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DO AUTOCONHECIMENTO AO AUTOCONCEITO: REVISÃO SOBRE CONSTRUTOS E INSTRUMENTOS PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES 1 1 Apoio e financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

DEL AUTO CONOCIMIENTO AL AUTO CONCEPTO: REVISIÓN SOBRE CONSTRUCTOS E INSTRUMENTOS PARA NIÑOS Y ADOLESCENTES

RESUMO.

O objetivo deste trabalho foi identificar o que há na literatura sobre o autoconhecimento e encontrar instrumentos disponíveis para avaliar tal construto voltado para o público de crianças e adolescentes, embasados na Terapia Cognitivo-Comportamental. Como método, foi desenvolvida uma revisão de literatura nas bases de dados PubMed, PsycINFO, Lilacs e Scielo. Durante a escolha dos descritores notou-se uma justaposição entre os conceitos autoconhecimento e autoconceito. A partir disso, ambos os conceitos foram tratados como sinônimos, adotando o termo autoconceito para se referir aos dois conceitos. A busca resultou em 11 artigos que atenderam aos critérios de seleção. Sobre os estudos, os anos de publicação variaram de 2008 a 2018, com objetivos variados, englobando desde problemas envolvidos com a saúde até sintomas e transtornos psíquicos na infância e/ou adolescência. O autoconceito mostrou se relacionar ao maior bem-estar e qualidade de vida. Além disso, foram encontrados sete instrumentos que avaliam o autoconceito na infância e/ou adolescência, sendo dois com adaptação para a população brasileira. Concluiu-se que ainda há poucos estudos na literatura sobre esse assunto, como também uma lacuna de instrumentos para avaliá-lo na população brasileira infanto-juvenil. Dessa forma, este estudo confirmou que o autoconhecimento é construto complexo e multidimensional e que há a necessidade de mais estudos na área.

Palavras-chave:
Autoconceito; escala de autoconceito infanto-juvenil; revisão de literatura

RESUMEN.

El objetivo de este estudio fue identificar qué hay en la literatura sobre el autoconocimiento y encontrar instrumentos disponibles para evaluar este constructo dirigido al público de niños y adolescentes, basado en la terapia cognitivo-conductual. Como método, se desarrolló una revisión de la literatura en las bases de datos PubMed, PsycINFO, Lilacs y Scielo. Durante la elección de los descriptores, hubo una yuxtaposición entre los conceptos de autoconocimiento y autoconcepto. A partir de esto, ambos conceptos fueron tratados como sinónimos, adoptando el término autoconcepto para referirse a ambos conceptos. La búsqueda arrojó 11 artículos que cumplieron con los criterios de selección. Con respecto a los estudios, los años de publicación oscilaron entre 2008 y 2018, con objetivos variados, desde problemas de salud hasta síntomas y trastornos psíquicos en la infancia y / o adolescencia, se demostró que el autoconcepto se relaciona con un mayor bienestar y calidad de vida. Además, encontramos siete instrumentos que evalúan el autoconcepto en la infancia y / o adolescencia, dos con adaptación a la población brasileña. Resulta que todavía hay pocos estudios en la literatura sobre este tema, así como una brecha de instrumentos para evaluarlo en la población juvenil brasileña. Por lo tanto, este estudio confirmó que el autoconocimiento es una construcción compleja y multidimensional y la necesidad de realizar más estudios en el área.

Palabras clave:
autoconocimiento; escala de autoconcepto de niños y jóvenes; revisión de literatura

ABSTRACT.

This study aimed to identify the material available in the literature about the self-knowledge and to find instruments to assess this construct aimed at the audience of children and adolescents, based on Cognitive-Behavioral Therapy. As a method, a literature review was performed in the PubMed, PsycINFO, Lilacs and Scielo databases. During the choice of descriptors, there was an overlap between the concepts self-knowledge and self-concept. From this, both concepts were treated as synonyms, adopting the term self-concept to refer to the two concepts. The search resulted in 11 articles that met the selection criteria. The studies were published from 2008 to 2018, with varied objectives, ranging from health problems to psychic symptoms and disorders in childhood and/or adolescence; self-concept was shown to be related to greater well-being and quality of life. In addition, seven instruments were found to assess self-concept in childhood and/or adolescence, two of which were adapted to the Brazilian population. In conclusion, there are still few studies in the literature on this subject, as well as a lack of instruments to assess it in the Brazilian population of children and adolescents. Thus, this study confirmed that self-knowledge is a complex and multidimensional construct and the need for further studies in the area.

Keywords:
Self-knowledge; children and youth self-concept scale; literature review

Introdução

Estudos e intervenções com o foco na promoção de saúde mental vêm crescendo na esfera da atenção primária. A promoção de saúde mental tem o objetivo de propiciar o desenvolvimento saudável do indivíduo, sendo visto como uma estratégia adicional para que ele possa exercer suas atividades diárias de forma eficaz e produtiva procurando um bem-estar para si e uma relação saudável com o ambiente. A saúde mental abarca algumas dimensões psicossociais, como emoções positivas, qualidade de vida percebida, funcionamento psicológico e social positivo, além de senso de pertencimento a grupos. Nesse sentindo, entende-se que a saúde mental não é simplesmente ausência de transtornos mentais, envolve também a percepção do indivíduo sobre seu bem-estar e qualidade de vida (McAllister, Knight, & Withyman, 2017McAllister, M., Knight, B. A., & Withyman, C. (2017). Merging contemporary learning theory with mental health promotion to produce an effective schools-based program. Nurse Education in Practice, 25, 74-79. doi: 10.1016/j.nepr.2017.05.005
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).

Uma das ferramentas que pode auxiliar nesse processo de percepção do indivíduo é o autoconhecimento. Considerado pela Organização Mundial da Saúde uma habilidade para a vida, este conceito é definido como a “[...] habilidade de reconhecer a si próprio, incluindo seu caráter, pontos fortes e limitações, desejos e desapontamentos” (World Health Organization [WHO], 1997World Health Organization(WHO). (1997). Promoting health through schools. Report of a WHO Expert Committee on Comprehensive School Health Education and Promotion (WHO Technical Report). Geneva, SW., p. 2), e não abarca apenas o conjunto de ideias de como o indivíduo se vê, mas também como se comporta (Goleman, 2006Goleman, D. (2006). Emotional intelligence(2a ed.). New York, NY: Basic Book.). Segundo Aránega, Sánchez e Pérez (2019Aránega, A. Y., Sánchez, R. C., & Pérez, C. G. (2019). Mindfulness’ effects on undergraduates perception of self-knowledge and stress levels. Journal of Business Research, 101, 441-446. doi: 10.1016/j.jbusres.2019.01.026
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), o autoconhecimento auxilia o manejo de emoções desagradáveis e faz parte da consciência emocional, a partir dele o indivíduo consegue identificar estados de humor, aplicá-los e manejá-los de acordo com as situações vivenciadas. Dessa forma, o autoconhecimento possibilita ao indivíduo reconhecer quando está estressado ou se sentindo sob pressão, podendo ser influenciado o tempo todo pelas situações que vivencia e pelas respostas comportamentais das outras pessoas (Vazire & Wilson, 2012Vazire, S., & Wilson, T. D. (2012). Handbook of self-knowledge. New York, NY: Guildford Press.).

