Acessibilidade / Reportar erro

Poder colonial e etnicidade no Chile: territorialização e reestruturação entre os Mapuche da época colonial

Pouvoir colonial et ethnicité au Chili: territorialisation et restructuration chez les Mapuches de l'époque coloniale

Colonial power and ethnicity in Chile: Territorialization and restructuring among the Mapuche in the colonial period

Resumos

Neste trabalho analisamos os mecanismos mediante os quais os grupos indígenas do sul do Chile conseguiram eximir-se da empresa de conquista e colonização levada a cabo pelos hispano-crioulos entre o século XVI e o início do século XIX. Mostramos como depois de um primeiro período, durante o qual os Mapuche resistiram militarmente à violência da conquista (1550-1650), logo começaram a transformar sua estratégia em função do novo contexto de negociação e comércio com os agentes coloniais, para constituir-se numa etnia política e economicamente poderosa.

Mapuche; Territorialização; Fronteira


Cet article aborde les mécanismes sociaux permettant de rendre compte de la résistance pluriséculaire des indiens du centre sud du Chili à l'entreprise coloniale. Nous montrons que, suite à une période durant laquelle les Reche-Mapuche résistaient militairement à la violence de la conquête (1550-1650), on enregistre une transformation des stratégies de résistance et d'adaptation de ces groupes qui connaissent une reconfiguration en profondeur de leur économie, de leur système politique et de leur forme de définition identitaire.

Mapuche; Territorialisation; Frontière


This paper deals with the Reche/Mapuche people's resistance to the Spanish conquest and colonization of South-Central Chile. After having successfully opposed the military conquest of their territory (1550-1650), these native groups adapted to the new context of the frontier (1650-1810) and became skilled traders and negotiators.

Mapuche; Territorialization; Frontier


OS ÍNDIOS NA HISTÓRIA: ABORDAGENS INTERDISCIPLINARES

Poder colonial e etnicidade no Chile: territorialização e reestruturação entre os Mapuche da época colonial

Colonial power and ethnicity in Chile. Territorialization and restructuring among the Mapuche in the colonial period

Pouvoir colonial et ethnicité au Chili: territorialisation et restructuration chez les Mapuches de l'époque coloniale

Guillaume Boccara

Universidad Católica Del Norte, Chile. E-mail: chumleimi@yahoo.br

RESUMO

Neste trabalho analisamos os mecanismos mediante os quais os grupos indígenas do sul do Chile conseguiram eximir-se da empresa de conquista e colonização levada a cabo pelos hispano-crioulos entre o século XVI e o início do século XIX. Mostramos como depois de um primeiro período, durante o qual os Mapuche resistiram militarmente à violência da conquista (1550-1650), logo começaram a transformar sua estratégia em função do novo contexto de negociação e comércio com os agentes coloniais, para constituir-se numa etnia política e economicamente poderosa.

Palavras-chave: Mapuche – Territorialização – Fronteira

ABSTRACT

This paper deals with the Reche/Mapuche people's resistance to the Spanish conquest and colonization of South-Central Chile. After having successfully opposed the military conquest of their territory (1550-1650), these native groups adapted to the new context of the frontier (1650-1810) and became skilled traders and negotiators.

Keywords: Mapuche – Territorialization – Frontier

RÉSUMÉ

Cet article aborde les mécanismes sociaux permettant de rendre compte de la résistance pluriséculaire des indiens du centre sud du Chili à l'entreprise coloniale. Nous montrons que, suite à une période durant laquelle les Reche-Mapuche résistaient militairement à la violence de la conquête (1550-1650), on enregistre une transformation des stratégies de résistance et d'adaptation de ces groupes qui connaissent une reconfiguration en profondeur de leur économie, de leur système politique et de leur forme de définition identitaire.

Mots-clés: Mapuche – Territorialisation – Frontière

Introdução

Até há pouco mais de duas décadas, os três séculos de contatos hispano-mapuches no centro-sul do Chile durante a época colonial eram percebidos basicamente por meio do prisma guerreiro. A narração dos acontecimentos da fronteira meridional do Reino de Chile quase se resumia à enumeração das contendas entre dois protagonistas que pouco a pouco, através de séculos de violência e incompreensão, foram se constituindo em autênticos inimigos hereditários. A história da Araucanía consistia numa lista de batalhas baseadas na idéia de que o caráter belicoso e naturalmente selvagem dos chamados araucanos tinha mantido em xeque a empresa conquistadora e civilizadora do invasor espanhol. Este marco interpretativo propiciou a construção da figura do araucano como um guerreiro indomável que, apesar do contato plurissecular com o espanhol, não parecia tirar nenhum proveito dessa proximidade e da potencial influência de gentes de razã.1 1 Influenciados pela filosofia aristotélica, os espanhóis consideravam os índios gente carente de razão, ou seja, sem aptidão para a ação e para decidir sobre o que é bom ou mal para o homem. Segundo eles, ser gente de razão era ter aptidão que permitisse avaliar corretamente como agir, isto é, ter a capacidade de decidir sobre o que é útil e bom no que se refere à felicidade. Os indígenas não se incluíam nessa categoria de pessoa. Depois de afirmar em Politicia, "(...) the slave has no deliberative faculty (...)" ( Politics, book 1, p. 454, in The Works of Aristotle, volume II, William Benton Publisher, Encyclopedia Britannica Inc., Chicago/London, 1952), Aristóteles afirma o seguinte: " But is there anyone thus intended by nature to be a slave, and for whom such a condition is expedient and right, or rather is not all slavery a violation of nature? There is no difficulty in answering this question, on grounds both of reason and of fact. For that some should rule and others be ruled is a thing not only necessary, but expedient; from the hour of their birth, some are marked out by subjection, others for rule" (Ibid., p. 447). Acrescenta, mais adiante, a respeito da racionalidade dos distintos grupos de pessoas que distingue (homens, mulheres, meninos e escravos): "(...) the virtue of the ruler we maintain to be different from that of the subject; the one being the virtue of the rational, and the other of the irrational part." (Ibid., p. 454). Grupos "sem Rei, sem fé, sem lei", estes "bárbaros" das margens do Império espanhol foram percebidos e descritos como povos sem história. Localizados nas fronteiras da civilização, estes guerreiros indomáveis foram relegados às margens da história.

É em oposição a esta visão dominante da Araucania como espaço guerreiro que emergiu no Chile, em princípios dos anos 1980, uma nova corrente historiográfica (conhecida pelo nome de Estudios Fronterizos)2 2 As principais publicações dos historiadores desta corrente historiográfica são as seguintes: Sergio Villalobos et al., Relaciones fronterizas en la Araucanía, Santiago do Chile, Ediciones Universidad Católica de Chile, 1982; Sergio Villalobos e Jorge Pinto R. comps., Araucanía, temas de historia fronteriza, Temuco, Universidad de la Frontera, 1985; Leonardo León et al. Araucanía: la frontera mestiza, siglo XIX, Quito, Abya Yala, 2004. que se propôs a levar em consideração as relações fronteiriças em toda a sua complexidade, chegando à conclusão de que a guerra não tinha sido a única modalidade do contato entre espanhóis e Mapuche. De fato, segundo os estudiosos desta corrente, é possível distinguir a primeira etapa claramente bélica (1536-1655) de uma segunda etapa, caracterizada pela convivência pacífica (1655-1883), durante a qual os contatos fronteiriços e as instituições de fronteiras (missão, comércio, tratados de paz) substituíram, paulatinamente, a guerra de conquista e o contato violento. Assim, de acordo com esses mesmos estudiosos (em sua grande maioria historiadores), a partir da segunda metade do século XVII, instaurou-se um período de paz ou de convivência pacífica durante o qual se desenvolveram processos de mestiçagem e se estabeleceram contatos interétnicos que terminaram em relações de dependências e conduziram à paulatina "desculturação" dos grupos indígenas que, no fim do século XIX, se incorporaram de maneira quase pacífica ao Estado chileno.

