando o imperativo superegoico que lança, em contrapartida, os sujeitos na compulsão por comer como recurso de enfrentamento da frustração decorrente dessa permanente inadequação.

É justamente em busca de adequação que muitos pacientes chegam à análise: ao profissional de saúde é delegada a tarefa da cura, restando ao obeso a queixa em relação ao sacrifício a que se submete em vão para emagrecer ou ao sofrimento que a genética lhe impõe. Essa desimplicação subjetiva com que o obeso demanda um novo tratamento coloca problemas para a instauração do dispositivo analítico, pois o direcionamento de uma questão ao analista é condição inicial para o estabelecimento da transferência, campo no qual se dá uma análise.

Diana Rabinovich, em A clínica da pulsão: as impulsões (2004Rabinovich, D. (2004). A clínica da pulsão: as impulsões (A. L. de O. Lopes, trad.). Rio de Janeiro, RJ: Companhia de Freud.), analisa o amplo campo de perturbações que apresentam dificuldades particulares no estabelecimento da transferência, denominadas pela autora como perturbações da demanda. Dentre estas, escolhe um caso de obesidade como exemplo a ser analisado. No caso apresentado, a autora se questiona quanto à analisabilidade de certos casos, uma vez que cria no analista uma sensação de impotência que, alerta a autora, não deve ser confundida com a impossibilidade lógica de uma análise. Esses casos exigem paciência e permanente questionamento, pois apesar da obesidade visível, não faz qualquer referência a esta e se apresenta com uma queixa inespecífica que coloca a questão do lado do analista: o que fazer com essa pessoa que consulta, mas não sabe bem o porquê ou para que, que não demanda nada?

A experiência clínica mostra aqui sua diversidade, pois assim como recebemos pacientes que têm um discurso excessivamente marcado por referências corporais, que se entregam ao profissional de saúde como um corpo a ser tratado, recebemos também pacientes que não se referem a si próprios nem ao seu corpo e não esboçam qualquer indício de subjetivação. Segundo Recalcati (2002Recalcati, M. (2002). O “demasiado cheio” do corpo: por uma clínica psicanalítica da obesidade. Latusa, 7, 51-74., p. 55), esse excesso de corpo comporta a dificuldade de “[...[ tornar eficaz a ação da fala no tratamento analítico”.

Como já foi dito, para que uma análise seja possível é preciso que haja uma demanda endereçada ao analista, uma demanda que articule o mal-estar com um sintoma e não só uma demanda de emagrecimento ou mesmo uma demanda difusa. É na constituição de uma suposição de saber em outro lugar que se dá a possibilidade do trabalho analítico. Contudo, o aprisionamento imaginário em que circula a economia pulsional dos pacientes ditos obesos exige o emagrecimento a todo custo, dificultando a ampliação desse momento inicial que promoveria um arrefecimento dessa urgência em favor da construção de um questionamento sobre o seu sofrimento.

Nesse sentido, é necessário pensar cuidadosamente o que o paciente demanda quando busca um tratamento para emagrecer, ou quando não veicula em seu discurso uma abertura em que possa surgir um questionamento sobre o seu sofrimento. Isso é fundamental para pensar a possibilidade do tratamento psicanalítico com esses pacientes, pois não se trata de emagrecer o obeso e adequá-lo ao Índice de Massa Corporal (IMC) desejável, mas de sustentar a demanda “[...[ para que reapareçam os significantes em que sua frustração está retida” (Lacan, 1998Lacan, J. (1998). Escritos(V. Ribeiro, trad.). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 624).

É em torno dessa fixação significante derivada da frustração que gira a dialética do tratamento desses pacientes, seja no que propicia a entrada em análise, seja no que favorece sua continuidade, podendo alcançar seu fim.

É nesse sentido que no Seminário 8, Lacan (1992Lacan, J. (1992).O seminário, livro 8: a transferência (D. Duque-Estrada, trad.). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar.) circunscreve a questão da demanda em relação ao amor, afirmando que toda demanda é, em última análise, demanda de amor. Ele indica que, no sujeito que fala, tudo aquilo que seria tendência natural precisa passar pelos desfiladeiros da demanda, situando-se num mais além, como demanda de amor, e num aquém, como objeto do desejo, objeto parcial. Considerando essa proposição podemos pensar que oferecer um tratamento que responda à demanda de emagrecimento como se fosse isso, como se fosse possível em uma resposta dar conta da divisão do sujeito, promove o transbordamento da demanda em novas demandas, ou pior, em soluções prontas que proliferam a cada novo verão. De acordo com Quinet (2009Quinet, A. (2009). As 4+1 condições da análise (12a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 16, grifo do autor),

A demanda de análise é correlata à elaboração do sintoma enquanto ‘sintoma analítico’. O que está em questão nessas entrevistas preliminares não é se o sujeito é analisável, se tem um eu forte ou fraco para suportar as agruras do processo analítico. A analisabilidade é função do sintoma e não do sujeito. A analisabilidade do sintoma não é um atributo ou qualificativo deste, como algo que lhe seria próprio: ela deve ser buscada para que a análise se inicie, transformando o sintoma do qual o sujeito se queixa em sintoma analítico.