Além disso, muitas vezes, o autoconhecimento pode ser pré-requisito para o desenvolvimento da empatia e, consequentemente, resultar em comunicações efetivas e relacionamentos interpessoais mais saudáveis, em conhecimento de recursos e limitações associados às normas e regras do ambiente social em que está inserido, bem como as consequências destas para si próprio. Dessa forma, o autoconhecimento engloba: a) recursos pessoais (capacidade de se observar, reconhecer seus próprios recursos e conseguir expressá-los e ter autocontrole); b) recursos externos (percepção de apoio da família, comunidade e instituições); c) dificuldades pessoais (reconhecimento de déficits, dificuldades e fontes de estresse) (Aránega et al., 2019Aránega, A. Y., Sánchez, R. C., & Pérez, C. G. (2019). Mindfulness’ effects on undergraduates perception of self-knowledge and stress levels. Journal of Business Research, 101, 441-446. doi: 10.1016/j.jbusres.2019.01.026
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; Del Prette & Del Prette, 2017Del Prette, A., & Del Prette, Z. A. P. (2017). Competência social e habilidades sociais: manual teórico-prático. Petrópolis, RJ: Vozes.).

Em virtude de o autoconhecimento ser uma habilidade para a vida, pode ser aprendido ou aprimorado em qualquer etapa do ciclo vital. No entanto, quanto mais cedo o indivíduo o desenvolve, mais chances ele tem de enfrentar de forma positiva e adaptativa os desafios da vida cotidiana (WHO, 1997World Health Organization(WHO). (1997). Promoting health through schools. Report of a WHO Expert Committee on Comprehensive School Health Education and Promotion (WHO Technical Report). Geneva, SW.). Alguns estudos ressaltam a importância do autoconhecimento na infância e adolescência, afirmando seu grande impacto sobre o comportamento diário, refletindo nas tomadas de decisões, no sucesso escolar e, consequentemente, na futura carreira profissional (Vazire & Wilson, 2012Vazire, S., & Wilson, T. D. (2012). Handbook of self-knowledge. New York, NY: Guildford Press.).

SegundoSubasree e Nair (2014Subasree, R., & Nair, A. R. (2014). The life skills assessment scale: the construction and validation of a new comprehensive scale for measuring life skills. Journal of Humanities and Social Science, 19(1), 50-58.doi: 10.9790/0837-19195058
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), o autoconhecimento auxilia a criança e o adolescente a entenderem seu próprio valor, construindo sua confiança para enfrentar as situações do dia a dia. É nesse cenário que o autoconhecimento é visto como uma ferramenta de promoção de saúde, pois está relacionado com o aumento de recursos e habilidades individuais que favorecem o bem-estar e a saúde psicológica (Oliveira, 2012Oliveira, S. A. (2012). Prevenção de saúde mental no Brasil na perspectiva da literatura e de especialistas da área (Dissertação de mestrado). Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília. Brasília.).

Dentre as abordagens que vão ao encontro dos princípios da promoção de saúde mental, destaca-se a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). Esta é uma abordagem psicológica que tem sido referenciada na literatura, principalmente no que tange aos programas de promoção de saúde, devido ao uso de estratégias e de intervenções com resultados positivos nesse âmbito (Murta & Barletta, 2015Murta, S. G., & Barletta, J. B. (2015). Promoção de saúde mental e prevenção aos transtornos mentais em terapia cognitivo-comportamental. In PROCOGNITIVA Programa de Atualização em Terapia Cognitivo-Comportamental: ciclo 1 (Vol. 4, p. 9-62). Porto Alegre, RS: ArtmedPanamericana.). Sendo assim, segundo essas autoras, a TCC está relacionada diretamente com a promoção de saúde, uma vez que potencializa os aspectos positivos da saúde mental, atuando em alguns fatores do bem-estar subjetivo.

Um dos focos da TCC é ampliar as crenças funcionais em relação à tríade cognitiva, além de potencializar a interpretação e a compreensão do ambiente de forma funcional, possibilitando estratégias de adaptação e enfrentamento. Nesse sentido, ao trabalhar com crenças relacionadas a si e aos outros e intensificar os recursos individuais, a TCC favorece o desenvolvimento do senso positivo de autoconhecimento, a partir da identificação dos pensamentos, sentimentos, comportamentos e reações corporais (Murta & Barletta, 2015Murta, S. G., & Barletta, J. B. (2015). Promoção de saúde mental e prevenção aos transtornos mentais em terapia cognitivo-comportamental. In PROCOGNITIVA Programa de Atualização em Terapia Cognitivo-Comportamental: ciclo 1 (Vol. 4, p. 9-62). Porto Alegre, RS: ArtmedPanamericana.). Dessa forma, quanto mais cedo a pessoa compreende esse processo de reconhecimento de seus pensamentos e distorções e como estes afetam nas respostas emocionais e comportamentais, mais chances ela tem de desenvolver pensamentos e comportamentos adaptativos e saudáveis (Friedberg et al., 2014Friedberg, R. D., Hoyman, L. C., Behar, S., Tabbarah, S., Pacholec, N. M., Keller, M., & Thordarson, M. A. (2014). We’ve come a long way, baby!: evolution and revolution in CBT with youth. Journal of Rational-Emotive & Cognitive-Behavior Therapy, 32(1), 4-14.doi: 10.1007/s10942-014-0178-3
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).

Partindo dessa ideia, entende-se que mapear o repertório de autoconhecimento nas crianças e adolescentes pode ser uma alternativa para delinear intervenções e auxiliar na minimização de problemas futuros (Justo, Santos, & Andretta, 2017Justo, A. R., Santos, A., & Andretta, L. (2017). Programas de prevenção na infância. In R. M. Caminha, M. G. Caminha & C. A. Dutra. A prática cognitiva na infância e na adolescência (p. 59-75). Novo Hamburgo, RS: Sinopsys.). Uma das maneiras de mapear é descrever de forma padronizada a frequência e a intensidade de repertórios de comportamentos, atitudes e habilidades, processo que faz parte da avaliação psicológica. Dentre todos os aspectos que englobam a grande área da avaliação psicológica, destaca-se o estudo aprofundado do construto, pois é a etapa inicial de qualquer trabalho que envolva mensurações de um objeto de estudo (American Education Research Association, 2014American Educational Research Association. (2014). Standards for educational and psychological testing. Washington. D.C.; Pasquali, 2010Pasquali, L. (2010). Testes referentes a construto: teoria e modelo de construção. In L. Pasquali. Instrumentação psicológica: fundamentos e práticas (p.165-198). Porto Alegre, RS: Artmed .).

