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A DESCONSTRUÇÃO HEIDEGGERIANA DA METAFÍSICA COMO TERAPIA DA CONDIÇÃO HUMANA

LA DESCONSTRUCCIÓN HEIDEGGERIANA DE LA METAFÍSICA COMO TERAPIA DE LA CONDICIÓN HUMANA

RESUMO

O texto, resultado de um estudo teórico, reflete sobre o potencial do pensamento do filósofo Martin Heidegger no que se refere às possibilidades nele contidas de reexperimentar o fundo a partir do qual os nossos empreendimentos teóricos e práticos se constituem. A ênfase recai sobre a desconstrução e fecundidade nela presente para a psicologia e para outras ciências humanas. Situaremos o problema, apresentaremos em traços gerais o seu pensamento e apontaremos alguns desafios que representam indícios de uma terapia para as explicações, teorias e práticas de cuidado com o ser humano. Esse movimento para dentro do ambiente não tematizado onde vivemos e pensamos, mas que é a condição de possibilidade deste mesmo ambiente, se constitui como acesso à condição humana, na direção da proximidade com o inaugural. E permite a compreensão e liberação do ser humano para além dos projetos ônticos, resultando em terapia das terapias especializadas, em terapia da condição humana no mundo.

Palavras-chave:
Heidegger; desconstrução; terapias

RESUMEN

El texto, resultado de un estudio teorético, refleja sobre el potencial del pensamiento del filósofo Martin Heidegger en lo que se refiere a las posibilidades en él contenidas de reexperimentar el fondo desde donde se desarrollan nuestros emprendimientos teóricos y prácticos. El énfasis recae sobre la deconstrucción y la fecundidad en ella presente para la psicología y para otras ciencias humanas. Situaremos el problema, presentaremos en trazos generales su pensamiento y apuntaremos algunos desafíos que representan indicios de una terapia para las explicaciones, teorías y prácticas de cuidado con el ser humano. Este movimiento hacia el ambiente no tematizado donde vivimos y pensamos, pero que es la condición de posibilidad de este mismo ambiente, se constituye como acceso a la condición humana, en la dirección de la cercanía con lo inaugural. Y permite una comprensión y liberación del ser humano más allá de los proyectos ónticos, resultando en una terapia de las terapias especializadas, en una terapia de la condición humana en el mundo.

Palabras clave:
Heidegger; desconstrucción; terapias

ABSTRACT

The text, result of a theoretical study, reflects on the potential of the philosopher Martin Heidegger's thinking about the possibilities contained therein to re-experience the background from where our theoretical and practical undertakings are constituted. The emphasis lies on deconstruction and fecundity present in it for psychology and other human sciences. We will situate the problem, present in general outlines his thinking and present some challenges that represent indications of a therapyfor the explanations, theories and practices of care for the human being. This movement into the non-thematized environment where we live and think, but which is the condition of possibility of the same environment, is constituted as access to the human condition, in the direction of proximity to the inaugural. And it allows an understanding and liberation of the human being beyond ontic projects, resulting in a therapy of specialized therapies, a therapy of the human condition in the world.

Keywords:
Heidegger; deconstruction; therapies

Introdução

As ciências, como áreas específicas do conhecimento, constituíram-se a partir da assunção de um determinado objeto, parte ou aspecto dele, e de um método ou modo de acesso e abordagem do mesmo. Separam um elemento do seu âmbito geral e universal e o constituem como aquilo a partir donde se dá a investigação e a produção do conhecimento. Por isso, uma ciência determinada já sempre pressupõe e se move dentro de um horizonte compreensivo normalmente não tematizado na investigação, descrição e explicação do seu objeto. Há um ‘todo fundamental’, uma pré-compreensão, sob a qual se reconhece algo como algo. Os objetos ou a realidade se constituem como tais sob esse fundo pressuposto, um sentido prévio que é a luz que permite ver isto e aquilo. As distinções, separações, comparações e avaliações se enraízam neste fundo. Acontecem, desse modo, duas coisas: há abertura ou compreensão do ser (do que as coisas são) já sempre pressuposta e não explicitada, denominada de nível ontológico, e, ao mesmo tempo, uma fragmentação e separação do que se oferece na abertura como objeto de consideração teórica, que constitui o nível ôntico.

Pode-se dizer que “o Ocidente é efetivamente um fragmentador [...]. Aliás, foi a fragmentação (ou seja, a atitude que consiste em construir objetos parciais) que forneceu ao Ocidente o poder técnico e intelectual” (Cyrulnik & Morin, 2013Cyrulnik, B. & Morin, E. (2013). Diálogo sobre a natureza humana. São Paulo: Palas Athena., p. 11). E além da fragmentação e do poder de controle e previsibilidade, há também o ‘esquecimento’ do ‘paradigma’, da abertura compreensiva na qual já sempre nos encontramos e que nos permite determinar os objetos enquanto tais. Nesse movimento, a filosofia, como busca de uma compreensão a partir da totalidade e nela, vai perdendo espaço e importância. Os resultados das investigações com os objetos isolados e particularizados são incríveis e permitem poder de previsão e controle antes inimaginável. Começa-se a desconfiar cada vez mais do âmbito dos valores ou, como escreve Guignon (1998Guignon, C. (1998). Poliedro Heidegger. Lisboa: Instituto Piaget.) em relação à ciência, que ela foi a “dispersão da imagem tradicional da realidade como carregada de valor, um cosmos com sentido, em favor da nossa moderna visão naturalista do ‘universo’ como um vasto agregado de objetos em interações causais” (Guignon,1998Stein, E. (2012). Analítica Existencial e Psicanálise. Ijuí, RS: Editora daUnijuí., p. 238).

O modelo de investigação e de conhecimento possível está atrelado a um modo de entender a realidade enquanto uma extensão decifrável matematicamente. Produzir conhecimentos, e inclusive exercer uma profissão e o próprio viver, estão cada vez mais atrelados a uma racionalidade, praticamente hegemônica no Ocidente, que se caracteriza como científica. Nesse ambiente, as ciências humanas irão conquistar seu espaço e se consolidar. Assim como o universo físico e natural, o fenômeno humano passa a ser fragmentado e ‘distribuído’, dando origem aos diversos campos das ciências humanas. O fundamento e modelo de racionalidade é, primordialmente, o modo de pensar que foi desenvolvido no domínio das ciências naturais e que foi estendido para o âmbito das ciências humanas, sociais ou do espírito.