Entretanto, este novo marco interpretativo, dominante no Chile desde o fim dos anos 1980 e que põe ênfase aos processos de mestiçagem, tendeu a perpetuar os pressupostos etnocêntricos (e às vezes abertamente racistas) anteriores em suas análises da natureza das relações hispano-indígenas. Em primeiro lugar, tende a conceber a mestiçagem como processo unidirecional de diluição da entidade e da identidade cultural indígena dentro da nova nação chilena. A cultura indígena se encontra definida em termos essencialistas, como algo dado a priori, como uma substância que unicamente se transformaria por contaminação. Em conseqüência, toda modificação da tradição ou reconfiguração identitária é percebida como uma perda da pureza original e como a primeira etapa em direção a um processo de total assimilação. Em segundo lugar, tende a invisibilizar ou silenciar o protagonismo indígena na medida em que as ações políticas dos grupos nativos aparecem como reações desordenadas e oportunistas à política hispano-crioula. Os indígenas são concebidos como sujeitos pré-políticos incapazes de definir uma política tanto interior como exterior. Mais interessados em receber os presentes entregues pelas autoridades espanholas e em embebedar-se durante as festas que seguem aos tratados de paz, os indígenas surgem como uma massa desordenada que participa de maneira passiva à elaboração de um pacto colonial pensado e definido desde os centros de poder hispano-crioulos. Finalmente, esta corrente historiográfica segue presa à ordem do discurso colonial, visto que retoma de maneira acrítica as taxonomias coloniais, reificando-as e recolocando-as em um marco ideológico evolucionista e estato-nacional. Neste trabalho, mostrarei que o chamado pacto colonial entre mapuches e hispano-crioulos foi tanto o produto do "protagonismo" indígena como da política voluntarista dos representantes da Coroa. Por outro lado, darei conta das formas indígenas da mestiçagem numa tentativa de descolonizar a noção de mestiçagem, recurso ideológico que ocupou um lugar central nas políticas indigenistas dos estados latino-americanos durante o século XX e que é usado hoje em dia por vários historiadores chilenos para deslegitimar as reivindicações territoriais do povo Mapuche. Não me deterei no debate teórico em torno das noções de etnogênese, etnificação e espaço fronteiriço que tem sido abordado em várias publicações da última década.3 3 Miguel Alberto Bartolomé, "As etnogêneses: velhos atores e novos papéis no cenário cultural e político", Mana, vol. 12, n. 1, 2006, p. 39-68; Guillaume Boccara, "Colonización, resistencia y etnogénesis en las fronteras de las Américas", in Guillaume Boccara ed., Colonización, Mestizaje y Resistencia en las Américas, Lima/Quito, Instituto Francés de Estudios Andinos/Ed. Abya Yala, 2002, p. 47-82; Guillaume Boccara, "Génesis y estructura de los complejos fronterizos euro-indígenas: Repensando los márgenes americanos a partir (y más all´s) de la obra de Nathan Wachtel", Memoria Americana, v. 13, Buenos Aires, 2005, p. 21-52; Jonathan Hill ed., History, Power, and Identity: ethnogenesis ein the Ameritas, 1492-1992, Iowa City, University of Iowa Press, 1996; João Pacheco de Oliveira, "Uma etnologia dos 'índios misturados'? Situação colonial, territorialização e fluxos culturais", Mana, vol. 4, n. 1, Rio de Janeiro, 1998, p. 47-77; Gerald Sider, "Identity as History. Ethnohistory, ethnogenesis, and ethnocide in the Southeastern United States", Identities, 1996, vol. 1, p. 109-122. Contudo, mencionarei brevemente alguns pontos a fim de esclarecer o marco teórico conceitual dentro do qual se localiza este trabalho.

Em primeiro lugar, entendo por etnogênese um processo de reconfiguração social, política, econômica e cultural que implica a redefinição do sentimento identitário e desemboca na emergência de uma nova formação social ou de uma nova entidade e identidade étnica.

Em segundo lugar, por etnificação ou territorialização entendo o processo de gênese do fato social étnico produzido mediante a implementação de tecnologias de saber/poder por parte de um poder colonial que tende a se constituir como hegemônico.

Em terceiro lugar, mais do que o termo fronteira, prefiro usar espaço fronteiriço para dar conta ao mesmo tempo da natureza construída a partir desta zona de contato, assim como da fluidez e do caráter constituinte das relações que se desenvolvem entre os diferentes agentes sociais em contato. Entendendo assim a fronteira como um espaço transicional de colonização no qual imperam mecanismos performativos de denominação e rituais de tomada de posse que levam à formação de novos sujeitos sociais. Ao considerar as fronteiras como um fato e as etnias selvagens que viviam ali como entidades que sempre existiram, os estudiosos americanistas tenderam durante muito tempo a reificar sem se dar conta os atos de denominação, de construção simbólica e de delimitação territorial realizados pelos agentes coloniais do estado. Com freqüência, prolongou-se e reforçou-se o fenômeno de reificação das coletividades indígenas dos limites dos impérios coloniais, ao mesmo tempo em que se deixava escapar o interesse por um estudo etnológico das práticas e representações relativas às construções dos limites e fronteiras consideradas como ritos de conquista e colonização.4 4 Sobre este tema, veja Guillaume Boccara, "Rethinking the Margins/Thinking from the Margins: Culture, Power, and Place on the Frontiers of the New World", Identities: Global Studies in Culture and Power, vol. 10, Taylor & Francis, 2003, p. 59-81. Em resumo, nossa aproximação tem como meta dar conta da historicidade das estruturas sociais, dos efeitos produzidos pelas tecnologias de saber/poder hegemônicas e das reconfigurações sociais e estratégias políticas desenvolvidas pelas populações indígenas dos espaços fronteiriços americanos. Abordaremos estes problemas histórico-antropológicos por meio do estudo do caso do povo mapuche durante o período colonial.

Contexto histórico

A seguir, apresentaremos alguns marcos cronológicos relativos à presença espanhola e à resistência indígena na região abordada neste trabalho.

