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REINSERÇÃO FAMILIAR DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES ACOLHIDOS: ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO EM TRÊS ESTADOS BRASILEIROS1 1 Apoio e financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)

LA REINSERCIÓN FAMILIAR DE NIÑOS Y ADOLESCENTES ACOGIDOS: ACTUACIÓN DEL PSICÓLOGO EN TRES ESTADOS BRASILEÑOS

RESUMO

A reinserção familiar após um período de acolhimento institucional constitui-se em um desafio tanto para a equipe que acolhe quanto para a família. Após a lei 12.010/2009, que determinou tempo de permanência máximo de dois anos, as equipes técnicas passaram a focar na provisoriedade da medida de proteção e planejar a reinserção familiar. Esse estudo objetivou conhecer os procedimentos e desafios de psicólogas da equipe técnica frente ao planejamento e acompanhamento da reinserção de crianças e adolescentes na família de origem. Participaram três psicólogas de acolhimentos institucionais de três cidades do Brasil: Santa Maria/RS, Brasília/DF e Natal/RN. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas a partir de um roteiro. Os dados foram analisados qualitativamente e categorizados com o auxílio da análise de conteúdo. Entre os resultados, destaca-se que as profissionais seguem procedimentos para a preparação da reinserção, como o estabelecimento de visitas, encaminhamento da família para rede de proteção e saúde e avaliação periódica das condições da família. Entre os desafios, encontraram-se fatores de risco enraizados, dificuldades econômicas, entre outros. Aperfeiçoamentos são discutidos para maximizar o sucesso da reinserção familiar.

Palavras-chave:
Acolhimento institucional; família; reinserção familiar

RESUMEN

La reinserción familiar después de un período de acogida institucional se constituye en un desafío tanto para el equipo que acoge como para la familia. Después de la ley 12.010/2009, que determinó tiempo de permanencia máximo de dos años, los equipos técnicos pasaron a enfocarse en la provisoriedad de la medida de protección y planificar la reinserción familiar. En este estudio se tiene como objetivo conocer los procedimientos y desafíos de psicólogas del equipo técnico frente al planeamiento y acompañamiento de la reinserción de niños y adolescentes en la familia de origen. Participaron tres psicólogas de acogidas institucionales de tres ciudades de Brasil, Santa María/RS, Brasilia/DF y Natal/RN. Se realizaron entrevistas semiestructuradas a partir de un itinerario. Los datos fueron analizados cualitativamente y categorizados con la ayuda del Análisis de Contenido. Entre los resultados, se destaca que las profesionales siguen procedimientos para la preparación de la reinserción, como el establecimiento de visitas, encaminamiento de la familia a la red de protección y salud y evaluación periódica de las condiciones de la familia y del deseo por el retorno del hijo. Entre los desafíos, se encontraron factores de riesgo arraigados e intergeneracionales, dificultades económicas, entre otros. Las mejoras se discuten para maximizar el éxito de la reinserción familiar.

Palabras clave:
Acogida institucional; familia; reinserción familiar

ABSTRACT

Family reunification after a period in foster care is a challenge for both the involved staff and the family. After law 12.010/2009, which determined a maximum length of two years, the staff began to focus on the provisional nature of the child advocacy and plan toward to family reunification. This study aimed to know the procedures and challenges of psychologists of the technical staff regarding the planning and follow-up of the reunification of children and adolescents in the family of origin. Three institutional psychologists from three cities in Brazil participated: Santa Maria/RS, Brasília/DF and Natal/RN. In-depth semi-structured interviews were carried out from a script. Data were analyzed qualitatively and categorized through Content Analysis. Among the results, it is highlighted that professionals follow procedures for the preparation of reunification, such as the establishment of visits, referral of the family to the protection and health network and periodic assessment of family conditions. The challenges included risk factors, economic difficulties, among others. Improvements are discussed to maximize the success of family reunification.

Keywords:
Institutionalization; family; psychosocial intervention

Introdução

O acolhimento de crianças e adolescentes tem sido alvo de inúmeros estudos no Brasil que avaliam tanto o impacto do afastamento familiar em todas suas facetas quanto as mudanças ocorridas ao longo das últimas décadas (Barbosa, Antunes, & Padilha, 2016Barbosa, V. M. C., Antunes, M. C., & Padilha, M. G. S. (2016). A reinserção familiar de crianças e adolescentes vítimas de violência intrafamiliar em acolhimento institucional por medida de proteção: o abuso sexual em foco. Boletim - Academia Paulista de Psicologia, 36(91), 286-309.; Fonseca, 1987Fonseca, C. W. (1987). O internato do pobre: Febem e a organização doméstica em um grupo Porto-alegrense de baixa renda. Temas IMESC, 4(1), 21-39.; Moré & Sperancetta, 2010Moré, C. L. O., & Sperancetta, A. (2010). Práticas de pais sociais em instituições de acolhimento de crianças e adolescentes. Psicologia & Sociedade, 22(3), 519-528.; Rizzini & Rizzini, 2004Rizzini, I., & Rizzini, I. (2004). A institucionalização de crianças no Brasil: percurso histórico e desafios do presente. Rio de Janeiro, RJ: Ed PUC-Rio.; Silva & Arpini, 2013Silva, M. L., & Arpini, D. M. (2013). A nova lei nacional de adoção: desafios para a reinserção familiar.Psicologia em Estudo,18(1), 125-135. dói: 10.1590/S1413-73722013000100013
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). Constituindo-se como uma medida de proteção provisória e excepcional, um plano de reunificação familiar ou o encaminhamento para adoção deve ser realizado, a fim de efetivar o direito à convivência familiar e comunitária (Bernardi, 2010Bernardi, D. C. F. (2010). Famílias em situação de vulnerabilidade. In D.C.F. Bernardi, (Coord), Cada caso é um caso: estudos de caso, projetos de atendimento (p. 32-44). São Paulo, SP: Associação Fazendo História.). A atuação da equipe técnica dos serviços de acolhimento assume papel chave no sucesso dessa reunificação. A reinserção familiar representa um processo delicado e exigente não só para as famílias e crianças e/ou adolescentes que estão sendo reunificadas, mas também para a equipe, que precisa tomar decisões que afetam inúmeras pessoas (Brito, Rosa, & Trindade, 2014Brito, C. O., Rosa, E. M., & Trindade, Z. A. (2014). O processo de reinserção familiar sob a ótica das equipes técnicas das instituições de acolhimento. Temas em Psicologia, 22(2), 401-413. dói: 10.9788/TP2014.2-11
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). Assim, o objetivo desse artigo é conhecer como as psicólogas das equipes técnicas dos serviços de acolhimento de três cidades do Brasil estão conduzindo os casos de reinserção na família de origem. O interesse está direcionado aos procedimentos adotados pela equipe antes e depois da reinserção familiar, na perspectiva do profissional psicólogo, como também aos desafios enfrentados durante esse processo. Primeiramente, uma discussão acerca das mudanças ocorridas na legislação de proteção será apresentada, a fim de amparar a discussão sobre o acolhimento institucional de crianças e a reinserção familiar e, a seguir, estudos sobre reinserção familiar após a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente serão apresentados.

