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Vencidas a distância e floresta!: A Transbrasiliana e a Amazônia desenvolvimentista

The Transbrasiliana and the Amazon in the Age of Development

Resumo:

A construção da estrada Belém-Brasília foi a principal intervenção estatal na região amazônica durante o interregno democrático (1946-1964). Era entendida por setores da imprensa como a possibilidade de integração da região amazônica ao restante do País e à nova capital que estava sendo construída, Brasília. A estrada tiraria a Amazônia de um isolamento histórico, além de representar a vitória definitiva do homem contra a natureza, considerada uma das principais vilãs do progresso e do desenvolvimento da região. A análise da construção da Transbrasiliana também possibilita a reflexão sobre o impacto dos grandes projetos em regiões consideradas periféricas.

Palavras-chave:
Belém-Brasília; História da Amazônia; História da imprensa; Era do desenvolvimento

Abstract:

The construction of the Belém-Brasília highway was the main work developed in the Amazon region during the Brazilian democratic period between 1946 and 1964. It was understood by part of the press as a possibility of integrating the Amazon region to the rest of the country and to the new capital that was being built: Brasília. The highway would put an end to the Amazon’s historical isolation, and would also represent the ultimate victory of man against nature, which was considered one of the main villains of progress and development of the region. The analysis of the construction of Transbrasiliana enables the reflection of the impact of large projects in peripheral areas, such as the Brazilian Amazon.

Keywords:
Belém-Brasília; Amazon history; Press history; Age of development

Introdução

Oh! Musa esplendorosa e inspiradora esquivaacode ao estro meu! Da inspiração a chama ajuda-me a cantar, de maneira expressiva, essa obra gigantesca e bela, cuja fama alarga-se no mundo e do Brasil, festiva, a pujança, a grandeza e o despertar proclama (Rolim, 1960ROLIM, Azevedo. Transbrasiliana - poema brasilista. Rio de Janeiro: s.n, 1960., p. 12).

Belém-Brasília, Transbrasiliana ou BR-14: três nomes dados à rodovia que fez um corte de mais de 2 mil km na Floresta Amazônica e representou o maior projeto de intervenção na região no período entre as ditaduras do Estado Novo e a civil-militar. Construída entre 1958 e 1960, a estrada foi alvo de críticas e elogios por parte da imprensa nacional, explicitando as relações entre o presidente, os meios de comunicação e os grandes projetos da época. A partir da história da rodovia, vamos apontar o lugar da Amazônia no projeto nacional desenvolvimentista capitaneado por Juscelino Kubitschek (JK). Na República, a “redescoberta da Amazônia” não é novidade: é possível destacar, tanto em períodos democráticos quanto em ditaduras, discursos que tratavam a região como um lugar a ser “desbravado” (Pádua, 2000PÁDUA, José Augusto. Biosfera, história e conjuntura na análise da questão amazônica. História, Ciências, Saúde - Manguinhos, v. 6(suplemento), setembro, 2000.). Pretende-se também aqui demonstrar que a BR-14 é um exemplo de como a região amazônica foi interpretada pela agenda desenvolvimentista dos anos 1950. Inicialmente, vamos apontar os textos que se dedicaram à história da Belém-Brasília. Dessa forma, aspectos históricos, visões e acontecimentos do período serão levados em consideração. Em um segundo momento, será destacada a propaganda positiva produzida pela imprensa apoiadora do projeto para justificar a construção da rodovia. Por fim, vamos destacar a principal ideia subjacente a este processo: a “integração” da Amazônia, um espectro que rondou grande parte dos governos brasileiros do século XX.

A construção da Transbrasiliana esteve também diretamente relacionada à história do rodoviarismo juscelinista, marcado pela transição dos investimentos econômicos brasileiros e do abandono das antigas ferrovias. Conforme Paula (2008PAULA, Dilma Andrade. 154 anos de ferrovias no Brasil: para onde caminha esse trem? História Revista, Goiânia, v. 13, n. 1, p. 45-69, jan.-jun. 2008.) aponta, desde a década de 1920, o debate acerca dos meios de transportes no Brasil centrou-se na oposição entre as ferrovias e as rodovias, não conseguindo, assim, efetivar um projeto nacional e integrado. A partir dos anos 1950, ocorreram dois processos decisivos para esta mudança: a entrada maciça de investimentos estrangeiros no País e a passagem de uma economia voltada para a produção e exportação de produtos primários para outra mais voltada para o mercado interno. A partir do Plano de Metas, em 1956, ocorreu a progressiva criação e consolidação da indústria automobilística e das grandes empreiteiras de obras públicas. Assim, a ferrovia deixou de ser objeto de investimentos e passou a ser alvo de projetos de extinção e desativação, em especial aquelas que operavam transporte de passageiros, se restringindo a ramais metropolitanos (Paula, 2008PAULA, Dilma Andrade. 154 anos de ferrovias no Brasil: para onde caminha esse trem? História Revista, Goiânia, v. 13, n. 1, p. 45-69, jan.-jun. 2008.).

Juscelino Kubitschek e o neobandeirantismo

No tempo se manteve, incólume e fecundo, sonho secular de brasileiros outros até que o realizasse um grande Presidente. Ousado em suas metas à Pátria ele ofertou a rodovia enorme Que aos séculos dirá, sem falsos ditirambos, Na mais alta expressão dos temerários feitos, A fibra e a decisão do povo brasileiro! (Rolim, 1960ROLIM, Azevedo. Transbrasiliana - poema brasilista. Rio de Janeiro: s.n, 1960., p. 13)

O governo de Juscelino Kubitschek foi pródigo em ideias-forças que ainda povoam a política e o imaginário nacional: a crença no Brasil “país do futuro”, a consolidação de uma identidade nacional, o desequilíbrio entre os “dois brasis”, e a velha questão atraso versus modernização, além, é claro, da consagração do vocábulo “desenvolvimentismo” (Benevides, 2002BENEVIDES, Maria Victoria. O Governo Kubitschek: a esperança como fator de desenvolvimento. In: GOMES, Angela de Castro (org.). O Brasil de JK. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002.; Moreira, 2003MOREIRA, Vânia Maria Losada. Os anos JK: industrialização e modelo oligárquico de desenvolvimento rural. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucília de Almeida Neves. O Brasil Republicano - o tempo da experiência democrática - da democratização de 1945 ao golpe civil-militar de 1964. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.). Ocorreu também neste período o uso de imagens e representações sobre a Amazônia como forma de inserir a região neste discurso. A região era caracterizada constantemente como um “vazio” demográfico, cuja natureza fazia do homem um estrangeiro em sua própria terra (Gondim, 2007GONDIM, Neide. A invenção da Amazônia. Manaus: Editora Valer, 2007.). Os projetos e o ideário de ocupação de terras consideradas longínquas passaram a ser mais bem sistematizados a partir do Estado Novo, com o programa Marcha para o Oeste, em 1938. O programa teve a colaboração intelectual de Cassiano Ricardo, com sua obra Marcha para Oeste (a influência da Bandeira na formação social e política do Brasil), lançada em 1940, que reforçava o chamado “imperialismo interno”. Uma das principais influências de Ricardo foi o artigo clássico de Frederick Jackson Turner, The Significance of the Frontier in American History, de 1893TURNER, Frederick Jackson. The Significance of the Frontier in American History. Annual Report of the American Historical Association, p. 197-227, 1893.. De acordo com Franco (2012FRANCO, José Luiz de Andrade et al. Apresentação. In: FRANCO, José Luiz de Andrade. (org.). História ambiental: fronteiras, recursos naturais e conservação da natureza. Rio de Janeiro: Garamond, 2012.), Turner inaugurou um modo de conceber a história dos Estados Unidos da América a partir da compreensão da relação dos humanos com o meio natural que ocupam. “A fronteira, na obra de Turner, não é compreendida como um limite geográfico entre países e territórios (border), mas como uma terra livre, em processo de ocupação (frontier)” (Franco, 2012, p.10). Aqui nos interessa o que essa ideia significou para a relação entre a Amazônia e o Poder Central, tendo em vista que a região passou a ser encarada, a partir do Estado Novo, como um lugar a ser “conquistado”.