O autoconhecimento é um construto complexo que envolve diferentes domínios. Devido à sua multiplicidade, ele se relaciona a diferentes conceitos, como automonitoria (Del Prette & Del Prette, 2017Del Prette, A., & Del Prette, Z. A. P. (2017). Competência social e habilidades sociais: manual teórico-prático. Petrópolis, RJ: Vozes.), autoconceito (Sisto & Martinelli, 2004Sisto, F. F., & Martinelli, S. C. (2004). Estudo preliminar para a construção da Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil (EAC-IJ). Interação em Psicologia, 8(2), 181-190.doi: 10.5380/psi.v8i2.3254
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), autocontrole (Sisto, Rueda, & Urquijo, 2010) e autoestima (Peixoto, 2003Peixoto, F. (2003). Auto-estima, autoconceito e dinâmicas relacionaisem contexto escolar (Tese de doutorado). Universidade do Minho, Braga.). Contudo, essa sobreposição de conceitos acaba por acarretar compreensões imprecisas desses construtos e a consequente dificuldade de mensuração adequada destes.

A partir do exposto acima, considerando a complexidade do autoconhecimento, a limitada quantidade de revisões sobre autoconhecimento e seus instrumentos, e a necessidade de aprimorar instrumentos e intervenções com essa temática, o objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão para identificar o que há na literatura sobre o construto autoconhecimento e por meio desta encontrar os instrumentos disponíveis para avaliar tal construto voltado para o público de crianças e adolescentes, embasados na TCC.

Método

Para atender ao objetivo proposto, empregou-se o método revisão da literatura. Segundo Botelho, Cunha e Macedo (2011Botelho, L. L. R., Cunha, C. C. de A., & Macedo, M. (2011). O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais. Gestão e Sociedade, 5(1), 121-136.doi:10.21171/ges.v5i11.1220
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, p. 123) a revisão da literatura é “[...] o primeiro passo para a construção do conhecimento científico [...]”, pois é por meio dela que surgem novas teorias e o reconhecimento de lacunas na literatura já existente. Vale ressaltar que existem diversas formas de elaboração de sínteses da literatura que, a depender do objetivo da pesquisa, apresentam diferentes passos metodológicos. Essa revisão seguiu as seguintes etapas: 1- identificação do tema e seleção da questão de pesquisa; 2- estabelecimento dos critérios de inclusão e exclusão; 3- identificação dos estudos pré-selecionados e selecionados; 4- categorização dos estudos selecionados; 5- análise e intepretação dos resultados; 6- apresentação da revisão/síntese do conhecimento. Além disso, foi utilizada a estratégia PICO para definir a pergunta de pesquisa (Botelho et al., 2011Botelho, L. L. R., Cunha, C. C. de A., & Macedo, M. (2011). O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais. Gestão e Sociedade, 5(1), 121-136.doi:10.21171/ges.v5i11.1220
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). Esta, por sua vez, resultou em dois questionamentos “O que há na literatura sobre o autoconhecimento?” e “Quais os instrumentos existentes para a faixa etária infanto-juvenil para sua avaliação?”

Para a escolha dos descritores, inicialmente foram utilizados os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), e os termos foram buscados nos idiomas português, inglês e espanhol, porém não houve resultado para busca por autoconhecimento e suas traduções. Devido a isso, foi feita uma busca também no Medical Subject Headings (MeSH). Nesse sistema, quando digitado self knowledge, houve o redirecionamento para a página de self concept. Assim, posteriormente, foi feita uma nova busca no DeCS, dessa vez pelo termo self-concept, e foram encontrados resultados. Partindo desse processo de busca, adotou-se autoconceito e autoconhecimento como um construto unificado.

Outro descritor utilizado foi cognitive therapy (Terapia Cognitiva), o qual, pela hierarquia do MeSH, engloba todos os outros termos associados, como cognitive behavioural therapy (Terapia Cognitivo-Comportamental). Cabe ressaltar que optou-se por utilizar esse descritor devido ao embasamento teórico do presente estudo. Os demais termos child, adolescent, adult foram encontrados nos descritores. Por fim, foram utilizados os seguintes descritores: ‘autoconceito’, self concept, ‘autoconcepto’, ‘Terapia Cognitiva’, cognitive therapy, ‘criança’, child, niño, ‘adolescente’, adolescent, ‘adulto’, adult.

A coleta dos dados ocorreu em novembro e dezembro de 2018, e foi feita uma atualização dessa busca em agosto de 2019. Essa coleta foi realizada a partir de periódicos indexados nas seguintes bases regionais e internacionais de dados bibliográficos: PUBMED, PSYCINFO, LILACS - Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde, e SciELO - Scientific Electronic Library Online. A busca específica utilizada para cada uma das bases, encontra-se na Quadro 1:

Quadro 1
Descrição das buscas realizadas nas respectivas bases de dados

O procedimento de seleção dos textos teve por base os seguintes critérios de inclusão: a) artigos científicos completos; b) idiomas inglês, português e espanhol; c) estudos cujo objetivo estava relacionado com o autoconceito; d) com embasamento da Terapia Cognitiva; e) faixa etária da amostra de 8 a 19 anos, pois é a faixa etária que compreende crianças alfabetizadas e adolescentes segundo a OMS (Brasil, 2007Brasil. Ministério da Saúde. (2007). Marco legal: saúde, um direito de adolescentes (Série A. Normas e Manuais Técnicos). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde.). Adicionalmente os critérios de exclusão foram: a) artigos em duplicidade; b) publicações que, apesar de citarem o autoconceito no resumo, não o tinham como objetivo principal; c) artigos que incluíam adultos na amostra, considerando adulto como indivíduo com idade acima de 19 anos.

Os trabalhos encontrados nas bases de dados foram selecionados em duas etapas. Na primeira, as pesquisas foram selecionadas por títulos e resumos. Cabe explicar que optou-se por pesquisar o autoconceito no resumo do artigo, pois sem essa condição a busca apontava muitos estudos em que o autoconceito não era objetivo primário, distanciando-se assim do objetivo da revisão. O segundo momento contou com a leitura dos artigos na íntegra. Essa etapa de seleção e leitura dos artigos de forma integral contou com dois juízes que avaliaram o material de maneira independente a fim de garantir o rigor dos critérios de inclusão e exclusão e, por conseguinte, manter a qualidade da revisão.

Após a seleção dos artigos, as principais informações foram transferidas para uma ficha de codificação, contendo os seguintes itens: ano de publicação, país, revista publicada, objetivo do estudo, público-alvo, como foi definido o construto autoconceito, delineamento do estudo, instrumento que avaliou o autoconceito, os resultados em relação a essa temática e o embasamento teórico. Após o preenchimento, analisaram-se os resultados. Para atender ao objetivo de investigar os instrumentos encontrados por meio da revisão, procuraram-se dados na literatura sobre os instrumentos encontrados nos artigos selecionados. Os resultados foram incluídos em uma segunda ficha de codificação apenas sobre os instrumentos com as seguintes informações: nome, autores, objetivo, faixa etária que se destina, número de itens, se abarcava subescalas, tipos de escalas de respostas e se havia adaptação para o Brasil.