Inúmeras mudanças têm ocorrido na legislação brasileira acerca da infância e juventude ao longo do tempo. Conforme Rizzini e Rizzini (2004Rizzini, I., & Rizzini, I. (2004). A institucionalização de crianças no Brasil: percurso histórico e desafios do presente. Rio de Janeiro, RJ: Ed PUC-Rio.), os extintos Códigos de Menores de 1927 e 1979 deixaram sua marca por representarem o período de maior atuação do Estado sobre a infância pobre, constituindo-se, assim, como disparadores de discriminação entre as diferentes infâncias, visto que denominava as crianças pobres de ‘menores’ que precisavam ser contidos e controlados. Assim, as instituições de acolhimento funcionavam como forma de ‘depósito’ de crianças e adolescentes das classes em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Uma vez institucionalizados, crianças e adolescentes dessa época permaneciam sendo cuidados assistencialmente, sem a preocupação com seu desenvolvimento ou projeto de futuro (Ferreira, 2014Ferreira, F. P. M. (2014). Crianças e adolescentes em abrigos: uma regionalização para Minas Gerais. Serviço Social & Sociedade,117, 142-168. dói: 10.1590/S0101-66282014000100009
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; Rocha, Arpini, & Savegnago, 2015aRocha, P. J., Arpini, D. M., & Savegnago, S. D. (2015a). Acolhimento institucional: percepções de familiares que o vivenciaram. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 67(1), 99-114.). Nos anos que precederam à implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente no Brasil (Lei nº 8.069, 1990Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (1990). Brasília, DF: Casa Civil.), um movimento internacional de reconhecimento da infância como estágio do desenvolvimento que necessita de cuidado e proteção se fortaleceu e ela passou a ser vista sob uma nova ótica também do ponto de vista legal, deixando de ser objeto de tutela para ser sujeito de direitos. Nesse sentido, as reformulações aos poucos foram sendo implementadas nas instituições e políticas públicas se constituíram por meio desse instrumento (Moré & Sperancetta, 2010Moré, C. L. O., & Sperancetta, A. (2010). Práticas de pais sociais em instituições de acolhimento de crianças e adolescentes. Psicologia & Sociedade, 22(3), 519-528.).

Com o reconhecimento do ECA de que as crianças e adolescentes são sujeitos de direitos e deveres, o direito à convivência familiar e comunitária se sobressaiu (Lei nº 8.069, 1990). A medida de proteção de acolhimento institucional deve ser aplicada após outras alternativas de proteção, como também a criança ou adolescente deverá retornar ao contexto familiar da forma mais segura e rápida possível (Rocha & Carvalho, 2014Rocha, G. V. M., & Carvalho, E, G. (2014). Estratégias para avaliação de crianças e adolescentes em situação de acolhimento institucional: reflexões a partir de um levantamento com vítimas de maus tratos e abandono. In L. C. A. William & L. F. Habigzang (Orgs.), Crianças e adolescentes vítimas de violência: prevenção, avaliação e intervenção (p. 144-159). Curitiba, PR: Juruá.; Silva & Arpini, 2013Silva, M. L., & Arpini, D. M. (2013). A nova lei nacional de adoção: desafios para a reinserção familiar.Psicologia em Estudo,18(1), 125-135. dói: 10.1590/S1413-73722013000100013
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). O direito à convivência familiar e comunitária conferiu prioridade ao ambiente familiar, reconhecendo-o como fundamental para o desenvolvimento das crianças e adolescentes. Para minimizar o impacto do afastamento familiar, o ECA (Lei nº 8.069, 1990Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (1990). Brasília, DF: Casa Civil.) estabeleceu que o ambiente institucional deve ter características semelhantes às da família, como ter uma estrutura física semelhante a uma casa, acolher poucos jovens em cada unidade, não separar irmãos, entre outras. Assim, buscou-se minimizar os efeitos negativos da institucionalização observados em estruturas de atendimento anteriores.

Embora políticas públicas já tivessem sido implementadas em 2006 com o intuito de minimizar o tempo de afastamento e incentivar alternativas à institucionalização, Rocha, Arpini e Savegnago (2015bRocha, P. J., Arpini, D. M., & Savegnago, S. O. (2015b). Significados atribuídos por mães acerca do acolhimento institucional, reintegração e rede de atendimento. Psicologia: Ciência e Profissão, 35(1), 111-124.) afirmaram que somente após a Lei nº 12.010 (2009)Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (1990). Brasília, DF: Casa Civil. houve o estabelecimento do tempo máximo de dois anos para a medida de proteção e a elaboração do Plano de Atendimento Individual. A publicação em 2006 da Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS (Brasil, 2006Brasil. (2006). Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS NOB-RH/SUAS. Brasília, DF.) determinou que a equipe dos serviços de acolhimento deveria ser composta por um psicólogo e um assistente social para cada 20 acolhidos. Com esses documentos apresentando procedimentos delimitados, as equipes técnicas das instituições passam a ser reformuladas, sendo responsáveis pelo trabalho conjunto e articulado com a rede socioassistencial, direcionado às famílias e com vistas à reinserção familiar. Elas também devem informar por meio de relatórios ao Judiciário, de seis em seis meses, a situação de cada caso e acompanhar os egressos das instituições, como forma de garantir a efetividade dessas reinserções. De acordo com Rizzini e Rizzini (2004Rizzini, I., & Rizzini, I. (2004). A institucionalização de crianças no Brasil: percurso histórico e desafios do presente. Rio de Janeiro, RJ: Ed PUC-Rio.), a reinserção familiar vem romper com um período histórico de incentivo à institucionalização, que trazia consigo o estigma de que as famílias pobres não eram aptas a cuidar de seus filhos.

A reinserção, reintegração ou reunificação familiar é considerada não apenas como a reunião física de crianças e adolescentes que estavam sob cuidados não familiares com suas famílias de origem, mas também compreende um entendimento mais amplo, enquanto reunificação psicológica. É o processo planejado de reconexão que acontece por uma variedade de serviços e apoio aos acolhidos, às suas famílias ou a outras pessoas envolvidas (Pine, Spath, & Gosteli, 2005Pine, B., Spath, R., & Gosteli, S. (2005). Defining and achieving family reunification. In G. P . Mallon & P. M. Hess (Eds.), Child welfare for the twenty-first century: a handbook of practices, policies and programs (p. 378- 391). NewYork, NY: Columbia University Press.). As medidas de reinserção devem ter como preocupação primordial o fortalecimento do vínculo afetivo entre o acolhido e sua família, tendo em vista que essa ligação se constrói e/ou se mantém com intimidade e afeição entre seres que estão em contínua interação e convívio social (Brito et al., 2014Brito, C. O., Rosa, E. M., & Trindade, Z. A. (2014). O processo de reinserção familiar sob a ótica das equipes técnicas das instituições de acolhimento. Temas em Psicologia, 22(2), 401-413. dói: 10.9788/TP2014.2-11
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; Rocha et al., 2015bRocha, P. J., Arpini, D. M., & Savegnago, S. O. (2015b). Significados atribuídos por mães acerca do acolhimento institucional, reintegração e rede de atendimento. Psicologia: Ciência e Profissão, 35(1), 111-124.). O tempo de permanência em um serviço de acolhimento institucional é considerado um fator chave para a reinserção e depende não só de questões institucionais, mas, principalmente, da superação da situação que motivou o afastamento familiar, geralmente relacionada a questões sociais e familiares (Siqueira, Massignan, & Dell'Aglio, 2011Siqueira, A. C., Massignan, L. T., & Dell’Aglio, D. D. (2011). Reinserção familiar de adolescentes: processos malsucedidos. Paidéia, 21(50), 383-391. dói: 10.1590/S0103-863X2011000300011
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).

