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A Amazônia euclidiana e os programas de integração da hileia durante o governo Geisel (1974-1979)

The Euclidian Amazon and the hiley’s integration programs during the Geisel government (1974-1979)

Resumo:

No presente artigo discutiremos o contexto de publicação da obra póstuma Um paraíso perdido (1976) de Euclides da Cunha, assim como as interfaces entre a edição dessa obra e os programas de integração econômica do território amazônico desenvolvidos durante o governo do presidente Ernesto Geisel (1974-1979). A partir dessas proposições, analisaremos contexto, o consumo cultural e as apropriações da publicação do referido livro a partir das concepções de Roger Chartier. De modo específico, discutiremos as problemáticas que envolveram a organização e publicação dessa obra, sua recepção, as apropriações e as interfaces com os programas do regime militar voltados para a integração econômica da Amazônia.

Palavras-chave:
Apropriação; Integração; Amazônia

Abstract:

In this article we will discuss the context of the publication of the posthumous work Paraíso perdido (1976) by Euclides da Cunha, as well as the interfaces between the edition of this work and the economic integration programs of the Amazonian territory developed during the government of President Ernesto Geisel (1974-1979). From these propositions, we will analyze context, the cultural consumption and appropriations of the publication of said book from the conceptions of Roger Chartier. Specifically, we will discuss the issues that have involved the organization and publication of this work, the reception, appropriations and interfaces with the programs of the military regime aimed at the economic integration of the Amazon.

Keywords:
Appropriation; Integration; Amazon

Introdução

A imensidão da Floresta Amazônica e as diversidades de povos encontrados nesse território despertaram a atenção da intelectualidade brasileira ao longo do século XX. Apesar dos excelentes estudos dedicados aos modos como esses intelectuais abordam a questão, torna-se necessário estudar as representações sobre o território amazônico a partir das correlações entre literatura, política e história. Com base nessa premissa, este artigo proporá outra interpretação referente à maneira como o espaço amazônico foi incorporado no rol das preocupações brasileiras na década de 1970.

Após ressaltar que o território amazônico pertence à experiência histórica e política brasileira, Jaime Ginzburg (2010GINZBURG, Jaime. Euclides da Cunha, a Amazônia e a barbárie. Estudos Avançados. v. 24, n. 69, p. 411-416, 2010.) defende que estamos longe de compreender como esse espaço foi inserido nas experiências no campo literário nacional. Especificamente nesse campo, Sirlei Silveira (2004SILVEIRA, Sirlei. A Amazônia de Euclides da Cunha: Paraíso versus inferno. 2004. Disponível em: <Disponível em: https://www.ces.uc.pt/lab2004/inscricao/pdfs/painel30/SirleiSilveira.pdf >. Acesso em: 31 dez. 2018.
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) e Rômulo de Paula Andrade (2010ANDRADE, Rômulo de Paula. Conquistar a terra, dominar a água, sujeitar a floresta: Getúlio Vargas e a revista “Cultura Política” redescobrem a Amazônia (1940-1941). Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas (Belém). v. 5, n. 2, p. 453-468, maio-ago. 2010.) acentuam que Euclides da Cunha foi um dos principais escritores responsáveis por imprimir, no imaginário social brasileiro, a representação da Floresta Amazônica como uma terra “à margem” e “sem história”. Essa representação seria sintetizada no “segundo livro vingador” de Euclides, o qual se intitularia Um paraíso perdido, mas seu falecimento em 1909 impediu que esse projeto se concretizasse.

Os textos euclidianos dedicados à Floresta Amazônica somente chegaram ao público mais de cinquenta anos após sua morte. Uma primeira fase desse resgate deu-se com duas publicações: as Obras completas de Euclides da Cunha (1966), organizada por Afrânio Coutinho, e o livro Euclides da Cunha e o paraíso perdido (1966), escrito por Leandro Tocantins. Após esses lançamentos na década de 1960, deu-se uma segunda fase com as edições póstumas do “segundo livro vingador” de Euclides da Cunha, com quatro edições, vejamos: Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos, organizado por Hildon Rocha em 1976; Um paraíso perdido: en­saios, estudos e pronunciamentos sobre a Amazônia, organizado por Leandro Tocantins em 1986; a reedição da edição de 1976 pela Biblioteca do Senado em 2000; e, por último, Amazônia: um paraíso perdido, obra coordenada por Tenório Teles em 2003. Para os limites deste artigo, optamos por analisar apenas a edição de 1976 e problematizá-la à luz do contexto político da década de 1970. Com base nesse recorte, levantaremos questões importantes sobre as interfaces entre a publicação dessa obra e os projetos de integração da Amazônia empreendidos pelo regime militar.

Para entendermos as problemáticas que envolveram a edição de Um paraíso perdido na década de 1970, torna-se necessário recorrer ao pensamento de Roger Chartier (1990CHARTIER, Roger. História cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Difel Bertrand, 1990.). Para esse historiador, o “consumo” cultural de uma obra é tomado como produção de representações que não são idênticas às que o produtor, o autor ou o artista investiram na obra. Concluindo seu raciocínio, o autor defende que o “consumo” cultural pode ser entendido como “outra produção”, que é um espaço aberto às leituras múltiplas. A partir dessa noção, Chartier constrói as bases para o conceito de apropriação como compreensão dos usos e das interpretações dos textos ou, melhor dizendo, o entendimento das formas como os textos são apreendidos e manipulados. Seguindo essa perspectiva, a significação dos textos depende das convenções de leitura das diferentes comunidades e dos diferentes públicos, bem como das “variações entre a significação, a interpretação e as apropriações plurais que sempre inventam, deslocam e subvertem” os enunciados (Chartier, 2002CHARTIER, Roger. À beira da falésia. A história entre certezas e inquietudes. Trad. Patrícia Chittoni Ramos. Porto Alegre: Editora da Universidade/UFRGS, 2002., p. 259). A partir das premissas apresentadas por Roger Chartier é que discutiremos o contexto de publicação da obra póstuma Um paraíso perdido na década de 1970, assim como as interfaces entre esse livro e os programas de integração econômica do território amazônico durante o governo do general Ernesto Geisel (1974GEISEL, Ernesto. Discursos, v. I, 1974. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1975.-1979).

Para desenvolver nossa proposta, este artigo está organizado em duas partes. Na primeira, intitulada “Estudos sobre os ‘ensaios amazônicos’ de Euclides da Cunha”, realizamos uma revisão bibliográfica referente aos textos amazônicos escritos pelo intelectual fluminense. Esse estudo é importante para expor como a historiografia analisou esses textos e, ao mesmo tempo, destacar o silêncio relativo ao contexto em que Um paraíso perdido (Cunha, 1976CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos. Brasília: INL, 1976.) foi publicado. Na segunda parte, intitulada “A edição póstuma de Um paraíso perdido e os projetos de ocupação econômica da Amazônia na década de 1970”, discutimos as interfaces entre a publicação dessa obra póstuma e o projeto de integração amazônica empreendido pelo Governo Geisel. Esse tópico está dividido em dois momentos: num primeiro momento, apresentamos a organização e publicação do “segundo livro vingador” de Euclides; e, na sequência, lançamos mão dos pronunciamentos do general Ernesto Geisel, os quais serão importantes para estabelecer o diálogo entre os projetos de ocupação da Amazônia e as posições explicitadas nos “ensaios amazônicos”. A partir desse esquema, convidamos o leitor a apreciar as problemáticas referentes ao processo de organização, publicação, recepção e apropriação dessa obra, e, da mesma maneira, suas interfaces com o projeto governamental de integração da Floresta Amazônica na década de 1970.