O conhecimento científico avança “pela observação descomprometida e livre, sistemática e tanto quanto possível rigorosa dos fenômenos naturais” (Santos, 2018Santos, B. S. (2018). Um discurso sobre as ciências. 8ª edição. São Paulo: Cortez., p. 25). Conhecer é quantificar, não qualificar (por isso a desqualificação dos valores; do que vale e não pode ser quantificado). Resulta a expulsão da intencionalidade, dos pressupostos, da temporalidade. E o conhecimento, como nota Santos (2018), perde em riqueza na medida em que ganha em rigor. Há um processo de redução da realidade a causalidades lineares e de busca da previsibilidade e segurança. Mas “sabemos que as causalidades lineares são abusivas: somos nós que as fabricamos para dar ao mundo uma visão redutora e, portanto, repleta de segurança” (Cyrulnik & Morin, 2013Cyrulnik, B. & Morin, E. (2013). Diálogo sobre a natureza humana. São Paulo: Palas Athena., p. 49).

Como seres humanos fomos, ao longo do processo de construção do nosso modo de existir e entender o mundo, consolidando uma compreensão do que é e do que não é, uma abertura compreensiva dentro e a partir da qual entendemos o mundo, as coisas, a nós mesmos e dentro da qual também agimos. Heidegger (1889-1976), um dos importantes filósofos alemães do século XX, chamou essa abertura de compreensão do ser, e ela, ao mesmo tempo em que dá acesso à realidade, também oculta a abertura como abertura, ou o sentido do ser. Na mesma medida em que ela é um horizonte que ilumina, tal qual uma ‘clareira’, e permite às coisas (entes) serem, a atitude naturalizada e cotidiana também oculta sua própria condição histórica e finita. Nossas explicações, teorias, crenças e instituições fazem parte da ordem e da lógica que consolida essa abertura compreensiva, que tende a se perpetuar. Ela assegura e garante previsibilidade e controle sobre a realidade, até porque institui a realidade.

Para conseguirmos ver, ouvir, experimentar além dos limites da abertura instituída (entes), há que se abrir e assumir essa mesma abertura guardada na tradição. Heidegger propõe a desconstrução como caminho e se empenha em realizá-la. Por isso seu pensamento representa a possibilidade de uma terapia para o instituído, para o que está consolidado enquanto realidade. Também as concepções de ser humano e as terapias dentro do campo da psicologia se constituem dentro e a partir desse ambiente metafísico e tendem a permanecer fiéis e congruentes com a abertura compreensiva que as permite e sustenta.

A filosofia, pela sua autonomia e liberdade, pela fidelidade mais à busca do que ao encontrado, já é sempre um antídoto contra as calcificações epocais e culturais que tendem a se formar. Não como negação das conquistas que foram possíveis à humanidade, mas como exercício constante de ‘ver, ouvir, sentir, experimentar além’ das conquistas, e esse além inclui a atenção aos pressupostos implícitos, normalmente ocultos, que organizam e solidificam um mundo determinado. E Heidegger, pela radicalidade com que pensa, pode ser um guia nesta trajetória. Escreve Evangelista (2016Evangelista, P. E. A. (2016). Psicologia fenomenológica existencial: a prática psicológica à luz de Heidegger. Curitiba: Editora Juruá.) que “a fenomenologia de Heidegger se apresenta como um caminho de reflexão sobre o ser da ciência moderna, que é manifestação do ser como fundo de reserva disponível para a produção. Por isso pode lançar luz sobre o ser da psicologia” (p. 184). Stein (2012Stein, E. (2012). Analítica Existencial e Psicanálise. Ijuí, RS: Editora daUnijuí.) observa que

A analítica existencial tem como tarefa uma metapsicologia ou uma hiperpsicologia, cujas características do ser, que é ali descrito, provém não da sua simples ancoragem em um universo empírico, mas está restrito a um âmbito filosófico, que vai servir, contudo, de instrumento de avaliação de outros processos que não são processos filosóficos (Stein, 2012Stein, E. (2012). Analítica Existencial e Psicanálise. Ijuí, RS: Editora daUnijuí., p. 47).

Nesse sentido, apresentamos elementos do pensar de Heidegger, do horizonte ontológico que ele conquista com sua filosofia, que podem servir como ambiente para a compreensão das condições das ciências que se ocupam com objetos específicos e a visualização e experimentação do seu contexto mais geral. Uma terapia no sentido de que permite às ciências específicas avaliarem melhor seu lugar, suas conexões e pressupostos; que ofereça uma distância suficiente de si mesmas e do envolvimento com seu objeto. E entendemos terapia justamente no sentido de um processo de enfrentamento dos elementos normalmente mantidos na obscuridade, mas que tem peso importante no funcionamento de algo, seja uma pessoa, instituição, teoria ou técnica. Terapia como um movimento de ampliação progressiva da autocompreensão, de maior controle sobre os elementos que compõem esse fenômeno, mas que necessita de uma exterioridade que lhe sirva de desafio e confronto na ampliação da consciência. É um movimento de abertura para fora dos limites instituídos e consolidados, ampliando a disponibilidade para acolher de forma livre e criativa as raízes e o porvir em sua ocasionalidade.

Não se pretende, portanto, discutir especificamente uma terapia psicológica ou oferecer alguma alternativa para estas, mas pensar, de modo geral, a possibilidade de que as próprias terapias enquanto teorias e técnicas de cuidado humano mantenham vigilância e consciência sobre seus limites e possibilidades, e o faremos a partir das contribuições filosóficas de Heidegger. Apresentaremos então, em traços gerais, algumas questões que estão em jogo no pensamento desse filósofo, que podem se constituir como essa exterioridade com a qual as ciências humanas, notadamente as psicologias, podem se confrontar. Sugerimos que sua obra oferece a possibilidade de alcançar uma visão para além das determinações, na direção da experiência fundadora e originária das interpretações consolidadas na tradição.

Desconstrução da existência cotidiana

Heidegger produziu uma obra na qual procurou relembrar os elementos da nossa existência ocidental que ficaram encobertos pelas determinações e institucionalizações que vigoram no presente. Trabalhou no sentido de conseguir diminuir o peso das objetivações, do nosso envolvimento cotidiano e naturalizado com os objetos e projetos, aquilo que denominamos de realidade (entes), com o propósito de resgatar as condições originárias e prévias que ficam soterradas e que acabamos por esquecer - o sentido do ser. O movimento do seu pensamento é um processo de apropriação (tornar próprio, seu e não impessoal e anônimo) e de libertação das amarras dos envolvimentos naturalizados e mecânicos com a realidade, com o escopo de resgatar o pensar para além do cálculo, uma superação da própria filosofia enquanto metafísica e do pensamento que não considera seus pressupostos e os assume como evidentes. Exercita, por isso, uma reflexão que busca, através do questionamento, libertar da cotidianidade, da impropriedade, da inautenticidade e do desenraizamento do dizer e pensar vigentes, na direção da abertura onde as coisas se dão, permitindo morar no intervalo entre o ser e o ente.