Tendo o estabelecimento da transferência como horizonte norteador do início do tratamento, o manejo do conteúdo discursivo - seja aquele repleto de queixas corporais, seja o discurso difuso que não se coloca como pergunta - em favor da constituição de um sintoma analítico é o que permite recolher os elementos necessários para que haja a continuidade do tratamento. As entrevistas preliminares têm, assim, uma função essencial no tratamento, pois cifrar o sintoma articulando-o à suposição de saber ao analista é condição sine qua non da empreitada analítica. Esse é um dos maiores desafios enfrentados por analistas que se propõem a tratar os ditos obesos.

Impasses no diagnóstico e na direção do tratamento

Se no campo médico o diagnóstico é estabelecido por meio de parâmetros quantitativos a partir de uma média populacional, no campo psicanalítico este deve ser pensado a partir da particularidade de cada caso, não se prestando a generalizações. A problemática quanto ao estabelecimento de um diagnóstico estrutural se coloca desde muito cedo na obra freudiana. Em 1913, em um de seus Trabajos sobre técnica psicoanalítica, fica patente sua preocupação em relação ao diagnóstico diferencial entre neurose e psicose, destacando que cometer um equívoco é de muito mais gravidade para um psicanalista que para um psiquiatra.

Nesse texto, assim como em vários outros, Freud é enfático na tese de que a psicanálise não deve ser empreendida nos casos de psicose. Contudo, algo de incongruente se apresenta quando pensamos no diagnóstico para a psicanálise, a saber: que este deve ser elaborado de saída, quando pouco se sabe da história do paciente e de sua doença, para que essa inferência possa, numa certa medida, fornecer uma indicação quanto ao tipo de tratamento a ser empreendido. Essa elaboração envolve uma margem de erro, indicando que algo escapa à noção de estrutura clínica. Frequentemente nos deparamos nos textos freudianos com a consideração de uma continuidade entre os casos patológicos e os casos normais, aspecto a partir do qual Freud realiza a construção de seus conceitos e perspectivas clínicas como, por exemplo, no texto Introducción del narcisismo (Freud, 2006cFreud, S. (2006c). Introdución del narcisismo. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 14, p. 71-104). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1914., p. 79, tradução nossa)4 4 “Así como las neuroses de transferência nos posibilitaron rastrear lasmocionespulsionales libidinosas, la dementiapraecox y la paranoia nos permitirá ninteligir La psicologia del yo. De nuevo tendremos a colegirla simplicidade aparente de lo normal desde las desfiguraciones y exageraciones de lo patológico”. , em que afirma:

[...[ assim como as neuroses de transferência nos possibilitaram rastrear as moções libidinais, a dementia praecox e a paranoia nos permitirão entender a psicologia do eu. De novo teremos que inferir a aparente simplicidade do normal a partir das desfigurações e exageros do patológico.

Da mesma maneira valemo-nos dessa perspectiva para pensar que os casos graves de obesidade abrem a possibilidade de vislumbrar o que se desdobra no funcionamento das compulsões por comer dos pacientes que cotidianamente frequentam os consultórios dos psicanalistas, médicos e nutricionistas em busca de soluções readymade para seu sofrimento.

Para além dessa diferenciação estrutural entre neurose e psicose, os casos graves de obesidade, em que há a presença recorrente de episódios de compulsão por comer, assim como os casos de bulimia (que apresentam a compulsão seguida de métodos compensatórios que fazem com que não haja uma alteração significativa de peso) nos sugerem certa inoperância da lógica fálica, lógica esta que no sintoma neurótico clássico se mostra tão evidente. No decorrer do tratamento podemos observar que grande parte dos pacientes se estrutura numa dinâmica neurótica clássica, seja histérica, seja obsessiva, marcada, porém, pela pregnância da dimensão do ato que nos possibilita pensar numa fragilidade do efeito de barra ao gozo que deve se inscrever pela operação da castração. O termo gozo é aqui tomado na acepção lacaniana, em que, retomando Freud, podemos considerar como a contrapartida do princípio do prazer, pois coloca a impossibilidade de sua plenitude e homeostase, um para além que ultrapassa esse princípio. O gozo aponta para a compulsão à repetição, na medida em que, do ponto de vista econômico, o excesso configura o gozo ao qual o sujeito permanece atado (Miller, 2000Miller, J-A. (2000). Os seis paradigmas do gozo. Opção Lacaniana, 26/27, 87-105.).