Estudos sobre os “ensaios amazônicos” de Euclides da Cunha

Em 1904, Euclides da Cunha foi nomeado pelo barão do Rio Branco para chefiar a Comissão Diplomática de Reconhecimento do Alto Purus. Segundo Luciana Murari (1997MURARI, Luciana. “O Brasil ainda chega até cá”: Euclides da Cunha dos sertões à Amazônia. Varia História (Belo Horizonte). n. 17, p. 219-236, mar. 1997. Disponível em: <Disponível em: https://static1.squarespace.com/static/561937b1e4b0ae8c3b97a702/t/57279c0f07eaa089fa602aa1/1462213652152/13_Murari%2C+Luciana.pdf >. Acesso em: 8 jan. 2019.
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), a experiência na Amazônia brasileira foi o ponto alto na trajetória do escritor desde o lançamento de Os sertões em 1902. Após o fim da missão diplomática, o intelectual retornou ao Rio de Janeiro e dedicou-se à revisão do relatório da expedição e à elaboração das “notas complementares”. Paralelamente à conclusão dos referidos documentos institucionais, Euclides escreveu artigos e livros dedicados às questões amazônicas.

Na obra Natureza e cultura no Brasil (1870-1922), Murari (2009MURARI, Luciana. Natureza e cultura no Brasil (1870-1922). São Paulo: Alameda, 2009.) estabelece a genealogia dos projetos literários que contribuíram para a fixação da Amazônia no imaginário social brasileiro. Em seu trabalho, a autora defende que esse espaço foi definido a partir do domínio da natureza pela civilização, pela técnica e pela modernidade. Ao discutir a incorporação da Amazônia nos debates nacionais, a autora destaca a forte influência das obras Inferno verde (1908) e Sombras n’água (1913) de Alberto Rangel. Na obra Inferno verde1 1 Euclides da Cunha, no prefácio dessa obra, denuncia o conhecimento fragmentado, a incompreensão e a miséria das sociedades que vivem na Amazônia. (1908), Alberto Rangel constrói uma representação da floresta ao estilo euclidiano, pois denuncia o descaso das classes dirigentes com relação à Amazônia. Em Sombras n’água (Rangel, 1913RANGEL, Alberto. Sombras n’água (Vidas e paisagens no Brasil equatorial). Leipzig: F. A. Brockhaus, 1913.), o autor chama a atenção para o fato de que na “Amazônia, não só o homem, mas a terra é a grande sacrificada” (p. 35). Juntamente com a crítica referente ao descaso com essa região, Rangel adjetiva esse espaço como um lugar “solitário” e “terrível”, onde permanece o “Império da Morte” (p. 114). Para Murari (2009)MURARI, Luciana. Natureza e cultura no Brasil (1870-1922). São Paulo: Alameda, 2009., tanto em Rangel quanto em Euclides, o ambiente amazônico foi posto como uma paisagem decadente, onde a força da natureza impõe-se ao homem.

Em relação à produção literária de Euclides da Cunha, diversos estudiosos, entre eles Roberto Ventura (1993VENTURA, Roberto. Euclides da Cunha.Remate de males(Campinas). n. 13, p. 41-46, 1993.), Francisco F. Hardman (2009HARDMAN, Francisco F. A vingança da hileia: Euclides da Cunha, a Amazônia e a literatura moderna. São Paulo: Editora Unesp, 2009.) e Kassius Pontes (2005PONTES, Kassius. Euclides da Cunha, o Itamaraty e a Amazônia. Brasília: Funag, 2005.), afirmam que existe um relativo desconhecimento sobre os “ensaios amazônicos”. Para Willi Bolle (2005BOLLE, Willi. O Mediterrâneo da América Latina: a Amazônia na visão de Euclides da Cunha. Revista USP (São Paulo). n. 66, p. 140-155, jun./ago.2005.), essa constatação se explica por três motivos: o sucesso de Os sertões (1902) teria ofuscado o restante da produção literária do escritor; o caráter fragmentário, esparso e inacabado dos “ensaios amazônicos” fragilizaria o valor literário desses textos; e, por último, o fato de que a temática amazônica ocuparia um lugar marginal no rol de interesse dos historiadores brasileiros. De certo modo, concordamos com as duas primeiras premissas, isto é, tanto o sucesso de Os sertões quanto o caráter inacabado do seu “segundo livro vingador” levariam ao desconhecimento dos “ensaios amazônicos”. Por outro lado, discordamos da afirmativa do desinteresse pela temática amazônica, uma vez que diversos pesquisadores dedicam-se a essa temática a partir da produção literária de Euclides da Cunha.

Antes de analisarmos as interfaces entre a publicação póstuma de Um paraíso perdido em 1976 e os programas governamentais voltados para a ocupação econômica da Amazônia na década de 1970, que, aliás, é o objetivo central deste artigo, essa revisão bibliográfica é importante por dois motivos: para demonstrar que o desdém sobre os temas amazônicos por parte de historiadores não se justifica e, ao mesmo tempo, para trazer à luz as diversas vertentes analíticas referentes aos “ensaios amazônicos” do intelectual fluminense.

No que concerne às formas como a historiografia discutiu a percepção euclidiana sobre a Floresta Amazônica, encontramos alguns estudos que partem da comparação entre Os sertões e os “ensaios amazônicos”. Para Murari (1997MURARI, Luciana. “O Brasil ainda chega até cá”: Euclides da Cunha dos sertões à Amazônia. Varia História (Belo Horizonte). n. 17, p. 219-236, mar. 1997. Disponível em: <Disponível em: https://static1.squarespace.com/static/561937b1e4b0ae8c3b97a702/t/57279c0f07eaa089fa602aa1/1462213652152/13_Murari%2C+Luciana.pdf >. Acesso em: 8 jan. 2019.
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), ambos os conjuntos textuais destacam o principal obstáculo ao fortalecimento da nacionalidade: o isolamento das regiões interioranas. Como complemento à tese do isolamento, Adriana da Silva e Alexandre Pacheco (2012PACHECO, Alexandre; SILVA, Adriana Conceição dos Santos da. O homem “à margem da história” por Euclides da Cunha. Fênix - Revista de História e Estudos Culturais. ano IX, v. 9, n. 1, p. 1-13, jan./fev./mar./abr. 2012.) defendem que Euclides ressaltou a “ausência de civilização” nessas regiões, a qual foi pensada a partir da “presença” dos tipos humanos encontrados no sertão nordestino - o sertanejo - e na Floresta Amazônica - o seringueiro. Apesar da ausência dos elementos civilizatórios nesses dois tipos humanos, Hardman (1996) enfatiza que, do ponto de vista social, a descrição negativa do seringueiro nos “ensaios amazônicos” é bem mais aguda do que a do sertanejo em Os sertões.