Seu diagnóstico, apresentado de forma sistemática e amadurecida em Ser e Tempo - embora seu pensamento não tenha iniciado e nem parado nesta obra -, oferece uma visão para além do modo com que estamos habituados a ler a realidade e a nós mesmos. Faz notar que o ser humano se apega ao horizonte compreensivo dos entes e esquece o ser (Heidegger, 1998Heidegger, M. (1998). Ser y Tiempo. Santiago do Chile: Editorial Universitária.). As coisas, desse modo, nos parecem evidentes e claras, mas isso pelo fato de termos esquecido a sua proveniência, as suas raízes, seu contexto e remissões. Nesse sentido “o filósofo alemão lembra que é preciso se demorar naquilo que é tido como óbvio, e, por isso, permanece não tematizado e pouco questionado, em seu sentido originário” (Feijoo & Mattar, 2015Feijoo, A. M., & Mattar, C. M. (2015). A desconstrução da psicossomática na análise existencial de Heidegger e Boss. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, (Vol. 18,4, 651-662)., p. 653). Mostra então que o ser humano compreende a si mesmo a partir da realidade e do tempo nos quais se encontra (do mundo no qual é ser humano), e nos quais age, se relaciona, sente e compreende, ou seja, há inicialmente e normalmente a inclinação “[...] a compreender seu ser desde aquele ente com que essencial, constante e imediatamente se relaciona em seu comportamento” (Heidegger, 1998Heidegger, M. (2011). Conceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária., p. 39). Isso, contudo, leva ao esquecimento da condição finita e da proximidade humana com o ser: que “no seu ser se comporta compreensivamente com respeito a esse ser” (Heidegger, 1998Heidegger, M. (2011). Conceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária., p. 79). Ele tende a perder-se na ocupação agitada e sempre urgente com as coisas, conhecimentos, instituições e tarefas. Por isso a necessidade de pensar novamente a questão do sentido do ser.

Podemos fazer uma analogia entre o movimento do pensamento de Heidegger e o conhecido mito da caverna de Platão: nascemos e crescemos dentro de um horizonte compreensivo, de um universo cultural e linguístico (uma caverna), ‘espaço’ onde nos constituímos e de onde haurimos as condições a partir das quais nos compreendemos já sempre, que Heidegger (1998)Heidegger, M. (2011). Conceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária. denomina de cotidianidade. Existimos a partir do que nos é oferecido neste ‘ambiente’; avaliamos, julgamos, sentimos, agimos, pensamos dentro desse horizonte. É, afinal, o lugar familiar, confortável e previsível que conhecemos e onde sabemos como agir e o que esperar. Essa tradição é o material que constitui nossa consciência, a abertura compreensiva em que habitamos e a partir da qual entendemos o presente e olhamos para o futuro. Inicial e normalmente permanecemos nessa abertura que, ao mesmo tempo, nos fecha para a experiência da própria abertura. Dito de outra forma, dificulta-nos notar e experimentar a caverna onde moramos, pois, a ocupação com as coisas e ‘visões’ dentro da caverna ocultam a própria caverna, e o ver em si mesmo.

Outra forma de pensar comparativamente essa questão é na relação entre a luz e os objetos que nos aparecem a partir dela. Vemos objetos, mas não vemos a luz que nos permite ver os objetos; vemos somente os objetos que estão na claridade. O sentido do ser é a luz a partir da qual os entes (os objetos) podem aparecer enquanto tais, mas a própria clareira não se mostra como algo, como alguma coisa nesta relação. É a diferença entre o ser e o ente, que é denominada por Heidegger de diferença ontológica. O foco nos entes permite um esquecimento da luz enquanto abertura e horizonte dentro do qual os entes comparecem. A cotidianidade é esse esquecimento, existência que está presa na relação ôntica (com os objetos, realidades, fatos), esquecida das condições prévias, do sentido do ser e do caráter de projeto da nossa existência e do mundo.

A ocupação cotidiana com os entes produz, portanto, um esquecimento do ser. Perguntar novamente pelo sentido do ser é um exercício que tem o potencial de preparar o resgate da sensibilidade e capacidade de ‘ver além’, de ‘sentir além’, de ‘experimentar além’ daquilo que nossa experiência com os entes, com a realidade disponível e presente permite. Mas não um ver, sentir e experimentar determinados, pois não é um ver, sentir e experimentar de um ente ou de um conjunto de entes, mas do horizonte, da abertura, da caverna ou da luz onde os entes podem ser de determinada forma, podem ser isto ou aquilo. Não se trata de ver, sentir ou experimentar algo que esteja ainda faltando, mas do não algo, do ser, ou do nada, que é sua condição de possibilidade.

Na cotidianidade (dentro da caverna), não há necessidade de retornar às fontes das tradições, dos conhecimentos, dos ritos, das compreensões, das teorias e práticas, de manter-se próximo da fonte, reexperimentar as coisas no seu dar-se, pois se perdeu a capacidade de ‘ver além’ da realidade. Acomodados, acostumados e familiarizados com um determinado modo de existir, compreender, ver, sentir, agir, já sempre compartilhado com os outros que participam da mesma tradição e linguagem, torna-se muito difícil parar, perfurar e aprofundar o ‘lugar’ onde nos encontramos e correr o risco de perder o conforto da caverna, da cotidianidade. Acostumados às sombras, aos ecos, às imagens consolidadas e guardadas na linguagem compartilhada, tendemos a continuar nossa vida dentro das expectativas e perspectivas abertas no presente. Vivemos como se as representações (sombras) refletissem natural e fielmente as coisas. Nem sequer suspeitamos que o mundo onde nossa existência decorre é somente um mundo possível, um projeto, e não algo como ‘o’ mundo enquanto tal.

Na imersão na cotidianidade e impessoalidade não pretendemos ter de ver e falar por nós mesmos e a partir de nós mesmos e, muito menos, estamos dispostos a abrir nossos olhos e ouvidos para o que se encontra além dos objetos e organização da caverna. Resguardamo-nos, existimos, falamos e ouvimos a partir e dentro do universo do impessoal e público, onde ninguém é efetivamente responsável ou tem de assumir a existência como sua. Neste mundo compartilhado somos o que todos são, contra ou a favor das coisas que estão autorizadas dentro da abertura lógica e compreensiva onde estamos. Como escreve Heidegger (1998Heidegger, M. (1998). Ser y Tiempo. Santiago do Chile: Editorial Universitária.), o ser-aí humano habita e está familiarizado com um mundo (estar-em), está em casa no ‘mundo’ onde nasceu, cresceu, onde se desenvolve e existe.

Heidegger (1998Heidegger, M. (1998). Ser y Tiempo. Santiago do Chile: Editorial Universitária., p. 85) registra que “agora se conhece a constituição do ser-aí - ademais como se fosse óbvia - marcada pela interpretação inadequada”. A interpretação que fazemos de nós mesmos na familiar imersão cotidiana deixa na penumbra a constituição fundamental do ser-aí como ser-no-mundo. No entanto, ele é mais do que a realidade ou alguma determinação extraída do seu comportamento, ou seja, para além da realidade ele é possibilidade. Com a noção de ser-aí (Dasein no original alemão) Heidegger aponta para o ser humano na sua condição originária, enquanto possibilidade que se encontra já sempre em alguma realidade. Remete para fora e além das determinações históricas com que ele é caracterizado nos discursos cotidianos.