Como para a psicanálise, a obesidade não constitui uma categoria clínica, uma estrutura clínica ou mesmo um tipo clínico, mas os efeitos no corpo dos impasses de um sujeito, é importante distinguir em termos teóricos as diferentes respostas subjetivas frente à perda e ao gozo. Ou seja, se a castração é o que permite ao sujeito articular simbolicamente a perda enquanto falta, e se é possível que essa articulação não se dê, então podemos vislumbrar o amplo campo de respostas que um sujeito pode vir a construir numa tentativa de contornar o vazio. Nesse vasto domínio, o corpo obeso e a compulsão por comer podem funcionar tanto como suplência na psicose, quanto se constituir como sintoma na estrutura neurótica, pois se na psicose há um déficit simbólico pela foraclusão do significante Nome-do-Pai, na neurose há uma carência simbólica devida à própria castração que inscreve pelo Nome-do-Pai a privação real.

Essa ideia acompanha a proposta de Recalcati quando distingue uma suplência generalizada, que responderia ao que Lacan (2010Lacan, J. (2010). Encore (1972-1973) (A. L. T. Ribeiro, trad.). Rio de Janeiro, RJ: Escola Letra Freudiana. Edição não comercial.) trabalhou no Seminário 20 em termos da impossibilidade para o ser humano levar a cabo a relação sexual, e daria lugar ao amor como suplência, e uma suplência restrita que seria a substituição do significante Nome-do-Pai foracluído (Recalcati, 2002). Essa questão é perseguida por Calazans e Bastos (2010Calazans, R., & Bastos, A. (2010). Passagem ao ato e acting-out: duas respostas subjetivas.Fractal: Revista de Psicologia,22(2), 245-256.) quando identificam a possibilidade da ocorrência de passagens ao ato discretas. A partir da noção de suplência, eles se perguntam se seria possível pensar que os atos repetitivos na anorexia e na bulimia, que implicam uma duração e não somente uma ruptura, seriam modos discretos de apresentação da passagem ao ato. Considerando que a passagem ao ato indica que a estrutura de ficção da neurose não se sustenta por haver um curto-circuito entre sujeito e objeto, o ato poderia funcionar como forma de apaziguamento do gozo?

Na compulsão por comer a pregnância da dimensão do ato sem uma regulação nos lança num campo minado, onde vale a preocupação quanto aos efeitos para cada sujeito da escuta analítica: se no dispositivo freudiano a interpretação opera sob a forma de um corte que se articula à lógica da castração, e se de alguma maneira parece que algo da castração não foi subjetivado, as palavras do analista podem funcionar aí como palavras persecutórias, fortalecendo o mandamento superegoico de adequação ao ideal estético. Podem até mesmo determinar o desencadeamento psicótico que confirma, a posteriori, a função de estabilização na psicose.

A compulsão por comer de alguma maneira condensa em si as dimensões dos mandamentos superegoicos e da angústia, num evidente círculo-vicioso: come-se descontroladamente, recrimina-se excessivamente e como efeito resta a angústia que se apresenta em todas as suas tonalidades. O corpo dito obeso vem, desse modo, vestir e nomear essa angústia atrelada ao gozo, cuja relativização ou franqueamento é dependente do funcionamento de barra que a castração promove. Para Gerez-Ambertín (2003Gerez-Ambertín, M. (2003). As vozes do supereu na clínica psicanalítica e no mal-estar na civilização(S. Chebli, trad.). São Paulo, SP: Cultura Editores Associados., p. 234), é preciso “[...[ encontrar um referencial que permita distinguir o imperativo de gozo do supereu na neurose daquele da psicose, pois, embora o primeiro se apresente algumas vezes como voz, há outras formas de apresentação que, mesmo silenciosas, não são menos atrozes [...[”, sugerindo organizar esses parâmetros clínicos a partir do desejo do sujeito diante do desejo do Outro ou do gozo do Outro.

Trata-se, portanto, de pensar na particularidade de uma modalidade de gozo e de resposta a este, à qual os pacientes ditos obesos estão aderidos, seja no início do tratamento, pela demanda feita ao analista, seja na sua continuidade, pelo curto-circuito que se descreve nas associações livres. A partir daí pode-se diferenciar os casos em que se pode encaminhar uma possibilidade de restabelecer a castração e o falo como ponto ‘arquimédico’ e bússola clínica do tratamento analítico, daqueles em que se deve supor uma psicose ordinária.

Psicose ordinária é termo cunhado por Jacques-Alain Miller na Convenção de Antibes ocorrida em Paris no ano de 1998, para driblar a rigidez de uma clínica binária (neurose-psicose) e pensar as especificidades dos casos clínicos que surpreendiam os analistas sob formas menos exuberantes de apresentação da psicose, em que não se observavam claramente os fenômenos elementares característicos das psicoses clássicas. Miller (2010)Miller, J-A. (2010). Efeito de retorno à psicose ordinária. Opção Lacaniana Online, 1(3), 1-29. afirma que o analista deve identificar na clínica os casos de neurose por sua estrutura precisa e reconhecível. Porém, quando o analista é levado, durante anos, a duvidar da neurose do sujeito, então, nesse caso, deve-se apostar que se está diante de uma psicose ordinária. É preciso, portanto, não esquecer da advertência de que esses casos devem ser tratados como psicose.