Além da comparação entre Os sertões e os “ensaios amazônicos”, outros estudiosos destacam a proximidade entre a perspectiva euclidiana e o pensamento social brasileiro do início do século XX. Essa aproximação é posta como um dos principais esteios para a elaboração do que seria o seu “segundo livro vingador”. Para Lucia L. de Oliveira (1998OLIVEIRA Lúcia L. A conquista do espaço: sertão e fronteira no pensamento brasileiro. 1998. Disponível em: <Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/6648/LuciaLippi_MANGUINHOSv5s0.pdf >. Acesso em: 31 dez. /2018.
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), a formação positivista do intelectual estava presente no projeto de Um paraíso perdido e, por essa razão, Euclides poderia ser classificado como um “missionário do progresso”. No tocante a essa consideração, Leandro B. Guimarães (2010GUIMARÃES, Leandro B. O sertão amazônico como um deserto. REU(Sorocaba), v. 36, n. 3, p. 129-141, dez. 2010.) e Carlos Guedelha (2013)SANTANA, José Carlos Barreto de. Ciência e arte: Euclides da Cunha e as ciências naturais. São Paulo: Hucitec, 2001. ressaltam que Euclides pertencia a uma geração que acreditava que os intelectuais deveriam orientar a Nação rumo ao progresso. Para esses autores, o escritor fluminense pretendia instaurar - na elite política e intelectual - o desejo de construção de uma nação desenvolvida, integrada e próspera através da nacionalização da Amazônia.

Além dos estudos que frisam a atitude geracional na elaboração dos “ensaios amazônicos”, outros autores tratam da forma como o espaço físico foi incorporado no projeto literário euclidiano. Para José de Santana (2001SANTANA, José Carlos Barreto de. Ciência e arte: Euclides da Cunha e as ciências naturais. São Paulo: Hucitec, 2001.), a formação intelectual e o consumo cultural da literatura naturalista e científica do século XIX são fundamentais para entender como Euclides representou a Floresta Amazônica. Quanto a essa questão, Frederic Amory (2008AMORY, Frederic. As biografias de Euclides da Cunha. In: BERNUCCI, Leopoldo M. Discurso, ciência e controvérsia em Euclides da Cunha. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008, p. 11-22., p. 20) considera que, na elaboração dos “ensaios amazônicos”, Euclides “foi guiado por todos os demônios do século XIX: trabalho, dever moral, religião (agnosticismo), racismo, paixão pela natureza tropical etc.”. Opinião destoante é apresentada por Guimarães (2010GUIMARÃES, Leandro B. O sertão amazônico como um deserto. REU(Sorocaba), v. 36, n. 3, p. 129-141, dez. 2010.). Esse autor defende que a representação do território amazônico euclidiano expôs a descontinuidade com essas leituras. Para tanto, o autor apresenta dois motivos que demonstram o distanciamento com as narrativas do século XIX: 1) embora Euclides se apresentasse como “científico”, o viés ideológico emergiu do texto através da perspectiva do progresso; 2) o intelectual fluminense descreveu a floresta como um ambiente desencantado, caótico, bárbaro e selvagem. Segundo Guimarães, a descrição euclidiana da floresta afastou-se dos traços deixados pela literatura do século XIX, os quais marcaram a floresta como um lugar imutável, idílico, tranquilo e encantado.

Um meio-termo entre a continuidade ou descontinuidade do estilo do século XIX na escrita dos “ensaios amazônicos” é apresentado por Nicolau Sevcenko (2003SEVCENKO, Nicolau. Literatura como missão: Tensões sociais e criação cultural na Primeira República. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.). Para esse historiador, coexistem “dois mundos que se negavam um ao outro de forma tão inexorável que um só poderia substituir à custa da morte do outro. Eram dois tempos, duas idades que se opunham [...] o século XIX literário, romântico e idealista; e o século XX, científico, naturalista e materialista” (p. 159).

Como resultado do encontro desses dois mundos literários, Sevcenko defende que ocorre uma síntese entre literatura e ciência. Devido a esse caráter híbrido, Leopoldo M. Bernucci (2011BERNUCCI, Leopoldo M. Imagenas utópicas e distópicas do deserto e da floresta em Euclides da Cunha. Signótica, v. 23, n. 1, p. 107-124, jan./jun. 2011. Disponível em: < Disponível em: https://www.revistas.ufg.br/sig/article/view/16148/10356 > Acesso em: 3 jun. 2020.
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) julga que interpretar os textos amazônicos de Euclides é desafiante, pois, se pensá-los estritamente do ponto de vista científico, perde-se o olhar do artista e vice-versa. Concluindo seu raciocínio, Bernucci evidencia que, como cientista, Euclides estudou a complexidade da natureza amazônica e sua relação com os seus habitantes e, como artista, oscilou entre uma representação, ora favorável, ora desfavorável sobre a floresta.

Paralelamente às análises da fusão entre a personalidade científica e a personalidade artística na composição desses ensaios, Bernucci (2011BERNUCCI, Leopoldo M. Imagenas utópicas e distópicas do deserto e da floresta em Euclides da Cunha. Signótica, v. 23, n. 1, p. 107-124, jan./jun. 2011. Disponível em: < Disponível em: https://www.revistas.ufg.br/sig/article/view/16148/10356 > Acesso em: 3 jun. 2020.
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) aponta o diálogo entre as imagens distópicas (marginalidade da floresta) e as imagens utópicas (centralidade da floresta). Na mesma linha de análise dualista, Mário Monteiro (1998MONTEIRO, Mário Ypiranga. Fatos da literatura amazonense. 2. ed. Manaus: Edua, 1998.), Ventura (1993VENTURA, Roberto. Euclides da Cunha.Remate de males(Campinas). n. 13, p. 41-46, 1993.) e Guedelha (2013)GUEDELHA, Carlos. A metaforização da Amazônia em textos de Euclides da Cunha. Tese (Doutorado em Linguística), Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2013. defendem que coexistem duas representações na descrição da floresta: o “infernismo” e o “edenismo”. Apesar desse dualismo, esses autores consideram que em Euclides há sempre um senão: o paraíso é “perdido” e “diabólico”, já o inferno é “verde” e “florido”, ou seja, o inferno euclidiano tinge-se de paraíso, enquanto o paraíso é chamuscado de inferno (Guedelha, 2013GUEDELHA, Carlos. A metaforização da Amazônia em textos de Euclides da Cunha. Tese (Doutorado em Linguística), Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2013.).