No contexto brasileiro, estudos empíricos surgiram a partir da década de 2000, quando as políticas operacionalizaram a provisoriedade da medida de proteção. O estudo pioneiro de Siqueira e Dell'Aglio (2007Siqueira, A. C., & Dell'Aglio, D. D. (2007). Retornando para a família de origem: fatores de risco e proteção no processo de reinserção de uma adolescente institucionalizada. Journal of Human Growth and Development, 17(3), 134-146. doi: 10.7322/jhgd.19855
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) identificou fatores de risco e proteção em um estudo de caso de uma adolescente institucionalizada. Entre os fatores de proteção, estavam o desejo de reunificação por parte dos familiares e as visitas frequentes dos adolescentes à família, e os fatores de risco eram desemprego, pobreza, família numerosa e violência. Azôr e Vectori publicaram seu trabalho em 2008Azôr, A. M., & Vectore, C. (2008). Abrigar/desabrigar: conhecendo o papel das famílias nesse processo. Estudos de Psicologia (Campinas ), 25(1), 77-89. dói: 10.1590/S0103: 166X2008000100008
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, cujos achados evidenciavam que a falta de condições socioeconômicas representa um empecilho para o processo de reinserção na família de origem. Já o estudo longitudinal de Siqueira, Zoltowski, Giordani, Otero e Dell'Aglio (2010)Siqueira, A. C., Zoltowski, A. P., Giordani, J. P., Otero, T. M., & Dell’Aglio, D. D. (2010). Processo de reinserção familiar: estudo de casos de adolescentes que viveram em instituição de abrigo. Estudos de Psicologia, 15(1), 07-15. dói: 10.1590/S1413-294X2010000100002
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, realizado com três adolescentes acolhidos, evidenciou a ausência de uma efetiva preparação do jovem para o retorno a sua família, como também a falta de um acompanhamento da reunificação após o retorno, tendo como consequência a reinstitucionalização de um dos adolescentes. O estudo de Brito et al. (2014Brito, C. O., Rosa, E. M., & Trindade, Z. A. (2014). O processo de reinserção familiar sob a ótica das equipes técnicas das instituições de acolhimento. Temas em Psicologia, 22(2), 401-413. dói: 10.9788/TP2014.2-11
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), com profissionais dos acolhimentos institucionais, demonstrou que existem alguns empecilhos para a reinserção, a baixa frequência de visitas dos familiares, que refletia tanto a desvinculação da família como o pouco investimento da equipe técnica na reunificação. Outros aspectos destacados pelos profissionais foram a ausência de adesão da família aos programas de apoio familiar e a presença da ideia de que o acolhimento é um lugar bom para a criança estar. Contrapondo outros estudos, a pesquisa de Rocha et al. (2015bRocha, P. J., Arpini, D. M., & Savegnago, S. O. (2015b). Significados atribuídos por mães acerca do acolhimento institucional, reintegração e rede de atendimento. Psicologia: Ciência e Profissão, 35(1), 111-124.), realizada com quatro famílias que foram reunificadas, apresentou evidências de que essas famílias estavam empenhadas na recuperação da guarda dos filhos, demonstrando que houve mudanças no que tange ao processo de reunificação após a implementação da Lei 12.010 (2009)Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. (2009). Brasília, DF: Casa Civil .. Quanto aos casos mal sucedidos, o estudo de Siqueira et al. (2011)Siqueira, A. C., Massignan, L. T., & Dell’Aglio, D. D. (2011). Reinserção familiar de adolescentes: processos malsucedidos. Paidéia, 21(50), 383-391. dói: 10.1590/S0103-863X2011000300011
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demonstrou que havia uma dificuldade de efetivar as legislações vigentes de promoção à convivência familiar e comunitária, como também ausência de uma avaliação baseada em etapas e critérios.

Os estudos internacionais têm se dedicado ao processo de reunificação familiar desde a década de 90. A produção científica atual é ampla e tem sido usada como ferramenta de aperfeiçoamento das práticas e dos procedimentos na reinserção familiar, que estão sob a responsabilidade dos profissionais da psicologia e assistência social (Maluccio, Warsh, & Pine, 1993Maluccio, A. N., Warsh, R., & Pine, B. (1993). Rethinking family reunification after foster care. Community Alternatives: International Journal of Family Care, 5(2), 1-17.). Quanto à atuação da equipe técnica para a reunificação, um planejamento é realizado no sentido de sanar as dificuldades que levaram ao afastamento da família, e o engajamento nesse plano será um fator relevante para o sucesso da reinserção familiar (Maluccio, Fen, & Davis, 1994Maluccio, A. N., Fein, E., & Davis, I. (1994). Family reunification: Researchfindings, issuesanddirections. Child Welfare League ofAmerica, 73(5), 489-504.; Siqueira & Dell'Aglio, 2007Siqueira, A. C., & Dell'Aglio, D. D. (2007). Retornando para a família de origem: fatores de risco e proteção no processo de reinserção de uma adolescente institucionalizada. Journal of Human Growth and Development, 17(3), 134-146. doi: 10.7322/jhgd.19855
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). Considerando a diversidade cultural e territorial no Brasil, compreender como tem sido a atuação de psicólogos em diferentes Estados, no que tange ao processo de reinserção familiar de jovens afastados da família, possibilita a interlocução de práticas e o aperfeiçoamento de procedimentos, fomentando a psicologia enquanto ciência e profissão. Além disso, o campo científico ainda carece de estudos que proponham o debate e a interlocução presentes nesse estudo. Dessa forma, essa pesquisa objetivou conhecer os procedimentos adotados antes e depois da reinserção familiar, como também os desafios da equipe técnica em três diferentes partes do Brasil.

Método

Delineamento e participantes

Trata-se de uma pesquisa multicêntrica de caráter qualitativo, por endereçar um tema pouco explorado cientificamente e cujo interesse está na compreensão do fenômeno. Participaram três psicólogas, membros de equipes de acolhimentos institucionais, dois filantrópicos e um governamental, localizados nos municípios de Santa Maria/RS, Natal/RN e Brasília/DF. As participantes tinham idade entre 28 e 37 anos, sendo todas do sexo feminino, com pós-graduação concluída ou em andamento. O critério de inclusão foi atuar em um serviço de acolhimento para crianças e adolescentes por no mínimo cinco meses e não houve critério de exclusão.