Na concepção de Turner e Ricardo, a fronteira atuaria como matéria-prima da elaboração de mitos que, por sua vez, deveriam ser superados para a formação de uma identidade nacional (Velho, 2009VELHO, Otávio Guilherme. Frentes de expansão e estrutura agrária - estudo do processo de penetração em uma área da Transamazônica. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais (Edição online), 2009.). Conforme destaca Silva (2009SILVA, Sandro Duarte. A natureza contra o progresso: mitos e narrativas do “destino bandeirante” na expansão desenvolvimentista. Textos de História, v. 17, n. 1, p. 85-106, 2009.), Cassiano Ricardo utilizou-se da ideia de fronteira como o fio condutor que daria unidade e legitimidade aos projetos de preenchimento dos “espaços vazios” do Brasil, utilizando-se de retóricas difundidas pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) durante o Estado Novo, como a “unidade nacional” e a “integração”, sempre em uma perspectiva centralizadora e autoritária, em oposição ao regionalismo característico da Primeira República (Silva, 2009SILVA, Sandro Duarte. A natureza contra o progresso: mitos e narrativas do “destino bandeirante” na expansão desenvolvimentista. Textos de História, v. 17, n. 1, p. 85-106, 2009.). A edição aqui utilizada de Marcha é a quarta, lançada em 1970, cuja capa interna traz um mapa da Belém-Brasília como um exemplo das novas fronteiras em movimento. Nesta edição, Ricardo acrescentou dois capítulos referentes às novas roupagens do bandeirismo (o capítulo XXV, As Bandeiras do século XX, e o capítulo XXVI, Outras modalidades de bandeirismo), que fazem referência à construção da Belém-Brasília e à Transamazônica, construída posteriormente durante o Governo Médici (1970), na Ditadura Militar. Tais medidas, de acordo com Ricardo, se fizeram necessárias, pois, à exceção de Kubitschek e Vargas, os outros governos teriam representado o aprofundamento da política do litoral, esquecendo-se das populações bandeirantes:

O engurgitamento do litoral só é explicável como reminiscência da colonização do tipo costeiro [...] [assim como] pela ausência de um coração que, no centro do nosso corpo geográfico, levasse o sangue a circular pelo Brasil todo [...]. Hoje, a bandeira continua a existir [...] pela inclusão da Marcha para Oeste nos programas de organização nacional e consequente retomada do espírito bandeirante [...] [pelo] Projeto Rondon e [pela] transamazônica. Anuncia-se a nova marcha. É o Brasil organizado que, de novo, caminha para o oeste, realizando o seu imperialismo interno, palmo a palmo [...] a estrada Belém-Brasília e a Transamazônica abrem novas perspectivas para o país na posse de si mesmo. A grandeza do Brasil exige o espírito bandeirante para a sua própria conquista - dado o imperialismo brasileiro, que é o nosso “expansionismo interno” - e o fenômeno bandeira não terá, portanto, deixado de existir (Ricardo, 1970RICARDO, Cassiano. Marcha para Oeste (a influência da Bandeira na formação social e política do Brasil 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 19701940., p.622-623).

Ricardo enaltece a atuação de JK por ter concretizado a cruzada “rumo ao oeste” que culminou na construção de Brasília. A realização de tal obra só poderia ficar a cargo do “mais bandeirante” dos homens do governo até então: Juscelino Kubitschek (Ricardo, 1970RICARDO, Cassiano. Marcha para Oeste (a influência da Bandeira na formação social e política do Brasil 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 19701940., p.624). A Belém-Brasília, para Ricardo, teria incrementado o bandeirismo do século XX em um sentido geoeconômico e geossocial, por meio das cidades e regiões abertas pela estrada. Ademais, a rodovia teria dado importantes lições à sua sucessora, a Transamazônica, pois os problemas enfrentados durante sua construção - condições extremamente desfavoráveis ao desenvolvimento da agricultura, falta de assistência direta ao lavrador e precariedade dos meios de transporte - serviriam de exemplos para evitar possíveis erros detectados no desenrolar de sua construção. Para Ricardo, “bandeirismo” e “desenvolvimento” se justapunham a um só e idêntico conteúdo, graças às novas Bandeiras que abririam o Brasil naquele momento (Ibid.).

O “sentido bandeirante” seria, assim, uma condição para que o homem dominasse a terra. Kubitschek, Vargas e Médici estariam inseridos em um dos novos bandeirismos do século XX, o bandeirismo estatal, que fazia parte dos programas de organização nacional destes governos (Ricardo, 1970RICARDO, Cassiano. Marcha para Oeste (a influência da Bandeira na formação social e política do Brasil 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 19701940.). Esse contexto produzia uma espécie de Estado em movimento, que construiria sua legitimidade à medida que se expandia pelo que se acreditava serem os espaços vazios do País. João Marcelo Maia, em seu estudo sobre a Fundação Brasil Central, aponta como marca das práticas estatais da agência o neobandeirantismo, ou seja, a forma pela qual os atores concebiam a produção do Estado naquele contexto histórico por intermédio de modos de imaginação espacial da nação, valendo-se assim de uma concepção aventureira da expansão estatal, empregando categorias como “desbravamento” e “penetração” (Maia, 2010MAIA, João Marcelo Ehlert. As ideias que fazem o Estado andar: imaginação espacial, pensamento brasileiro e território no Brasil Central. Dados - Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 53, n. 3, p. 621-655, 2010., p.620). Dito de outra forma, ideias estatais e ações não constituiriam uma relação meramente causal, bem como o Estado não seria uma máquina coesa, impondo regras assimétricas para o restante da sociedade. Os textos que buscavam justificar a existência da rodovia trouxeram à tona um vasto repertório de imagens preexistentes da região amazônica, como o “vazio demográfico” e exotismo. Tal repertório cultural não se deu de forma espontânea e descompromissada: foi construído a partir das críticas dos opositores do governo JK à construção de Brasília e às subsequentes rodovias do movimento de “integração”.

Entre os aspectos relevantes para compreender este contexto e, de certa forma, montar este mosaico analítico, estão: o jogo parlamentar e as disputas envolvendo a União Democrática Nacional (UDN) e os dois partidos que sustentavam o governo (o Partido Social Democrata - PSD - e o Partido Trabalhista Brasileiro - PTB); a ampla rede de contatos com a qual o presidente contava na imprensa; e, por fim, a situação da Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), agência responsável por liderar as políticas de desenvolvimento regional, que passava, à época, por intensas críticas, acusações e comissões parlamentares de inquérito (CPIs). Representações da fronteira - vista como a vitória da “civilização” contra o “atraso”, o neobandeirantismo - expostas na caracterização de Juscelino Kubitschek como desbravador, assim como imagens negativas da natureza e da floresta amazônica, deram o tom dos discursos sobre a rodovia.