Ato, compulsão e sintoma

A dimensão do ato se mostra na clínica de diversas maneiras, seja por meio do ato falho, do ato sintomático, do acting out ou da passagem ao ato. São consideradas formas de resposta frente ao mal-estar, ao lado da inibição, do sintoma e da angústia (Calazans & Bastos, 2010Calazans, R., & Bastos, A. (2010). Passagem ao ato e acting-out: duas respostas subjetivas.Fractal: Revista de Psicologia,22(2), 245-256.). O ato sintomático e o ato falho seriam considerados formações do inconsciente, sendo, portanto, passíveis de interpretação no dispositivo analítico como os sintomas o são. O acting out, por sua vez, seria uma forma de ato que apareceria no lugar da recordação e indica que algo do que se apresenta no decorrer de uma análise não se articula simbolicamente por meio da recordação, mas faz sua presença nos atos sob transferência sendo, ainda assim, suscetível à abordagem sob transferência. Além dessas variações do ato, Freud (2006gFreud, S. (2006g). Sobre la psicogénesis de un caso de homosexualidad femenina. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 18, p. 141-164). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1920.) aponta por meio da análise da jovem homossexual um terceiro modo de apresentação do ato (que será nomeado por Lacan como passagem ao ato) quando ocorre uma tentativa de suicídio que rompe com a cifração do sintoma e caminha na contramão do processo analítico.

A diferenciação introduzida por Lacan no que diz respeito à dimensão do ato remonta tanto à sua investigação dos atos criminosos, também denominados crimes do supereu - como o caso Aimée e o crime das irmãs Papin -, quanto a sua leitura de certas análises realizadas por alguns pós-freudianos em que dá destaque à dimensão do ato para compor uma crítica ao modo como esses analistas conduziam suas análises. Um exemplo que é tratado por Lacan em vários momentos do seu ensino é o caso do paciente de Ernest Kris, conhecido como homem dos miolos frescos. Trata-se do caso de um paciente que acredita ser um plagiário. Considerando isso, Kris se dispõe a ler seus escritos e verifica não haver plágio, o que o faz precipitadamente interpretar que o paciente defensivamente esboça uma atração pelas ideias dos outros, ao que se segue um longo silêncio. Em seguida, o paciente conta que, há algum tempo, ao sair da sessão, passeia por uma rua onde há vários restaurantes e come seu prato predileto: miolos frescos. Isso que para Kris é uma grande interpretação é para Lacan um engano técnico, pois Kris teria feito emergir a pulsão por meio de um acting out no lugar de fazer emergir a verdade do sintoma. Nesse caso, Lacan indica como a condução do tratamento pode, muitas vezes, favorecer a produção de um acting out como um modo de convocar a escuta analítica e um reposicionamento do analista no dispositivo.

É com a ajuda da conceituação do objeto a que Lacan (2005Lacan, J. (2005). O seminário, livro 10: a angústia (V. Ribeiro, trad.). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar.) pode explicitar a diferenciação entre passagem ao ato e acting out. Diferentemente do acting out, em que há um endereçamento de um ato ao Outro, a passagem ao ato seria algo que rompe com a cena transferencial/fantasmática, na medida em que o sujeito não se apresenta. Essa diferenciação nos permite interrogar a compulsão por comer do ponto de vista do dispositivo analítico, considerando que muitas vezes a compulsão por comer se configura como um endereçamento que convoca o analista na sua função, mas outras vezes tem as características de uma passagem ao ato, em que há um apagamento do sujeito indo na contramão da análise. Talvez também possamos pensar na compulsão por comer como um sintoma, ou seja, como uma solução de compromisso que negocia as imposições pulsionais e as forças recalcadoras do eu, ao modo da compulsão na neurose obsessiva. Vejamos essas diferenças detalhadamente.

Primeiramente a compulsão é tratada por Freud a partir do quadro clínico típico da neurose obsessiva, cujos sintomas incluem ideias obsedantes, a luta contra esses pensamentos, assim como a compulsão a realizar rituais e atos indesejáveis. O que marca a especificidade da compulsão na neurose obsessiva é o seu caráter coercitivo, uma força interna (zwang) que coage o sujeito à ação. O principal exemplo na obra freudiana é a análise do caso do Homem dos ratos, em que as compulsões tinham a função de proteção contra a angústia proveniente das fantasias originadas a partir do relato que o paciente ouvira de um tipo de tortura oriental provocada pela penetração de ratos no reto de um indivíduo (Freud, 2006bFreud, S. (2006b). A propósito de un caso de neurosis obsesiva. In S. Freud, Obras completas(2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 10, p. 123-194). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1909.). Nesse sentido, a compulsão (zwang) presente na neurose obsessiva (zwangneurose) é uma ação resultante de um conflito psíquico, e se inscreve no quadro fantasmático do sujeito.