Para recordar e liberar o ser de possibilidades da ocupação automática e mecânica com os entes, o filósofo explora alguns dispositivos que quebram a lógica e a consistência desse mundo cotidiano e impessoal, tais como a angústia, a morte, o tédio e o espanto. No caso da angústia, escreve que ela é “a possibilidade de uma abertura privilegiada, porque ela isola. Tal isolamento retira o ser-aí do seu decair e lhe revela a propriedade e impropriedade como possibilidades do seu ser” (Heidegger, 1998Heidegger, M. (1998). Ser y Tiempo. Santiago do Chile: Editorial Universitária., p. 212). Vislumbra na angústia a possibilidade da compreensão da existência já sempre decaída na cotidianidade e, com isso, também a possibilidade da sua assunção própria. A angústia que por vezes nos toma, produz uma quebra na teia organizada da vida cotidiana, faz os fios que compõem a trama da realidade se soltarem e, assim, revela a finitude e o fundo que necessitamos ignorar para termos a certeza de que estamos num mundo seguro e confiável.

O mesmo se passa com o fenômeno do tédio (Heidegger, 2011Heidegger, M. (2011). Conceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária.), relacionado à questão do tempo: quando não conseguimos ocupar e preencher todo tempo (estar completamente ocupados) e, com isso, dominá-lo, é o próprio tempo que aparece como tempo e nos entedia (no alemão tédio é Langeweile, ‘tempo longo’). Quando não estamos ocupados com coisas, projetos, atividades (ou seja, com os entes), deparamo-nos com o tempo enquanto tal, um tempo ‘vazio’, que se demora e nos desola. Na cotidianidade estamos cativados e aprisionados pelas coisas com que nos ocupamos e, com isso, ocultamos o tempo enquanto tempo, pois tudo está à disposição, inclusive o tempo através do relógio, do cronômetro. No tédio, um vazio se anuncia e o tempo se torna problemático; não conseguimos controlar e passar o tempo (com ‘passatempos’) e somos remetidos de volta para nós mesmos e para o nosso ser-no-mundo, para nossa finitude; do âmbito das determinações ou realidades, para as possibilidades. Posteriormente em sua obra, Heidegger (2015)Heidegger, M. (2011). Conceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária. trata também do espanto como “a viagem de volta do caráter corrente do comportamento familiar para a abertura do acometimento do que se encobre, em cuja abertura o que há até aqui de corrente se revela ao mesmo tempo como o estranho e agrilhoante” (Heidegger, 2015Heidegger, M. (2011). Conceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária., p. 19). Angústia, morte, tédio e espanto são ocorrências que desmontam a familiaridade e remetem para a proveniência da presente condição humana.

Por isso podemos dizer que o exercício filosófico de Heidegger durante toda sua vida intelectual é um movimento para esclarecer e iluminar cada vez mais a possibilidade enquanto tal (não esta ou aquela possibilidade específica) e não pretende fixar-se na realidade (numa possibilidade realizada ou em realização). Ao fazer o movimento de retorno às condições fáticas, aos pressupostos esquecidos, mas subjacentes aos empreendimentos e compreensões, produz-se uma experiência do próprio experimentar enquanto tal, e talvez se possa dizer, abre-se a possibilidade de pensar a terapia a partir da experiência da abertura dentro da qual existimos.

Os discursos sobre os entes e, por isso, das ciências que se ocupam com os entes ou com aspectos dos entes, inclusive as psicologias, tendem também a permanecer e se acomodar à cotidianidade. Na cotidianidade, ou na caverna, as teorias estão a serviço daquilo que está disponível ou potencialmente disponível segundo a abertura vigente, denominada de metafísica. Discutem-se e pesquisam-se objetos, mas não as possibilidades de ser desses objetos e das relações entre eles.

O pensamento de filósofo em questão, pela investigação não de objetos específicos, mas do sentido do ser, pode nos ajudar a desemaranhar e libertar da fixação nas certezas e, não raro, das obsessões, dogmatismos e até fanatismos em relação àquilo com que nos ocupamos e de como entendemos a nós mesmos, nossas teorias e nossas práticas, que se desdobram continuamente a partir de pressupostos inquestionados.

O esforço se concentra em perfurar e escavar para o fundo da verdade dos objetos, em busca da verdade do ser. Nesse itinerário, o pensador se encontra diante da tarefa de desmontar a lógica, a linguagem e os pressupostos que, inquestionados, nos mantém na segurança e certeza em relação ao mundo que dispomos a partir do impessoal cotidiano, da tradição recebida, mas não tornada própria e autêntica. A familiaridade com as representações dificulta o acesso ao que está em questão e pode, por isso, passar por um processo de desconstrução para que se conquiste a liberdade e transcendência do humano, para reexperimentar o que se oculta nesta ou naquela forma de lidar com os objetos, nota Heidegger (2009Heidegger, M. (2009). Seminários de Zollikon. Petrópolis: Vozes.). Não se trata de condenar alguma teoria ou método, mas de relembrar que são sempre um projeto possível, situado e comprometido.

Tradição e linguagem na autocompreensão humana

Heidegger (2009Heidegger, M. (2009). Seminários de Zollikon. Petrópolis: Vozes.) manifestou a Medard Boss o desejo de que seu pensamento pudesse ultrapassar o campo da filosofia e alcançar as ciências ônticas e, com isso, ajudar a entender melhor o ser humano e tudo o que com ele se relaciona, inclusive terapeuticamente. Nas palavras de Stein (2012Stein, E. (2012). Analítica Existencial e Psicanálise. Ijuí, RS: Editora daUnijuí.), era “o próprio filósofo quem tinha um interesse em observar as possíveis aplicações de seu pensamento no campo das diversas teorias e práticas terapêuticas” (Stein, 2012Stein, E. (2012). Analítica Existencial e Psicanálise. Ijuí, RS: Editora daUnijuí., p. 13).

O potencial do pensamento desse filósofo está no exercício de superação dos modelos dualistas e dicotômicos, ou então do paradigma que subjaz e fundamenta as teorias e práticas vigentes, também as psicoterapêuticas. Seu pensamento representa um constante ir e vir entre o que está dado, objetificado, reificado e o que se recusa; um resgate daquilo que fica impensado no que está sendo pensado e feito, os elementos que constituem as condições prévias e o ‘fundamento’ daquilo que se manifesta e se cristaliza na linguagem cotidiana e nas teorias e práticas ‘normais’. É um resgate da diferença entre os entes e o ser, da diferença ontológica (Heidegger, 2015Heidegger, M. (2015). Contribuições à filosofia: do acontecimento apropriador. Rio de Janeiro: Via Verita.) e que pretende superar a indiferença na qual tudo se transformou em objeto, em coisa. Por isso resgatar a sensibilidade para a diferença que foi esquecida, resultando na capacidade de abrir-se para o que não está previsto e programado nas nossas teorias e métodos.