Uma obra “ciclópica”

Esse é o mundo assombroso, o mundo extraordinário, cuja grandiosidade, assaz impressionante, passa a ser fecundada pelo arrojo invulgar, o feito rodoviário que é a Brasília-Belém, da Pátria, de ora em diante, a portentosa estrada! (Rolim, 1960ROLIM, Azevedo. Transbrasiliana - poema brasilista. Rio de Janeiro: s.n, 1960., p.40 )

Em discurso anterior ao anúncio da construção da estrada, o deputado federal oposicionista Gabriel Hermes, da UDN (Pará), foi ao Congresso tecer diversas críticas à SPVEA, apontando o Governo Federal como culpado pela sua insatisfatória atuação. Segundo ele, o governo estaria tratando de duas nações, usando dois pesos e duas medidas, prejudicando, assim, a região amazônica. Mesmo contando com um dispositivo constitucional que destinava parte do orçamento anual para a região, o governo estaria fazendo vista grossa para os problemas da Amazônia, que, além de não receber as verbas previstas, não participara até então dos planos de eletrificação, saúde, habitação e irrigação elaborados pelos órgãos de planejamento (Brasil, 1958BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Centro de Documentação e Informação. Coordenação de Relacionamento, Pesquisa e Informação. Diário do Congresso Nacional. Brasília: Coordenação de Relacionamento e Pesquisa e Informação (Corpi) , 28 de agosto de1958b., p.307)1 1 Brasil, Diário do Congresso Nacional, 26/03/1958, p. 307. Da Constituição de 1946 constava o artigo 199, que previa o repasse de 3% do Orçamento da União para ações que visassem o soerguimento da região amazônica. Para fiscalizar e utilizar o montante, foi formada em 1947 a Comissão do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (Cepevea). A partir de 1953, foi criada a SPVEA, que seria extinta em 1966, durante o regime militar, dando lugar à Superintendência e Desenvolvimento da Amazônia (Sudam).. . Para o deputado, a construção de Brasília estaria subtraindo os recursos destinados à região:

O Governo Federal, nas suas famosas metas - entre as quais se inclui a loucura de Brasília, nenhum programa estabeleceu em defesa da região amazônica. A meta especial de Brasília está absorvendo os minguados recursos de que dispomos, esgotando assim a nossa capacidade de realizar o indispensável em outros setores [...]. A inflação com a sua gritante e desenfreada marcha aniquila as iniciativas e provoca a miséria dos homens da Amazônia, beneficiando poucos (Brasil, 1958BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Centro de Documentação e Informação. Coordenação de Relacionamento, Pesquisa e Informação. Diário do Congresso Nacional. Brasília: Coordenação de Relacionamento e Pesquisa e Informação (Corpi) , 28 de agosto de1958b., p.309).

Ao longo de sua trajetória parlamentar, Gabriel Hermes manteve suas críticas direcionadas aos projetos públicos para a Amazônia em geral, e para a SPVEA em particular. Sua postura combativa pode ser atribuída, em parte, ao fato de integrar o grupo de oposição ao diretor da agência, o sanitarista Waldir Bouhid (PSD). De seus planos, constava a intenção de instalar uma CPI para investigar a aplicação dos recursos destinados àquela superintendência. Sua frequência e posição de destaque na tribuna do parlamento provinham da importância do cargo que ocupou durante a maior parte do Governo Kubitschek: presidente da Comissão do Plano para a Valorização Econômica da Amazônia, órgão responsável pela fiscalização dos recursos dirigidos à SPVEA. Posteriormente, durante o período ditatorial, Hermes se transformaria em partidário da Aliança Renovadora Nacional (Arena), e comporia grupos de trabalho sobre o desenvolvimento da Amazônia.

Em 1960, já no final do governo Kubitschek, ainda se ouviam ponderações sobre a Belém-Brasília. Em aparte ao discurso do deputado federal Oscar Corrêa (UDN/Minas Gerais-MG), Carmelo D’Agostino (PSD/São Paulo-SP), da própria base aliada do governo (que, àquele momento, apresentava turbulências) criticou a construção da estrada, em especial do ponto de vista econômico. Considerava a BR-14 uma obra “ciclópica”, sem a devida contrapartida econômica para ocupá-la:

Esta grandiosidade da obra, se me permite, caiu no abstrato. Não há produtividade que se lhe possa dar, no sentido do aproveitamento econômico brasileiro. Ela aí está. O que teremos para trafegar nessas estradas, para integrá-las no sentido nacional e econômico? Produtos produzidos nas suas margens? [...] Quer ir à integração da nossa grandeza geográfica, deixando a econômica. [...] Enquanto se construíam as grandes estradas, nós sentíamos falta da carne, do feijão [...] mergulhando numa das mais graves carestias por que passou o país. [...] Isso não se admite mais no estatismo moderno, menos ainda que uma população se sacrifique pela falta de racionalização dos projetos governativos (Brasil, 1960BRASIL. O planejamento transforma a Amazônia. Rio de Janeiro: SPVEA, 1960b., p.230).

Mantiveram-se, portanto, até os tempos finais do Governo JK, as críticas - agora não só da oposição, como também da base aliada - ao seu Plano de Metas e à falta de visão quanto ao maior aproveitamento econômico das obras destinadas à região. É importante ressaltar que a propaganda positiva sobre a obra se impôs sobre as vozes dissonantes, tendo em vista a pluralidade de mídias utilizadas pelo Governo Kubitschek para divulgar a “nova” descoberta da Amazônia. A associação entre o contexto político democrático e a força de JK entre grandes veículos de comunicação ajudou a construir a imagem pública do “Presidente Bossa Nova”, e jogou no limbo as eventuais inconsistências do Plano de Metas, prevalecendo, afinal, o slogan dos anos JK, “50 anos de progresso em 5 anos de governo”. Como exemplo do tratamento dado aos críticos das realizações governamentais, transcrevemos aqui um breve trecho da publicação estatal (editada pela própria SPVEA) denominada O planejamento transforma a Amazônia, na qual a tensão entre a defesa contra denúncias e a propaganda das obras se faz presente.

Agora que todo o país se lança em um programa de obras a que se deu o nome de metas, surgem os reclamos, os protestos, sob as alegações mais diversas, algumas paradoxais. [...] Doze anos de redemocratização mostraram que o essencial em matéria de política partidária é procurar destruir o adversário e substituí-lo no poder. Nenhuma outra lei ou política rege a conduta política senão essa. Daí o clamoroso abuso e consequente descrédito, no Poder Legislativo, das Comissões Parlamentares de Inquérito, que de tanto procurarem escavar episódios [...] terminam reconhecendo a inutilidade de esforço vão, tanto foi o tempo perdido(Brasil, 1960, p.2-3).

As opiniões desfavoráveis ao governo sempre mereceram resposta, oficiosa (por meio de artigos em jornais e/ou revistas) ou oficial (via departamento de imprensa dos órgãos públicos). Em uma publicação da SPVEA, Brasília e Amazônia, houve uma resposta às críticas de Gustavo Corção, que considerava tanto Brasília quanto a estrada verdadeiros “disparates” (Vaitsman, 1959VAITSMAN, Maurício. Brasília e Amazônia - reportagens. Rio de Janeiro: SPVEA , 1959., p.123). Para Corção - escritor e pensador católico, membro da UDN e um expoente do pensamento conservador no Brasil -, era considerada antieconômica qualquer estrada que não servisse de imediato a núcleos demográficos progressistas já existentes no traçado. Para o autor, este seria um “absurdo pensamento”, que refletia o “espírito mercantilista” de certas camadas influentes (pertencentes à oposição):

Escrevendo como o fez, contra a maior das tentativas nacionais para aproveitamento, pelos próprios brasileiros, dessas imensas áreas despovoadas [...] o ilustre escritor Gustavo Corção presta um péssimo serviço a este país, justificando aqueles seus colegas estrangeiros que protestam contra os vazios territoriais do Brasil em um mundo pletórico de gente faminta... (Vaitsman, 1959VAITSMAN, Maurício. Brasília e Amazônia - reportagens. Rio de Janeiro: SPVEA , 1959., p. 122).