Outra forma de pensar a compulsão na psicanálise seria tomá-la como repetição automática, diferenciando-a do sintoma, uma vez que não poderia ser traduzida por meio do enunciado de uma fantasia. Nesse sentido, articula-se ao conceito freudiano de compulsão à repetição (wiederholungzwang) apresentado em Más Allá del principio de placer (Freud, 2006fFreud, S. (2006f). Más Allá del principio de placer. In S. Freud, Obras completas(2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 18, p. 7-62). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1920.), que consiste em uma mobilização dos investimentos psíquicos a fim de realizar uma ligação (bindung) do excesso de excitação livre que invade o aparelho psíquico sem que este esteja preparado para isso. Essa dimensão compulsiva que se apresenta como radicalmente estranha e não simbolizável seria uma característica fundamental da pulsão de morte, e suas expressões clínicas mais conhecidas são os sonhos traumáticos, o Fort-da, o destino fatídico e a repetição na transferência. Esses exemplos trabalhados por Freud são os testemunhos clínicos de um trabalho do aparelho psíquico em relação à pulsão de morte, ou seja, uma simbolização possível para o excesso pulsional que se faz presente por meio de uma compulsão a repetir.

Seguindo essa diferenciação freudiana, Barros (2002Barros, R. R. (2002). Compulsões, desejo e gozo. Latusa, 7, 95-106.) propõe pensar uma terceira forma de apreender a compulsão. Para o autor não se trataria de saber se é possível ampliar a margem do que pode ser simbolizado, mas de “[...[ ampliar a própria noção de sintoma, que já não seria um representante simbólico do sujeito, mas uma forma de gozo pulsional, sem mediação discursiva” (Barros, 2002Barros, R. R. (2002). Compulsões, desejo e gozo. Latusa, 7, 95-106., p. 104). O sintoma entendido como repetição e não mais como formação de compromisso enquadraria os desafios clínicos contemporâneos como a bulimia, aspecto importante que talvez possamos encontrar na própria concepção freudiana de sintoma.

Sintoma: ganho de peso, ganho de gozo

Cosentino (1996Cosentino, J. C. (1996). A concepção do sintoma em diferentes momentos da obra freudiana. Revista da Escola Letra Freudiana, 15(17), 3-31.), ao analisar as diferentes concepções de sintoma na obra freudiana, reitera a insistência de Freud, desde o Manuscrito K até Moisés y la religión monoteísta, na tese de que o sintoma tem o caráter de uma formação de compromisso entre as representações recalcadas e as recalcadoras, substituindo uma lembrança patogênica. Com o gradativo abandono da perspectiva da sexualidade genital e a consolidação do ponto de vista pulsional, o sintoma tende a ser tomado mais como o resultado do conflito que se instaura no psiquismo entre uma tendência inconsciente que busca satisfação e outra consciente que recalca, sendo considerado como um substituto não mais da lembrança, mas da própria satisfação sexual. É analisando a fonte das compulsões a que obedecem os sintomas obsessivos e o modelo da neurose de angústia que Freud identifica uma quantidade de energia proveniente da vida sexual que causa uma perturbação dentro do psiquismo, dando, assim, maior ênfase ao aspecto econômico em jogo nos sintomas em detrimento do aspecto dinâmico.

É esse ponto que gostaríamos de destacar, pois essa excitação sexual que causa perturbação e promove a formação do sintoma como uma satisfação que a substitui não extingue a fonte pulsional, permanecendo um resto. O sintoma em si pode adquirir um aspecto compulsivo, pois, na qualidade de satisfação, garante uma realização à qual o sujeito permanece vinculado. Podemos entrever esse entendimento nos ditos que a clínica nos presenteia

Não consigo me olhar, tenho raiva deste corpo, é uma barreira que coloco pra não chegar perto de nada, principalmente do meu marido. Não consigo fazer amor com ele, não consigo me aproximar. Tenho vergonha de sair na rua, só troco de roupa com a luz apagada, nem me olho no espelho. Mas também não consigo deixar de comer, é o meu único prazer (Lugão, 2008Lugão, S. M. (2008). Aspectos narcísicos da clínica da obesidade (Dissertação de Mestrado), Programa de Pós-graduação em Teoria Psicanalítica. Instituto de Psicologia. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro., p. 63).

Ao analisar a formação dos sintomas na 19ª Conferência, Freud afirma que, no caso das neuroses de transferência, os pacientes adoecem de uma frustração, quando a satisfação de seus desejos sexuais é inviabilizada pela realidade. A satisfação figura aí como a “[...[ satisfação substitutiva do que se perdeu na vida” (Freud, 2006dFreud, S. (2006d). 19ª Conferência. Resistencia e repressión. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 16, p. 262-276). Buenos Aires: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1917., p. 274, tradução nossa)5 5 “[...[ una satisfacción sustitutiva de lo que se echó de menos en la vida”. . Em seguida afirma que haveria uma série de objeções a essa ideia da satisfação do desejo presente nos sintomas, sobretudo pela observação de que os sintomas parecem ter o propósito contrário, ou seja, de excluir ou cancelar a satisfação sexual, como podemos ver na fala destacada acima. Em resposta a essa observação, Freud acrescenta que os sintomas