Resultados

Resultados da busca na literatura

Como resultado da busca inicial foram encontrados 49 artigos que, após leitura dos títulos e resumos, resultou em um total de 17 artigos. Depois da leitura na íntegra pelos dois avaliadores, percebeu-se que três artigos tinham sido excluídos em concordância, para dois houve divergências e havia dúvidas se um outro artigo atendia aos critérios de inclusão. Dessa forma, foi realizada uma reunião de consenso, na qual foram discutidos esses três artigos restantes (duas divergências e um incerto). Após essa reunião os dois avaliadores chegaram a um consenso, excluindo essas três publicações. Dessa forma ao todo foram excluídos 6 artigos. Portanto, 11 artigos foram selecionados para a revisão da literatura. As etapas podem ser visualizadas na Figura 1.

Figura 1
Fluxograma da seleção dos artigos incluídos na revisão.

Caracterização dos estudos incluídos

A respeito dos 11 artigos incluídos na revisão, 63,63% (N=7) contaram com um delineamento transversal e o restante com um delineamento longitudinal. Os anos de publicação variaram de 2008 a 2018, com uma maior concentração em 2012, 2014 e 2016. Não houve nenhuma seleção nos anos de 2010, 2015 e 2017 (Figura 2). Quanto ao país de origem, todos os estudos incluídos foram internacionais, tendo uma maior ocorrência nos Estados Unidos. Houve um único estudo multicêntrico realizado na Alemanha e Suíça.

Figura 2
Distribuição dos anos de publicação dos artigos selecionados para a revisão.

O público-alvo desses artigos variou em estudos que englobava crianças e adolescentes (63,63%, N=7), e estudos com apenas adolescentes (36,36%, N=4). Não foram encontrados artigos com público-alvo apenas com crianças. Cabe ressaltar que essa classificação foi baseada na definição da Organização Mundial da Saúde que determina a adolescência entre 10 e 19 anos e crianças abaixo de 10 anos (Brasil, 2007Brasil. Ministério da Saúde. (2007). Marco legal: saúde, um direito de adolescentes (Série A. Normas e Manuais Técnicos). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde.).

Em relação aos objetivos dos estudos houve grande diversidade, englobando desde problemas envolvidos com a saúde até sintomas e transtornos psiquiátricos. Sendo assim, foram encontrados estudos que relacionaram o autoconceito com fobia social em crianças com epilepsia, excesso de peso, Transtorno de Tique Crônico, Transtornos psiquiátricos no geral sendo tratados com internação ou em ambiente ambulatorial, intenção de fumar em adolescentes, traço e estado emocional e Transtorno Depressivo.

Uma vez que procurou-se investigar definições do autoconceito, foram encontrados apenas quatro artigos que o explicaram: a) em um deles os autores o compreenderam como a percepção e conhecimento de si; b) dois trabalhos apresentaram uma perspectiva sócio cognitiva, na qual há uma construção social de atributos descritivos para que o indivíduo possa se definir; e c) o último artigo definiu apenas o autoconceito acadêmico, como uma estrutura de representação das habilidades e competências acadêmicas que uma pessoa possui. O restante dos artigos (N=7) não definiu autoconceito. Ainda deste número, apesar da ausência da definição, em alguns casos foi possível compreender domínios que englobavam o autoconceito ou outros conceitos relacionados a esse construto (identificados nas subescalas), porém em outros artigos nenhum tipo de definição ou correlação foi identificada (mais detalhes na Quadro 2).

Foram investigados também os principais resultados encontrados em relação ao autoconceito em cada estudo incluído. Identificou-se que o autoconceito se associa de forma negativa com sintomas e transtornos mentais, como ansiedade social, Transtorno de Tique Crônico e depressão, e, consequentemente, tem uma associação positiva com a melhora dos sintomas, emoções positivas, autoeficácia, entre outros aspectos positivos. Esses achados foram sintetizados na Quadro 2.

Quadro 2
Principais resultados encontrados em relação ao autoconceito sobre cada temática dos estudos incluídos

Caracterização dos instrumentos encontrados nos estudos

Por meio dos estudos incluídos na revisão, foram investigados quais instrumentos de medida os autores de cada estudo utilizaram para avaliar o autoconceito. Ao todo foram encontrados sete instrumentos, que se diferenciaram no que se refere ao número de itens, escalas de respostas e faixa etária da população a que se destina. Cabe ressaltar que alguns instrumentos não são exclusivos para avaliar autoconceito, e outros não são destinados para esse fim, como avaliam autoestima, porém os autores usaram em seus estudos para mensurar o autoconceito. Desses sete instrumentos, apenas dois têm adaptação para a população brasileira. Os instrumentos encontrados e suas características constam na Quadro , 3.

Quadro 3
Descrição dos instrumentos utilizados nos estudos incluídos quanto ao nome do instrumento, autor e data, objetivo, faixa etária a que se destina, número de itens, subescalas que compõem cada instrumento, escala de respostas e se há adaptação para população brasileira

Quadro 3
Continuação

Discussão

O objetivo desta revisão foi investigar e descrever o que há na literatura científica sobre o autoconhecimento de crianças e adolescentes, embasados na TCC, como também os instrumentos disponíveis para avaliar esse construto para o público infanto-juvenil. Deste modo, foram relatados os estudos encontrados, seus atributos e particularidades, bem como foram descritos os instrumentos utilizados nesses estudos e suas características.

Apesar de a literatura inserir o autoconhecimento como uma habilidade importante para a promoção de saúde mental de forma geral, ainda há divergências sobre a definição desse construto (Tomás & Oliver, 2004Tomás, J.M., & Oliver, A. (2004). Confirmatory factor analysis of a Spanish multidimensional scale of self-concept. Revista Interamericana de Psicología, 38, 285-293. Recuperado de:https://www.researchgate.net/publication/293077271_Confirmatory_factor_analysis_of_a_Spanish_multidimensional_scale_of_self-concept
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) e já no processo de escolha dos descritores percebeu-se essa dissonância de definições e termos. No processo de definição da pergunta de pesquisa, adotou-se o termo autoconhecimento, pois era o construto psicológico de interesse para o presente estudo. No entanto, após a criação da pergunta de pesquisa, foi necessário definir as estratégias de busca e parte desse processo foi escolher os descritores. Percebeu-se, então, que a definição do autoconhecimento se mistura com o autoconceito, consequência disso é o fato do termo autoconhecimento não ser um descritor. Olhando as definições desses termos na literatura, compreendeu-se que ambos são definidos como a compreensão e a percepção que o indivíduo tem de si (Sisto et al., 2010Sisto, F. F., Rueda, F. J. M., & Urquijo, S. (2010). Relación entre los constructos autocontrol y autoconcepto en niños y jóvenes. Liberabit, 16(2), 217-226. Recuperado de: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=68617161010
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; Sisto & Martinelli, 2004), como também foi identificado nos artigos incluídos na revisão que contavam com essa mesma definição do autoconceito (Jones, Blocher, Jackson, Sung, & Fujikawa, 2014Jones, J. E., Blocher, J. B., Jackson, D. C., Sung, C., & Fujikawa, M. (2014).Social anxiety and self-concept in children with epilepsy: A pilot intervention study. Seizure, 23(9), 780-785. doi: 10.1016/j.seizure.2014.06.011
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; Gottlieb, Martinovich, Meyers, & Reinecke, 2016Gottlieb, L., Martinovich, Z., Meyers, K. M., & Reinecke, M. A. (2016).Treatment for depression enhances protection: findings from the Treatment for Adolescents With Depression Study (TADS). International Journal of Cognitive Therapy, 9(1), 38-56. doi: 10.1521/ijct_2016_09_02
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).