Foi em 1550 que se empreendeu a conquista do centro-sul do Chile atual. Enquanto os territórios situados ao norte do rio Bío-Bío foram dominados de maneira bastante rápida, a marcha em direção ao sul se viu interrompida por uns grupos indígenas que os espanhóis denominaram araucanos. Estes indígenas, que na realidade se autodefiniam de maneira interna como reche,5 5 Sobre a noção de reche, ver o trabalho recente de José Isla, "Un lugar en el mundo. Notas Pewenche para una sociología de la distancia", manuscrito, Chile, 2005, 66 p. , assim como Guillaume Boccara, Guerre et Ethnogenèse Mapuche dans le Chili Colonial, Paris, Editions L'Harmattan, 1998. resultaram ser ferozes guerreiros. O caráter acidentado do território, o rigor do clima e a natureza multicéfala da organização sociopolítica indígena foram um impedimentos para que os conquistadores pudessem se estabelecer de forma permanente. Seus fortes eram constantemente atacados, o caminho real muito freqüentemente cortado. Numa palavra, os indígenas não se deixavam submeter, o que significa que não se puderam assentar com eficiência os dois pilares da empresa colonial: a encomienda e a evangelização. Em 1598, ou seja, 40 anos depois da primeira rebelião geral que custou a vida do governador Pedro de Valdivia, os indígenas se revoltaram novamente. Desta vez, expulsaram o invasor definitivamente de suas terras. Os sete estabelecimentos espanhóis situados ao sul do Bío-Bío foram saqueados e destruídos, executaram o governador Martín García de Loyola e se instituiu desde então uma linha de fronteira ao longo do rio Bío-Bío, fronteira ao sul, sobre a qual os indígenas manteriam sua soberania até fins do século XIX. Iniciou-se então a guerra da maloca.6 6 O termo maloca ou malóm em mapundungun se refere a uma expedição militar, cujo objetivo é capturar cabeças de gado e "peças humanas". Isto significa que, apesar das tentativas de pacificação promovidas pelos missionários jesuítas, os territórios indígenas eram objeto de sistemáticas razias. Foram aniquiladas suas colheitas, suas plantações e suas casas, capturados os rebeldes, reduzidos à escravidão e deportados. Frente a esta guerra delmalon, os indígenas não ficaram impávidos. Ao adotar o cavalo, empreenderam por sua vez malocas o malones, no território controlado pelos espanhóis. Apropriaram-se dos animais das fazendas hispano-crioulas e das reduções de índios amigos da fronteira. Na segunda metade do século XVII, a dinâmica das guerras hispano-indígenas sofreu uma mudança. Por motivos muito extensos para serem aqui apresentados, as autoridades coloniais foram adotando progressivamente outra política de conquista e desde então se propuseram a pacificar a fronteira meridional por meio da missão e do parlamento (reuniões políticas). Os jesuítas, a quem se confiou o trabalho de "civilização" desses "selvagens incorrigíveis", estabeleceram suas missões e efetuaram correrias.7 7 Missões itinerantes durante as quais os missionários realizavam o batismo e o matrimônio em facie ecclesia e davam a extrema-unção aos índígenas das parcialidades não submetidas à ordem colonial. Foi o período da chamada conquista espiritual em que floresceram as capelas e cruzes em território "pagão". Ao final do século XVII, se institucionalizou o parlamento ou grande reunião política hispano-indígena, durante os quais se estabeleciam acordos comerciais, militares, políticos e religiosos. As autoridades coloniais desejavam reunir em um mesmo espaço a totalidade das parcialidades indígenas8 8 O termo parcialidade era empregado pelos espanhóis para fazer referência às unidades socioterritoriais indígenas, nas quais reconheciam a presença de um chefe ou cacique. Na prática era um termo genérico, pouco preciso em termos sociopolíticos, que servia tanto para descrever como para construir a realidade indígena, além de ser útil para repartir os índios em encomienda. da fronteira e das terras do interior. Os hispanocrioulos usaram estes dois dispositivos de poder (a missão e o parlamento) até o fim da época colonial. Ainda que a implementação destas instituições fronteiriças tenha contribuído para o processo de etnificação dos indígenas e implicado uma série de mudanças profundas na estrutura sociopolítica e territorial mapuche, cabe mencionar que esta continuação da guerra de conquista por outros meios (políticos) não permitiu às autoridades coloniais acabar com a soberania indígena. De forma que, no momento da independência do Chile, os Mapuche mantêm sua autonomia territorial ao sul de Bío-Bío, rio que foi se constituindo em uma verdadeira fronteira política, tanto de fato como de direito. Se, como exponho em outro trabalho,9 9 Guillaume Boccara, "El podercreador: tipos de poder y estrategias de sujeción en la frontera sur de Chile en la época colonial", Anuario de Estudios Americanos, vol. LVI, n. 1, Sevilha, 1999, p. 65-94. os espanhóis passaram de um diagrama de poder soberano que tinha como meta submeter as massas de indígenas por meio das instituições do requerimento, da encomienda e da escravidão (1550-1641) à implementação de dispositivos de disciplinamento (escolas, parlamentos, missões), cujo objetivo era normalizar e civilizar por intermédio da produção de pequenas individualidades adaptadas e funcionais (1641-1810), cabe analisar agora o impacto que tiveram estas estratégias coloniais sobre a sociedade indígena.

Os Mapuche frente à conquista e colonização do centro-sul do Chile: guerra, mestiçagem e reestruturação

Como um grande número de populações encontradas pelos conquistadores nas margens dos estados inca e mexica, os Mapuche foram qualificados de povo "sem Rei, sem fé, sem lei". O termo empregado de maneira recorrente para designar a organização desses grupos situados na fronteira sul do Tawantisuyu era behetra.10 10 Termo usado pelos espanhóis para dar conta da natureza da organização política indígena. Em geral, tem um sentido pejorativo que remete à ausência de chefia permanente e de um poder real do cacique de uma parcialidade. Para mais informações sobre as tipologias políticas da época colonial, ver Guilhaume Boccara."Rethinking the margins/thinking from the margins", Identity, vol. 10, Francis & Bacon, 2003, p. 59-81. A característica principal da distribuição espacial desses grupos era a dispersão, sendo sua organização política considerada como acéfala. A inexistência de um poder político centralizado que permitisse assegurar a continuidade política da sociedade e que obrigasse seus membros a obedecer, constituía, segundoos espanhóis, um dos principais inconvenientes à conquista desses grupos. Mas, além desta ausência política essencial, os conquistadores perceberam outras ausências que impediam tanto a conquista militar como a espiritual. Estes grupos não conheciam a figura onipotente e onisciente do deus cristão e, por conseguinte, os espanhóis pensavam, seus membros não distinguiam o bem do mal, o bom do mau, o justo do injusto. Para os europeus, esta dupla ausência das figuras celestial e terrena do poder implicava logicamente a inexistência da lei. Entretanto, por trás desta visão negativa da sociedade indígena, os espanhóis não deixaram de perceber as particularidades na organização destes grupos, especialmente na medida em que sua forte resistência ao empreendimento de conquista lhes colocava um problema fundamental. Na documentação do início da conquista aparecem duas características principais: a dispersão em relação ao seu padrão de assentamento e a guerra como a sua reação à presença européia. É com base nestes aspectos (a dispersão e a organização guerreira) que apreenderemos agora a estrutura social indígena, para depois analisar as mudanças nela ocorridas em conseqüência dos contatos plurisseculares com os agentes coloniais.