Justamente por não oferecer objeto, há a possibilidade de liberar o potencial do inusitado, do inesperado, do outro no pensamento e na ação. Não se trata tanto de encontrar uma nova receita para resolver problemas relacionados aos objetos das psicologias, mas conquistar a liberdade da abertura, tornar-se disponível para experimentar o que não se acessa com a linguagem usual dos entes. Se conhecemos as coisas por intermédio dos conhecimentos que temos, daquilo de que nossa consciência é consciência, há que desconstruir esses conhecimentos para preparar a disposição para a abertura em si mesma. A atitude fenomenológica pretende desenvolver a capacidade de deixar-ser, “a serenidade para com as coisas e a abertura ao mistério” (Heidegger, 2011Heidegger, M. (2011). Conceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária., p. 26). Para as ciências que se ocupam com o ser humano é interessante que o acesso ao seu objeto não seja determinado por compreensões e práticas fechadas pela lógica do cálculo e previsibilidade, pois isso “poderia prender, enfeitiçar, ofuscar e deslumbrar o Homem de tal modo que, um dia, o pensamento que calcula viesse a ser o único pensamento admitido e exercido” (Heidegger, 2011, p. 26). Para evitar esse ofuscamento o filósofo se ocupa com a compreensão de ser pressuposta nos empreendimentos teóricos e práticos do existir humano, de modo a exercitar a capacidade de ver, escutar e experimentar orientados pelo acolhimento sereno do inusitado que se doa sempre e renovadamente em cada ocasião. O ser humano “não é tanto um objeto, mas um evento ou acontecimento que se desenrola - o movimento no decorrer de uma vida” (Guignon, 1998Guignon, C. (1998). Poliedro Heidegger. Lisboa: Instituto Piaget., p. 243). Pode-se postular, a partir disso, uma relação terapêutica aberta para o objeto, e não fechada e limitada por compreensões e técnicas prévias que se mantém inquestionadas no decorrer do processo e da relação terapêutica.

Essa atitude caracteriza bem uma das qualidades importantes no processo terapêutico, ou seja, a abertura e liberdade para a escuta do outro, para o acontecer singular e único de cada encontro e de cada pessoa. Antes e apesar da teoria, há uma existência singular e uma vida sendo vivida e que se manifestam na relação. As teorias não são equívocos, mas acessos determinados e generalizados, relacionados a um acontecer que tende sempre a transbordar os limites que elas oferecem. Não é uma negação daquilo que constitui a intencionalidade, aquilo que conforma nosso acesso aos fenômenos, mas a preparação constante para uma atitude receptiva que não se limita às possibilidades interpretativas desta ou daquela teoria ou técnica.

Com esse pensador está em questão, entre outras coisas, a atenção às concepções de ser humano que orientam nossas teorias e nossas práticas. Oferece condições, pela desconstrução, de se repensar a relação terapêutica para além das explicações e práticas consolidadas e que não colocam, elas mesmas, sua visão em questão, o que implica em fechamento e indisponibilidade para a ocasionalidade e o porvir. Por isso considera fundamental a relação entre o ser e o tempo. Apanhamos ou recolhemos o que nos vem do futuro a partir dos recursos que dispomos no presente e que foram construídos no passado. Familiarizados com o disposto no presente tornamo-nos incapazes de receber e acolher o futuro como tal, assim como se manifesta a partir de si mesmo e não do passado. Gumbrecht (2015Gumbrecht, H. U. (2015). Nosso amplo presente. São Paulo: Editora Unesp.) escreveu sobre o amplo presente que “transformou-se numa dimensão de simultaneidades que se expandem”, produzindo o “fechamento da futuridade” (Gumbrecht, 2015Gumbrecht, H. U. (2015). Nosso amplo presente. São Paulo: Editora Unesp., p. 16). ‘Matamos’ o futuro a partir do presente em nome da previsibilidade, do controle e da segurança (ou ‘verdade’, ‘realidade’). Tendemos a eliminar a historicidade e o tempo para garantir a verdade. Stein (2012Stein, E. (2012). Analítica Existencial e Psicanálise. Ijuí, RS: Editora daUnijuí.) afirma que “na historicidade, o que nos escapa é a questão da mensurabilidade do ser humano e a possibilidade de fazer uma teoria que o torne completamente um objeto” (Stein, 2012, p. 130).

Por isso, costumamos entender o que acontece, e que vem a partir do futuro, com os recursos compreensivos que já possuímos e que foram produzidos ao longo da nossa história, reunidos e guardados na linguagem e na tradição, às custas da historicidade. Nossa formação tende a nos dotar de saberes e fazeres que estão assentados em conquistas anteriores, mas não nos preparam para a liberdade e abertura ao porvir, para o ‘acontecimento’, o ‘instante’. Ou para a capacidade de escutar e ver livremente. O que já sabemos ou conhecemos se converte em rede ou filtro com que tudo o mais é conhecido. Desse modo, conhecemos com e a partir do passado. Interpretamos com o que sabemos; e aplicamos o que sabemos ao que se oferece aqui e agora.

Não podemos, no entanto, isolar ou esquecer o que sabemos (e o que somos!) com a pretensão de alcançar conhecimentos neutros, impessoais e assépticos. Se recusarmos a nossa herança, a tradição dentro da qual nos tornamos o que somos e na qual se constituiu nosso pensar, perderemos a mediação que torna possível o encontro de algo enquanto algo. Sem as compreensões prévias, as teorias e explicações da tradição (sem a linguagem, afinal) perdemos o acesso mesmo às coisas, ao mundo. Há que, por isso, encetar um trabalho hermenêutico de apropriação da tradição. A tradição é o meio, o ambiente dentro e a partir do qual algo pode ser alguma coisa. Sem uma tradição não teríamos acesso ao mundo e às coisas dentro do mundo.

Está em questão a compreensão do ser que, voltando a ser indagado, abre espaços, quebras, indícios para o que não está previsto e contido dentro do que já temos no presente. Isso significa penetrar corajosa e conscientemente no círculo compreensivo (círculo hermenêutico), não para destruir o passado guardado na linguagem, mas para apropriar-se dele autenticamente e movimentar-se nele com autonomia.