Apesar dessa dificuldade com o construto a priori, optou-se por manter o estudo com ele, pois, segundo American Education Research Association (2014American Educational Research Association. (2014). Standards for educational and psychological testing. Washington. D.C.) e Pasquali (2010Pasquali, L. (2010). Testes referentes a construto: teoria e modelo de construção. In L. Pasquali. Instrumentação psicológica: fundamentos e práticas (p.165-198). Porto Alegre, RS: Artmed .), a ausência de teorias sólidas sobre um construto não pode ser um empecilho para seu aprofundamento teórico, sendo necessário, neste ponto, levantar toda evidência empírica para chegar ao início de uma nova teoria. Sendo assim, os termos autoconhecimento e autoconceito foram unificados, sendo autoconceito o termo utilizado como descritor para atender às exigências do estudo de investigar o autoconhecimento, e também contemplar os critérios de inclusão.

Outro ponto sobre o autoconceito é que sua definição também engloba uma construção sociocognitiva, à medida que a percepção que o indivíduo tem de si está relacionada com as experiências que vivencia ao longo de sua trajetória desenvolvimental (Shadel, Tharp-Taylor, & Fryer, 2008Shadel, W. G., Tharp-Taylor, S., & Fryer, C. S. (2008). Exposure to cigarette advertising and adolescents’ intentionsto smoke: the moderating role of the developing self-concept. Journal of Pediatric Psychology, 33(7), 751-760.doi: 10.1093/jpepsy/jsn025
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). Esse processo também ocorre com o autoconhecimento, uma vez que em sua composição há os recursos externos, isto é, a percepção que o sujeito tem sobre apoio da família, comunidade e possíveis instituições em que está inserido (Aránega et al., 2019Aránega, A. Y., Sánchez, R. C., & Pérez, C. G. (2019). Mindfulness’ effects on undergraduates perception of self-knowledge and stress levels. Journal of Business Research, 101, 441-446. doi: 10.1016/j.jbusres.2019.01.026
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; Del Prette & Del Prette, 2017Del Prette, A., & Del Prette, Z. A. P. (2017). Competência social e habilidades sociais: manual teórico-prático. Petrópolis, RJ: Vozes.). Sendo assim, essa semelhança de construções de definições é, também, outro fator que permitiu a sobreposição dos construtos autoconhecimento e autoconceito.

Verifica-se que o autoconceito pode ser um fator de proteção importante, o que, por sua vez, o torna um elemento fundamental em programas de prevenção e promoção de saúde mental. Por exemplo, o autoconceito pode ser estabelecido como meta proximal ou distal em programas com foco na pessoa, ou seja, em intervenções com objetivo de fortalecer os recursos cognitivos e comportamentais de crianças e adolescentes (Murta & Barletta, 2015Murta, S. G., & Barletta, J. B. (2015). Promoção de saúde mental e prevenção aos transtornos mentais em terapia cognitivo-comportamental. In PROCOGNITIVA Programa de Atualização em Terapia Cognitivo-Comportamental: ciclo 1 (Vol. 4, p. 9-62). Porto Alegre, RS: ArtmedPanamericana.). Além disso, as autoras apontam que o aumento de fatores de proteção à saúde pode impactar na diminuição de problemas e riscos, favorecendo o pleno desenvolvimento saudável.

A TCC tem sido considerada uma abordagem de referência para programas de prevenção e promoção de saúde. Murta e Barletta (2015Murta, S. G., & Barletta, J. B. (2015). Promoção de saúde mental e prevenção aos transtornos mentais em terapia cognitivo-comportamental. In PROCOGNITIVA Programa de Atualização em Terapia Cognitivo-Comportamental: ciclo 1 (Vol. 4, p. 9-62). Porto Alegre, RS: ArtmedPanamericana., p. 15) concordam com essa ideia ao afirmarem que “[...] uma maneira de potencializar os recursos individuais nos programas com foco na pessoa é desenvolver o senso positivo de autoeficácia, o autoconceito e o autoconhecimento, a partir da identificação dos pensamentos, dos sentimentos, dos comportamentos e das reações corporais”. Desta forma, as autoras apontam que a forma de trabalho da TCC, com ressignificação de crenças, manejo de emoções e aumento sobre o conhecimento do próprio funcionamento da pessoa, vai ao encontro da promoção de bem-estar e da prevenção de desfechos negativos.

Com esse entendimento, a presente pesquisa foi embasada na TCC, pois esta preconiza que o paciente compreenda a visão de si, do mundo e do futuro de forma funcional, e também que a interpretação da situação influencia suas emoções e comportamentos (Beck, 2013Beck, J. (2013). Terapia cognitiva: teoria e prática (2a ed.). Porto Alegre, RS: Artmed.; Friedberg et al., 2014Friedberg, R. D., Hoyman, L. C., Behar, S., Tabbarah, S., Pacholec, N. M., Keller, M., & Thordarson, M. A. (2014). We’ve come a long way, baby!: evolution and revolution in CBT with youth. Journal of Rational-Emotive & Cognitive-Behavior Therapy, 32(1), 4-14.doi: 10.1007/s10942-014-0178-3
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). Sendo assim essa compreensão auxilia no desenvolvimento do autoconhecimento, por isso acredita-se que a TCC potencializa esse processo. É fato que definir uma abordagem teórica durante o processo de busca afunilou os resultados, porém isso fez-se necessário, uma vez que é importante que uma pesquisa tenha um embasamento teórico para norteá-la e fundamentá-la (Marconi & Lakatos, 2003Marconi, M. A., & Lakatos, E. M. (2003). Fundamentos da metodologia científica. São Paulo, SP: Atlas.).