A unidade social mínima dos grupos Mapuche era a ruka (casa), moradia da família polígama extensa. O nível seguinte era o casario, geralmente composto de quatro a nove. Os membros masculinos das casas pertenciam à mesma linhagem, a do ulmen (cacique) principal da ruka. Os indígenas praticavam a residência virilocal. O nível de integração superior ao conjunto de casas constituía o kiñelof, o núcleo endógamo, que integrava vários conjuntos de casas. Os membros desta agregação cooperavam na realização de diversas atividades econômicas e se mobilizavam em caso de agressão exterior. Os grupos indígenas não obedeciam a uma lógica segmentária; ao contrário, organizavam-se numa trama social feita de múltiplos grupos de consangüíneos e aliados que giravam em torno da figura de um ulmen. Em um nível superior ao kiñelof encontramos outro agregado denominado lebo. Esta unidade social pode ser considerada crucial na socialização indígena porque era no ceio do lebo que se resolviam as questões relativas à guerra e à paz, isto é, ali se elucidavam as questões de política interior e exterior. Era também no nível do lebo que se desenvolviam as reuniões festivas e guerreiras, bem como as cerimônias religiosas essenciais à reprodução simbólica da sociedade. Afinal, a identidade social dos indígenas, que naquela época se denominava reche (de re: gente; che: pura, autêntica), se constituía pelo pertencimento a um lebo e em referência ao rewe, o espaço cerimonial de cada lebo. As decisões jurídicas e políticas que se tomavam no lebo deveriam ser respeitadas. Os conflitos em matéria de bruxaria, roubo, adultério eram discutidos e resolvidos no nível do lebo, e as partes ofendidas tinham direito à compensação. Simbolicamente, o rewe funcionava como o centro do mundo e simbolizava a unidade do grupo. Por outro lado, o lebo consistia no primeiro grau da diferenciação identitária, visto que um reche não sacrificava, não decapitava e não comia outro membro do seu próprio lebo. Este agregado formava um limite duplo, tanto de ordem sociopolítica como de ordem identitária. Para resumir, diria que os homens verdadeiros (os reche) se definiam no plano identitário e se organizavam no plano sociopolítico em relação a um lugar verdadeiro (o rewe, re: puro; we:lugar). No caso de conflito guerreiro, vários lebo podiam reunir-se em uma unidade superior chamada ayllarewe. Esta unidade não tinha um caráter permanente. Apesar de os lebo pertencentes ao mesmo ayllarewe nunca guerrearem (weichan) entre si, existia sim um tipo de conflito coletivo interno ao ayllarewe, a vendeta (tautulun).

Em um nível ainda superior, temos o futamapu, ou terra grande, que se formava a partir da agrupação de vários ayllarewe. Durante a época colonial tardia, três destes futamapu chegaram a dividir o território da Araucanía em um mesmo número de faixas longitudinais. Resumidamente, a unidade sociopolítica crucial e permanente da organização social indígena era o lebo ou rewe, ainda que vários lebo pudessem se aliar de maneira esporádica em um ayllarewe em caso de ameaça exterior. Uma das mudanças notáveis na estrutura sociopolítica e territorial reche foi precisamente a institucionalização dos ayllarewe e futamapu, que de unidades temporárias pré-hispânicas, que funcionavam em períodos de guerra, passaram a ser agregados político-territoriais permanentes dotados de representantes próprios.

Se nos detivermos agora sobre o funcionamento desta unidade que definimos como central na sociedade reche, podemos notar que a guerra era o feito que intervinha naprodução e reprodução material e simbólica do lebo ou rewe. Dentro do lebo o poder político não era exercido por um só indivíduo. Os documentos mencionam a existência de três tipos de personagens políticos com funções distintas: o chefe civil (ngenfoye), o chefe de guerra (ngentoki) e o chefe religioso (voquifoye). Teoricamente, estes cargos se obtinham por direito de sucessão, mas um grande número de documentos indica que poderiam ser adquiridos ou merecidos. De fato, era por meio da atividade bélica que alguns ulmen obtinham o cargo de toki (general dos esquadrões indígenas) para logo ascenderem ao cargo de ngentoki. Existem várias razões para afirmar que a guerra era um fenômeno central na produção e reprodução do lebo. Primeiro, no nível da dinâmica da política interna, advertimos que é por intermédio da guerra que se produziam os líderes do espaço político reche. O ulmen era, antes de tudo, um grande guerreiro. O xamã (machi) atuava como um verdadeiro guerreiro do invisível. Segundo, a imagem do guerreiro ideal se percebia em todas as facetas da vida social reche: no espírito dos jogos, na educação dos jovens e no prestígio social dos guerreiros que se destacavam durante o combate na busca da luta individual. Existia também um grupo de guerreiros especializados que gozavam de um grande prestígio. A existência deste ideal guerreiro se refletia simbolicamente nas relações de gênero. Os grandes guerreiros eram, traduzindo um termo em mapuzungun da época, "extremamente homens", e os vencidos eram irremediavelmente colocados na categoria de mulher. A guerra se desenhava também como uma instituição que estruturava as relações entre as diversas unidades do ayllarewe. A luta para captura de troféus guerreiros colocava em movimento uma verdadeira dinâmica de dom/contra dom entre os diversos rewe de um mesmo ayllarewe. Um lebo que capturava um inimigo enviava-o, vivo ou morto, a outro lebo com o fim de obrigá-lo a devolver-lhe o dom. A centralidade da guerra ia mais além da produção do espaço social e político interno e externo. Tinha um papel central na elaboração da identidade própria, na produção de si mesmo e das figuras da alteridade. Efetivamente, a guerra reche era uma verdadeira guerra de captação, de construção do "si-mesmo" em um movimento de abertura canibal em direção ao outro. Tudo nas práticas e representações da guerra tendia à assimilação das qualidades do inimigo. Por isso os guerreiros durante o combate se esforçavam em capturar um objeto que simbolizara o espanhol. Ao voltar da expedição, os guerreiros e ulmen se vestiam como os espanhóis. Mas, era certamente no trabalho ritual realizado sobre o corpo do cativo que se percebia de forma mais clara esse afã por digerir o outro, embora nem todos os cativos fossem "bons para comer". O corpo que servia para os rituais de antropofagia era o de um inimigo famoso e valente. Nesse caso, o cativo era decapitado e sua cabeça usada como recipiente-troféu para as cerimônias guerreiras. Confeccionavam-se flautas a partir dos ossos das pernas e uma espécie de gorro guerreiro dos maxilares e da pele do rosto. O coração era arrancado e comido. O que restava do corpo do outrora grande guerreiro era lançado com desprezo em direção ao seu território de origem. Os cativos não propícios ao sacrifício ritual eram submetidos a um intenso processo de "indigenização". Proibiam-nos de falar castelhano e os vestiam à moda indígena imediatamente após a sua captura. Depilavam-nos e os punham a trabalhar como qualquer lavrador. Quanto às mulheres, casavam-nas, e os filhos destas uniões mistas eram totalmente integrados à sociedade indígena. Se tivéssemos que resumir, diríamos, retomando uma expressão de Eduardo Viveiros de Castro, que para os reche "o outro não era só pensável, era indispensável".11 11 "Le marbre et le myrte: de l'inconstance de l'âme sauvage", in Mémoire de la tradition,Aurore Becquelin y Antoinette Molinié, comps., Nanterre, Société d'Ethnologie, 1993, p. 365-431. O exocanibalismo, a recheização dos cativos e desertores, a adoção de elementos culturais exógenos (cavalo, ferro, trigo, roupa), a identificação com o outro no período imediatamente anterior à guerra (os guerreiros deixavam crescer barba e bigode), o fato de agir como se fosse o outro nas cerimônias de regresso de uma expedição guerreira e a captação simbólica da substância vital da pessoa sacrificada, tudo isto tende a demonstrar que a reprodução da diferença e produção da identidade reche se fazia por meio de um movimento de abertura canibal em direção ao outro. De certa maneira, poder-se-ia dizer que para os reche, em determinados contextos, "o hábito faz o monge".

