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PRECARIZAÇÃO E SOFRIMENTOS: PARA ALÉM DE UMA EDITORAÇÃO

Num país como o Brasil, manter a esperança viva é em si um ato revolucionário. Paulo Freire

A palavra “esperançar”, ecoada das falas de Paulo Freire, está muito presente neste ano de comemoração de seu centenário. Entretanto, como “esperançar” em épocas tão difíceis em função, dentre outros aspectos, de uma pandemia que provocou a perda de mais de 600 mil vidas? Como vivenciar o luto e planejar o futuro?

Há muito nossos editoriais vêm traçando linhas que tangenciam a importância de produzir conhecimento de qualidade, bem como da veiculação desse material em veículos que impulsionem o alcance, cada vez maior, da ciência. Somos abertamente defensores da ética em pesquisa e direito dos autores à publicação de suas construções erigidas com empenho, dedicação e amor. Desse lado de cá, também é o nosso empenho, nossa dedicação, nosso amor por aquilo que fazemos e acreditamos, que foi edificado um local pautado pela relação de respeito, confiança e empatia entre autores e corpo editorial. Foi, portanto, alicerçado sobre esse baldrame que a revista Psicologia em Estudo pode alcançar seu reconhecimento em altos índices nacionais e internacionais, sem nunca ter cobrado nenhum custo de submissão de nossos autores.

Claramente que orgulhosos de onde conseguimos chegar com muito esforço, dificuldade e ajuda. Entretanto, esse editorial não fora arquitetado para discursar sobre as conquistas e luzes desse caminho - infelizmente não. Redigimos esse editorial para descortinar uma realidade que nos assombra atualmente. Fazemos parte de uma universidade pública alocada no seio da sociedade e que estabelece fortes laços com ela, por isso sentimos os reveses que essa mesma sociedade também sente.

Estamos envoltos em uma espécie de penumbra, onde o ódio e as ofensas querem fazer frente ao conhecimento científico e análises embasadas, em que o poder do estado está cooptado pelos interesses neoliberais de organizações privadas, onde oscila uma nuvem de falta de perspectivas futuras. Precarização, flexibilização, terceirização, informalidade, plataformização do trabalho são discursos e expressões que já fazem parte de nosso cotidiano e parecem nem mais nos assustar. Nesse sentido, até quando teremos que fazer mais com menos? Até quando enxugar o que está seco? Até quando teremos que ser resilientes, meritocratas torpes e empreendedores de si mesmo, assumindo toda responsabilidade por tudo? Até quando estaremos atendendo uma demanda advinda de reformas trabalhistas, de reformas previdenciárias, de PECs dos precatórios, das quais não concordamos?

Tudo isso também respinga no cotidiano de editoração dessa e várias outras revistas brasileiras. Destacam-se, aqui, os significativos e graves cortes de verbas, dos últimos anos, direcionados às áreas das ciências humanas e sociais. Esse modelo nos colocou diante de uma posição de intensa degradação das condições de trabalho, falta de pessoal, precarização de recursos advindos de agências de fomento e financiamentos. Parece escancarar a falta de vontade em se dedicar ao público, ao invés de se entregar ao interesse dos grandes grupos privados.

Essas linhas gerais aqui traçadas e desabafadas talvez possa explicar o porquê de nosso histórico de publicações ter seu número significativamente reduzido nesse último ano (ação realizada com muito sofrimento de seus editores). Não bastasse isso, ainda temos, em nosso encalço, cobranças quanto ao número de artigos publicados, o que pode qualificar a revista. Interrogamos: Que tipo de avaliação será essa? Que sociedade produtivista, sem pandemia ou crise está sendo quantificada?

Investir em conhecimento e ciência em nosso país, apesar de parecer coisa do passado e até mesmo um luxo desnecessário, é muito mais do que publicar em revistas científicas estratificadas - elas são apenas o telhado bonito de uma casa. O início, a fundação, de todo processo de construção dessa obra está no investimento em educação e saúde, caminho do qual desviamos. A crise sanitária recente apenas descortinou uma realidade que há tempos estava sendo (des)construída.

A valorização da ciência, dos conhecimentos científicos nunca foi tão necessária, considerando a defesa do obscurantismo, da ignorância aos conhecimentos elaborados historicamente. Nesse sentido, os artigos veiculados em nossa revista trabalham na contramão do esvaziamento dos conhecimentos. Os leitores encontram, neste volume, discussão de temáticas necessária para compreender a formação humana, o psiquismo, em interface com a realidade posta.

Assim, retomamos a fala do Paulo FreireFreire, P. Num país como o Brasil, manter a esperança viva é em si um ato revolucionário. Recuperado de: Recuperado de: https://www.pensador.com/frase/MTgxOTI0Mw/ acessado em 10/11/2021.
https://www.pensador.com/frase/MTgxOTI0M...
, que sejamos revolucionários em favor da socialização dos conhecimentos científicos e artísticos!!!

Boa leitura.

Novembro de 2021

Referência:

  • Freire, P. Num país como o Brasil, manter a esperança viva é em si um ato revolucionário. Recuperado de: Recuperado de: https://www.pensador.com/frase/MTgxOTI0Mw/ acessado em 10/11/2021.
    » https://www.pensador.com/frase/MTgxOTI0Mw/

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    2021
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