A partir desse levantamento bibliográfico, destacamos quatro eixos interpretativos na análise dos “ensaios amazônicos”: 1) as similitudes entre esses ensaios e Os sertões; 2) o desejo de Euclides que o progresso alcançasse a Floresta Amazônica; 3) a continuidade ou o rompimento com a literatura científica e naturalista do século XIX; 4) e, por fim, a perspectiva dualista na representação da floresta. Além desses quatro eixos, podemos levar em consideração o silêncio referente ao contexto de publicação póstuma do livro Um paraíso perdido em 1976. Sem prejuízo à qualidade desses estudos, esses autores não deram atenção necessária às problemáticas que envolveram a edição dessa obra durante o regime militar.

Em sua maioria, esses autores lançaram mão apenas das edições de Um paraíso perdido organizadas por Leandro Tocantins em 1986, a edição publicada pelo Senado Federal em 2000 ou a edição de 2003 coordenada por Tenório Teles. Além dessas edições, esses autores utilizaram textos encontrados nos livros: Contrastes e confrontos (1907), Peru versus Bolívia (1907), À margem da história (1909), Rio Purus (1960) e Obras completas de Euclides da Cunha (1966). A edição de Um paraíso perdido de 1976 aparece apenas nas bibliografias de Murari (1997MURARI, Luciana. “O Brasil ainda chega até cá”: Euclides da Cunha dos sertões à Amazônia. Varia História (Belo Horizonte). n. 17, p. 219-236, mar. 1997. Disponível em: <Disponível em: https://static1.squarespace.com/static/561937b1e4b0ae8c3b97a702/t/57279c0f07eaa089fa602aa1/1462213652152/13_Murari%2C+Luciana.pdf >. Acesso em: 8 jan. 2019.
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), Bolle (2005BOLLE, Willi. O Mediterrâneo da América Latina: a Amazônia na visão de Euclides da Cunha. Revista USP (São Paulo). n. 66, p. 140-155, jun./ago.2005.) e Hardmam (2009), mas, apesar de constar nas referências, nenhum dos autores utiliza essa edição em seus estudos: Murari (1997)MURARI, Luciana. “O Brasil ainda chega até cá”: Euclides da Cunha dos sertões à Amazônia. Varia História (Belo Horizonte). n. 17, p. 219-236, mar. 1997. Disponível em: <Disponível em: https://static1.squarespace.com/static/561937b1e4b0ae8c3b97a702/t/57279c0f07eaa089fa602aa1/1462213652152/13_Murari%2C+Luciana.pdf >. Acesso em: 8 jan. 2019.
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analisa apenas os livros Contrastes e confrontos (1907) e À margem da história (1909); Bolle (2005)BOLLE, Willi. O Mediterrâneo da América Latina: a Amazônia na visão de Euclides da Cunha. Revista USP (São Paulo). n. 66, p. 140-155, jun./ago.2005. e Hardman (2009HARDMAN, Francisco F. A vingança da hileia: Euclides da Cunha, a Amazônia e a literatura moderna. São Paulo: Editora Unesp, 2009.) lançam mão somente da edição de 1986 organizada por Leandro Tocantins.

Como apontado acima, nenhum dos autores faz conexão entre a primeira edição póstuma de Um paraíso perdido (1976) e o contexto político da década de 1970. Por esse motivo, consideramos que ocorre o silêncio sobre os possíveis elos entre a publicação dessa obra e os projetos de integração amazônica empreendidos pelo regime militar. Para tentar suprir essa lacuna, no próximo tópico trataremos do contexto, do consumo cultural e das apropriações derivadas da publicação póstuma do “segundo livro vingador” de Euclides da Cunha. Discutiremos, também, as problemáticas que envolveram a organização e publicação de Um paraíso perdido (1976) e, acima de tudo, as interfaces entre essa edição e os programas governamentais que visavam integrar a Floresta Amazônica ao restante da Nação. Para tanto, lançaremos mão de alguns comentários sobre essa obra póstuma e dos pronunciamentos do presidente Ernesto Geisel dirigidos para a divulgação desses projetos governamentais.

A edição póstuma de Um paraíso perdido e os projetos de ocupação econômica da Amazônia na década de 1970

As páginas do Jornal do Brasil anunciam a publicação de Um paraíso perdido de Euclides da Cunha. De acordo com as notícias desse jornal, trata-se de uma obra que “além de ser um documento social, tem um grande valor literário” (Jornal do Brasil, 3 maio 1976JORNAL DO BRASIL JORNAL DO BRASIL. Caderno B. ano 85, n. 26, p. 1, 3 maio1976.). Em outra edição do mesmo jornal, Fausto Cunha defende que a publicação dessa obra irá suprir a falta de conhecimento sobre a Amazônia e, por essa razão, é uma obra “coesa, abrangente e de fascinante atualidade” em face das ações governamentais na região amazônica (Jornal do Brasil, 13 jun. 1976JORNAL DO BRASIL, JORNAL DO BRASILCaderno B. ano 85, n. 67, p. 7, 13 jun.1976.). Levando em consideração essas palavras, estabeleceremos um diálogo entre essa edição póstuma e os projetos de integração da Floresta Amazônica empreendidos pelo governo Geisel,

Essa obra póstuma veio a público sob a direção, seleção e coordenação editorial de Hildon Rocha.2 2 Hildon Rocha, além de ensaísta, memorialista, crítico literário e jornalista, pertenceu ao corpo editorial da Editora Vozes durante a década de 1970. Publicou, entre outras obras, O poeta e as potências abstratas (1956), Entre lógicos e místicos (1968) e Poesias escolhidas de Álvares de Azevedo (1971). Em sua apresentação, Hildon Rocha deixa claro que os textos para esta seleção foram extraídos das Obras completas de Euclides da Cunha (1966). Com o título, Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos (1976), esse livro foi o 1º volume da “Coleção Dimensões do Brasil”3 3 O presidente do Conselho Consultivo dessa coleção foi Arthur Cesar Ferreira Reis. Arthur Reis foi membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA) e da Academia Amazonense de Letras (AAL). Além de ser um intelectual de renome na região amazônica, também desempenhou várias funções públicas, dentre elas: governador do Estado do Amazonas entre 1964 a 1967, superintendente do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e delegado do Brasil em várias conferências de âmbito internacional. publicado pela Editora Vozes em coedição com o Instituto Nacional do Livro (INL). Diversos intelectuais fizeram parte do conselho consultivo dessa coleção, em sua maioria, membros da Academia Brasileira de Letras (ABL): Barbosa Lima Sobrinho, José Honório Rodrigues, Luiz Viana Filho e Vianna Moog. Entre os colaboradores, encontramos outros imortais da Casa de Machado de Assis, entre eles: Adonias Filho, Afonso Arinos de Melo Franco, Américo Jacobina Lacombe, Josué Montello, Peregrino Junior, Odylo Costa Filho, Francisco de Assis Barbosa e Pedro Calmon.