Creio que temos aqui um bom exemplo da forma como a mestiçagem se localizava no coração da máquina social indígena. Em outro trabalho falei da existência de uma lógica de mestiçagem reche12 12 "Antropología diacrónica. Dinámicas culturales, procesos históricos y poder político", in Guillaume Boccara y Sylva Galindo eds., Lógica Mestiza en América, Temuco, Universidad de la Frontera, 2000, p. 11-59. e insisti sobre o fato de que a resistência que estes indígenas opuseram à colonização de seu território se devia não só à sua grande capacidade guerreira, mas também, fundamentalmente, à natureza em si do feito social guerreiro, pois é a guerra de captação reche a que determina a flexibilidade e capacidade de adaptação desta sociedade. A máquina guerreira indígena era, por sua própria natureza, vetor de transformação e reconfiguração social e étnica. E de fato, entre os séculos XVI e XVIII, os grupos indígenas do centro-sul do Chile experimentariam mudanças estruturais e identitárias de grande magnitude, as quais abordaremos a seguir.

Uma das conseqüências mais notáveis da empresa de colonização do sul chileno foi a emergência de uma entidade e identidade étnica nova, os mapuches propriamente dito. Com isto quero dizer que as mudanças políticas, econômicas e sociais desencadeadas pelas tentativas de conquista e colonização dos grupos reche confluíram para a formação de uma entidade política e de uma identidade étnica nova que tendia a se cristalizar, na segunda metade do século XVIII, como resultado de um longo processo de etnogênese e etnificação. Examinemos os mecanismos que nos permitem afirmar que tanto as pressões espanholas (etnificação ou territorialização)13 13 Tomo emprestado o conceito de territorialização de João Pacheco de Oliveira, que o conceitua da seguinte maneira: "A noção de territorialização é definida como um processo de reorganização social que implica: 1) a criação de uma nova unidade sociocultural mediante o estabelecimento de uma identidade étnica diferenciadora; 2) a constituição de mecanismos políticos especializados; 3) a redefinição do controle social sobre os recursos ambientais; 4) a reelaboração da cultura e da relação com o passado." ("Uma etnologia dos 'índios misturados'? Situação colonial, territorialização e fluxos culturais", Mana, vol. 4, n. 1, Rio de Janeiro, 1998, p. 55). como as capacidades criativas dos grupos reche (etnogênese) resultaram na formação de uma nova "nação".

Registramos, primeiramente, fortes mudanças no âmbito econômico, pois se os reche praticavam a horticultura, a colheita e a criação de camelídeos em pequena escala, no século XVIII as atividades econômicas das comunidades indígenas giram ao redor de três novos pólos: a criação de gado não autóctone, a razia em busca do gado das fazendas hispano-crioulos e o comércio de ponchos e artesanato em barro vendidos nos postos fronteiriços aos conchavadores14 14 No Chile e na Argentina colonial o conchavador é o comerciante, e o verbo conchavar significa negociar, vender, trocar. ou comerciantes que penetravam em território indígena. Essas alterações econômicas ocasionaram transformações na divisão do trabalho. A carga da economia doméstica chegou a recair sobre as mulheres (produção do poncho, trabalhos agrícolas, cuidado com o gado). A atividade do homem se direcionou cada vez mais ao exterior, já que o Mapuche era ao mesmo tempo maloquero e conchavador. Percebe-se, por outro lado, uma transformação no status do cativo, pois se, no século XVI, alguns cativos eram executados e os demais utilizados para um resgate ou postos a trabalhar, nos séculos XVII e XVIII, se transformaram em verdadeiros escravos-mercadoria. Os homens eram vendidos e circulavam de comunidade em comunidade como qualquer tipo de mercadoria. Se no século XVI existiam duas categorias de indivíduos submetidos a um processo de exploração de trabalho (o kuñifal ou gens de rien e o reghtuñ ou cativo),15 15 Sobre o tema das modificações nas relações de trabalho no seio da sociedade mapuche, veja Guillaume Boccara, "'Mestizaje salvaje', trabajo y resistencia en la frontera hispanomapuche", in Eduardo França Paiva y Carla Maria Junho Anastasia (orgs.), O trabalho mestiço. Maneiras de pensar e formas de viver. Séculos XVI a XIX, São Paulo, Annablume/UFMG, 2002, p. 265-279. emerge no século XVIII uma nova categoria, a pessoa comprada ou escrava (nguillanche em idioma mapuche). Diferentemente do que aconteceu na chegada dos espanhóis, em que os cativos executados permitiam captar valores e os prisioneiros ajudavam na produção doméstica, os escravos servem apartir de agora para produzir mercadorias destinadas exclusivamente aos mercados coloniais. É assim que vai se desenvolvendo um comércio de peças. Portanto, a transformação nas relações de trabalho efetuou-se mediante a incorporação de uma mão-de-obra servil alógena. Além do processo de "mestiçagem forçado" posto em marcha pelo desenvolvimento desta nova economia mercantil, observamos que a expansão mapuche ao leste da cordilheira (a chamada Araucanización de las Pampas) desencadeou um complexo processo de hibridação interindígena e implicou a internacionalização da economia indígena. Depois de dois séculos de progressiva penetração além da cordilheira, se percebe a existência no século XVIII de assentamentos mapuchenos pampas da Argentina atual. Firma-se um complexo sistema econômico-guerreiro que supõe a união e colaboração de vários grupos por meio de um território que se estende do Pacífico ao Atlântico. Este "império mapuche" funciona com base em alianças políticas e matrimoniais entre grupos Mapuche, huilliches, pampas e tehuelches. De modo que temos aqui um interessante processo de mestiçagem interétnico em um macroespaço que cobre várias fronteiras e conduz os indígenas a desenvolver estratégias políticas diversas com os poderes coloniais tanto das fronteiras chilenas quanto argentinas. A análise dos objetos trocados permite precisar a transformação sofrida pela economia indígena. Efetivamente, durante o século XVII, os Mapuche trocavam gado e ponchos por vinho, índigo, pregos e ferro. No século XVIII, os indígenas produzem grandes quantidades de ponchos que são vendidos em troca de todo tipo de gado. Resumindo, para o século XVIII a economia mapuche produzia um forte excedente econômico e estava amplamente aberta aos vários fluxos comerciais, tanto para o que é hoje o Chile, como para o oriente da cordilheira. O gado (kulliñ) chegou a ser o padrão de uma economia em que o comércio tinha um papel fundamental. Há que se considerar, por outro lado, que estas mudanças econômicas, longe de prejudicarem o poder militar dos Mapuche, tenderam a incrementar sua capacidade de resistência e de negociação em um contexto marcado pela organização regular de parlamentos com as autoridades coloniais. Finalmente, a transformação do modelo econômico determinou o grande desenvolvimento das guerras interindígenas (Mapuche, huilliches, pehuenche) para o controle dos pastos, das passagens fronteiriças (para a empresa maloquera e o comércio além da cordilheira dos Andes) e das minas de sal. As guerras interindígenas tenderam, por conseguinte, a mudar de significado. Com a substituição do weichan pela maloca e a passagem progressiva de uma economia de abundância no sentido de Marshall Sahlins16 16 Stone Age Economics, London, Routledge, 2005 (1972). para uma economia da escassez, o conjunto da estrutura sociopolítica e dos mecanismos de definição identitária seria redefinido.