Por meio da revisão foi possível observar a variedade de assuntos que estão relacionados com o autoconceito. Foram identificados estudos que investigavam esse conceito ligado a problemas de saúde como o excesso de peso (Jelalian, Sato, Hart, 2011Jelalian, E., Sato, A., & Hart, C. N. (2011). The effect of group-based weight control intervention on adolescent psychosocial outcomes: perceived peer rejection, social anxiety and self-concept. Child Health Care, 40(3), 197-211. doi:10.1080/02739615.2011.590391.
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), à falta do conhecimento nutricional (Rabiei, Sharifirad, Azadbakht, & Hassanzadeh, 2013Rabiei, L., Sharifirad, G. R., Azadbakht, L., & Hassanzadeh, A. (2013). Understanding the relationship between nutritional knowledge, self efficacy, and self concept of high school students suffering from overweight. Journal of Education and Health Promotion, 2, 1-6. doi: 10.4103/2277-9531.115834
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) e a intenções de fumar (Shadel et al., 2008Shadel, W. G., Tharp-Taylor, S., & Fryer, C. S. (2008). Exposure to cigarette advertising and adolescents’ intentionsto smoke: the moderating role of the developing self-concept. Journal of Pediatric Psychology, 33(7), 751-760.doi: 10.1093/jpepsy/jsn025
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, Shadel, Tharp-Taylor, & Fryer, 2009). Foram encontrados, também, estudos que relacionavam o autoconceito com transtorno psiquiátricos, como Transtorno Depressivo (Dozois, Eichstedt, Collins, Phoenix, & Harris, 2012Dozois, D. J. A., Eichstedt, J. A., Collins, K. A., Phoenix, E., & Harris, K. (2012). Core beliefs, self-perception, and cognitive organization in depressed adolescents. International Journal of CognitiveTherapy, 5(1), 99-112. doi: 10.1521/ijct.2012.5.1.99
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; Gottlieb et al., 2016Gottlieb, L., Martinovich, Z., Meyers, K. M., & Reinecke, M. A. (2016).Treatment for depression enhances protection: findings from the Treatment for Adolescents With Depression Study (TADS). International Journal of Cognitive Therapy, 9(1), 38-56. doi: 10.1521/ijct_2016_09_02
https://doi.org/10.1521/ijct_2016_09_02...
) e o Transtorno de Tique Crônico (Hanks, McGuire, Lewin, Storch, & Murphy, 2016Hanks, C. E., McGuire, J. F., Lewin, A. B., Storch, E. A., & Murphy, T. K. (2016). Clinical correlates and mediators of self-concept in youth with chronic tic disorders. Child Psychiatry & Human Development, 47(1), 64-74. doi: 10.1007/s10578-015-0544-0
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; Storch et al., 2012Storch, E. A., Morgan, J. E., Caporino, N. E., Brauer, L., Lewin, A. B., Piacentini, J., & Murphy, T. K. (2012). Psychosocial treatment to improve resilience and reduce impairment in youth with tics: an intervention case series of eight youth. Journal of Cognitive Psychotherapy: An International Quarter, 26(1), 57-70.doi: 10.1891/0889-8391.26.1.57
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). E, ainda, estudos investigativos sobre a diferença do autoconceito em traço ou estado emocional (Bieg, Goetz, & Lipnevich, 2014Bieg, M., Goetz, T., & Lipnevich, A. A. (2014). What students think they feel differs from what they really feel - academic self-concept moderates the discrepancy between students’ trait and state emotional self-reports. PlosOne, 9(3), 1-9.doi: 10.1371/journal.pone.0092563
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) e em pacientes que foram internados em comparação com pacientes que receberam atendimento ambulatorial (Choi & Ferro, 2018Choi, C., & Ferro, M. A. (2018). Comparing self-concept among youth currently receiving inpatient versus outpatient mental health services. Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 27(1), 69-74. Recuperado de:https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5777692/
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). Dessa forma, percebeu-se a diversidade que os estudos de autoconceito podem proporcionar. Essa variedade também ocorre em estudos brasileiros, uma vez que foram encontradas pesquisas sobre o autoconceito em adolescentes e suas relações com aspectos psicológicos, sociais e físicos (Mendonça & Fleith, 2005Mendonça, P. V. C. F., & Fleith, D. S. (2005). Relação entre criatividade, inteligência e autoconceito em alunos monolíngues e bilíngues. Psicologia Escolar e Educação, 9(1), 59-70.doi: 10.1590/S1413-85572005000100006
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; Peixoto, 2003Peixoto, F. (2003). Auto-estima, autoconceito e dinâmicas relacionaisem contexto escolar (Tese de doutorado). Universidade do Minho, Braga.).

Os resultados da presente pesquisa confirmam os dados de outros autores que também encontraram uma grande quantidade de pesquisas que abordam problemas relacionados com o autoconceito dos estudantes do ensino fundamental e médio, o que demonstra um interesse em estudar essa variável (Sisto & Martinelli, 2004Sisto, F. F., & Martinelli, S. C. (2004). Estudo preliminar para a construção da Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil (EAC-IJ). Interação em Psicologia, 8(2), 181-190.doi: 10.5380/psi.v8i2.3254
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). No entanto, essa diversidade não se aplica ao público de idade pré-escolar, uma vez que são poucas as investigações nessa temática (Pinto, Gatinho, Silva, Veríssimo, & Santos, 2013Pinto, A., Gatinho, A., Silva, F., Veríssimo, M., & Santos, A. J. (2013). Vinculação e modelo interno dinâmico do self em crianças de idade pré-escolar. Psicologia, Saúde & Doença, 14, 515-528. Recuperado de:http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-00862013000300011
http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?scri...
). Esse dado da literatura também é condizente com os resultados do presente estudo, pois, apesar do uso do descritor criança (child e niño) sem filtros de idade, não foi encontrado nem mesmo um estudo com o público-alvo inferior a sete anos.

Por meio desta revisão também se identificou de forma surpreendente a ausência de estudos nacionais sobre a temática. Cabe frisar que apesar do autoconceito ser um tema estudado há mais de 20 anos (WHO, 1997World Health Organization(WHO). (1997). Promoting health through schools. Report of a WHO Expert Committee on Comprehensive School Health Education and Promotion (WHO Technical Report). Geneva, SW.), os estudos com foco nele são dos últimos 11 anos (2008-2019), conforme os achados nesta revisão. Uma vez que esse tema está relacionado com estudos de promoção de saúde, levanta-se a hipótese de que houve atraso para investigar estudos sobre o autoconceito, pois, apesar dos princípios preventivos e comunitários serem adotados nos anos 1970 e 1980, o foco nessas temáticas e a aplicabilidade de ações de promoção de saúde tiveram ênfase e crescimento por volta dos últimos 10 anos (Schneider, 2015Schneider, D. R. (2015). Da saúde mental à atenção psicossocial: trajetórias da prevenção e da promoção de saúde. In S. G. Murta, C. Leandro-França, K. B. dos Santos & L. Polejack. Prevenção e promoção em saúde mental: fundamentos, planejamentos e estratégias de intervenção (p. 34-53). Novo Hamburgo, RS: Sinopsys.).