Assim, essas duas dimensões (entusiastas e oposicionistas) estavam presentes nas narrativas do período. Na próxima seção, vamos apontar a “rede de confiança” estabelecida pelo presidente, e que possibilitou a elaboração de vasto material propagandístico sobre a Belém-Brasília.

Uma obra incompreendida?

O futuro dirá dessa obra-monumento incompreendida, agora, e até, por despeitados,por adversários cruéis, e pelos maldizentes, subestimada assaz - do seu merecimentocomo avanço sem par, dos mais acelerados na história rodoviária em nossos continentes! (Rolim, 1960ROLIM, Azevedo. Transbrasiliana - poema brasilista. Rio de Janeiro: s.n, 1960., p. 53)

Juscelino Kubitschek obteve um apoio de parte significativa da imprensa, em especial dos meios associados a quatro grandes grupos do período: os Diários Associados, de Assis Chateaubriand, o Grupo Bloch, de Adolpho Bloch, o Última Hora, do Samuel Wainer, e o Correio da Manhã, de Edmundo Bittencourt . A única oposição constante ao presidente foi o Tribuna da Imprensa, pertencente à Carlos Lacerda (Bizello, 2010BIZELLO, Maria Leandra. Imagens otimistas: representações do desenvolvimentismo nos documentários de Jean Manzon. 1995. Dissertação (Mestrado em Multimeios) -Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, Campinas. 1995., Birolli, 2004BIROLI, Flavia. Liberdade de imprensa: margens e definições para a democracia durante o governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960).Rev. Bras. Hist. [online]. 2004, vol.24, n.47 [cited:] 02-20-2019, pp.213-240. Available from: <Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext &pid=S0102-01882004000100009&lng=en&nrm=iso >>. ISSN 0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-01882004000100009
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
). O mito criado em torno da morte de Bernardo Sayão é um reflexo deste processo.2 2 Bernardo Sayão faleceu no término das obras da Belém-Brasília, atingido por uma árvore. Sobre a criação do mito envolvendo o engenheiro, ver Silva, 2017. Contratada pelo Governo JK, a produtora Jean Manzon Films elaborou dois curtas favoráveis à rodovia.3 3 Após a ocupação da França pelos alemães durante a II Guerra Mundial, Jean Manzon, assim como muitos de sua geração, teve de sair de sua terra natal. A partir da indicação do cineasta Alberto Cavalcanti, Manzon foi contratado em 1942 por Lourival Fontes, então diretor do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), para a organização do setor de reportagens fotográficas do órgão. O prestígio do fotógrafo cresceu nos anos subsequentes, em especial a partir de dois eventos específicos: em 1942, quando se tornou fotógrafo pessoal do então presidente Getúlio Vargas, e em 1943, ano no qual Assis Chateubriand contratou o fotógrafo para trabalhar, ao lado do jornalista David Nasser em reportagens para O Cruzeiro. Em 1952, abandonou o fotojornalismo para abrir uma empresa de documentários. De forma geral, os estudiosos da carreira de Manzon destacam sua influência no Poder Público como uma das razões pelas quais o então fotógrafo abriu sua produtora (Bizello, 1995; Cardenuto Filho, 2008). Amazônia vai ao encontro de Brasília foi produzido e lançado em 1958, nos primeiros momentos dos debates sobre a construção da estrada. Uma das ideias recorrentes no texto do poeta Paulo Mendes Campos, narrado na conhecida voz do Repórter Esso Luiz Jatobá, é a de novidade. Ou seja, nada existia na Amazônia até a chegada do “novo bandeirante” Juscelino Kubitschek de Oliveira:

A Amazônia era até então o Inferno Verde. Um mundo estranho, onde seres misteriosos se moviam como fantasmas dentro das florestas ou sobre as águas silenciosas dos seus rios. Porém, aquele rio imenso que parecia um continente líquido a caminhar deixaria de ser uma longínqua e proibida miragem perdida no milagre de Belém do Pará, centro de progresso isolado. Num pequenino avião, voando sobre a floresta, um homem sabia que todas essas riquezas fabulosas da Amazônia não poderiam continuar separadas do corpo do continente brasileiro. Uma estrada precisava ser aberta de qualquer jeito, fossem quais fossem os obstáculos: florestas, pântanos ou rios (Manzon, 1958MANZON, Jean. A Amazônia vai ao encontro de Brasília. Jean Manzon Films, 1958.).

A ideia de “novidade” associada ao Brasil central e à região amazônica foi significativamente utilizada nos anos de inauguração de Brasília e na construção da estrada (Vieira, 2007VIEIRA, Tamara Rangel. No coração do Brasil, uma capital saudável: a participação dos médicos e sanitaristas na construção de Brasília (1956-1960). Hist. cienc. saude-Manguinhos [online]. 2009, vol. 16, suppl.1 [cited 02-2019] pp.289-312. Available from: <Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702009000500014&lng=en&nrm=iso >. ISSN 0104-5970. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-59702009000500014
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
; Silva, 2009SILVA, Sandro Duarte. A natureza contra o progresso: mitos e narrativas do “destino bandeirante” na expansão desenvolvimentista. Textos de História, v. 17, n. 1, p. 85-106, 2009.). Em 1960, era lançado o documentário Coluna Norte, que dava conta da recém-inaugurada capital e da recém-construída estrada. Porém, o principal objetivo da cinerreportagem era outro, o de celebrar a construção das estradas e promover a indústria automobilística nacional, por meio da Caravana de Integração Nacional, antes da inauguração de Brasília. Saindo dos quatro pontos cardeais e encontrando-se na nova capital, foram organizadas quatro caravanas, com origem em Porto Alegre (Coluna do Sul), Cuiabá (Coluna do Oeste), Belém (Coluna Norte) e São Paulo (Coluna do Leste). A caravana também buscava promover a construção da estrada Belém-Brasília, mesmo que poucos trechos estivessem asfaltados. O filme apresentava um breve histórico da estrada, sempre apostando na fala da “integração”:

A primeira árvore tombada. Um areal de rios, uma floresta espessa, um mundo de [...] mistérios. Um pesadelo cheio de duendes e ameaças separavam o Norte e o coração do Brasil. A estrada Belém-Brasília começava. [...] vossos machados de gumes cortantes... Pioneiros, ó pioneiros... [...] Sessenta veículos brasileiros vão decifrar os segredos do Inferno Verde. [...]Avançam, avançam as serradas fileiras com as novas etapas sempre a conquistar. As baixas, rapidamente preenchidas em meio de lutas e derrotas, sempre avançando [...]. Rampas abaixo, picadas adentro, escarpas acima, conquistando, dominando, desafiando a enfrentar caminhos desconhecidos [...]. Interrompeu-se aqui a marcha de Bernardo Sayão. Um homem, ó morrer, sempre avançando, um entre nós deve tombar e morrer? Soou a hora de alguém? Marchando é que morremos dignamente pioneiros, ó pioneiros... [...]. Só os que fazem da ação a irmã do sonho acreditaram nessa estrada. [...] As imagens da selva primitiva são substituídas pelas modulações modernas de uma arquitetura harmoniosa. Nisto reside a beleza tocante da integração geográfica, econômica e social. Uma integração dos contrastes [...] (Manzon, 1960MANZON, Jean. Coluna Norte. Jean ManzonFilms, 1960.).