Instrumentos

As participantes responderam a uma entrevista semiestruturada composta por duas partes. A primeira parte referia-se aos objetivos do estudo guarda-chuva, tendo como foco a investigação da formação, atuação e inserção do psicólogo no campo da assistência social. A segunda parte continha questões acerca do funcionamento do serviço de acolhimento institucional, procedimentos tomados para a reunificação familiar e o trabalho após a reunificação.

Procedimentos e considerações éticas

Esse estudo é parte de uma pesquisa realizada através do Programa de Cooperação Acadêmica (CAPES/PROCAD/2013), desenvolvido em nível nacional, entre três universidades brasileiras. Esse estudo incluiu a análise dos dados sociodemográficos e das respostas da entrevista sobre os Serviços de Acolhimento Institucional. A pesquisa está de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, conforme a Resolução nº 510 (2016)Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016. (2016, 24 de maio). Diário Oficial da União, Brasília, DF, n. 98, seção 1, p. 44-46. do Conselho Nacional de Saúde. Foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa de uma das universidades envolvidas (CAEE nº 45151815.4.1001.5346). A amostra foi composta por conveniência, a partir da seleção de um serviço de acolhimento de cada cidade participante do estudo, sendo incluída uma profissional de cada equipe técnica dos acolhimentos. As participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), sendo que duas psicólogas foram entrevistadas nas próprias instituições e a terceira, em seu domicílio. Todas as entrevistas tiveram duração de 1 hora e 30 minutos a 2 horas. Neste artigo, as participantes serão nomeadas por P1, P2 e P3, como forma de garantir o sigilo da identidade.

Análise dos dados

Este estudo utilizou análise de conteúdo, segundo Bardin (2004Bardin, L. (2004). Análise de conteúdo. São Paulo, SP: Edições 70. Obra original publicada em1977.), a qual consiste em um conjunto de procedimentos metodológicos que se aplicam aos discursos, analisando as comunicações, decompondo-as e elencando categorias, sendo um método muito utilizado em pesquisas qualitativas. Assim, surgiram três categorias: (1) procedimentos adotados para a reinserção familiar, (2) desafios enfrentados no planejamento da reinserção familiar e (3) a reinserção familiar na prática.

Resultados e discussão

Procedimentos adotados para a reinserção

Nessa categoria temática, foram incluídos os procedimentos adotados pelos profissionais relacionados ao processo de reinserção familiar. Sobre o plano de visitação, as participantes P2 e P3 mencionaram que é montado um planejamento da condução do caso e é organizado um plano de visitas junto com as famílias. Segundo elas, quando é permitido pelo órgão de justiça, é garantido o contato do acolhido com sua família, bem como uma periodicidade dessas visitas. Segundo as profissionais, “[...] as famílias vêm visitar as crianças de acordo com cada caso, conforme a avaliação da nossa equipe” (P1), “[...] e aí tem muitos que tem mãe e pai e que aí a gente facilita essas visitas, nos finais de semana, de 15 em 15 dias, prá passar férias, agora no feriado” (P3),

[...] tem essas visitas que eles fazem nos dias de terça e quinta, eles vem até aqui, tem essas visitas que a criança faz lá, quando tem dia da criança, a gente chama eles aqui pra participar, ou alguma atividade da escola, dia da família, não sei o que, eles vão até lá, então a gente tenta sempre manter esse link aí (P2).

As falas evidenciam que há o estabelecimento de uma visitação, mediante avaliação da equipe, podendo ser um promovedor da reinserção. Segundo o estudo de Siqueira et al. (2010Siqueira, A. C., Massignan, L. T., & Dell’Aglio, D. D. (2011). Reinserção familiar de adolescentes: processos malsucedidos. Paidéia, 21(50), 383-391. dói: 10.1590/S0103-863X2011000300011
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), há procedimentos que podem facilitar o sucesso do retorno, entre eles está a ocorrência de visitas periódicas entre a família e os filhos em situação de acolhimento. Contudo, essas visitas geralmente são restritas a dias e horários pré-determinados, o que é um contrassenso, tendo em vista que, na busca pela reunificação, deve-se abrir espaço à família e não limitar (Iannelli, Assis, & Pinto, 2015Iannelli, A. M., Assis, S. G., & Pinto, L. W. (2015). Reintegração familiar de crianças e adolescentes em acolhimento institucional em municípios brasileiros de diferentes portes populacionais. Ciência e Saúde Coletiva, 20(1), 39-48. dói: 10.1590/1413-81232014201.19872013
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).

Outro procedimento citado por uma participante foi a inclusão da criança e/ou adolescente nos processos relacionados à reinserção, no sentido de fazê-la sentir-se consultada frente às decisões. Segundo P1, “[...] tem que ouvir muito a criança né? Neste processo porque, se ela realmente quer a família ou não quer, porque ela foi violada, teve seus direitos violados, então tem que escutar ela [...], sempre tentar estar ouvindo essa criança”. A escuta efetiva da criança e do adolescente é direito básico garantido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, 1990Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (1990). Brasília, DF: Casa Civil.) e, por isso, deveria fazer parte do planejamento para todos os acolhimentos. A literatura indica que participação ativa envolve, entre outras coisas, escutar crianças e os adolescentes acolhidos e, para isso, é preciso valorizar o que eles sentem/pensam sobre sua própria situação (Rossetti-Ferreira, Sólon, & Almeida, 2010Rossetti-Ferreira, M. C., Sólon, L. A. G., & Almeida, Y. G. (2010). A delicada arte da conversa e da escuta. In D. C. F. Bernardi (Org.), Cada caso é um caso: estudos de caso, projetos de atendimento (p. 61-73). São Paulo, SP: Associação Fazendo História .). Corroborando esse estudo, Silva e Arpini (2013Silva, M. L., & Arpini, D. M. (2013). A nova lei nacional de adoção: desafios para a reinserção familiar.Psicologia em Estudo,18(1), 125-135. dói: 10.1590/S1413-73722013000100013
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) afirmam que as crianças e adolescentes acolhidos devem participar de decisões que lhes afetam.

Avaliação da família de origem foi outro procedimento mencionado pelas participantes. Essa avaliação focalizava se a família buscou solucionar os problemas e dificuldades que motivaram o acolhimento institucional. Segundo as psicólogas,“[...] porque, às vezes, não vai ter como, por questões de violência, alcoolismo, mas existe o vínculo” (P3), “[...] a gente sempre tenta trabalhar com as famílias, prá ver a possibilidade de retorno, ou então família ampliada, que também nós temos bastante casos” (P1) e “[...] esse é o objetivo principal, que a gente possa reinseri-los, de preferência na família pai e mãe, a família de origem que eles vieram, [...] o objetivo principal é fazer com que eles voltem” (P2).