[...[ são produtos de compromisso, nascem da interferência de duas aspirações opostas e substituem tanto o recalcado quanto o recalcador que tenham cooperado em sua origem. A substituição pode se inclinar para um lado ou para outro e é raro que uma dessas influências falte por completo. Na histeria se alcança a coincidência dos dois propósitos, na maioria das vezes, no mesmo sintoma. Na neurose obsessiva as duas partes se separam frequentemente e o sintoma se torna então em dois tempos, consta de duas ações sucessivas que se anulam entre si (Freud, 2006dFreud, S. (2006d). 19ª Conferência. Resistencia e repressión. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 16, p. 262-276). Buenos Aires: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1917., p. 275, tradução nossa)6 6 “[...[ son productos de compromiso; nacen de la interferencia de dos aspiraciones opuestas y subrogan tanto a lo reprimido cuanto a lo represor que han cooperado en su génesis. La subrogación puede entonces inclinarse más hacia un lado o hacia el otro; es raro que una de esas influencias falte por completo. En la histeria se alcanza, las más de las veces, la coincidencia de los propósitos en el mismo síntoma. En la neurosis obsesiva, las dos partes a menudo se separan; el síntoma se hace entonces en dos tempos, consta de dos acciones sucesivas que se cancelan entre sí”. .

Para Cosentino, na 23ª Conferência, Freud faz claramente a distinção entre os sintomas e a doença, sustentando que a eliminação dos sintomas não é a cura da doença, pois permanece a capacidade de gerar novos sintomas. O aspecto compulsivo do sintoma já delimitado por Freud em relação à resistência na análise foi indicando a necessidade de reformulação de seu entendimento quanto ao processo de análise. Num primeiro momento, Freud apostava na necessidade de tornar consciente o inconsciente, afirmando em vários momentos da obra a importância de comunicar ao paciente os conteúdos inconscientes, tornando-os conscientes para haver um recrudescimento dos sintomas. Essa concepção, contudo, tornou-se problemática, pois a clínica apontava repetidamente para algo que não se inscrevia no aparelho psíquico, escapando à possibilidade de conscientização.

Podemos acompanhar, assim, a ampliação do conceito de sintoma como satisfação substitutiva, que passa a comportar os paradoxos da pulsão: algo de estranho e irreconhecível começa a acenar nas formações sintomáticas que não se sujeitam à cura, mas prestam-se a permanentes deslocamentos. Com a virada da teoria das pulsões em 1920, o dualismo pulsional centrado na oposição entre pulsões de vida (de autoconservação) e pulsões sexuais (libido) é abandonado, e as pulsões de vida passam a englobar as pulsões de autoconservação e as pulsões sexuais, contrapondo-se em seu conjunto à pulsão de morte. Essa virada possibilita pensar elementos que ultrapassam o princípio do prazer como, por exemplo, “[...[ essa missão paradoxal do sintoma, adequada para colocar como manifesto a insistência da pulsão” (Cosentino, 1996Cosentino, J. C. (1996). A concepção do sintoma em diferentes momentos da obra freudiana. Revista da Escola Letra Freudiana, 15(17), 3-31., p. 21) em procurar infinitamente a satisfação.

O descolamento da supressão dos sintomas em relação à cura da doença indica a função secundária daqueles, pois, se no início o sintoma é um hóspede mal recebido, na economia psíquica ele ganha, por outro lado, uma função externa secundária que Freud assinala numa nota agregada ao caso Dora em 1923.

O motivo para adoecer é em todos os casos o propósito de obter um ganho [...[ mas em toda neurose deve-se reconhecer um ganho primário. Ficar doente poupa, antes de tudo, uma operação psíquica; se apresenta como uma solução economicamente mais cômoda no caso de um conflito psíquico (refúgio na doença), por mais que na maioria das vezes se revele inequivocamente o caráter inadequado dessa saída. Essa parte do ganho primário da doença pode se chamar interno, psicológico; é constante. Além disso, fatores externos [...[ proporcionam motivos para adoecer e, assim, constituem a parte externa do ganho primário da doença (Freud, 2006aFreud, S. (2006a). Fragmento de análisis de un caso de histeria. In S Freud, Obras completas(2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 7, p. 7-107). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1905., p. 39, tradução nossa)7 7 “El motivo para enfermar es en todos los casos el propósito de obtener ganancia. [...[ pero entoda contracción de unaneurosis debe reconocerse una ganancia primaria. El enfermarse ahorra, ante todo, una operación psíquica; se presenta como la solución económicamente más cómoda en caso de conflicto psíquico (refugio en la enfermedad), por más que la mayoría de las veces se revele después inequívocamente el carácter inadecuado de esa salida. Esta parte de la ganancia primaria de la enfermedad puede llamarse interna, psicológica; es, por así decir, constante. Además, factores exteriores […[ proporcionan motivos para enfermar y así constituyen la parte externa de la ganancia primaria de la enfermedad”. .