Não se trata, por isso, de jogar fora a tradição acumulada nas pesquisas e práticas psicoterapêuticas, mas de avaliar os limites muitas vezes estreitos e reducionistas em que elas costumam nos colocar; de minimizar a tendência de nos fecharmos ao fenômeno humano manifestando-se aqui e agora, na sua ocasionalidade, preferindo a teoria e sua confirmação. Por isso o conhecido lema de Husserl de retornar às ‘próprias coisas’. Um retorno para as coisas, para além (ou aquém) das representações, das teorias e explicações com que as revestimos e nas quais as aprisionamos.

Heidegger (2012Heidegger, M. (2012). A caminho da linguagem. Petrópolis: Editora Vozes.), para quem “a linguagem é a casa do ser” (p. 127), nota que esta se tornou prisioneira da metafísica da presença, do tempo enquanto presença e perdeu sua dimensão de indiciamento e de insinuação. Fixamos a linguagem no dito e perdemos a dimensão inaugural do ‘dizer’. Tanto a linguagem quanto o que ela refere se petrificou na tradição denominada de metafísica e, por isso, é necessário “preparar uma experiência pensante com a linguagem” (Heidegger, 2012, p. 140). A linguagem também precisa relembrar sua dimensão apresentativa (acontecencial) e não somente representativa (objetificadora).

A linguagem, e também os objetos que ela representa, se ajustaram ao modelo representacional e por isso tendemos, na cotidianidade, a nos aferrar aos nossos conhecimentos e práticas. Nossos saberes sobre o ser humano se tornam mais importantes do que o próprio ser humano. São as coisas que precisam, de alguma forma, se ajustar aos nossos saberes para que, afinal, sejam verdadeiras e coerentes. É a pessoa humana que precisa, no encontro terapêutico, manifestar sua simetria e ajustamento aos saberes do terapeuta para que possa haver algum progresso e possível ‘cura’. O terapeuta que pensa a partir de uma teoria determinada reconhece a ‘verdade’, a realidade, ou o problema, a doença, se conseguir identificar elementos que produzam a conexão entre o saber e os sintomas de quem procura ajuda, mas não está necessariamente aberto ao que o outro realmente manifesta e como se expõe.

Nossa linguagem, que é sempre linguagem que diz alguma coisa sobre alguma coisa, é o acesso e mediação com o mundo, as coisas, os fenômenos e, portanto, com o outro da relação terapêutica também. Chegamos às coisas, ao mundo, a nós mesmos, aos outros, mediados pela linguagem. Nosso acesso ao mundo como mundo e às coisas enquanto essa ou aquela coisa, é linguístico. Se a linguagem se torna opaca e rígida, há que trabalhar com ela para que se torne novamente inaugural e originária; recordar a sua dimensão mostradora, indiciadora antes de se tornar representação e antes da objetificação e cristalização dos sentidos que ela carrega e guarda. Há a necessidade de uma terapia com a linguagem.

Apropriação da tradição

Nesse processo inscreve-se o desafio de que o ser humano seja redescoberto como ser-aí, que existe, experimenta, pensa e age a partir de si mesmo e permita aos outros, ao mundo e às coisas também serem si mesmos. Extrapolando a tendência de existir unicamente a partir do impessoal cotidiano e, por isso, do horizonte compreensivo e explicativo compartilhado e guardado na linguagem também compartilhada, há o desafio de deixar as coisas serem elas mesmas, dentro e a partir dos recursos que a tradição nos oferece, mas agora com a apropriação destes. Heidegger pretende “uma ‘apropriação criadora’ da nossa herança filosófica, principalmente grega, libertando-a do que nos impede de aceder à verdade do seu passado e de com ela nos confrontarmos” (Blanc, 2015Blanc, M. (2015). Desconstrução e Retomação: Heidegger e a demanda do originário.Philosophica,(Vol.45, p. 57-68)., p. 66). A apropriação implica um confronto pessoal com aquilo de que somos feitos: de tradição. Não para negar ou aceitar naturalmente, mas para liberar as possibilidades criadoras que nela se ocultam.

A geração desvigorada e decaída de que fala Heidegger em A caminho da Linguagem pode ser superada em favor do recolhimento em relação à dispersão e distração incessantes. Um movimento que busca a intimidade e conexão que desaparecem cada vez mais em razão da impessoalidade e absorção na cotidianidade (Trawny, 2013Trawny, P. (2013). Adyton. A filosofia esotérica de Heidegger. Rio de Janeiro: Mauad X.).

O pensador (e também o terapeuta) é alguém que se coloca num movimento de travessia e de meditação sobre os ditos que ocultam sua procedência e que, por isso, exercita a escuta serena e atenta do que comparece. Para além dos saberes determinados que o terapeuta carrega consigo nas teorias com que pensa o ser humano e sua saúde, ele cultiva também a abertura que o silêncio resultante da desconstrução e apropriação propiciam. Mas a tendência da cotidianidade é que nos tornemos consumidores, reprodutores e explicadores das geniais intuições e experiências de homens e mulheres do passado, mas sem que nós tenhamos palavra própria.

Recebemos e reproduzimos o que herdamos, com pequenas modificações e ajustamentos. Carecemos de sensibilidade e disposição para criar, não por birra ou por rebeldia, mas por genialidade, tal como vemos nos grandes formuladores de teorias e práticas na tradição. Normalmente vivemos e pensamos a partir deles, do passado, e não cultivamos a disposição para acolher, pensar e criar a partir do que nos vem ao encontro em cada instante e acontecimento. Tendemos a não falar a partir do que se dá aqui e agora, mas dos saberes acumulados que herdamos dos pensadores e investigadores do passado.

As formulações e métodos disponíveis acabam nos engessando e se tornando nossas certezas implícitas ou explícitas. Assim, “toda formulação é perigosa. Ela constrange o dizer, reduzindo-o à exterioridade de uma opinião apressada e minando com facilidade a lentidão do pensamento” (Heidegger, 2012Heidegger, M. (2012). A caminho da linguagem. Petrópolis: Editora Vozes., p. 69). A urgência e premência cotidiana acabam por sufocar o pensamento. Torna-se mais cômodo e confiável a operação que calcula, que maneja elementos disponíveis, ajustando, combinando, separando e classificando. O pensar, no entanto, é lento e silencioso. Há em Heidegger a ênfase em libertar o pensamento do cálculo, que opera sem consideração concomitante do que já sabemos e daquilo que se nos mostra na pesquisa ou na relação terapêutica aqui e agora.

Nas ciências humanas também tendemos a fazer cálculos. Operamos com o que sabemos e o aplicamos ao que nos chega a partir do futuro. Heidegger escreve em Ser e Tempo, que na vida cotidiana já se “limitou de antemão as possibilidades disponíveis ao âmbito do conhecido, acessível, tolerável, do que se deve e costuma fazer” (Heidegger, 1998, p. 216). Na psicologia dispõe-se de certo número de teorias, técnicas e métodos, que são aplicados, independentemente da meditação sobre a diferença que sempre surge e se insinua em cada pessoa, encontro, fenômeno ou coisa.