Essa edição póstuma foi dividida da seguinte maneira. Um primeiro tópico intitula-se “Epígrafes, introduções, biobibliografia”, onde encontramos artigos de Arthur César Ferreira Reis, Hildon Rocha, Francisco Venâncio Filho, Theodoro Sampaio e Sílvio Romero. O segundo tópico é dividido em três partes: “Amazônia: terra sem história”, “O rio Purus: e outros estudos” e “Carta da Amazônia”. Os textos que compõem essa obra foram extraídos do jornal O Estado de S. Paulo (1904), do Jornal do Commercio (1907), da Revista da Academia Brasileira de Letras (1906), da Revista Kosmos (1906) e do Almanaque Brasileiro (1908). Além de textos extraídos de revistas e jornais, alguns deles foram retirados dos livros Peru versus Bolívia (1907), À margem da história (1909), Inferno verde (1908) de Alberto Rangel e do Relatório da Comissão Mista Brasileiro-Peruana de Reconhecimento do Alto Purus (1906). Um terceiro conjunto textual que compõe essa obra póstuma é formado pelas correspondências pessoais de Euclides da Cunha. Todos esses textos já haviam sido inseridos nas Obras completas de Euclides da Cunha (1966), organizadas por Afrânio Coutinho, o que leva a crer que Hildon Rocha não fez um trabalho de pesquisa, mas apenas uma seleção.

Ao levar em consideração que Um paraíso perdido foi publicado pelo INL, torna-se importante entender a atuação desse instituto na década de 1970, bem como sua aproximação com membros da ABL. Segundo Ricardo Oiticica (1997OITICICA, Ricardo. O Instituto Nacional do Livro e as ditaduras: Academia Brasílica dos Rejeitados. Tese (Doutorado em Letras), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1997.), o Plano de Ação Cultural (PAC) implantado pelo regime militar após 1967 ampliou os incentivos fiscais do INL, os quais serviram para impulsionar a indústria editorial brasileira. Paralelamente aos incentivos fiscais oferecidos ao INL, diversos membros da ABL prestaram serviço para o instituto, entre eles, Adonias Filho, Jacobina Lacombe e Octavio de Faria. Essa constatação demonstra uma clara aproximação entre a política editorial do regime militar e a Casa de Machado de Assis.

Em relação às aproximações entre a academia e o governo militar, Fernando Jorge (1999JORGE, Fernando. A academia do fardão e da confusão: a Academia Brasileira de Letras e os seus “imortais” mortais. São Paulo: Geração Editorial, 1999.) alega que a ABL se acovardou diante do regime, pois nunca protestou contra as apreensões de livros e a falta de liberdade de pensamento. O autor acusa que esse servilismo teve um bônus; o presidente Castelo Branco - por intermédio do decreto-lei 232 de 28 de fevereiro de 1967 - doou à ABL um terreno situado na avenida Presidente Wilson. Segundo Fernando Jorge, em troca, o general Lyra Tavares - o mesmo que assinou o Ato Institucional n. 5 (AI-5) - foi eleito para a academia em 23 de abril de 1970. Logo após a eleição desse general para o rol da imortalidade, o presidente Emílio Garrastazu Médici também demonstrou sua generosidade ao promulgar a lei 5.643 - em 3 de dezembro de 1970 - que autorizaria a ABL alugar, alienar ou hipotecar frações do imóvel doado por Castelo Branco. Outro presidente militar que bajulou a academia foi o general Ernesto Geisel. Este, por sua vez, autorizou junto a Caixa Econômica Federal o empréstimo de 200 milhões de cruzeiros para a construção de um edifício no referido terreno doado.

No que diz respeito a essas aproximações, Oiticica (1997OITICICA, Ricardo. O Instituto Nacional do Livro e as ditaduras: Academia Brasílica dos Rejeitados. Tese (Doutorado em Letras), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1997.) e Anibal Bragança (2009BRAGANÇA, Aníbal As políticas públicas para o livro e a leitura no Brasil: O Instituto Nacional do Livro (1937-1967). Matrizes, v. 2, n. 2, p. 221-246, 2009. Disponível em: <Disponível em: https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/75/o/pol_ticas_publicas_artigo_2009_historia.pdf > Acesso em: 3 jun. 2020.
https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/75/...
) sugerem que o regime instaurado em 1964 preocupou-se com a elaboração de uma política cultural que legitimasse o governo autoritário e, ao mesmo tempo, viabilizasse a reaproximação entre os intelectuais - principalmente com os membros da ABL - e o Estado. Ao longo da ditadura, Diogo Cunha (2017CUNHA, Diogo. Sociabilidade, memórias e valores compartilhados: o cotidiano na Academia Brasileira de Letras durante a ditadura militar. Estudos Ibero-Americanos (Porto Alegre). v. 43, n. 2, p. 317-332, maio-ago. 2017.) sublinha que vários intelectuais da Casa de Machado de Assis proferiram conferências em instituições de ensino ligadas às Forças Armadas como, por exemplo, a Escola Naval, a Escola de Comando do Estado-Maior e a Escola Superior de Guerra (ESG). Por essas razões, o autor acredita que a ABL serviu como instância de legitimação da ditadura militar e, em contrapartida a essa legitimação, diversos membros da academia ocuparam funções importantes em conselhos, institutos e órgãos governamentais. Entre os órgãos que contaram com a participação dos membros da ABL, podemos citar o Conselho Consultivo do INL, órgão responsável pela publicação da obra póstuma de Euclides da Cunha.

À primeira vista, o pesquisador poderia sugerir que a publicação de Um paraíso perdido em 1976 simbolizaria uma homenagem dos membros da ABL ao autor de Os sertões. Ou, ainda, essa edição representaria o esforço por parte de Arthur Cezar Ferreira Reis - presidente da “Coleção Dimensões do Brasil” - de trazer à luz um estudo dedicado ao seu estado natal. Poderíamos considerar, também, o fato de que, sendo Euclides da Cunha um intelectual bastante conhecido, essa edição inédita ofereceria uma boa oportunidade para aumentar a receita da editora através das vendas de exemplares. Apesar de todas essas hipóteses fazerem sentido e estarem interligadas, acreditamos que essa publicação pode ser explorada sob a perspectiva dos projetos governamentais de integração da Floresta Amazônica entre 1974 e 1979 que, aliás, já havia sido salientada pelas notícias do Jornal do Brasil. Antes de discutirmos a apropriação e o consumo cultural dessa obra, torna-se importante destacar os projetos de integração da Amazônia durante o governo do presidente Ernesto Geisel.

Para entender a ideologia militar sobre a região amazônica que, a propósito, não começou com o governo Geisel, podemos recorrer às ideias do general Golbery do Couto e Silva (1981SILVA, Golbery do Couto e. Conjuntura política nacional: o Poder Executivo & geopolítica do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1981.) defendidas na década de 1960. Esse general buscou traçar “as linhas mestras” do “destino geopolítico [da Nação] e entrever [...] a estratégia portentosa de toda uma hercúlea integração territorial” (p. 3). Para defender sua visão geopolítica do Brasil, Couto e Silva considera que só a “hileia” - em referência a Amazônia - “escapa ao papel vinculador do planalto, resistindo-lhe à ação coesiva e aglutinadora” (p. 39). Sintetizando sua visão geopolítica sobre a Amazônia, o general defende que se deva conquistar e inundar de civilização a “hileia amazônica”, chamada por ele de “a grande ilha brasileira” (p. 45).