Considerando ainda o contexto de promoção de saúde, foi encontrada, por meio dos estudos incluídos, associação positiva entre o autoconceito e as seguintes variáveis: funcionamento social (Jelalian et al., 2011Jelalian, E., Sato, A., & Hart, C. N. (2011). The effect of group-based weight control intervention on adolescent psychosocial outcomes: perceived peer rejection, social anxiety and self-concept. Child Health Care, 40(3), 197-211. doi:10.1080/02739615.2011.590391.
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), autoeficácia e conhecimento nutricional (Rabiei et al., 2013Rabiei, L., Sharifirad, G. R., Azadbakht, L., & Hassanzadeh, A. (2013). Understanding the relationship between nutritional knowledge, self efficacy, and self concept of high school students suffering from overweight. Journal of Education and Health Promotion, 2, 1-6. doi: 10.4103/2277-9531.115834
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) e emoções positivas (Bieg et al., 2014Bieg, M., Goetz, T., & Lipnevich, A. A. (2014). What students think they feel differs from what they really feel - academic self-concept moderates the discrepancy between students’ trait and state emotional self-reports. PlosOne, 9(3), 1-9.doi: 10.1371/journal.pone.0092563
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). Sendo assim, esses achados vão ao encontro da literatura que afirma o autoconceito como um fator de proteção (Gottlieb et al., 2016Gottlieb, L., Martinovich, Z., Meyers, K. M., & Reinecke, M. A. (2016).Treatment for depression enhances protection: findings from the Treatment for Adolescents With Depression Study (TADS). International Journal of Cognitive Therapy, 9(1), 38-56. doi: 10.1521/ijct_2016_09_02
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), que facilita as relações positivas e implica diretamente no bem-estar e na satisfação pessoal (Esnaola, Goñi, & Madariaga, 2008Esnaola, I., Goñi, A., & Madariaga, J. M. (2008). El autoconcepto: perspectivas de investigación. Revista de Psicodidáctica, 13(1), 179-194. Recuperado de:http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=17513105
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; Martínez-Antón, Buelga, & Cava, 2007Martínez-Antón, M., Buelga, S., & Cava, M. J. (2007). La satisfacción con la vida en la adolescencia y su relación con la autoestima y el ajuste escolar. Anuario de Psicología, 38(2), 5-15. Recuperado de: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=97017404013
http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=97...
). É importante ressaltar que todos os estudos longitudinais desta revisão mostraram um aumento do autoconceito após a intervenção.

No que se refere às associações negativas do autoconceito, foi encontrado que baixo repertório dessa habilidade em crianças e adolescentes pode levar ao desenvolvimento de mais ansiedade (Jones et al., 2014Jones, J. E., Blocher, J. B., Jackson, D. C., Sung, C., & Fujikawa, M. (2014).Social anxiety and self-concept in children with epilepsy: A pilot intervention study. Seizure, 23(9), 780-785. doi: 10.1016/j.seizure.2014.06.011
https://doi.org/10.1016/j.seizure.2014.0...
), agravar os sintomas de Transtorno de Tique Crônico, TDAH, TOC (Hanks et al., 2016Hanks, C. E., McGuire, J. F., Lewin, A. B., Storch, E. A., & Murphy, T. K. (2016). Clinical correlates and mediators of self-concept in youth with chronic tic disorders. Child Psychiatry & Human Development, 47(1), 64-74. doi: 10.1007/s10578-015-0544-0
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), depressão (Dozois et al., 2012Dozois, D. J. A., Eichstedt, J. A., Collins, K. A., Phoenix, E., & Harris, K. (2012). Core beliefs, self-perception, and cognitive organization in depressed adolescents. International Journal of CognitiveTherapy, 5(1), 99-112. doi: 10.1521/ijct.2012.5.1.99
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; Hanks et al., 2016Hanks, C. E., McGuire, J. F., Lewin, A. B., Storch, E. A., & Murphy, T. K. (2016). Clinical correlates and mediators of self-concept in youth with chronic tic disorders. Child Psychiatry & Human Development, 47(1), 64-74. doi: 10.1007/s10578-015-0544-0
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) e fobia social (Choi & Ferro, 2018Choi, C., & Ferro, M. A. (2018). Comparing self-concept among youth currently receiving inpatient versus outpatient mental health services. Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 27(1), 69-74. Recuperado de:https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5777692/
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; Jones et al., 2014Jones, J. E., Blocher, J. B., Jackson, D. C., Sung, C., & Fujikawa, M. (2014).Social anxiety and self-concept in children with epilepsy: A pilot intervention study. Seizure, 23(9), 780-785. doi: 10.1016/j.seizure.2014.06.011
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). Também foi encontrada uma associação negativa entre o autoconceito e autoconflito, intenções de fumar (Shadel et al., 2008Shadel, W. G., Tharp-Taylor, S., & Fryer, C. S. (2008). Exposure to cigarette advertising and adolescents’ intentionsto smoke: the moderating role of the developing self-concept. Journal of Pediatric Psychology, 33(7), 751-760.doi: 10.1093/jpepsy/jsn025
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, 2009Shadel, W. G., Tharp-Taylor, S., & Fryer, C. S. (2009). How does exposure to cigarette advertising contribute to smoking in adolescents? The role of the developing self-concept and identification with advertising models. AddictiveBehabiors, 34(11), 932-937.doi: 10.1016/j.addbeh.2009.05.014
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) e emoções negativas (Bieg et al., 2014Bieg, M., Goetz, T., & Lipnevich, A. A. (2014). What students think they feel differs from what they really feel - academic self-concept moderates the discrepancy between students’ trait and state emotional self-reports. PlosOne, 9(3), 1-9.doi: 10.1371/journal.pone.0092563
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). Esses dados também podem ser encontrados em outros estudos que afirmam que eventos estressores durante a infância e adolescência podem provocar consequências psicológicas menos positivas, afetando assim a percepção de si e dos outros, alterando consequentemente o autoconceito desses jovens (Lipp, 2014Lipp, M. (2014). Stress em crianças e adolescentes. Campinas, SP: Papirus.).

Diante desse cenário em que o autoconceito pode ser visto como um fator de proteção, juntamente com a visão de que a TCC auxilia na formação e potencialização dessa habilidade, as intervenções embasadas nessa abordagem que têm o intuito de promover autoconhecimento/autoconceito podem gerar resultados positivos tanto em aspectos relacionados ao bem-estar do indivíduo, como na prevenção de sintomas e psicopatologias. Além disso, como já mencionado, quanto mais cedo se dá o desenvolvimento dessa habilidade, mais chances há de resultados positivos para a criança/adolescente, promovendo saúde, bem-estar e qualidade de vida para a vida adulta. Por isso, torna-se essencial estudar e intervir ainda na infância e adolescência de modo a proporcionar a esses indivíduos maiores níveis de satisfação pessoal ao longo da vida (Faria, 2003Faria, L. (2003). A importância do auto-conceito em contexto escolar. In C. M. L. Pires, P. J. Costa, S. Brites & S. Ferreira. Psicologia, sociedade & bem-estar (p. ?-?). Leiria, PT: Editorial Diferença.; Silva, 2009Silva, B. C. L. (2009). O autoconceito em crianças e pré-adolescentes numa amostra de famílias de origem e famílias de acolhimento (Monografia final de curso). Universidade Fernando Pessoa, Porto.).

No que se refere aos instrumentos encontrados, eles apresentaram algumas divergências já esperadas, como número de itens, tipos de escalas de resposta, faixa etária a que se destina. No entanto, houve também semelhanças. Todos os instrumentos são de autorrelato. Essa informação vai ao encontro da própria definição de autoconceito, que corresponde à percepção de si (Aránega et al., 2019Aránega, A. Y., Sánchez, R. C., & Pérez, C. G. (2019). Mindfulness’ effects on undergraduates perception of self-knowledge and stress levels. Journal of Business Research, 101, 441-446. doi: 10.1016/j.jbusres.2019.01.026
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; Sisto & Martinelli, 2004Sisto, F. F., & Martinelli, S. C. (2004). Estudo preliminar para a construção da Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil (EAC-IJ). Interação em Psicologia, 8(2), 181-190.doi: 10.5380/psi.v8i2.3254
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), por isso faz sentido que os instrumentos sirvam para que a própria criança ou adolescente faça uma avaliação sobre si.