Para não sucumbir à tentação da segurança propiciada pelo apego ao que já sabemos e fazemos, de controle da realidade e da objetificação ininterrupta, Heidegger (1999Heidegger, M. (1999). Serenidade. Lisboa: Instituto Piaget.) reivindica a liberdade da atitude de “dizer ‘sim’ à utilização inevitável dos objetos técnicos e [...] ao mesmo tempo dizer ‘não’, impedindo que nos absorvam” (Heidegger, 1999, p. 26), que resulta de um pensar lento e incansável, atento e responsável, que busca as raízes e o solo onde as coisas repousam já sempre antes das separações e objetivações.

Se expressa aqui um “esforço de transformar o homem e, com isso, a metafísica herdada, em um ser-aí mais originário” (Heidegger, 2011Heidegger, M. (2011). Conceitos Fundamentais da Metafísica: mundo, finitude e solidão. Rio de Janeiro: Forense Universitária., p. 401). O ser do ser humano, seu ser-aí, essa experiência originária e instauradora, não é algo que possa ser determinado, apreendido e disponibilizado como coisa, como teoria, como técnica ou método. Podemos, no entanto, colocar-nos a caminho, abertos para o que não sabemos antecipadamente, para o que não pode ser obtido e determinado, mas que só pode ser sempre preparado, pensa Heidegger (2011). O cuidado e atenção que podem surgir nesta disposição nos alertam “para a impossibilidade de fazermos de nós um objeto segundo os limites e critérios de qualquer quadro teórico e metodológico” (Seibt, 2015Seibt, C. L. (2015). Por uma antropologia Existencial-Originária: aproximações ao pensamento de Martin Heidegger. Ijuí, RS: Editora da Unijuí., p. 204). Não somos essencialmente determinações ou substâncias, mas somos cuidado e possibilidade.

Considerações finais

Como mostramos, o pensamento de Heidegger é um estar a caminho, no qual importa resgatar a capacidade de continuar experimentando a proveniência da carga da tradição que perdeu seu vigor e vitalidade nas representações linguísticas e estruturas que criamos. Esse caminho se caracteriza pela desconstrução das cristalizações teóricas e práticas com as quais estamos envolvidos e que são as lentes a partir das quais compreendemos a nós mesmos e o mundo. No pensamento de Heidegger há a preocupação constante “com o abalo de hábitos desvitalizados, com a ruptura de realidades incrustadas” (Trawny, 2013Trawny, P. (2013). Adyton. A filosofia esotérica de Heidegger. Rio de Janeiro: Mauad X., p. 46).

Estamos diante de um persistente e radical trabalho de perfuração da realidade na direção da possibilidade; da tradição cristalizada na direção das suas fontes; das representações conceituais para o acontecer. É a reaprendizagem da atitude natural da criança, a atitude que se mantém sempre próxima ao vivido por não estar carregada e saturada com saberes e fazeres prévios. Uma reaprendizagem da possibilidade de experienciar as coisas para além da objetividade, do disponível, do presente. Uma atitude na qual os pressupostos, a compreensão que organiza e dá sentido ao mundo, não são esquecidos no movimento de experimentar os entes, os fenômenos humanos, o próprio ser humano como humano. Uma abertura para o diálogo e contra o monólogo (Gadamer, 2011Gadamer, H. G. (2011). Verdade e Método II. Petrópolis, RJ: Vozes; Bragança Paulista, SP: Editora Universitária São Francisco.), onde o ‘outro’ é autorizado a ser ele mesmo a partir de si mesmo. É, por isso, necessário exercitar o acolhimento e a escuta daquilo que se retrai, que sobra ou se recusa no cálculo que fazemos com o saber disponível.

Ao invés de substância, o ser humano é existência, que tem a si mesmo como encargo. As medidas de normalidade e doença, de maturidade e imaturidade são reconduzidas para suas raízes e aparecem sob nova luz: são inseridos no fluxo criativo e ao mesmo tempo determinador da realidade do que denominamos de ser humano. Se “[...] o Homem nasce possibilidade e não determinação” (Sodelli & Sodelli-Teodoro, 2011Sodelli, M. & Sodelli-Teodoro, A. (2011). Visitando os “Seminários de Zollikon”: novos fundamentos para a psicoterapia fenomenológica. Psicologia USP, (Vol. 20, 2, 245-272)., p. 249), as determinações podem ser iluminadas de forma inusitada pelo retorno à experiência do ser e da nossa proveniência. O envolvimento cotidiano com os entes (e as determinações do ser humano e da realidade) passa por uma nova experiência, por uma terapia que alarga e desconstrói as imobilidades e universalizações. Prepara-se a disposição para o imprevisível e inusitado de cada instante.

A desconstrução da metafísica, que passa pela analítica existencial (movimento na direção da compreensão originária do ser humano), é como uma terapia da situação, do horizonte, das condições em que já sempre nos encontramos, como seres-no-mundo. Nascemos, crescemos, pensamos e tornamo-nos o que somos a partir de uma herança que foi gestada lenta e gradualmente ao longo da história. Essa herança oferece certas possibilidades e fecha outras, assim como acontece com cada universo cultural. Ao procurar as raízes e as fontes desse mundo, acontece um processo de abertura que é terapêutico, que libera dos determinismos e condicionamentos. Escreve Guignon:

Enquanto o Dasein inautêntico anda à deriva, seguindo as últimas modas, o Dasein autêntico ‘recorda-se’ das suas raízes no largo desenrolar da sua cultura, e experiencia a sua vida como se estivesse em dívida para com o largo drama de uma história compartilhada (1998, p. 254).

As terapias psicológicas se fundam nessa ‘história compartilhada’, ‘paradigma’, determinada compreensão de ser, que se tornou largamente predominante no Ocidente, e que reduz seu alcance ao âmbito do ente e se fecha para o porvir, porque está desconectada das raízes, da proveniência e, com isso, se perde em meio à realidade presente. Acompanhar Heidegger nesse exercício pode ser uma experiência terapêutica e liberadora, que devolve a responsabilidade e a singularidade ao ser humano e a autenticidade às técnicas e teorias. Um trabalho que tem o potencial de reconquistar a capacidade de pensar, sentir, existir e agir a partir da abertura temporal de cada um, e que prepara a disposição para acolher o inusitado e imprevisível.

É um processo terapêutico que exige, como indicamos, um trabalho com a linguagem, de desconstrução das cristalizações dos sentidos, que abra para as fontes dos conceitos e teorias. A linguagem é o meio onde nosso acesso ao mundo acontece e é guardado. É no seio da linguagem, com a apropriação de uma determinada linguagem, que temos acesso a um mundo (somos ser-no-mundo). Mas o mundo que se abre numa determinada linguagem, com seus sentidos, sua lógica e gramática, oferece acesso a uma determinada realidade e fecha para outras. Por isso, “a exploração linguística, basicamente etimológica, constitui o caminho de acesso de compreensão do que se mostra na imediatez do seu mostrar-se” (Duarte, 2017Duarte, I. B. (2017). Cuidado e Pobreza em Heidegger. In I. B. Duarte, B. Sylla, & M. Casanova, (Orgs.). Fenomenologia Hoje VI: Intencionalidade e Cuidado (p. 9-35). Rio de Janeiro: Via Veritas., p. 20).