Cavalcante, Silva e Magalhães (2010Cavalcante, L. I. C., Silva, S. S. C., & Magalhães, C. M. C. (2010). Institucionalização e reinserção familiar de crianças e adolescentes. Revista Mal-estar e Subjetividade, 10(4), 1147-1172.) pontuam que nem sempre as condições familiares que levaram crianças e adolescentes a serem acolhidos institucionalmente são totalmente superadas pela família durante o acolhimento, o que dificulta a reinserção. A ausência da garantia de seus direitos básicos, como direito à saúde, à educação, ao emprego, entre outros evidencia a complexidade da questão, e demonstra a importância de compreender esses aspectos sociais presentes no cotidiano das famílias das crianças e adolescentes acolhidos (Azevedo, Cavalcante, Heumann, & Torres, 2016Azevedo, T. B. V., Cavalcante, L. I. C., Heumann, S., & Torres, R. F. (2016). Assistência dos cuidadores nas atividades de autocuidado de crianças em acolhimento institucional. Revista Psicologia: Teoria e Prática, 18(3), 115-126. dói: 10.5935/1980-6906/psicologia.v18n3p115-126
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; Siqueira & Dell'Aglio, 2007Siqueira, A. C., & Dell'Aglio, D. D. (2007). Retornando para a família de origem: fatores de risco e proteção no processo de reinserção de uma adolescente institucionalizada. Journal of Human Growth and Development, 17(3), 134-146. doi: 10.7322/jhgd.19855
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). Nesse sentido, o estudo de Rosa, Nascimento, Matos e Santos (2012Rosa, E. M., Nascimento, C. R., Matos, R. J., & Santos, R. J. (2012). O processo de desligamento de adolescentes em acolhimento institucional. Estudos de Psicologia, 17(3), 361-368.) verificou que, apesar de a maioria dos acolhidos manter vínculos positivos com pelo menos um familiar e dos esforços da equipe técnica, há a dificuldade nos processos de reinserção. Conflitos familiares e carências materiais são empecilhos para efetivação da reinserção, constituindo-se em um impasse: manter o esforço em reunificar ou sugerir a destituição do poder familiar, já que possivelmente as condições para a reinserção não serão alcançadas? Em sintonia com esse aspecto, Iannelli et al. (2015Iannelli, A. M., Assis, S. G., & Pinto, L. W. (2015). Reintegração familiar de crianças e adolescentes em acolhimento institucional em municípios brasileiros de diferentes portes populacionais. Ciência e Saúde Coletiva, 20(1), 39-48. dói: 10.1590/1413-81232014201.19872013
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) demonstraram que são muitas as dificuldades enfrentadas pelas famílias no que tange ao plano de visitação e aos serviços psicológicos indicados no Plano Individual de Atendimento, como a precariedade na oferta de apoio social efetivo, por exemplo. Quanto ao desejo da família pela reunificação, apenas a profissional P3 indicou dar importância para esse fator: “E inclusive escutar o desejo da pessoa, o que ela enquanto mãe deseja”.

Para a efetiva reunificação familiar, além de avaliar as condições socioeconômicas, é necessário observar se há o desejo da família pelo retorno do filho e o grau de vinculação existente entre eles (Azôr & Vectore, 2008Azôr, A. M., & Vectore, C. (2008). Abrigar/desabrigar: conhecendo o papel das famílias nesse processo. Estudos de Psicologia (Campinas ), 25(1), 77-89. dói: 10.1590/S0103: 166X2008000100008
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; Rocha et al., 2015bRocha, P. J., Arpini, D. M., & Savegnago, S. O. (2015b). Significados atribuídos por mães acerca do acolhimento institucional, reintegração e rede de atendimento. Psicologia: Ciência e Profissão, 35(1), 111-124.). Uma atuação atenta a esse aspecto é fundamental para o sucesso desse processo.

Outro procedimento adotado pelas profissionais foi buscar auxílio na rede de proteção e de serviços. Segundo suas palavras, “[...] com as escolas, CRAS, CREAS, CAPS, a gente tá envolvido com vários profissionais, as crianças estão inseridas nesses espaços, a gente precisa ter conhecimento desse contato com os outros serviços” (P1); “[...] tem que fazer alguns encaminhamentos, alguns tem histórico de dependência química, a gente consegue atendimento psicológico, atendimento do CAPS, acompanha a criança no atendimento do CAPS, conversa com o psiquiatra, entende a medicação” (P2).

Mobiliza também, faz o trabalho da rede, essa mãe tá precisando de uma cesta básica? CRAS, aconteceu isso e isso, o que tá acontecendo? Então, faz os primeiros contatos pra mãe saber onde ela pode ir, onde ela pode buscar. Emprego, vamos montar um currículo [...] Às vezes, a equipe fala, mas a gente conseguiu a vaga de emprego, a gente deu curso profissionalizante, a gente pintou a casa dela, deu móvel, deu eletrodoméstico, e essa mãe não quer nada com nada. Mas não é o material, como é a relação de afeto? (P3).

Esse auxílio socioeconômico e profissional é pouco relatado na literatura, contudo demonstra ser de grande valia para a organização dessa família e a superação de dificuldades financeiras. Por outro lado, sabe-se que, em muitos casos, o afastamento familiar se deu por conta de maus tratos, assim, esse suporte não será suficiente para o retorno à família.

Desafios enfrentados no planejamento da reinserção familiar

Inúmeros desafios surgem como impasses para a reunificação. Duas profissionais mencionaram a dificuldade de cumprir a provisoriedade dessa medida de proteção: “[...] eu cheguei aqui, tinha uma menina, a vida inteira no acolhimento. Em alguns casos, as crianças são institucionalizadas a vida toda” (P2) e “[...] eu sei que ficam muitos nos serviços de acolhimento, assim, os que não são adotados, tem muita gente que tá ali há muito tempo” (P3). Estudos têm indicado que o tempo de institucionalização tem sido bastante prolongado no Brasil, mesmo depois do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, 1990), evidenciando a dificuldade em garantir a provisoriedade da medida e a existência de poucos casos em que ocorre a volta para casa (Cavalcante et al., 2010Cavalcante, L. I. C., Silva, S. S. C., & Magalhães, C. M. C. (2010). Institucionalização e reinserção familiar de crianças e adolescentes. Revista Mal-estar e Subjetividade, 10(4), 1147-1172.).

Outro desafio relatado foi a dificuldade de superação de fatores de risco enraizados nas famílias, como fragilidade econômica, doenças crônicas, dependência química dos cuidadores e violência doméstica. Segundo as participantes: “[...] não é nem só a questão da equipe ou da equipe técnica, é a questão da família mesmo” (P2);

São pessoas que não conseguem um emprego, que têm pouca escolaridade, que vivem de cesta básica. Muitos casos de negligência, de abandono, de deixar para cuidados de terceiros e sair prá namorar, prá passar um tempo fora, a questão do abuso sexual também é bem comum. Tem um ou outro que o pai é alcoolista, que a mãe tem transtorno mental (P3).