Outro texto que pode nos auxiliar no entendimento da ideologia militar sobre a região amazônica é o relatório Operação Amazônia. A partir de 1966, leis federais e incentivos fiscais buscaram desenvolver economicamente a Amazônia. Essa iniciativa ficou conhecida por “Operação Amazônia”, a qual visava estabelecer a posse definitiva daquele território, a exploração dos recursos minerais, vegetais e animais e, ao mesmo tempo, incentivar o desenvolvimento agropecuário e industrial na região. Essas ideias foram sintetizadas no relatório apresentado pelo ministro extraordinário para a Coordenação dos Organismos Regionais - o marechal Oswaldo Cordeiro de Farias - ao presidente Castello Branco. Nesse trabalho, são apresentadas as bases para a reformulação da política de desenvolvimento, de segurança e de integração efetiva do espaço amazônico. Na concepção do marechal Cordeiro de Farias (1966), a “Operação Amazônia” seria necessária para motivar a reformulação da política de desenvolvimento desse território.

Como reflexos dessas propostas, a década seguinte nos dá diversos exemplos de programas voltados para o desenvolvimento da Amazônia. Em 1974, o presidente Geisel (1975GEISEL, Ernesto. Discursos, v. II, 1975. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1976.) anuncia dois deles: o Polamazônia4 4 O Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (Polamazônia) foi criado pelo Decreto n. 74.607, de 25 de setembro de 1974 “com a finalidade de promover o aproveitamento integrado das potencialidades agropecuárias, agroindustriais, florestais e minerais, em áreas prioritárias da Amazônia” (Brasil, 1974). e PND II.5 5 O Plano Nacional de Desenvolvimento II previa o ajustamento da economia nacional à situação de escassez de petróleo, um novo estágio da evolução industrial do país, a substituição da importação pela exportação e o incentivo à agropecuária como caminho para o desenvolvimento brasileiro. Ambos os programas estariam vinculados a Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e tinham, segundo o presidente Geisel, o intuito de abrir os caminhos físicos para o desenvolvimento da “hileia amazônica” (Geisel, 1976GEISEL, Ernesto. Discursos, v. II, 1975. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1976.).

A partir das palavras do general Golbery do Couto e Silva, do relatório Operação Amazônia e do presidente Ernesto Geisel, vemos a utilização do termo “hileia”, utilizado pela primeira vez por Alexander von Humboldt e Aimé Bonpland para se referir à Floresta Amazônica e, posteriormente, apropriado por Euclides da Cunha em seu livro À margem da história (1909CUNHA, Euclides da. À margem da história. Porto: Chardron, 1909.). Nessa obra, Euclides da Cunha (1909) questiona a permanência da imagem - “carregada de espanto religioso” - da “hileia prodigiosa” cunhada por Humboldt no século XIX. Contra essa representação, Euclides defende a necessidade do conhecimento da “Amazônia real” pelos brasileiros.

Apesar de o termo “hileia” constar nos “ensaios amazônicos”, em nenhum momento aparece nos textos selecionados por Hildon Rocha para a publicação de Um paraíso perdido em 1976. A referência a “hileia” somente é encontrada nos artigos de Arthur César Ferreira Reis e Francisco Venâncio Filho, ambos inseridos na introdução dessa obra póstuma. No que se refere à apropriação do termo “hileia”, esses dois comentaristas destacam dois elementos importantes sobre a atuação do intelectual fluminense: o fato de Euclides ter colocado sua inteligência a serviço da “hileia portentosa”, assim como ter colocado seu gênio para vingar-se da “hileia maravilhosa” dos escritores que maculavam esse território desde o século XVII (Venâncio Filho, 1976VENÂNCIO FILHO, Francisco. Retrato humano de Euclides da Cunha. In. CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos. Brasília: INL, 1976, p. 53-71.).

No que se refere à necessidade de divulgar as ações governamentais na Amazônia e contribuir com a reordenação da “hileia”, Geisel visitou a sede da Sudam no Pará em setembro de 1974GEISEL, Ernesto. Discursos, v. I, 1974. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1975.. Na ocasião, o presidente informa as atividades desempenhas pelo órgão para “ocupação racional da Amazônia”, entre elas, a criação da rede “rodoviária, o aumento da oferta de energia, a inauguração de sistema de telecomunicações [...] a [...] revitalização da navegação fluvial, a pesquisa de recursos naturais [...] as experiências de colonização oficial, a execução de numerosos projetos agropecuários e industriais” (Geisel, 1974GEISEL, Ernesto. Discursos, v. I, 1974. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1975., p. 140).

O objetivo dessas iniciativas governamentais seria conquistar e integrar o território amazônico para “aproveitar-lhe a vasta potencialidade” (Geisel, 1974GEISEL, Ernesto. Discursos, v. I, 1974. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1975., p. 141). Dois anos após essas palavras, Geisel retorna à sede da Sudam no Pará, onde defende que a Amazônia precisa “ser povoada e conquistada” e, por isso, o chefe da Nação anuncia que essa iniciativa

exige de todos nós um esforço, um trabalho imenso, não só econômico, mas político, social, um desenvolvimento integrado, que resulta não apenas do governo [...] mas [...] do esforço de todos nós, cada um carregando a sua carga de responsabilidade e produzindo [...] para a coletividade nacional (Geisel, 1976GEISEL, Ernesto. Discursos, v. III, 1976. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1977., p. 57).

Ao defender a participação de todos os brasileiros na “conquista” do território amazônico, o presidente ressalta que o “sentimento real do povo brasileiro” é o de “construir um grande Brasil” (Geisel, 1976GEISEL, Ernesto. Discursos, v. III, 1976. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1977., p. 136). E, para que essa missão seja cumprida, Geisel acentua que “mais do que o presente, nós estamos [...] construindo um futuro. Futuro que é grande para a Amazônia, que é grande para o Brasil. Mas não é só o Governo que constrói esse futuro: é o Governo juntamente com o restante da nação. É o Governo junto com o povo” (Geisel, 1977GEISEL, Ernesto. Discursos, v. III, 1976. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1977., p. 260).