De acordo com Afrânio Mello, repórter que acompanhou a Coluna Norte, tratou-se de uma “viagem histórica” (Melo, 1960MELO, Afrânio. Dez Dias na Belém-Brasília. Cadernos Belém-Brasília, Rio de Janeiro: Editora SPVEA, 1960., p.12). Assim, muitos a acompanhariam com inveja e entusiasmo, e outros, certos de que seriam comidos por índios. Para o repórter, a caravana trazia à tona a vitória do homem sobre a natureza, bem como uma visão nada aterradora da região, vista como monótona. Tratava-se, segundo ele, de um “espetáculo admirável”:

Espetáculo admirável, o de ver-se centenas de cidadãos armando e desarmando redes e camas de campanha, carregando-as e descarregando-as de suas viaturas, disputando alegremente um lugar à mesa, ou um canto do riacho para o banho diário, sem definições de ordem social. Sente-se, contudo, que, mais uma vez, o homem venceu a selva, dominou-a por completo e, rompendo-a, deixou a sua passagem enfeitada de galhos e de árvores batidas, de queimadas, de campo de pouso e de acampamentos. [...] Depois do [rio] Guamá, entramos na floresta virgem, na monotonia da paisagem, quebrada, aqui e ali, pelas queimadas na beira da estrada. A perder de vista [...] as árvores majestosas, como a desafiar, com a sua imponência, novos desbravadores (Melo, 1960MELO, Afrânio. Dez Dias na Belém-Brasília. Cadernos Belém-Brasília, Rio de Janeiro: Editora SPVEA, 1960., p.13).

De fato, a construção da rodovia rendeu momentos dignos de aventura, com a morte de alguns dos envolvidos e o desafio de acender clareiras na floresta amazônica. Um exemplo é descrito no relatório da Rodobras O planejamento transforma a Amazônia (Brasil, 1960bBRASIL. O planejamento transforma a Amazônia. Rio de Janeiro: SPVEA, 1960b.), quando, impossibilitados de abrir uma clareira por terra para construir uma pista de aterrissagem, um grupo de funcionários desceu por cabo e guincho, dentro da mata, durante 60 dias consecutivos. Dessa forma, conseguiram estabelecer um campo de pouso para aviões leves poderem realizar o abastecimento das turmas. De acordo com os jornalistas presentes à época das obras e na inauguração, a fome era um dos grandes problemas enfrentados pelos lambaios, como eram chamados os funcionários que trabalharam na construção da rodovia.

Outro exemplo “aventureiro” foi descrito pelo jornalista Arnaud Pierre (1960PIERRE, Arnaud. Primeira viagem na Belém-Brasília. Rio de Janeiro: SPVEA, 1960. (Cadernos Belém-Brasília, v. 4). PINTO, Lúcio Flávio. O trauma amazônico: as estradas de rodagem. Jornal Pessoal, Belém, agosto de 2010. Disponível em: < https://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1270>. Acesso em: 25/01/2018), que narrou casos de debandada geral por conta da carência alimentar. Os trabalhadores embrenhavam-se nas matas próximas em busca de caça, mas o fato de não poderem se afastar muito da clareira aberta limitava o sucesso da empreitada, passando eles a depender do abastecimento aéreo, não só para a continuidade das obras, mas, sobretudo, para a própria sobrevivência. Muitos desses trabalhadores morreram durante as obras em virtude da escassez de alimentos e do acometimento da malária. Os alimentos eram jogados por meio de paraquedas, e, como citam as testemunhas oculares do processo, pequenos animais vivos (principalmente porcos) eram arremessados sobre as picadas abertas na mata. Era comum ver porcos estatelados no chão ou mesmo pendurados nos galhos das árvores. Como aponta o jornalista: “Isso, naturalmente, causará horror às senhoras da Sociedade Protetora dos Animais, mas é que a luta contra a fome não conhece leis, nem piedade” (Pierre, 1960PIERRE, Arnaud. Primeira viagem na Belém-Brasília. Rio de Janeiro: SPVEA, 1960. (Cadernos Belém-Brasília, v. 4). PINTO, Lúcio Flávio. O trauma amazônico: as estradas de rodagem. Jornal Pessoal, Belém, agosto de 2010. Disponível em: < https://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1270>. Acesso em: 25/01/2018, p.24). As narrativas, mesmo em relatórios oficiais, tinham o tom de aventura e epopeia, ao expor fatos como a falta d’água durante grande parte do período de execução obras:

[...] já no mês de outubro, 4 mil homens trabalhavam num regime de sol a sol, procurando vencer a batalha contra o tempo, numa epopeia sem precedentes e ainda agravada pela quase absoluta falta d’água decorrente do intenso verão então verificado, o que se constitui quase um paradoxo na hileia amazônica [...] cumprida a [...] grande missão, a até então indevassada Floresta Amazônica dobrava-se, vencida à conta do mais forte do trabalhador nacional. [O quantitativo de material humano utilizado] diz bem do incomensurável esforço desenvolvido pela Rodobras no sentido de implantar em regiões [...] entregues ao capricho da natureza e ao domínio das lendas, o traçado da rodovia (Rodobras, 1960RODOBRAS. Rodovia Belém-Brasília: a Rodovia da unidade nacional e suas implicações de ordem técnica, econômica e política. Rio de Janeiro: s.n, 1960, p.1).

Nas penas dos apoiadores do governo, os acontecimentos aqui descritos tornaram-se uma autêntica epopeia (por mais que fossem, de fato, dignos de atenção), mediante a apropriação e ressignificação da dicotomia histórica entre homem e natureza, civilização e atraso, que agora poderia ser superada pela política desenvolvimentista. Tais cores formaram o mosaico heroico das narrativas aventureiras sobre a BR-14. O que ocorreu com a construção da Belém-Brasília não foi algo particular, pois é possível encontrar paralelo em outras expedições e excursões realizadas por agentes estatais. Os relatórios resultantes da Fundação Brasil Central reforçaram essa abordagem epopeica, incorporando os modos clássicos de narrar a ação humana sobre o espaço e embutindo a ideia de aventura, estranha à impessoalidade característica de escritos burocráticos. A linguagem do ineditismo e da aventura imiscuiu-se, portanto, na prática discursiva dos agentes governamentais (Maia, 2010MAIA, João Marcelo Ehlert. As ideias que fazem o Estado andar: imaginação espacial, pensamento brasileiro e território no Brasil Central. Dados - Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 53, n. 3, p. 621-655, 2010.). Este fenômeno também é detectado nas narrativas sobre a Belém-Brasília, mas de forma um pouco diferente: o agente estatal per se, Juscelino Kubitschek, incorporou tais concepções em sua memória, fruto de diversos artigos e obras escritas por agentes não estatais, mas partidários dele, como os jornalistas Arnaud Pierre, Maurício Vaitsman e Afrânio Mello. Contando com a colaboração de uma extensa rede de confiança, JK conseguiu que essa construção ideológica tomasse forma em jornais, livros, revistas e filmes.

Nas narrativas sobre a Belém-Brasília, o presidente Juscelino Kubitschek é visto como o exemplo máximo da incorporação do espírito bandeirante, mas um acontecimento próximo à inauguração da estrada mudou os rumos desta apropriação: a morte de Bernardo Sayão, ironicamente atingido pelas mesmas árvores que a Rodobras, empresa responsável pela construção da estrada, derrubava. Tal fato reforçou o caráter desbravador e pioneiro do engenheiro. Esta última característica faz referência às pessoas que se deslocaram para trabalhar e habitar as cidades rejuvenescidas ou criadas após a construção. Dessa forma, Sayão era nivelado, pelas reportagens e discursos, aos outros funcionários, tendo assim sua personalidade mitificada. Sua representação como o “tipo ideal” de bandeirante serviu para justificar os discursos sobre a natureza, apresentando, em decorrência do fato, aspectos “vingativos”, e reforçando a necessidade de incursão, expansão territorial e desenvolvimento.