Além disso, todas as escalas apresentaram subescalas ou domínios que compõem o autoconceito. Esse resultado condiz com a literatura que afirma que o autoconceito é multidimensional, pois compreende que é determinado por diversos fatores ou dimensões, como domínio social, acadêmico, físico, entre outras possibilidades (Harter, 2012Harter, S. (2012). The construction of the self. New York, NY: The Guilford Press.; Pinto et al., 2013Pinto, A., Gatinho, A., Silva, F., Veríssimo, M., & Santos, A. J. (2013). Vinculação e modelo interno dinâmico do self em crianças de idade pré-escolar. Psicologia, Saúde & Doença, 14, 515-528. Recuperado de:http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-00862013000300011
http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?scri...
).

No entanto, cabe ressaltar que, apesar da presença das subescalas, elas se diferenciaram de forma considerável, pois, por exemplo, umas contam com itens que avaliam felicidade e satisfação; outras avaliam competência atlética; outra, ainda, honestidade. Isso mostra que há uma gama de conceitos dentro do autoconceito que são muito diferentes entre si. Esse resultado levanta um questionamento sobre a necessidade de padronizar ou afunilar esse construto em termos de definição para facilitar sua mensuração. Isto é, um instrumento apresenta validade quando avalia aquilo que se pretende medir (Markus & Borsboom, 2013Markus, K. A., & Borsboom, D. (2013). Frontiers of tests validity theory: measurement, causation, and meaning (Multivariate Applications Series). New York, NY: Routledge.), porém este objeto que está sendo medido precisa ter características pontuais e objetivas suficientes para que sejam mensuráveis e reflitam o traço latente do construto, caso contrário torna-se um instrumento pobre em validade e pouco robusto, tornando seu uso inviável (Hutz, Bandeira, & Trentini, 2015Hutz, C. S., Bandeira, D. R., & Trentini, C. M. (Org.) (2015). Psicometria. Porto Alegre, RS: Artmed .). Dessa forma, ressalta-se que o problema não está em ser multidimensional, mas sim ser visto na literatura de forma muito diferente em termos de construto, pois torna-se difícil estabelecer um padrão para sua avaliação/mensuração.

Segundo Sisto e Martinelli (2004Sisto, F. F., & Martinelli, S. C. (2004). Estudo preliminar para a construção da Escala de Autoconceito Infanto-Juvenil (EAC-IJ). Interação em Psicologia, 8(2), 181-190.doi: 10.5380/psi.v8i2.3254
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), no Brasil, boa parte dos instrumentos que objetivam avaliar o autoconceito está publicada em dissertações de mestrado e teses de doutorado que nem sempre estão disponíveis nem são de fácil acesso. Observa-se que esse dado ainda é presente, pois infelizmente apenas dois dos instrumentos encontrados nessa revisão têm adaptação para a população brasileira, sendo que um deles (The Self-Perception Profile for Children - SPPC) não foi encontrado na literatura - acredita-se que não é de livre acesso. Já o segundo instrumento (Cognitive Triad Inventory for Children - CTI-C) não se destina exclusivamente a avaliar o autoconceito, apenas parte dele, seu objetivo principal é mensurar a tríade cognitiva, que corresponde à visão que o indivíduo tem sobre si, o mundo e o futuro (Kaslow, Stark, Printz, Livingston, & Tsai, 1992Kaslow, N. J., Stark, K. D., Printz, B., Livingston, R., & Tsai, S. L. (1992). Cognitive triad inventory for children: development and relation to depression and anxiety. Journal of Clinical Child Psychology, 21(4), 339-347. doi: https://doi.org/10.1207/s15374424jccp2104_3
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).

Por fim, foi possível perceber com esta revisão que o construto autoconceito/autoconhecimento é passível de justaposição, pois suas definições são semelhantes e os descritores confirmam essa equivalência. Estudos nessa área ainda são escassos e precisam ser mais investigados. No que se refere a mensuração desse construto, também foi identificada uma lacuna de instrumentos disponíveis com essa finalidade para a população brasileira infanto-juvenil.

Considerações finais

Este estudo teve o objetivo de realizar uma revisão acerca do que há na literatura sobre o autoconhecimento para crianças e adolescentes, embasados na TCC, bem como identificar os instrumentos para avaliar tal construto nesse público-alvo. De modo geral, apesar de ter poucos estudos disponíveis na literatura, os resultados confirmaram que o autoconhecimento é construto complexo e multidimensional, permitindo uma interlocução com o autoconceito, resultando em encontrar a mesma definição para ambos, sendo tratados como um único construto (utilizando o autoconceito para tratar ambos).

O autoconceito foi compreendido como fator de proteção para crianças e adolescentes, contribuindo para o bem-estar e satisfação pessoal do indivíduo. Além disso, é um construto que responde as intervenções e está associado de forma positiva com demais aspectos positivos do indivíduo, da mesma forma que se associa negativamente com sintomas, problemas de saúde e transtornos mentais. A TCC é uma abordagem que incentiva o paciente na busca de suas potencialidades e no desenvolvimento de habilidades, sendo uma alternativa para o desenvolvimento do autoconceito.

Este trabalho teve como limitação o encontro dos descritores, bem como um número pequeno de estudos atender aos critérios de inclusão. Dessa forma, sugere-se que sejam feitos mais estudos com novas combinações de descritores e operadores booleanos, como também diferentes critérios de inclusão, na tentativa de encontrar outros resultados. Além disso, a partir desta revisão sugere-se a execução de mais estudos com ambos os construtos, não apenas com caráter de revisão, mas também estudos de intervenção, como forma de ampliar o conhecimento sobre eles destinados ao público infanto-juvenil. Cabe ressaltar também que se encontrou uma escassez de instrumentos destinados à população brasileira. Sendo assim, faz-se necessário o desenvolvimento de instrumentos validados para avaliar o autoconhecimento em crianças e adolescentes brasileiros.

Portanto, a partir deste estudo foi possível compreender a importância de se fazer uma revisão para explorar assuntos ainda pouco tratados na literatura. Além disso, devido à escassez de estudos na área do autoconhecimento/autoconceito, bem como à ausência de instrumentos com essa temática destinados a população infanto-juvenil brasileira, ressalta-se a importância do presente estudo como um ponto de partida para novas pesquisas tanto para explorar mais o assunto, ampliar os estudos de desenvolvimento e validação de escalas e intervenções embasadas na TCC, quanto para a promoção do autoconhecimento/autoconceito para crianças e adolescentes.

Agradecimentos

Esse projeto contou com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por meio do fornecimento de uma bolsa de doutorado para a primeira autora, bem como com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sendo que a quarta autora é bolsista produtividade. Todas as autoras contribuíram para as etapas de elaboração deste trabalho. As autoras declaram que não houve concorrentes ou potenciais conflitos de interesse em relação a este estudo.

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    Apoio e financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    17 Fev 2020
  • Aceito
    12 Jan 2021
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