De fato, a dinâmica, a estrutura e o funcionamento políticos mapuche do século XVIII diferem substancialmente daqueles dos reche do século XVI. Percebe-se, de um lado, um processo de concentração de poder e, de outro, um movimento em direção à cristalização das relações de forças no seio das comunidades indígenas. Com relação à dinâmica política interna, registra-se a transformação dos caciques reche de "grande homem" em uma espécie de chefe.17 17 Sobre as noções de grande homem, chefe e big man, veja Maurice Godelier, La production des Grands Hommes: pouvoir et domination masculine chez les Baryua de Nouvelle Guinée, Paris, Editions Fayard, 1982, e Pierre Lemonnier, Guerres et festins: paix, échanges et compétition dans les highlands de Nouvelle-Guinée, Paris, Editions de la Maison des Sciences de L'Homme, 1990. Já não é por meio da guerra que se constituem as figuras indígenas do poder político, mas sim pelo acúmulo de um capital econômico, político e informacional. Surge a figura do ulmen, homem rico que se lança em uma nova competição econômica e em hábeis negociações políticas. O cacique mapuche continua sem exercer um poder coercitivo, entretanto concentra desde agora todas as funções de organização da sociedade que antes cabiam a pessoas diferentes (ngenfoye, ngentoki, voquifoye). Esta redução do espaço das figuras do poder político, produto das mudanças socioeconômicas e dos mecanismos de delegação de poder surgidos do novo contexto de negociação política com as autoridades coloniais, é acompanhada por uma concentração das diferentes espécies de capital nas mãos de um número reduzido de indivíduos que dispõem ao mesmo tempo da riqueza mais importante, de relações políticas privilegiadas com os agentes coloniais, das redes mais extensas de alianças políticas matrimoniais e de um número maior de conas-maloqueiras (soldados raiders). Entretanto, este poder que tende a se cristalizar sob a forma de hegemonias sociais tem uma contrapartida no sentido em que obriga o cacique a operar uma redistribuição de bens. A documentação do século XVIII faz ampla referência a grandes festas (cahuin) durante as quais os chefes consumiam riquezas e distribuíam liberalmente chicha e cabeças de gado. Para resumir, o campo de poder tende a mudar na Araucanía do século XVIII. Primeiramente, em razão da transformação da economia indígena e, em segundo lugar, devido à política de negociação e parlamento desenvolvida pelas autoridades coloniais, que conduzem os Mapuche, de um lado, a escolher representantes regulares e, de outro, a reconfigurar sua organização socioterritorial. É assim que o ayllarewe e o futamapu se convertem em agregados sociopolíticos macrorregionais permanentes. Encabeçado por um apoulmen (grande cacique), o ayllarewe chega a ser o lugar onde se estabelece uma legislação criminal, isto é, o distrito no qual se aplica uma norma jurídico-política de compensação e sanção, em caso de homicídio, roubo, adultério ou violação dos tratados e acordos. O rewe chega a perder boa parte de sua autonomia, pois o apoulmen do rewe mais poderoso chega a exercer um poder de representação desconhecido até esse momento. O apoulmen adquirira a capacidade de tomar uma decisão que comprometia o conjunto das unidades que compunham a sua jurisdição. Os mecanismos de negociação fronteiriços contribuíram sem dúvida para acentuar as transformações políticas da sociedade indígena, incitando as parcialidades indígenas a gerar "cabeças" e a definir mecanismos permanentes de delegação de poder. Com a institucionalização dos três futamapu que dividiam a Araucanía em três grandes distritos políticos, este processo de concentração e cristalização tende a intensificar-se. O futamapu chega a constituir uma unidade macrorregional permanente. Durante os últimos parlamentos do período colonial se observa que os apoulmen dos diferentes futamapu atuam como porta-vozes de seus súditos. O processo de unificação conduz, portanto, à formação de um novo tipo de dirigente. No último parlamento da época colonial se designa um só chefe indígena para presidir as seções em nome do conjunto dos futamapu. Essas transformações estruturais foram acompanhadas por modificações profundas na percepção que os grupos indígenas tinham de si mesmos e do outro, pois além da definição grupal e ontológica como o reche pertencente a uma rewe, emerge a atribuição étnica de mapuche. O termo mapuche aparece pela primeira vez na documentação colonial aproximadamente nos anos 1760, no momento preciso em que pudemos determinar mudanças profundas tanto na economia como na esfera político-indígena. A identidade étnica mapuche emerge tanto como um produto da confrontação bélica, como da negociação política com os wingka, os não-mapuche. A adoção do etnônimo mapuche remete a um registro diferente do de reche, pelo qual não se pode afirmar que os Mapuche substituíram os reche. Podemos dizer que a contração e estabilização do campo político em um contexto colonial de territorialização, de tornar quadricular o espaço indígena e de fabricação de representantes indígenas permanentes que atuam fora de suas terras de origem, conduziram a uma transformação do sentimento de pertencimento. Segundo o missionário jesuíta Andrés Febres, que escreve na segunda metade do século XVIII,18 18 Andrés Febrés, Arte de la lengua general del reino de Chile, Lima, 1775. os indígenas se autodenominam mapuche e chamam aos Mapuche de outras terras de ca-mapuche (ca: outro). Surge assim um novo sentimento identitário que transcende o âmbito local do rewe.

Deste ponto de vista, a história dos reche-mapuche representa um caso particularmente interessante de etnogênese, posto que a resistência proverbial dos reche, que lhes permitiu sobreviver como entidade específica, foi também o vetor de um profundo processo de transculturação que convergiu na estruturação de uma nova formação social e no surgimento de novas identidades. A formação desta nova entidade e identidade étnica mapuche pode ser interpretada como resultado tanto de um processo de etnogênese como de etnificação. Etnogênese porque é o produto de um processo criativo endógeno. Etnificação porque as técnicas de poder implementadas pelas autoridades coloniais (o espaço do parlamento, essencialmente) produziram um efeito tanto sobre as estruturas objetivas dos grupos indígenas, como sobre as estruturas cognitivas dos indivíduos e das coletividades.

Para concluir, parece-nos adequada a afirmação de João Pacheco de Oliveira sobre os processos de territorialização aos quais foram sujeitos os povos indígenas em situação colonial:

Se muitos fatores (internos e externos) podem ser indicados para explicar a passagem de uma sociedade segmentar à condição de sociedade centralizada, o elemento mais repetitivo e constante responsável por tal transformação é a sua incorporação dentro de uma situação colonial, sujeita, portanto, a um aparato político-administrativo que integra e representa um Estado (seja politicamente soberano ou somente com

status

colonial). O que importa reter dessa discussão (...) é que é um fato histórico – a presença colonial – que instaura uma nova relação da sociedade com o território, deflagrando transformações em múltiplos níveis de sua existência sociocultural.

19 19 Op. cit., p. 54.

Entretanto, diferentemente dos índios misturados estudados por J. Pacheco de Oliveira, o processo de reorganização sociocultural mapuche se desenvolveu em um contexto marcado pela autonomia, no qual, apesar de os indígenas terem que repensar suas relações internas e externas, nunca, até a derrota final no fim do século XIX, foram dominados socialmente, explorados economicamente, submetidos militarmente ou transformados em sujeitos políticos da Coroa. Sua reconversão econômica, sua expansão em direção aos pampas, suas conexões exitosas com os mercados coloniais e interindígenas explicam em grande parte o fato de terem podido ser, durante mais de três séculos, os vencedores e não os vencidos da história.20 20 Para um caso muito parecido de transformação política e de conexão exitosa aos mercados coloniais, veja o estudo de Pekka Hämäläinen sobre os Comanches, The Comanche Empire. A Study of Indigenous Power, 1700-1875, Finland, Helsinki University Press, 2001. Para uma recente síntese com respeito às relações entre colonizadores e indígenas nas fronteiras das Américas no século XVIII, veja o trabalho de David Weber, Bárbaros: Spaniards and Their Savages in the Ages of Enlightment, New Haven, Yale University Press, 2005.