Ao inserir a povo brasileiro no projeto de integração amazônica, a colonização e a integração econômica desse território tornam-se essenciais na crença do Brasil como o “país do futuro”. Euclides, em seus escritos, já defendia que seria na Amazônia que concentraria a civilização futura e, por essa razão, tornar-se-ia imperativo a imposição da nacionalidade brasileira à região amazônica. Dessa forma, o escritor fluminense insistia na rápida integração e defesa da Amazônia como condição sine qua non para a evolução histórica do país. Diante disso, consideramos que a junção entre modernização e expansão da fronteira agrícola abriu espaço para a apropriação dos enunciados euclidianos, mais especificamente a tese de um destino a ser cumprido por todos os brasileiros. Essa construção simbólica foi um dos principais elementos utilizados pelo regime militar para fundamentar ideologicamente o desenvolvimento econômico e a conquista da Amazônia. Nesse sentido, a publicação póstuma de Um paraíso perdido veio em boa hora, uma vez que, ao defender a expansão da fronteira amazônica, o discurso oficial pode apropriar-se de diversos elementos idealizados por Euclides em seus “ensaios amazônicos”.

No que diz respeito ao consumo cultural dos enunciados euclidianos cinquenta anos após a sua morte, Leandro Tocantins6 6 Leandro Tocantins ocupou diversos cargos públicos, entre eles foi diretor de Operações Não Comerciais da Embrafilme S.A. (MEC), Fundação Brasil Central e auxiliar da Secretaria da Presidência da República. Também escreveu diversos livros, podemos citar: O rio comanda a vida (Uma interpretação da Amazônia) (1952); Formação histórica do Acre (1961); e Brasil: alguns valores essenciais (1966). (1968TOCANTINS, Leandro. Euclides da Cunha e o paraíso perdido. Rio de Janeiro: Gráfica Record Editora, 1968., p. 17) considera que o intelectual fluminense possuiu uma visão “profética” e um “espírito iluminado” na forma como abordou os problemas amazônicos. Para o autor, ao ver a possibilidade de construir “um novo Brasil” no território amazônico, Euclides expressou “suas revelações, suas denúncias, suas interpretações [e] suas intuições” (p. 17). Segundo o comentarista, essas atitudes qualificam Euclides da Cunha como o primeiro representante do “brasileirismo-amazônico” (p. 17).

Alguns anos depois dessas palavras, Geraldo I. Joffily7 7 Em 1960 assumiu o cargo de juiz eleitoral em Brasília, mas em 1964, por ato do governo militar, foi colocado em disponibilidade por decreto. No período que intermediou sua disponibilidade e a execução da Lei da Anistia (1964-1979), publicou textos literários e históricos, entre eles: Atividades de um juiz (1964), Um cronista do sertão no século passado (1965), L´Inscription phénicienne de Parayba, un document apocryphe (1972), Brasília e sua ideologia (1977) e O juiz na Revolta da Chibata (1978). (1971JOFFILY, G. Irenêo. Euclides da Cunha e a Rodovia Transamazônica. Revista de Informação Legislativa, v. 8, n. 31, p. 145-148, jul./set. 1971. Disponível em:<Disponível em:http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/180502 >. Acesso em:03/06/2020
http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id...
) escreveu um artigo defendendo a perfeita semelhança entre os principais tópicos defendidos por Euclides e os programas governamentais de integração da Amazônia do regime militar. Para Joffily, um dos exemplos dessa semelhança seria a Rodovia Transamazônica idealizada pelos militares e, mais, esse empreendimento tornar-se-ia a verdadeira concretização das ideias euclidianas.

Em relação à semelhança entre os projetos de desenvolvimento da Amazônia do governo Geisel e as ideias defendidas por Euclides da Cunha, Januário F. Megale8 8 Foi professor do Departamento de Economia vinculado à Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo. Publicou o livro Introdução às ciências sociais — roteiros de estudo (1986), Geografia e sociologia em Max Sorre (1983), Max Sorre (1984). (1976CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos. Brasília: INL, 1976.) afirma que a publicação de Um paraíso perdido veio em boa hora, pois poderia ajudar a romper com as indecisões dos projetos dos diferentes governos brasileiros e corroborar com os planos de integração da Amazônia empreendidos pelo governo militar.

Na obra Um paraíso perdido (1976), encontramos outros exemplos de atualizações dos enunciados euclidianos. Francisco Venâncio Filho9 9 Em 1924 foi um dos fundadores da Associação Brasileira de Educação, da qual foi presidente. Exerceu a livre docência no Colégio Pedro II de junho de 1920 a dezembro de 1937, e as cátedras de Ciências Naturais e História da Educação no Instituto de Educação do Rio de Janeiro. No início de 1946, no Colégio Rio Branco, pronunciou diversas conferências sobre o autor de Os sertões. O falecimento precoce ocorreu no dia 12 de agosto de 1946, na cidade de São Paulo, quando se dirigia para São José do Rio Pardo, a fim de participar da Semana Euclidiana. (1976VENÂNCIO FILHO, Francisco. Retrato humano de Euclides da Cunha. In. CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos. Brasília: INL, 1976, p. 53-71.) considera que, no capítulo “Transacreana”,10 10 A integração da Amazônia ao Brasil poderia ser operada, acreditou Euclides da Cunha, através da realização do projeto da ferrovia Transacreana. Euclides idealizou a ferrovia em todos os detalhes: seu traçado, seu percurso, suas locomotivas, curvas, declives e até mesmo os materiais a serem utilizados, suas medidas e seu custo. - pertencente ao livro À margem da história (1909) e reproduzido na obra póstuma - se “casam o artista e o engenheiro” na elaboração de um projeto com forte “função nacional” (Venâncio Filho, 1976VENÂNCIO FILHO, Francisco. Retrato humano de Euclides da Cunha. In. CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos. Brasília: INL, 1976, p. 53-71., p. 69). Na mesma obra, Arthur Reis (1976REIS, Arthur César Ferreira. Euclides e o Paraíso Perdido. In: CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos. Brasília: INL , 1976, p. 41-51., p. 50) defende que o escritor fluminense conduziu a “opinião nacional” para a meditação acerca dos problemas do extremo norte do país. Ao recuperar a Transacreana como parte dos projetos idealizados por Euclides, Reis faz uma pergunta retórica: o “que se realiza agora, com a Transamazônica, mais arrojada, não será um capítulo do projeto de Euclides?” (Reis, 1976REIS, Arthur César Ferreira. Euclides e o Paraíso Perdido. In: CUNHA, Euclides da. Um paraíso perdido: reunião dos ensaios amazônicos. Brasília: INL , 1976, p. 41-51., p. 50).

A partir das posições desses comentaristas, vemos a tentativa de atualizar as ideias defendidas por Euclides. Para Arthur Reis, os programas governamentais da década de 1970 - a integração da Amazônia, a ocupação econômica da floresta e a construção da Rodovia Transamazônica - nada mais são do que a tentativa de efetivação das ideias anunciadas por Euclides da Cunha na primeira década do século XX. No que tange aos projetos viários do regime militar, a Rodovia Transamazônica ganharia um valor simbólico capaz de sedimentar a construção da ideologia de eliminar os vazios demográficos no território amazônico e, ao mesmo tempo, integrar esse território ao restante do país. A construção dessa rodovia reforçaria a nacionalidade através da integração entre todos os brasileiros e a floresta. Como vemos, é clara a apropriação dos enunciados literários euclidianos entre os intelectuais vinculados ideologicamente ao governo. Vemos, também, o consumo cultural dos escritos de Euclides, os quais são postos para justificar a necessidade de ocupação econômica da Floresta Amazônica ou, seguindo as palavras do presidente Geisel, para fortalecer o ímpeto de integração da “hileia amazônica”.