O retorno às experiências fundantes, à nossa proveniência, é uma terapia da condição humana é, por isso, um trabalho com os sentidos cristalizados na linguagem e nas compreensões que essa linguagem carrega, uma terapia do universo compreensivo que nos abriga e no qual nós tendemos a nos alojar (cotidianidade), e a partir do qual entendemos, medimos, classificamos, julgamos tudo o que se passa conosco e com o mundo. Uma terapia das explicações ou ‘racionalizações’ com que compreendemos e agimos, com que acessamos o mundo, as outras pessoas e a nós mesmos.

No caso do pensar de Heidegger, temos uma terapia que não contribui para o ajustamento ou reformas parciais dentro da realidade, mas que almeja o desenvolvimento de uma atitude em que se vive a partir do ‘cuidado’ (Sorge), que libera cada um para si mesmo, para sua autonomia, liberdade e responsabilidade. A partir da propriedade e autenticidade, também o ‘outro’ é liberado para suas próprias possibilidades. Livre da necessidade de controle e previsibilidade, as relações consigo, com os outros e com o mundo passam a ser uma experiência emancipadora e constantemente enriquecedora, embora acompanhada sempre pela ‘angústia’ em relação ao que escapa e se recusa constantemente, da nossa condição finita.

Da desconstrução não resulta nova teoria ou técnica, mais precisa e verdadeira. Resgatar a proveniência e originariedade do ser humano permite o desenvolvimento da disposição e sensibilidade para aceitar o caráter de projeto da existência e do mundo em que ela acontece.

A ontologia fundamental e todo esforço de desconstrução da metafísica constitui um mergulho no universo compreensivo onde vivemos, não para destruí-lo, mas redescobrir e colocar-se na proximidade do começo, para sempre poder novamente agir criativamente e de não repetir automaticamente. Trata-se de uma “consciência formada hermeneuticamente” (Gadamer, 2011Gadamer, H. G. (2011). Verdade e Método II. Petrópolis, RJ: Vozes; Bragança Paulista, SP: Editora Universitária São Francisco., p. 76), aberta e receptiva para a alteridade.

A filosofia de Heidegger pretende retirar das sombras a imagem de ser humano da tradição, sempre pressuposta na nossa lida com os objetos e acontecimentos no mundo. Sua apresentação ou descrição fenomenológica da existência dilui essa imagem no sentido de substância, dotado de certas qualidades objetivas e essenciais e que permitem estabelecer um parâmetro de medida a-histórico para seus comportamentos.

Habitamos descrições e explicações do nível dos objetos (ôntico) e esperamos isso também normalmente dos autores que estudamos; que nos ajudem a resolver os problemas de ‘funcionamento’ no nível dos objetos. O pensar de Heidegger se move, no entanto, no nível das condições de possibilidade (ontológico), não descrevendo objetos ou realidades, mas desencobrindo o ser possível (não o ser real) que se esconde por trás das realidades instituídas. Sua obra não é uma resposta pontual para nossos problemas objetivos, do universo ôntico, mas um alargamento do horizonte dos objetos para o ‘espaço’ que abre a possibilidade dos objetos e substancializações. Acompanhar seu pensar possibilita, por isso, uma terapia fundamental, em que o problema não são os objetos, mas o fato de os objetos serem algo, isto ou aquilo, esses objetos e não outros. Afinal, o fato de que algo seja algo.

Não é uma terapia para problemas específicos, mas tem o potencial de tornar possível experimentar novamente o problema como problema, a partir da proximidade com a diferença ontológica, a experiência mesma do fato de se poder experimentar objetos. Não oferece, por isso, uma nova terapia. Mas a possibilidade de repensar sempre e continuamente nossos pressupostos antropológicos e epistemológicos, as condições que conformam nossas teorias e práticas terapêuticas ou pedagógicas. Oferece-nos a experiência da desmontagem, desconstrução do mundo onde somos o que somos e fazemos o que fazemos.

Ao invés de reunir mais material teórico para sustentar o projeto de mundo em vigência e predominância, leva a mergulhar nele para apropriar-se dele e, dessa forma, conquistar autonomia e independência. Heidegger oferece a oportunidade de aliviar o peso da carga da tradição que determina nossa relação com o mundo, com as coisas e conosco mesmos. Sugere o desenvolvimento da capacidade de deixar-ser (Sein-lassen) com serenidade (Gelassenheit), diferente da tendência de exercer controle e domínio cada vez maior e irrestrito sobre tudo.

A desconstrução da metafísica, pelo caminho da ontologia fundamental que pergunta novamente pelo sentido do ser que havia sido esquecido e soterrado nas evidências e na clareza dos nossos saberes e fazeres, e que passa pela análise da existência humana como o lugar onde o ser encontra sua manifestação, pode se constituir como caminho para uma terapia da condição humana no mundo, uma volta para o lar esquecido. Não uma terapia que corrige e tranquiliza o indivíduo singular dentro do projeto de humanidade que compartilhamos, mas uma terapia do próprio projeto de humanidade que constitui nosso ser enquanto ser-aí, seres humanos situados, enraizados e envolvidos num projeto finito.

Sugerimos, por isso, a apropriação da meditação de Heidegger como possibilidade terapêutica das ciências das realidades específicas (ônticas). Mas essa terapia não consta de metodologias ou instrumentos específicos para casos específicos, mas uma perfuração do ‘lugar’ onde nos encontramos quando pesquisamos, pensamos, cuidamos uns dos outros e buscamos soluções para os problemas. Não é uma descrição objetiva de um caminho ou de outra postura em relação a um objeto ou questão, mas o desenvolvimento de uma atitude aberta e receptiva para as coisas, para além do quadro teórico-prático em que já sempre nos encontramos e que orienta nosso acesso aos fenômenos do mundo, sejam eles as patologias, o próprio ser humano, os objetos com que lidamos. Uma postura fenomenológica ou terapia que é uma constante preparação para acolher as coisas como elas se oferecem, sem sacrificá-las automaticamente a partir das pressuposições inquestionadas; um incessante preparar-se, sem nunca alcançar uma nova determinação objetiva definitiva em relação ao fenômeno em questão para nós.

Referências

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  • Trawny, P. (2013). Adyton. A filosofia esotérica de Heidegger Rio de Janeiro: Mauad X.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    22 Abr 2019
  • Aceito
    27 Mar 2021
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