Artigo recebido em abril de 2007 e aprovado para publicação em maio de 2007.

  • 2 As principais publicações dos historiadores desta corrente historiográfica são as seguintes: Sergio Villalobos et al., Relaciones fronterizas en la Araucanía, Santiago do Chile, Ediciones Universidad Católica de Chile, 1982;
  • Sergio Villalobos e Jorge Pinto R. comps., Araucanía, temas de historia fronteriza, Temuco, Universidad de la Frontera, 1985;
  • Leonardo León et al. Araucanía: la frontera mestiza, siglo XIX, Quito, Abya Yala, 2004.
  • 3 Miguel Alberto Bartolomé, "As etnogêneses: velhos atores e novos papéis no cenário cultural e político", Mana, vol. 12, n. 1, 2006, p. 39-68;
  • Guillaume Boccara, "Colonización, resistencia y etnogénesis en las fronteras de las Américas", in Guillaume Boccara ed., Colonización, Mestizaje y Resistencia en las Américas, Lima/Quito, Instituto Francés de Estudios Andinos/Ed. Abya Yala, 2002, p. 47-82;
  • Guillaume Boccara, "Génesis y estructura de los complejos fronterizos euro-indígenas: Repensando los márgenes americanos a partir (y más all´s) de la obra de Nathan Wachtel", Memoria Americana, v. 13, Buenos Aires, 2005, p. 21-52;
  • Jonathan Hill ed., History, Power, and Identity: ethnogenesis ein the Ameritas, 1492-1992, Iowa City, University of Iowa Press, 1996;
  • João Pacheco de Oliveira, "Uma etnologia dos 'índios misturados'? Situação colonial, territorialização e fluxos culturais", Mana, vol. 4, n. 1, Rio de Janeiro, 1998, p. 47-77;
  • Gerald Sider, "Identity as History. Ethnohistory, ethnogenesis, and ethnocide in the Southeastern United States", Identities, 1996, vol. 1, p. 109-122.
  • 4 Sobre este tema, veja Guillaume Boccara, "Rethinking the Margins/Thinking from the Margins: Culture, Power, and Place on the Frontiers of the New World", Identities: Global Studies in Culture and Power, vol. 10, Taylor & Francis, 2003, p. 59-81.
  • 5 Sobre a noção de reche, ver o trabalho recente de José Isla, "Un lugar en el mundo. Notas Pewenche para una sociología de la distancia", manuscrito, Chile, 2005, 66 p.
  • , assim como Guillaume Boccara, Guerre et Ethnogenèse Mapuche dans le Chili Colonial, Paris, Editions L'Harmattan, 1998.
  • 9 Guillaume Boccara, "El podercreador: tipos de poder y estrategias de sujeción en la frontera sur de Chile en la época colonial", Anuario de Estudios Americanos, vol. LVI, n. 1, Sevilha, 1999, p. 65-94.
  • 10 Termo usado pelos espanhóis para dar conta da natureza da organização política indígena. Em geral, tem um sentido pejorativo que remete à ausência de chefia permanente e de um poder real do cacique de uma parcialidade. Para mais informações sobre as tipologias políticas da época colonial, ver Guilhaume Boccara."Rethinking the margins/thinking from the margins", Identity, vol. 10, Francis & Bacon, 2003, p. 59-81.
  • 11 "Le marbre et le myrte: de l'inconstance de l'âme sauvage", in Mémoire de la tradition,Aurore Becquelin y Antoinette Molinié, comps., Nanterre, Société d'Ethnologie, 1993, p. 365-431.
  • 12 "Antropología diacrónica. Dinámicas culturales, procesos históricos y poder político", in Guillaume Boccara y Sylva Galindo eds., Lógica Mestiza en América, Temuco, Universidad de la Frontera, 2000, p. 11-59.
  • 13 Tomo emprestado o conceito de territorialização de João Pacheco de Oliveira, que o conceitua da seguinte maneira: "A noção de territorialização é definida como um processo de reorganização social que implica: 1) a criação de uma nova unidade sociocultural mediante o estabelecimento de uma identidade étnica diferenciadora; 2) a constituição de mecanismos políticos especializados; 3) a redefinição do controle social sobre os recursos ambientais; 4) a reelaboração da cultura e da relação com o passado." ("Uma etnologia dos 'índios misturados'? Situação colonial, territorialização e fluxos culturais", Mana, vol. 4, n. 1, Rio de Janeiro, 1998, p. 55).
  • 15 Sobre o tema das modificações nas relações de trabalho no seio da sociedade mapuche, veja Guillaume Boccara, "'Mestizaje salvaje', trabajo y resistencia en la frontera hispanomapuche", in Eduardo França Paiva y Carla Maria Junho Anastasia (orgs.), O trabalho mestiço. Maneiras de pensar e formas de viver. Séculos XVI a XIX, São Paulo, Annablume/UFMG, 2002, p. 265-279.
  • 16Stone Age Economics, London, Routledge, 2005 (1972).
  • 17 Sobre as noções de grande homem, chefe e big man, veja Maurice Godelier, La production des Grands Hommes: pouvoir et domination masculine chez les Baryua de Nouvelle Guinée, Paris, Editions Fayard, 1982,
  • e Pierre Lemonnier, Guerres et festins: paix, échanges et compétition dans les highlands de Nouvelle-Guinée, Paris, Editions de la Maison des Sciences de L'Homme, 1990.
  • 18 Andrés Febrés, Arte de la lengua general del reino de Chile, Lima, 1775.
  • 20 Para um caso muito parecido de transformação política e de conexão exitosa aos mercados coloniais, veja o estudo de Pekka Hämäläinen sobre os Comanches, The Comanche Empire. A Study of Indigenous Power, 1700-1875, Finland, Helsinki University Press, 2001. Para uma recente síntese com respeito às relações entre colonizadores e indígenas nas fronteiras das Américas no século XVIII, veja o trabalho de David Weber, Bárbaros: Spaniards and Their Savages in the Ages of Enlightment, New Haven, Yale University Press, 2005.
  • 1
    Influenciados pela filosofia aristotélica, os espanhóis consideravam os índios gente carente de razão, ou seja, sem aptidão para a ação e para decidir sobre o que é bom ou mal para o homem. Segundo eles, ser gente de razão era ter aptidão que permitisse avaliar corretamente como agir, isto é, ter a capacidade de decidir sobre o que é útil e bom no que se refere à felicidade. Os indígenas não se incluíam nessa categoria de pessoa. Depois de afirmar em
    Politicia, "(...)
    the slave has no deliberative faculty (...)" (
    Politics, book 1, p. 454, in The Works of Aristotle, volume II, William Benton Publisher, Encyclopedia Britannica Inc., Chicago/London, 1952), Aristóteles afirma o seguinte: "
    But is there anyone thus intended by nature to be a slave, and for whom such a condition is expedient and right, or rather is not all slavery a violation of nature? There is no difficulty in answering this question, on grounds both of reason and of fact. For that some should rule and others be ruled is a thing not only necessary, but expedient; from the hour of their birth, some are marked out by subjection, others for rule" (Ibid., p. 447). Acrescenta, mais adiante, a respeito da racionalidade dos distintos grupos de pessoas que distingue (homens, mulheres, meninos e escravos): "(...)
    the virtue of the ruler we maintain to be different from that of the subject; the one being the virtue of the rational, and the other of the irrational part." (Ibid., p. 454).