Foi possível evidenciar a busca ativa pela recuperação da família como uma atribuição da equipe técnica, além de um esforço pelo retorno à família de origem o mais rápido possível, muitas vezes, em detrimento da recomendação pela destituição familiar. Além disso, ficou claro que a prática está voltada para o cumprimento da provisoriedade da medida de proteção. Esses aspectos foram vistos nas falas a seguir:

Agora, com a Nova Lei da Adoção, as crianças vêm e logo já saem. Agora tá demorando bem menos, porque antigamente os casos chegavam aqui, às vezes faziam anos que tavam na fila de adoção, sem ter uma alternativa, agora dos casos que entraram a maioria tá tendo família ampliada, ou trabalhar com esses pais pra ter um retorno. Se não tiver nenhuma possibilidade, dai sim encaminha para a família substituta, família ampliada e quando não tiver tios, avós, alguém que tem o interesse a adoção, em última instância, quando realmente não tem ninguém (P1);

A gente precisa fazer os estudos de caso a respeito das crianças que são acolhidas, pra gente ver a possibilidade deles serem reinseridos, esse é o objetivo principal, que a gente possa reinseri-los, de preferência a família pai e mãe, a família de origem que eles vieram, só se por uma série de outras coisas a gente vai ver se eles vão pra família extensa ou destituição do poder familiar, mas o objetivo principal é fazer com que eles voltem (P2);

Então eu tenho que explicar pra ela porque ela não tá indo pra casa no final de semana, preciso explicar pra ela porque ela precisa conviver com os tios, porque se não der certo a reintegração com a mãe, a gente não quer que eles vão para o cadastro de adoção (P3).

Mais recentemente, um estudo de Silva e Arpini (2013Silva, M. L., & Arpini, D. M. (2013). A nova lei nacional de adoção: desafios para a reinserção familiar.Psicologia em Estudo,18(1), 125-135. dói: 10.1590/S1413-73722013000100013
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) demonstrou que após a Lei 12.010 (2009)Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. (2009). Brasília, DF: Casa Civil ., os profissionais do sistema de acolhimento institucional estão realmente buscando esgotar as possibilidades de retorno à família de origem ou extensa, antes de que haja a total destituição do poder familiar. Os autores salientam que, antes de tal legislação, nenhum profissional do acolhimento era responsável por garantir a reunificação, mesmo que o ECA já preconizasse o direito à convivência familiar e comunitária, tal prática ficava a critério de cada profissional, não sendo uma prática sistematizada.

Contudo, observou-se na fala da psicóloga 3, que a questão do tempo máximo de dois anos constitui-se em outro desafio, e na prática acaba se flexibilizando pois, cada caso apresenta suas particularidades que devem ser levadas em consideração:

A gente trabalha assim, o juiz tá sempre em cima, porque quando não tem a possibilidade de reintegração, vai para a destituição do poder familiar e para o processo de adoção. Quando eu estudava na teoria, eu entendia tudo, fechava tudo assim, tudo bonitinho, na prática, por exemplo, faz um ano e meio que elas estão aqui, você não consegue ver possibilidade de reintegração, mas vai destituir o poder, essas crianças tem o vínculo com a mãe, eu não imagino essas crianças sendo adotadas, porque existe um vínculo muito forte com essa mãe, apesar de elas não poderem estar morando juntas agora (P3).

O marco de dois anos para o acolhimento institucional foi preconizado pela Lei 12.010 (2009)Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009. (2009). Brasília, DF: Casa Civil . para combater situações em que jovens permaneciam muitos anos acolhidos sem uma ativa proposta de reinserção familiar e social (Silva & Arpini, 2013Silva, M. L., & Arpini, D. M. (2013). A nova lei nacional de adoção: desafios para a reinserção familiar.Psicologia em Estudo,18(1), 125-135. dói: 10.1590/S1413-73722013000100013
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). Contudo, parece ser um limite inatingível, pois não se constitui em tempo suficiente para a realização do trabalho junto às famílias, considerando seu contexto de falta e violências estruturais.

Por fim, outro desafio consistiu em demonstrar para as famílias a importância de os filhos estarem no contexto familiar. As participantes mencionaram que, por vezes, os pais consideravam o acolhimento um bom lugar para seus filhos viverem e não aderem ao plano de reinserção familiar. Segundo P1, “[...] tem muitas famílias que entendem o acolhimento como um espaço de proteção, realmente. Proteção que elas não conseguem dar ou a oportunidade de que ali eles vão ser alguém, que vão estudar”.

Um estudo de Brito et al. (2014Brito, C. O., Rosa, E. M., & Trindade, Z. A. (2014). O processo de reinserção familiar sob a ótica das equipes técnicas das instituições de acolhimento. Temas em Psicologia, 22(2), 401-413. dói: 10.9788/TP2014.2-11
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), sobre a visão das equipes técnicas acerca da reintegração familiar, observou a valorização do acolhimento institucional por parte dos pais, como local ideal para seus filhos permanecerem. Essa concepção do acolhimento como um lugar adequado para o filho já havia sido identificada por Fonseca (1987Fonseca, C. W. (1987). O internato do pobre: Febem e a organização doméstica em um grupo Porto-alegrense de baixa renda. Temas IMESC, 4(1), 21-39.) em estudos sobre a Febem, a qual nomeou a instituição como ‘internato do pobre’, embora tenha sido em um diferente momento e contexto. Contrapondo essa visão, uma recente pesquisa realizada por Rocha et al. (2015aRocha, P. J., Arpini, D. M., & Savegnago, S. D. (2015a). Acolhimento institucional: percepções de familiares que o vivenciaram. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 67(1), 99-114.), com mães cujos filhos estavam em acolhimento institucional, percebeu o envolvimento das mães com vistas à reintegração dos filhos, o que pode ser evidenciado pelo esforço das mesmas em seguir as orientações propostas pela equipe técnica para ter a guarda dos filhos de volta.

Reinserção familiar na prática

Essa categoria inclui as informações sobre como é o acompanhamento após a reunificação. As participantes apontaram que nem sempre o retorno é bem-sucedido, apesar do esforço da equipe.

A maioria a gente consegue reinserir, na maioria, nem sempre é tão eficaz, tem casos de elas voltarem para o abrigo, nesse tempo que tô aqui, teve um caso de um menino que tá pra voltar agora. Quando acontecem são terríveis assim mais pra criança do que pra qualquer outra pessoa (P2).

Uma das razões apontadas para o fracasso da reinserção é a fragilidade da rede de proteção social, que deveria auxiliar de forma mais efetiva essas famílias, e o impasse de atribuições vivenciado entre as diferentes instâncias dessa rede. A participante 2 mencionou que a rede

[...] é muito capenga, a criança chega aqui tendo o direito violado, tem muita coisa que a gente faz que deveria ser o CREAS [...], é muito difícil colocar os CREAS no mesmo diálogo, os CRAS pior ainda, e é tudo na mesma secretaria, mas é muito difícil, fica nessa coisa, essa atribuição é minha, essa é sua [...], esse trabalho é gradativo né porque a gente faz todo um trabalho de fortalecimento com essas famílias, a rede tem que estar atuante também né porque muitas vezes envolve o Conselho Tutelar para acompanhar, o CRAS, nós.