Se o ganho primário da doença corresponde a um ganho econômico interno ao aparelho psíquico, o ganho secundário constitui a vantagem exterior palpável, cujo valor real deve ser cobrado ao eu, a mais ou a menos (Freud, 2006eFreud, S. (2006e). 24ª Conferência. El estado neurótico común. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 16, p. 344-356). Buenos Aires, AR: Amorrortu . Trabalho original publicado em 1917.). O ganho da doença é também tratado por Freud em El yo y El ello (2006hFreud, S. (2006h). El yo y el ello. In S. Freud, Obras completas(2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 19, p. 13-66).Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1923.) a propósito de esclarecer a íntima afinidade do supereu com o isso, considerando os casos em análise em que os pacientes reagem de modo inverso aos avanços da análise e, em vez de melhorarem, pioram. A assim denominada reação terapêutica negativa evidencia uma necessidade de estarem doentes, e mesmo frente ao manejo clássico das resistências ela se mostra como um obstáculo ainda mais forte (Freud, 2006hFreud, S. (2006h). El yo y el ello. In S. Freud, Obras completas(2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 19, p. 13-66).Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1923.). Essa posição foi sustentada por Freud (2006j)Freud, S. (2006j). Análisis terminable e interminable. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 23, p. 219-254). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1937. até o final de sua obra permanecendo mesmo como uma questão abordada em Análisis terminable e interminable, a propósito dos limites da interpretação e do destino da transferência no final de análise.

A relação do sintoma com o eu volta a ser abordada por Freud (2006iFreud, S. (2006i). Inhibición, síntoma y angustia. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 20, p. 83-164). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1926.) em Inhibición, sintoma y angustia, demonstrando que à medida que o sintoma substitui tanto a tendência recalcada quanto a recalcadora ele ganha uma independência em relação ao eu estabelecendo uma sequência tediosa e interminável de operações, em que a luta do eu contra a moção pulsional se prolonga em uma luta contra o sintoma. Há aí uma tentativa de absorção do sintoma por parte do eu, cujo exemplo clássico seria o sintoma histérico de punição, pois

[...[ o sintoma está aí e não pode ser eliminado e se impõe aceitar a situação e retirar dela o máximo proveito possível. Sobrevém uma adaptação ao fragmento do mundo interno que é estranho ao eu e está representado pelo sintoma, adaptação como a que o eu faz com o mundo externo real [...[ assim, o sintoma é encarregado gradativamente de representar importantes interesses, ‘cobra um valor’ para sua afirmação, ‘se funde cada vez mais com o eu’ e se torna cada vez mais indispensável para ele. Poder-se-ia exagerar o valor dessa adaptação secundária ao sintoma afirmando que o eu procurou-o exclusivamente para gozar de suas vantagens (Freud, 2006iFreud, S. (2006i). Inhibición, síntoma y angustia. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 20, p. 83-164). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1926., p. 95, tradução nossa, grifo nosso)8 8 “[…[ el síntoma ya está ahí y no puede ser eliminado, ahora se impone avenirse a esta situación y sacarle a máxima ventaja posible. Sobreviene una adaptación al fragmento del mundo interior que es ajeno al yo y está representado (repräsentieren) por el síntoma, adaptación como la que el yo suele llevar a cabo normalmente respecto al mundo exterior objetivo (real) […[ así el síntoma es encargado poco a poco de subrogar importantes intereses, cobra un valor para la afirmación de sí, se fusiona cada vez más con el yo, se vuelve cada vez más indispensable para este. […[ podría exagerarse el valor de esa adaptación secundaria al síntoma mediante el enunciado de que el yo se lo ha procurado únicamente para gozar de sus ventajas”. .

É sob a perspectiva lacaniana que podemos avançar um pouco mais no entendimento dessa estranha combinação de ganhos e perdas da doença que Freud investiga cuidadosamente e que se coloca como questão por meio da compulsão por comer dos pacientes ditos obesos. Aqui o ganho de peso decorrente da compulsão dá corpo e forma ao paradoxo do sintoma: ao mesmo tempo em que traz um ganho de prazer proporcionado pela atividade oral erotizada e pela economia de energia psíquica, por outro traz o sofrimento atrelado ao excesso, excesso de peso, de críticas e de atos. Um verdadeiro peso na consciência.

Considerações finais

Retomando a proposta de Barros (2002Barros, R. R. (2002). Compulsões, desejo e gozo. Latusa, 7, 95-106.), de pensar o sintoma ampliado como uma forma de gozo, podemos depreender do percurso freudiano traçado por Cosentino (1996Cosentino, J. C. (1996). A concepção do sintoma em diferentes momentos da obra freudiana. Revista da Escola Letra Freudiana, 15(17), 3-31.) que a compulsão por comer constitui uma forma de evitar a angústia que paradoxalmente produz um sofrimento, ou ainda, um ato que se funde ao eu e cobra seu preço na moeda da angústia. Seria preciso avançar no entendimento da angústia para distinguir as diferentes maneiras de abordagem clínica do ato em suas diferentes declinações, pois seja como passagem ao ato, acting out ou sintoma, o que se trata de promover a partir do dispositivo analítico é o enxugamento do gozo, pois como nos diz Lacan

O sintoma por natureza é gozo, não se esqueçam disso, gozo encoberto, sem dúvida, untergebliebene Befriedgung, não precisa de vocês como o acting out, ele se basta. É da ordem daquilo que lhes ensinei a distinguir do desejo como sendo o gozo, isto é, aquilo que vai em direção à Coisa, depois de ultrapassar a barreira [...[ do princípio do prazer, e é por isso que tal gozo pode traduzir-se num Unlust - para os que ainda não entenderam, esse termo alemão significa ‘desprazer’ (Lacan, 1992Lacan, J. (1992).O seminário, livro 8: a transferência (D. Duque-Estrada, trad.). Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar., p. 140, grifo do autor).