Em vez de sua morte ser vista como uma das consequências da falta de planejamento da construção da rodovia, as narrativas desenvolvimentistas reforçaram a necessidade de ampliar o enfrentamento à natureza, ao mesmo tempo em que o engenheiro recebia as glórias do bandeirismo (Silva, 2009SILVA, Sandro Duarte. A natureza contra o progresso: mitos e narrativas do “destino bandeirante” na expansão desenvolvimentista. Textos de História, v. 17, n. 1, p. 85-106, 2009.). Um aspecto revelador da apropriação do fato pela propaganda sobre a rodovia encontra-se na junção de todas as reportagens e discursos favoráveis ao engenheiro em uma publicação do Serviço de Documentação da Presidência da República intitulada Bernardo Sayão - bandeirante moderno, em 1959, mesmo ano de sua morte. Sayão foi, também, o primeiro morto enterrado no cemitério de Brasília, ressaltando, ironicamente, sua trajetória pioneira.4 4 Até a presente data (e esperamos que no futuro também), o enterro de Sayão está disponível no sítio YouTube. Corpo do engenheiro Bernardo Sayão chega a Brasília em 1959. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=CvLbVRwv2hY&feature=related>. Acesso em: 10 de junho de 2017.

E a epopéia chega ao fim...

É a Transbrasiliana, a fabulosa estrada. A Pátria, através dela, encontrou-se a si mesma. Não mais existe, agora, a Amazônia isolada, que o homem, contrariando a própria natureza, ao coração da pátria uniu-a com essa estrada. Mais uma vez venceu o homem civilizado, vencera a inteligência, e do trabalho, a força semeadora de luz, que cria e que constrói. (Rolim, 1960ROLIM, Azevedo. Transbrasiliana - poema brasilista. Rio de Janeiro: s.n, 1960., p. 43)

A história da construção da estrada Belém-Brasília é um dos indícios que demonstram que o discurso de progresso e do desenvolvimento atingiu um clímax no Governo JK, em especial porque tais concepções estavam entranhadas nos projetos governamentais, como o Plano de Metas. Mesmo com a história da rodovia sendo contada em prosa e verso, reforçando os aspectos épicos e desbravadores, os problemas não foram excluídos dos livros publicados pela SPVEA. Em todos, há menção ao problema da grilagem de terras, ocorrida em função do rápido crescimento das cidades, mas, pela riqueza dos detalhes, o livro de Arnaud Pierre é o escolhido aqui. Os maiores problemas, segundo o jornalista, seriam a ocupação desordenada das terras e a especulação, pois até aquele momento (1960), posseiros e grileiros estavam em oposição em 35 pontos diferentes de Goiás. Um exemplo é Gurupi, cidade que foi emancipada após a chegada da rodovia. Um morador, em depoimento a Pierre, afirmou: “[...] em 1957, comprei cinco lotes por 19.600 cruzeiros, e em 1958, vendi três por 86.000 cruzeiros. E hoje me arrependo” (Pierre, 1960PIERRE, Arnaud. Primeira viagem na Belém-Brasília. Rio de Janeiro: SPVEA, 1960. (Cadernos Belém-Brasília, v. 4). PINTO, Lúcio Flávio. O trauma amazônico: as estradas de rodagem. Jornal Pessoal, Belém, agosto de 2010. Disponível em: < https://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1270>. Acesso em: 25/01/2018, p. 71).

[...] hoje a terra vale ouro. Quem não tem dinheiro se apossa de um bocado: entra nela, planta, faz casa e diz que a terra é sua. Quem tem dinheiro não vai lá, nem pensa nunca ir. Mas compra terra, e muita, e espera valorizar. A questão da terra em Goiás vai dar trabalho, nos próximos anos. Muita gente vai chorar, jogada pra fora da que pensa ser sua, muita gente vai esbravejar, ao perceber que caiu no conto do vigário, comprando terras lá [...].5 5 Ibid., p. 75.

Os piores locais da região eram os antigos acampamentos das empreiteiras da Rodobras. Um exemplo era Paraíso, que, mesmo junto a acampamentos da empresa, tinha casos constantes de assassinatos devido a disputas de terras e “de mulheres” (Pierre, 1960PIERRE, Arnaud. Primeira viagem na Belém-Brasília. Rio de Janeiro: SPVEA, 1960. (Cadernos Belém-Brasília, v. 4). PINTO, Lúcio Flávio. O trauma amazônico: as estradas de rodagem. Jornal Pessoal, Belém, agosto de 2010. Disponível em: < https://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1270>. Acesso em: 25/01/2018, p.76). Para conseguir certa conscientização dos moradores das cidades, os engenheiros e funcionários da Rodobras buscaram fazer um “desarmamento geral”, para servir de exemplo aos residentes locais, visto que, por questão de segurança, os próprios engenheiros tinham que andar armados. Aqui entra o registro “fantástico”, pois, segundo o jornalista, as armas também tinham a função de matar as onças, mesmo que, até aquele momento, elas fossem inexistentes.

O ocaso da Belém-Brasília é diretamente relacionado ao final do Governo JK, marcado por denúncias de corrupção que deram origem ao famoso jingle “varre vassourinha” de Jânio Quadros, cujas acusações ao então presidente fortaleceram sua campanha política, além de enfraquecer o candidato da situação, Marechal Henrique Teixeira Lott. Jânio apresentava-se como a autoridade que “daria ordem ao caos” em que se encontrava o Governo Kubitschek. Assim, não à toa, logo após a vitória de Jânio Quadros, a Rodobras foi extinta e incorporada ao Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) e as obras da Belém-Brasília, paralisadas. É importante lembrar que, durante o Governo Kubitschek, a estrada fora apenas aberta, sem asfaltamento. Segundo Barreto (1965BARRETO, Roberto Menna. Aventura através do progresso. Rio de Janeiro, SPVEA, 1965.), foi o período no qual a estrada passou por maior desgaste. O decreto-lei no 50.272, de 1961, tirou da SPVEA o plano de viação da Amazônia, deixando-o todo para o DNER. No Governo João Goulart, a Rodobras foi recriada, ficando a administração da aplicação dos recursos destinados à complementação da Belém-Brasília (decreto no 420, de 1961) novamente a cargo da SPVEA. O traçado definitivo foi acrescido de 350 quilômetros, com o objetivo de restabelecer o trânsito na rodovia. Durante os meses de janeiro a dezembro de 1963, o tráfego foi interrompido em diversos trechos da estrada, ocasionando prejuízos ao abastecimento da região. A solução foi retornar ao abastecimento aéreo, realizado pelo Exército. Após o golpe civil-militar de 1964, o general Mário Barros de Cavalcanti tornou-se o novo dirigente da Rodobras e da SPVEA. Período também, segundo reportagem de 1965 de Roberto Menna Barreto, de enorme desgaste da BR-14:

[...] em março e abril de 1964, mais de 200 caminhões ficaram efetivamente detidos, atolados na estrada. As fotografias aéreas da estrada durante esse período são deprimentes, lembram cenas de guerra, comboios danificados. [...] é frequente encontrar-se na estrada caminhões, tratores, carregadeiras e motoniveladoras abandonados, imprestáveis, retorcidos de ferrugem. Vítimas muito da descontinuidade administrativa [...] (Barreto, 1965BARRETO, Roberto Menna. Aventura através do progresso. Rio de Janeiro, SPVEA, 1965., p.24)

Em 1964, logo após assumir a administração da rodovia e da recém-restabelecida Rodobras, o general Mário de Barros Cavalcanti criticou o estado em que se encontrava a estrada. O relatório do general destacava a forma pela qual a rodovia fora rasgada sem as devidas análises prévias que permitissem a elaboração de um projeto definitivo, e explica que, para atingir a normalidade administrativa, foi necessário eliminar os elementos “corruptos e subversivos” e revisar a tabela numérica de vencimentos do pessoal que trabalhava na construção (Cavalcanti, 1967CAVALCANTI, Mário de Barros. Relatórios Rodobras - 1964-1966. In: CAVALCANTI, Mário de Barros . Da Spvea à Sudam (1964-1967). Belém: Sudam, 1967., p.436). Entre julho e agosto de 1965, um convênio entre a SPVEA e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) resultou na elaboração de um relatório sobre o estado da arte da estrada, que, àquele momento, apresentava desgastes ao longo do percurso. Já era notório que determinadas regiões da rodovia serviram apenas à especulação, resultando em áreas muito pobres, como no caso na faixa de lenha de Belém:

Para aqueles não habituados ao estudo de Geografia Agrária de países tropicais, causa espanto encontrar uma região tão devastada e abandonada, nas imediações de uma grande cidade. Esta é uma região vazia, onde vive uma população rarefeita de caboclos miseráveis, que fazem rocinhas de mandioca para subsistência [...]. É possível que parte das terras, longe das rodovias, sejam devolutas, talvez abandonadas pelos primitivos posseiros que as devastaram; a maior parte, no entanto, deve pertencer a particulares, que aguardam valorização. (Valverde,1967 VALVERDE, Orlando. A epopeia da BR-14. In: VALVERDE, Orlando; DIAS, Catharina (org.). A rodovia Belém-Brasília - estudo de geografia regional. Rio de Janeiro: Editora Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1967., p.19)

Em 1977, a pesquisadora Bertha Becker assinalava que a área da Belém-Brasília não apresentava nível elevado de desenvolvimento, além de não ser espacialmente homogênea, assim como não houvera, até aquele momento, melhorias significativa nas condições de vida da população que havia migrado para a área (Becker, 1977BECKER, Bertha. A implantação da rodovia Belém-Brasília e o desenvolvimento regional. Anuário do Instituto de Geociências. Rio de Janeiro, UFRJ, 1977, p.32-46.). Em dissertação apresentada à UFRJ em 1978, Maria Rodrigues demonstrava que, em comparação com o período pré-Belém-Brasília (tendo como marco inicial o ano de 1960), a população que perpassou o trajeto, em um espaço de tempo de 14 anos, aumentou de 100 mil habitantes para 2 milhões, e que o número de cidades e povoados cresceu de 10 para 120 (Rodrigues, 1978RODRIGUES, Maria de Lourdes. Uma forma de ocupação espontânea na Amazônia: povoados do trecho norte da Belém-Brasília. 1978. 128 p. Dissertação (Mestrado emGeografia) - Departamento de Geografia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 1978.). Por mais que tivesse se diversificado a agricultura para plantação de milho, feijão, arroz e algodão, a maior parte da população ainda vivia basicamente de agricultura de subsistência. Uma das maiores consequências do processo desordenado de colonização da estrada foi a concentração de terras nas mãos de poucos fazendeiros, fazendo a maior parte da população empregar-se no desmatamento e plantio de capim para os rebanhos. A malária foi a doença mais endêmica deste processo de “picada” da mata; porém, em muitos casos, este era o único trabalho disponível para os imigrantes, em sua maioria nordestinos. Tal situação empregatícia levava os peões a ficarem à mercê dos recrutadores (chamados de “gatos”), sem direitos trabalhistas e sociais, resultando em constantes trocas de habitação, conforme novas oportunidades surgissem (Rodrigues, 1978RODRIGUES, Maria de Lourdes. Uma forma de ocupação espontânea na Amazônia: povoados do trecho norte da Belém-Brasília. 1978. 128 p. Dissertação (Mestrado emGeografia) - Departamento de Geografia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 1978.).

Para o jornalista Lúcio Flávio Pinto, as estradas de rodagem foram o acontecimento mais traumático da história da Amazônia:

O acontecimento mais traumático na história da Amazônia, depois (e por causa) da chegada dos europeus, foram as estradas de rodagem. A presença do colonizador branco na região tem meio milênio. A dos habitantes primitivos, chamados pelos europeus (impropriamente, como de regra) de índios, mais de 10 milênios. As estradas são um fato de apenas meio século. Mas demarcaram o tempo amazônico, que pode ser descrito como antes e depois delas. [...] Sua marca mais profunda é a de não admitir retorno. A história que existiu antes delas pôde ser refeita. A atual é definitiva, irremediável. O colono, que cruzara os espaços para se tornar proprietário, virou posseiro e, agora, assentado, cliente do agrarismo de compadrio dos companheiros. [...] A floresta era derrubada, os animais, mortos, o ambiente, desfigurado, as comunidades nativas, desorganizadas, a cultura local, corroída para que desse anacrônico Éden resultasse um volume crescente de divisas [...]. (Pinto, 2010PIERRE, Arnaud. Primeira viagem na Belém-Brasília. Rio de Janeiro: SPVEA, 1960. (Cadernos Belém-Brasília, v. 4). PINTO, Lúcio Flávio. O trauma amazônico: as estradas de rodagem. Jornal Pessoal, Belém, agosto de 2010. Disponível em: < https://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1270>. Acesso em: 25/01/2018)

Outros autores também apontaram as consequências da estrada sobre a região amazônica. Ronaldo Costa Couto, biógrafo de Juscelino Kubitschek, afirmou que a rodovia atraiu latifúndios e enxame de madeireiras e serrarias, facilitando a devastação da floresta, resultando em exploração predatória sem qualquer planejamento (Couto, 2001COUTO, Ronaldo Costa. Brasília Kubitschek de Oliveira. Rio de Janeiro: Record, 2001., p.68). Na condição de estrada de penetração, a Belém-Brasília trouxe muito prejuízo aos povos indígenas da área, pois suas tradições e culturas foram desconsideradas.6 6 Este aspecto não pôde ser trabalhado neste artigo, mas, para uma futura agenda de pesquisa, dois temas são primordiais: o trabalho do Serviço de Proteção aos Índios (SPI) durante a construção da rodovia, analisando o impacto da rodovia no cotidiano dessas populações, e a relação entre a política regional (referida pelas fontes como a “grande vilã” da Belém-Brasília) e nacional - críticas e elogios oriundos dos estados amazônicos. Napoleão Araújo Aquino também reforça os impactos negativos para as populações nativas e o meio ambiente, creditando isso a uma ausência de “consciência ecológica” (Aquino, 2002AQUINO, Napoleão Araújo. A construção da Belém-Brasília e suas implicações no processo de urbanização do estado de Tocantins. In: GIRALDIN, Odair. (org.). A (trans)formação histórica do Tocantins. Goiânia: Editora UFG, 2002.) naquele período, e ao fato de que não se falava em medidas que atenuassem impactos ambientais. Estudos como o de Franco (2009FRANCO, José Luiz de Andrade; DRUMMOND, José Augusto. Prefácio. In: FRANCO, José Luiz de Andrade; DRUMMOND, José Augusto. Proteção à natureza e identidade nacional no Brasil - anos 1920-1940. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009. demonstram que já existiam grupos que pensavam e combatiam as consequências da destruição da natureza para o meio ambiente. Porém, mais do que uma política, o desenvolvimento transformou-se em um valor, imperativo de tal forma, que silenciou estas vozes dissonantes (Dean, 2010DEAN, Warren. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo, Companhia das Letras, 2010.).

A história da rodovia Belém-Brasília é também oportunidade de, por meio de um fato específico, analisar o percurso histórico da Amazônia, as representações que eivaram das políticas e das interferências estatais sobre a região. As representações sobre a Amazônia conferiram à região certa identidade, em muitos casos, caricatural (inferno/paraíso). De acordo com Santos Filho, desde a colonização - não importa de que ângulo a região seja observada - era sempre sugerido que ela se acomodava em um lugar definido como seu, formando olhares que insinuariam uma direção e procederiam assim, a uma submissão (Filho, 2011). Existiria assim, uma certa tríade matricial explicativa para a história da Amazônia: rica, vazia e vulnerável (Ibid.).