São imprescindíveis para o trabalho de fortalecimento da família a efetivação das políticas sociais e o oferecimento de serviços capazes de disponibilizar à família recursos e benefícios sociais que atendam a demandas comuns e específicas de seus membros (Azôr & Vectore, 2008Azôr, A. M., & Vectore, C. (2008). Abrigar/desabrigar: conhecendo o papel das famílias nesse processo. Estudos de Psicologia (Campinas ), 25(1), 77-89. dói: 10.1590/S0103: 166X2008000100008
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). Não se trata de ‘curar as famílias’, mas devolver a elas o exercício da cidadania e garantir-lhes seus direitos básicos. Todos os órgãos do sistema de garantia de direitos, como Conselho Tutelar, Juizados da Infância e da Juventude, Centros de atendimentos especializados da Assistência Social, Procuradoria de Justiça e Ministério Público, devem se articular em prol da efetiva reinserção.

Segundo as participantes, após a reunificação, a equipe realiza visitas domiciliares com o objetivo de analisar como está sendo o impacto dessa vivência para o jovem e para a família e manter o trabalho de orientação quanto aos serviços que podem ser acionados. Segundo as profissionais, “[...] nós fazemos visitas domiciliares e é o tempo inteiro também colocar prá eles, informar aonde buscar, como fazer, o que nós podemos auxiliar, é um trabalho com as famílias, questão de acompanhamento” (P1); “Eu faço algumas visitas. Ah, vamos conhecer a família tal. Eu aproveito pra tá junto, aí eu aproveito e já converso um pouco com um, um pouco com o outro” (P3); e

Não é da psicologia fazer visita domiciliar, é instrumento clássico da assistência social, mas eu acho que o psicólogo inserido no contexto da assistência social, se ele não vai pra visita, ele vai tá perdendo esse instrumento valioso pra qualquer estudo que a gente vai ter, situações de vulnerabilidade social, por exemplo, é muito difícil separar (P2).

O papel da equipe do acolhimento após a reinserção é realizar o acompanhamento periódico da criança ou adolescentes pelo período de seis meses (Lei nº 8.069, 2009). A visita domiciliar é uma ferramenta de trabalho que possibilita o estreitamento do contato entre a equipe e as famílias, favorecendo um clima de confiança entre os sujeitos envolvidos (Azôr & Vectore, 2008Azôr, A. M., & Vectore, C. (2008). Abrigar/desabrigar: conhecendo o papel das famílias nesse processo. Estudos de Psicologia (Campinas ), 25(1), 77-89. dói: 10.1590/S0103: 166X2008000100008
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; Goering & Shaw, 2017Goering, E. S., & Shaw, V. T. (2017). Foster carereentry: a survival analysis assessing differences across permanency type. Child Abuse & Neglect, 68 (1), 36-43. doi: 10.1016/j.chiabu.2017.03.005
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). Tendo seu valor reconhecido no campo da assistência social e da saúde, atualmente é instrumento da psicologia recomendado por documentos que regulam a profissão (Conselho Federal de Psicologia [CFP], 2009Conselho Federal de Psicologia [CFP] (2009). Orientações técnicas: serviços de acolhimento para crianças e adolescentes. Brasília: DF, CFP.; Conselho Federal de Serviço Social [CFSS], 2007Conselho Federal de Serviço Social [CFESS]. (2007). Parâmetro para atuação de assistentes sociais e psicólogos(as) na Política de Assistência Social. Brasília, DF: CFP/CEFESS.). Sendo a visita domiciliar um valioso instrumento, parece fundamental fortalecer os profissionais para que esse procedimento seja incluído considerando a singularidade do campo psicológico.

A situação dos adolescentes acolhidos é mais delicada e exige um empenho diferente da equipe técnica. Para as psicólogas 1 e 3, “[...] tem a questão do apadrinhamento que seria positivo para os adolescentes, quando os adolescentes não têm mais perspectiva de retorno, daí o apadrinhamento era uma forma positiva” (P1); e

A gente tem, por exemplo, o caso de dois adolescentes que a gente já acolheu quando eles já estavam com 16, 17 anos, e aí nessa idade ninguém mais vai adotar, pode acontecer, mas é bem raro [...] porque assim, mesmo que não tenha a reintegração, eles têm essa referência familiar, porque, às vezes, não vai ter como, por questões de violência, alcoolismo, mas existe o vínculo, que não é o que deveria ser, mas a gente mantém essa referência. E que, às vezes, quando completa 18 anos, aí volta, vai morar perto da mãe (P3).

As colocações das profissionais destacam que, por vezes, não haverá saída para eles a não ser voltar a conviver com uma família com inúmeras fragilidades já que, a partir dos 18 anos, não haverá mais medidas de proteção. Conforme Siqueira et al. (2010Siqueira, A. C., Zoltowski, A. P., Giordani, J. P., Otero, T. M., & Dell’Aglio, D. D. (2010). Processo de reinserção familiar: estudo de casos de adolescentes que viveram em instituição de abrigo. Estudos de Psicologia, 15(1), 07-15. dói: 10.1590/S1413-294X2010000100002
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), o acolhimento de adolescentes é uma situação mais complexa, exigindo inúmeros procedimentos e cuidados. Além disso, a vivência de prolongadas situações de violência e descuido também dificulta a adaptação à instituição de acolhimento e à adoção tardia, ainda que sejam raras (Siqueira et al., 2011Siqueira, A. C., Massignan, L. T., & Dell’Aglio, D. D. (2011). Reinserção familiar de adolescentes: processos malsucedidos. Paidéia, 21(50), 383-391. dói: 10.1590/S0103-863X2011000300011
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).

Considerações finais

O retorno para a família de origem, após a vivência de uma situação de violação de direitos, é um processo delicado, complexo e suscetível a muitos fatores. Apesar de o ECA (Lei nº 8.069, 1990Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (1990). Brasília, DF: Casa Civil.) ter preconizado a provisoriedade da medida do acolhimento, os estudos demonstram que até a Lei 12.010 de 2009 ainda não havia procedimentos sistemáticos que promovessem o retorno para a família. Esta pesquisa multicêntrica apresentou informações preciosas sobre a atuação da equipe técnica frente a tarefa da reinserção familiar. Contudo, os desafios associados a este processo chamam a atenção para esse importante tema, como também convergem com a literatura acerca da temática.