Trata-se, melhor dizendo, de ampliar as respostas possíveis frente ao mandamento superegoico que ata o sujeito a um gozo oral que lhe ultrapassa e torna a castração inoperante. É preciso, para tanto, verificar a hipótese segundo a qual a incidência das exigências superegoicas estaria diretamente relacionada à manutenção do sintoma e ao aumento da angústia devido a uma falha na operação simbólica que regula as relações entre supereu, gozo e desejo para restituir ao sintoma sua possibilidade de favorecer a tramitação da angústia. O sintoma segue em seu papel de substituto e retorno do recalcado, cuja

[...[ exigência de satisfação é renovada reiteradamente, constrangendo o eu a dar em cada caso o sinal de desprazer e a colocar-se em posição defensiva. A luta defensiva secundária contra o sintoma é variada em suas formas, é travada em diferentes cenários e se vale de vários métodos (Freud, 2006iFreud, S. (2006i). Inhibición, síntoma y angustia. In S. Freud, Obras completas (2a ed., J. L. Etcheverry, trad., Vol. 20, p. 83-164). Buenos Aires, AR: Amorrortu. Trabalho original publicado em 1926., p. 96, tradução nossa) .

Considerando o sintoma não somente em sua função de substituição, mas sobretudo sob a perspectiva dessa exigência de satisfação que se renova repetidamente, podemos articular o sintoma a uma economia de gozo que se instaura na compulsão por comer, cuja regulação é dependente da operação do simbólico. A partir daí vale verificar a possibilidade de pensar freudianamente a ampliação da noção de sintoma como o que ao mesmo tempo substitui o recalcado e articula o real da angústia. Questão metapsicológica, sem dúvida, mas necessária para pensar as formas de intervenção possíveis junto aos pacientes ditos obesos na clínica contemporânea.

Referências

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  • 1
    Apoio e financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
  • 4
    “Así como las neuroses de transferência nos posibilitaron rastrear lasmocionespulsionales libidinosas, la dementiapraecox y la paranoia nos permitirá ninteligir La psicologia del yo. De nuevo tendremos a colegirla simplicidade aparente de lo normal desde las desfiguraciones y exageraciones de lo patológico”.
  • 5
    “[...[ una satisfacción sustitutiva de lo que se echó de menos en la vida”.
  • 6
    “[...[ son productos de compromiso; nacen de la interferencia de dos aspiraciones opuestas y subrogan tanto a lo reprimido cuanto a lo represor que han cooperado en su génesis. La subrogación puede entonces inclinarse más hacia un lado o hacia el otro; es raro que una de esas influencias falte por completo. En la histeria se alcanza, las más de las veces, la coincidencia de los propósitos en el mismo síntoma. En la neurosis obsesiva, las dos partes a menudo se separan; el síntoma se hace entonces en dos tempos, consta de dos acciones sucesivas que se cancelan entre sí”.
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    “El motivo para enfermar es en todos los casos el propósito de obtener ganancia. [...[ pero entoda contracción de unaneurosis debe reconocerse una ganancia primaria. El enfermarse ahorra, ante todo, una operación psíquica; se presenta como la solución económicamente más cómoda en caso de conflicto psíquico (refugio en la enfermedad), por más que la mayoría de las veces se revele después inequívocamente el carácter inadecuado de esa salida. Esta parte de la ganancia primaria de la enfermedad puede llamarse interna, psicológica; es, por así decir, constante. Además, factores exteriores […[ proporcionan motivos para enfermar y así constituyen la parte externa de la ganancia primaria de la enfermedad”.
  • 8
    “[…[ el síntoma ya está ahí y no puede ser eliminado, ahora se impone avenirse a esta situación y sacarle a máxima ventaja posible. Sobreviene una adaptación al fragmento del mundo interior que es ajeno al yo y está representado (repräsentieren) por el síntoma, adaptación como la que el yo suele llevar a cabo normalmente respecto al mundo exterior objetivo (real) […[ así el síntoma es encargado poco a poco de subrogar importantes intereses, cobra un valor para la afirmación de sí, se fusiona cada vez más con el yo, se vuelve cada vez más indispensable para este. […[ podría exagerarse el valor de esa adaptación secundaria al síntoma mediante el enunciado de que el yo se lo ha procurado únicamente para gozar de sus ventajas”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    05 Nov 2017
  • Aceito
    13 Dez 2018
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