  • 2
    As principais publicações dos historiadores desta corrente historiográfica são as seguintes: Sergio Villalobos
    et al., Relaciones fronterizas en la Araucanía, Santiago do Chile, Ediciones Universidad Católica de Chile, 1982; Sergio Villalobos e Jorge Pinto R. comps.,
    Araucanía, temas de historia fronteriza, Temuco, Universidad de la Frontera, 1985; Leonardo León
    et al. Araucanía: la frontera mestiza, siglo XIX, Quito, Abya Yala, 2004.
  • 3
    Miguel Alberto Bartolomé, "As etnogêneses: velhos atores e novos papéis no cenário cultural e político", Mana, vol. 12, n. 1, 2006, p. 39-68; Guillaume Boccara, "Colonización, resistencia y etnogénesis en las fronteras de las Américas", in Guillaume Boccara ed., Colonización, Mestizaje y Resistencia en las Américas, Lima/Quito, Instituto Francés de Estudios Andinos/Ed. Abya Yala, 2002, p. 47-82; Guillaume Boccara, "Génesis y estructura de los complejos fronterizos euro-indígenas: Repensando los márgenes americanos a partir (y más all´s) de la obra de Nathan Wachtel", Memoria Americana, v. 13, Buenos Aires, 2005, p. 21-52; Jonathan Hill ed., History, Power, and Identity: ethnogenesis ein the Ameritas, 1492-1992, Iowa City, University of Iowa Press, 1996; João Pacheco de Oliveira, "Uma etnologia dos 'índios misturados'? Situação colonial, territorialização e fluxos culturais", Mana, vol. 4, n. 1, Rio de Janeiro, 1998, p. 47-77; Gerald Sider, "Identity as History. Ethnohistory, ethnogenesis, and ethnocide in the Southeastern United States", Identities, 1996, vol. 1, p. 109-122.
  • 4
    Sobre este tema, veja Guillaume Boccara, "Rethinking the Margins/Thinking from the Margins: Culture, Power, and Place on the Frontiers of the New World",
    Identities: Global Studies in Culture and Power, vol. 10, Taylor & Francis, 2003, p. 59-81.
  • 5
    Sobre a noção de
    reche, ver o trabalho recente de José Isla, "Un lugar en el mundo. Notas Pewenche para una sociología de la distancia", manuscrito, Chile, 2005, 66 p. , assim como Guillaume Boccara,
    Guerre et Ethnogenèse Mapuche dans le Chili Colonial, Paris, Editions L'Harmattan, 1998.
  • 6
    O termo
    maloca ou
    malóm em mapundungun se refere a uma expedição militar, cujo objetivo é capturar cabeças de gado e "peças humanas".
  • 7
    Missões itinerantes durante as quais os missionários realizavam o batismo e o matrimônio em
    facie ecclesia e davam a extrema-unção aos índígenas das parcialidades não submetidas à ordem colonial.
  • 8
    O termo parcialidade era empregado pelos espanhóis para fazer referência às unidades socioterritoriais indígenas, nas quais reconheciam a presença de um chefe ou cacique. Na prática era um termo genérico, pouco preciso em termos sociopolíticos, que servia tanto para descrever como para construir a realidade indígena, além de ser útil para repartir os índios em
    encomienda.
  • 9
    Guillaume Boccara, "El podercreador: tipos de poder y estrategias de sujeción en la frontera sur de Chile en la época colonial",
    Anuario de Estudios Americanos, vol. LVI, n. 1, Sevilha, 1999, p. 65-94.
  • 10
    Termo usado pelos espanhóis para dar conta da natureza da organização política indígena. Em geral, tem um sentido pejorativo que remete à ausência de chefia permanente e de um poder real do cacique de uma parcialidade. Para mais informações sobre as tipologias políticas da época colonial, ver Guilhaume Boccara."Rethinking the margins/thinking from the margins",
    Identity, vol. 10, Francis & Bacon, 2003, p. 59-81.
  • 11
    "Le marbre et le myrte: de l'inconstance de l'âme sauvage", in
    Mémoire de la tradition,Aurore Becquelin y Antoinette Molinié, comps., Nanterre, Société d'Ethnologie, 1993, p. 365-431.
  • 12
    "Antropología diacrónica. Dinámicas culturales, procesos históricos y poder político", in Guillaume Boccara y Sylva Galindo eds.,
    Lógica Mestiza en América, Temuco, Universidad de la Frontera, 2000, p. 11-59.
  • 13
    Tomo emprestado o conceito de territorialização de João Pacheco de Oliveira, que o conceitua da seguinte maneira: "A noção de
    territorialização é definida como um
    processo de reorganização social que implica: 1) a criação de uma nova unidade sociocultural mediante o estabelecimento de uma identidade étnica diferenciadora; 2) a constituição de mecanismos políticos especializados; 3) a redefinição do controle social sobre os recursos ambientais; 4) a reelaboração da cultura e da relação com o passado." ("Uma etnologia dos 'índios misturados'? Situação colonial, territorialização e fluxos culturais",
    Mana, vol. 4, n. 1, Rio de Janeiro, 1998, p. 55).
  • 14
    No Chile e na Argentina colonial o
    conchavador é o comerciante, e o verbo conchavar significa negociar, vender, trocar.
  • 15
    Sobre o tema das modificações nas relações de trabalho no seio da sociedade mapuche, veja Guillaume Boccara, "'Mestizaje salvaje', trabajo y resistencia en la frontera hispanomapuche", in Eduardo França Paiva y Carla Maria Junho Anastasia (orgs.),
    O trabalho mestiço. Maneiras de pensar e formas de viver. Séculos XVI a XIX, São Paulo, Annablume/UFMG, 2002, p. 265-279.
  • 16
    Stone Age Economics, London, Routledge, 2005 (1972).
  • 17
    Sobre as noções de grande homem, chefe e
    big man, veja Maurice Godelier,
    La production des Grands Hommes: pouvoir et domination masculine chez les Baryua de Nouvelle Guinée, Paris, Editions Fayard, 1982, e Pierre Lemonnier,
    Guerres et festins: paix, échanges et compétition dans les highlands de Nouvelle-Guinée, Paris, Editions de la Maison des Sciences de L'Homme, 1990.
  • 18
    Andrés Febrés,
    Arte de la lengua general del reino de Chile, Lima, 1775.
  • 19
    Op. cit., p. 54.
  • 20
    Para um caso muito parecido de transformação política e de conexão exitosa aos mercados coloniais, veja o estudo de Pekka Hämäläinen sobre os Comanches,
    The Comanche Empire. A Study of Indigenous Power, 1700-1875, Finland, Helsinki University Press, 2001. Para uma recente síntese com respeito às relações entre colonizadores e indígenas nas fronteiras das Américas no século XVIII, veja o trabalho de David Weber,
    Bárbaros: Spaniards and Their Savages in the Ages of Enlightment, New Haven, Yale University Press, 2005.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Maio 2008
    • Data do Fascículo
      2007

    Histórico

    • Aceito
      Maio 2007
    • Recebido
      Abr 2007
    EdUFF - Editora da UFF Instituto de História/Universidade Federal Fluminense, Rua Prof. Marcos Waldemar de Freitas Reis, Bloco O, sala 503, 24210-201, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil, tel:(21)2629-2920, (21)2629-2920 - Niterói - RJ - Brazil
    E-mail: tempouff2013@gmail.com