Ao retratar três realidades diferentes, foi possível visualizar a sintonia na adoção de alguns procedimentos e desafios, como também singularidades específicas vividas por cada profissional. O planejamento do Plano Individual de Atendimento (PIA), incluindo a avaliação das famílias, as visitas na família de origem e acompanhamento dos casos de reinserção após o retorno foram ações tomadas por todas as profissionais, as quais convergem com o que é esperado dessas equipes. A promoção de visitas por parte das equipes foi mencionada pelas profissionais e, de fato, a visita é considerada fundamental pois fornece informações sobre a conexão da família com a criança e com o adolescente, promove fortalecimento dos vínculos, e possibilita a convivência familiar de forma supervisionada (Maluccio et al., 1993Maluccio, A. N., Warsh, R., & Pine, B. (1993). Rethinking family reunification after foster care. Community Alternatives: International Journal of Family Care, 5(2), 1-17.; Siqueira & Dell'Aglio, 2007Siqueira, A. C., & Dell'Aglio, D. D. (2007). Retornando para a família de origem: fatores de risco e proteção no processo de reinserção de uma adolescente institucionalizada. Journal of Human Growth and Development, 17(3), 134-146. doi: 10.7322/jhgd.19855
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). Contudo, o presente estudo evidenciou a dificuldade de algumas famílias cumprirem as visitas no acolhimento, alertando para o fato de que esse plano deve considerar opções viáveis para elas. No que diz respeito à avaliação periódica e criação do PIA, pode-se constatar que são ferramentas fundamentais para promover o retorno o mais breve e seguro possível.

Por outro lado, apenas uma profissional comentou escutar a criança e o adolescente que está retornando sobre o retorno, um procedimento preconizado pela literatura científica e pelas diretrizes que norteiam a prática profissional do psicólogo. Da mesma forma, apenas uma profissional mencionou estar atenta ao desejo da família pelo retorno, já que, por vezes, o foco na reinserção impede que esse aspecto seja valorizado, mesmo que a literatura indique que o desejo pelo retorno do filho seja um fator influente para o sucesso da reinserção familiar (Âzor & Vectore, 2008Azôr, A. M., & Vectore, C. (2008). Abrigar/desabrigar: conhecendo o papel das famílias nesse processo. Estudos de Psicologia (Campinas ), 25(1), 77-89. dói: 10.1590/S0103: 166X2008000100008
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; Siqueira & Dell'Aglio, 2007Siqueira, A. C., & Dell'Aglio, D. D. (2007). Retornando para a família de origem: fatores de risco e proteção no processo de reinserção de uma adolescente institucionalizada. Journal of Human Growth and Development, 17(3), 134-146. doi: 10.7322/jhgd.19855
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).

Outro aspecto revelado pela pesquisa é a presença de um esforço em reinserir na família de origem, mesmo que as fragilidades não tenham sido superadas, a violação continue, fatores de risco não tenham sido combatidos, sem o desejo da família pela reunificação e também a busca pela garantia da provisoriedade da medida de proteção. Silva e Arpini (2013Silva, M. L., & Arpini, D. M. (2013). A nova lei nacional de adoção: desafios para a reinserção familiar.Psicologia em Estudo,18(1), 125-135. dói: 10.1590/S1413-73722013000100013
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) evidenciaram que se por um lado a delimitação de dois anos de acolhimento pode evitar o prolongamento do tempo no acolhimento, por outro, pode não ser suficiente para a reorganização familiar e para sanar a violação dos direitos que levou à medida de proteção, e pode levar ao fracasso da reinserção. Sugere-se que o estudo de cada caso seja realizado em prol do melhor interesse da criança, considerando a possibilidade de a família de origem não ser a melhor opção. Associado a esse dado, ocorre a busca pela provisoriedade da medida, que pode fazer com que algumas reinserções aconteçam em condições desfavoráveis para a criança. Uma análise das reais condições emocionais e financeiras da família para o retorno do filho, a visualização do engajamento das famílias no plano individual de atendimento, um esforço em escutar o acolhido no seu desejo de retornar e seu estado mental após as visitas podem ser sugeridos como procedimentos que fornecem dados sobre a possibilidade de um retorno seguro da criança ou adolescente.

A postura pela articulação da rede constatada pode ser considerada um aspecto inovador encontrado nessa pesquisa. O trabalho com a rede de proteção e os impasses quanto às atribuições dos diferentes atores da rede foram fatores destacados pelas profissionais e merecem atenção. Para um trabalho em prol da reunificação familiar, é preciso superar a realização de atividades pontuais e fragmentadas, e estabelecer ações coletivas. As equipes dos serviços de acolhimento institucional devem trabalhar em cooperação com conselheiros tutelares, profissionais dos centros de referência em assistência social, em prol do acompanhamento do processo de reinserção. Além disso, a rede deve estar apta profissionalmente para atuar em cooperação. Só assim poderão juntas ser promovedoras de processos de reinserção.

As dificuldades enfrentadas na reinserção familiar de adolescentes causam preocupação e remetem à fragilidade estrutural vivenciada pela família das crianças e adolescentes acolhidos. Fatores de risco como dependência química, alcoolismo, desemprego, baixa escolaridade e subempregos foram observados nas falas das participantes. A complexidade é maior quando se analisa a situação dos adolescentes em acolhimento. Esses jovens não possuem o perfil que potencialmente se beneficiariam com o retorno à família ou mesmo com a colocação em família substituta. Muitas vezes, eles se encontram em uma situação semelhante aos seus familiares, evidenciando a vulnerabilidade. Uma alternativa seria a implementação das repúblicas para jovens, que poderiam ser uma alternativa para a reinserção na sociedade, no sentido de oferecer aos adolescentes uma oportunidade de exercitar a autonomia, responsabilidade e o autocuidado sob supervisão, antes que a medida de proteção seja extinta com sua maioridade, mas não sem antes propor e colocar em prática intervenções consistentes a favor de desenvolvimento e saúde desses jovens. Além disso, a proposta do apadrinhamento afetivo se fortalece, visto que esses cidadãos poderiam consistir em modelos de identificação, possibilitando interações saudáveis e potencializando as qualidades dos jovens. Mesmo compreendendo a existência de falhas nesse programa, reconhece-se o seu papel para jovens sem opções de referências saudáveis, e assim, sugere-se que esforços sejam tomados para a superação dessas dificuldades.

Por fim, pode-se considerar o tamanho da amostra como uma limitação para esse estudo, ainda que a inclusão de profissionais de três regiões diferentes do país represente uma inovação para a área. Ainda, sugere-se a inclusão na amostra de outros técnicos dos acolhimentos, como os assistentes sociais. É imprescindível fomentar estudos que retratem os processos vividos nos acolhimentos institucionais, sendo o aumento da amostra uma sugestão para estudos futuros. Acredita-se que a promoção da reunificação familiar de crianças e adolescentes necessita de profissionais que tenham suas estratégias de trabalho amparadas em uma rede de apoio social atuante, que consiga realizar suas atribuições de acordo com as diretrizes da política de assistência social. Somente assim as famílias terão subsídios para enfrentar suas vulnerabilidades sociais e proporcionar o melhor ambiente para o desenvolvimento de seus filhos.

Referências

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    Apoio e financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    02 Fev 2018
  • Aceito
    18 Abr 2019
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