Conclusão

A década de 1950 configurou-se como um momento importante de inflexão para a história da atenção governamental à Amazônia, pois é o momento em que se percebe a neutralização dos elementos constitutivos da matriz que continuavam pautando os registros sobre a região. Relacionando esta tríade com o que apontamos aqui, é possível concluir que esses mesmos três elementos foram utilizados no jargão político da época para justificar a empreitada de construção de uma rodovia fora dos padrões do liberalismo clássico, porém repleta de significações históricas reapropriadas, como o “glorioso” destino reservado à região, a fuga de um isolamento eterno, e a possibilidade de o Estado fazer-se presente lá. Em tempos de Guerra Fria, existiam também argumentos de defesa da criação da estrada que tinham por mote o temor de o “elemento vermelho” conquistar a Amazônia, em razão de sua pouca densidade demográfica.

Como exposto no início, nosso objetivo neste artigo foi analisar a construção da rodovia Belém-Brasília, Transbrasiliana ou BR-14, a partir de contrapontos e cotejamentos entre os discursos e permanências sobre a Amazônia. Tentou-se apontar que o objeto em questão dá margem para uma ampliação do foco de análise, tal como um jogo de escalas, devido à riqueza das fontes levantadas. As epígrafes que nos acompanharam no curso do texto foram retiradas do livro Transbrasiliana - poema brasilista, de Lauro de Azevedo Rolim (1960ROLIM, Azevedo. Transbrasiliana - poema brasilista. Rio de Janeiro: s.n, 1960.). São exemplos de como um fato concreto (construção da rodovia), aliado a questões políticas (plano de metas, dinâmica oposição-situação), deu origem a diversas visões sobre aspectos relevantes e representativos para a história da região amazônica (natureza, progresso e vazio demográfico), os quais, de certa forma, impuseram estigmas sucessivos sobre a região. A estrada é, também, um exemplo de como o desenvolvimentismo juscelinista também se fez presente na Amazônia.

A perspectiva de “integração” revelou-se, na prática, uma política enviesada que tinha o objetivo de trazer a Amazônia (apresentada como rural, vazia e, principalmente, atrasada) para o padrão urbano-industrial que começava a se mostrar majoritário no Sudeste. O esforço em construir a estrada não foi apenas material e humano, como também publicitário. Apoiadores desde os tempos da campanha presidencial, como os veículos pertencentes a Assis Chateubriand, publicaram séries de reportagens cobrindo o período de construção e inauguração da estrada. A relação entre o Poder Público e o privado foi tão conspícua que essas reportagens tornaram-se livros publicados pela então questionada SPVEA.

A análise desse conjunto documental mostrou-se fundamental para compreensão da forma pela qual estes veículos de imprensa “viam” a Amazônia, e, sendo publicados por agências governamentais, esses documentos tornaram-se também o discurso oficial sobre a região. A pergunta que não conseguimos responder neste artigo foi o porquê da permanência dessas ideias sobre a região amazônica ao longo de sua história. Se uma resposta em um caráter de longa duração não foi possível, ao menos pudemos apontar que tal discurso é, não apenas problemático, como também confortável para os policy-makers. Afinal, se existe uma região “intransponível”, “impenetrável” e “impossível” ao convívio humano, existe também a força motriz desta resposta: a intervenção estatal, que pretendia moldar os aspectos físicos e culturais da região (interferência nas atividades econômicas locais). Se as perguntas sobre a possibilidade de progresso da Amazônia persistem, as respostas mudam de acordo com o contexto histórico e com a perspectiva pela qual o Estado dá sentido e concretude à região. Desta forma, as questões apriorísticas, bem como a tríade matricial proposta por José dos Santos Filho (2006SANTOS F FILHO, José dos Reis. A instituição imaginária da Amazônia Brasileira - registros cognitivos e práticas sociais. Revista NERA, v. 8, n. 9, p. 113-143, jul.-dez. 2006. Disponível em: < Disponível em: http://revista.fct.unesp.br/index.php/nera/article/viewFile/1436/1414 >. Acesso em: 26 de janeiro de 2018.
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), emanavam, repetidamente (Governos Vargas, Kubitschek e militar), do Estado, alijando deste processo de formulação e reflexão os principais atingidos por estas políticas: as populações locais.7 7 À exceção, obviamente, das elites locais, que foram bastante colaborativas com os projetos de desenvolvimento para a região ao longo do século XX. Intelectuais locais foram presidentes de comissões, como Arthur Cezar Ferreira Reis, primeiro diretor da SPVEA.

Referências bibliográficas

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  • 1
    Brasil, Diário do Congresso Nacional, 26/03/1958, p. 307. Da Constituição de 1946 constava o artigo 199, que previa o repasse de 3% do Orçamento da União para ações que visassem o soerguimento da região amazônica. Para fiscalizar e utilizar o montante, foi formada em 1947 a Comissão do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (Cepevea). A partir de 1953, foi criada a SPVEA, que seria extinta em 1966, durante o regime militar, dando lugar à Superintendência e Desenvolvimento da Amazônia (Sudam)..
  • 2
    Bernardo Sayão faleceu no término das obras da Belém-Brasília, atingido por uma árvore. Sobre a criação do mito envolvendo o engenheiro, ver Silva, 2017.
  • 3
    Após a ocupação da França pelos alemães durante a II Guerra Mundial, Jean Manzon, assim como muitos de sua geração, teve de sair de sua terra natal. A partir da indicação do cineasta Alberto Cavalcanti, Manzon foi contratado em 1942 por Lourival Fontes, então diretor do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), para a organização do setor de reportagens fotográficas do órgão. O prestígio do fotógrafo cresceu nos anos subsequentes, em especial a partir de dois eventos específicos: em 1942, quando se tornou fotógrafo pessoal do então presidente Getúlio Vargas, e em 1943, ano no qual Assis Chateubriand contratou o fotógrafo para trabalhar, ao lado do jornalista David Nasser em reportagens para O Cruzeiro. Em 1952, abandonou o fotojornalismo para abrir uma empresa de documentários. De forma geral, os estudiosos da carreira de Manzon destacam sua influência no Poder Público como uma das razões pelas quais o então fotógrafo abriu sua produtora (Bizello, 1995CARDENUTO, Reinaldo FILHO. Discursos de intervenção: o cinema de propaganda ideológica para o CPC e o Ipês às vésperas do Golpe de 1964. 2008. Dissertação (Mestrado em Ciências da Comunicação) - Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação, Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2008.; Cardenuto Filho, 2008).
  • 4
    Até a presente data (e esperamos que no futuro também), o enterro de Sayão está disponível no sítio YouTube. Corpo do engenheiro Bernardo Sayão chega a Brasília em 1959. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=CvLbVRwv2hY&feature=related>. Acesso em: 10 de junho de 2017.
  • 5
    Ibid., p. 75.
  • 6
    Este aspecto não pôde ser trabalhado neste artigo, mas, para uma futura agenda de pesquisa, dois temas são primordiais: o trabalho do Serviço de Proteção aos Índios (SPI) durante a construção da rodovia, analisando o impacto da rodovia no cotidiano dessas populações, e a relação entre a política regional (referida pelas fontes como a “grande vilã” da Belém-Brasília) e nacional - críticas e elogios oriundos dos estados amazônicos.
  • 7
    À exceção, obviamente, das elites locais, que foram bastante colaborativas com os projetos de desenvolvimento para a região ao longo do século XX. Intelectuais locais foram presidentes de comissões, como Arthur Cezar Ferreira Reis, primeiro diretor da SPVEA.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    04 Maio 2018
  • Aceito
    04 Out 2018
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