Ao avançar sobre esse “mundo desconhecido”, a apropriação dos enunciados euclidianos pelo governo militar também relacionou a memória, o passado, o nacionalismo, a necessidade de ocupação dos vazios demográficos e o desenvolvimento nacional. No que diz respeito à construção da memória referente aos projetos de ocupação amazônica, o presidente Geisel lembra que esses propósitos já estavam presentes nos roteiros da “revolução de 64” (Geisel, 1975GEISEL, Ernesto. Discursos, v. I, 1974. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1975., p. 21). Ao estabelecer o jogo entre memória e esquecimento, o presidente Geisel afirma que a política do seu governo é a mesma de Castelo Branco, Costa e Silva e Garrastazu Médici. Ao dar continuidade a esse projeto supostamente iniciado em 1964, o chefe da Nação defende que é imperativo “dar atenção especial à Amazônia” através dos programas que visam “vinculá-la cada vez mais ao resto do País, no sentido de, assegurar a perfeita integração nacional” (Geisel, 1978GEISEL, Ernesto. Discursos, v. IV, 1977. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1978., p. 520). Para reforçar os ideários da “revolução de 64”, Geisel (1977GEISEL, Ernesto. Discursos, v. III, 1976. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1977., p. 239) enumera todas as medidas tomadas pelo regime:

a transformação da antiga SPVEA na [...] SUDAM; implantação da Zona Franca de Manaus - a SUFRAMA; a revitalização do Banco da Amazônia; a política de incentivos fiscais [...] o levantamento integral pelo RADAM; os polos agropecuários e agrominerais que constituem o POLAMAZÔNIA; a abertura de rodovias [...] a hidrelétrica de Tucuruí [...] a exploração da bauxita de Oriximiná e de Paragominas; o projeto de alumínio - ALBRÁS; o projeto do complexo mineral de CARAJÁS; os fluxos migratórios provindos de todas as outras regiões do país e orientados para o desbravamento de novas áreas adensando o povoamento; o abastecimento de água e o saneamento de diversas cidades; o desenvolvimento do ensino e da assistência à saúde.

O presidente defende que o propósito de todas essas iniciativas é apenas um: conservar a nossa nacionalidade através da integração econômica da Amazônia ao restante do país. Essa integração, segundo o chefe da Nação, obedece a um “espírito nacional” enraizado no “sentimento de coesão” de “ter um País todo ele desenvolvido” (Geisel, 1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979., p. 493). Ao defender a coesão do país, vemos, também, que, no seio dos programas de integração da Amazônia, está presente a necessidade de fortalecimento da soberania da Nação em um “território quase desconhecido” (Geisel, 1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979., p. 493).

No que concerne ao discurso de soberania nacional associado aos projetos militares de integração da Amazônia, cabem algumas considerações sobre esses enunciados a partir de estudos dos “ensaios amazônicos”. No tocante aos estudos desses textos, encontramos diversos autores que destacam a manutenção da soberania brasileira sobre o território amazônico como uma das preocupações de Euclides da Cunha. Bolle (2005BOLLE, Willi. O Mediterrâneo da América Latina: a Amazônia na visão de Euclides da Cunha. Revista USP (São Paulo). n. 66, p. 140-155, jun./ago.2005.), Sevcenko (2003SEVCENKO, Nicolau. Literatura como missão: Tensões sociais e criação cultural na Primeira República. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.) e Murari (1997MURARI, Luciana. “O Brasil ainda chega até cá”: Euclides da Cunha dos sertões à Amazônia. Varia História (Belo Horizonte). n. 17, p. 219-236, mar. 1997. Disponível em: <Disponível em: https://static1.squarespace.com/static/561937b1e4b0ae8c3b97a702/t/57279c0f07eaa089fa602aa1/1462213652152/13_Murari%2C+Luciana.pdf >. Acesso em: 8 jan. 2019.
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) evidenciam como Euclides da Cunha aborda as questões fronteiriças em seus “ensaios amazônicos”, as quais notoriamente envolvem debates políticos internos e de relações internacionais. De acordo com esses autores, Euclides compartilhava do medo de sua geração ao temer que, se o governo brasileiro não operasse a nacionalização da floresta, o Brasil poderia perder esse território para as potências imperialistas europeias ou norte-americana. Para Sevcenko (2003SEVCENKO, Nicolau. Literatura como missão: Tensões sociais e criação cultural na Primeira República. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.), esse temor gerou um tipo peculiar de nacionalismo que pode ser chamado de “nacionalismo defensivo”. Nos livros Contrastes e confrontos (1907) e À margem da história (1909), Euclides da Cunha defendia que a expansão imperialista das grandes potências no século XX deriva-se do renascimento da atividade militar expansionista e, por esse motivo, o Brasil deveria empreender o mais rápido possível a nacionalização da Floresta Amazônica.

Em relação ao medo de perder a soberania sobre a Amazônia, Geisel (1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979.) fala aos brasileiros sobre as interferências externas que assumem formas sutis. Para o presidente, o “Brasil é um país soberano que sabe cuidar de si” e, por isso, “não precisa que os outros venham aqui cuidar de nós” (Geisel, 1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979., p. 105). Geisel afirma que o Estado brasileiro deve ser:

Contra os ensaios de internacionalização, sob a forma abrupta do passado ou da interferência sutil do presente, o melhor antídoto é a [...] proteção da área. Na Amazônia, repito, compete aos países que a partilham, e a eles só, a responsabilidade exclusiva pelo seu desenvolvimento (Geisel, 1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979., p. 291).

Além “de inibir preventivamente os paternalismos” e lutar contra os que querem ver a “Amazônia estagnada”, o presidente anuncia que esse território não pode ser retirado “por ninguém porque decorre de um fato: a existência soberana dentro da Amazônia” (Geisel, 1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979., p. 291). Nesse sentido, a ocupação da Amazônia e a definição de uma política interna de desenvolvimento permanecerão de exclusiva competência da esfera nacional. Reforçando esse ponto de vista, o presidente Geisel (1975GEISEL, Ernesto. Discursos, v. I, 1974. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1975., p. 176) defende que “o desenvolvimento econômico e a transformação social” dependem da “soberania nacional”. De modo geral, Geisel sustenta que os brasileiros irão defender “a nossa soberania, as nossas prerrogativas e as nossas necessidades” (Geisel, 1977GEISEL, Ernesto. Discursos, v. III, 1976. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1977., p. 54). Em uma de suas últimas mensagens ao Congresso Nacional, Geisel (1979 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979.) afirma que os fundamentos da política externa brasileira jamais deixarão de ser a soberania sobre o território amazônico.

Como vemos, em diversos momentos é possível perceber as interfaces entre os enunciados expostos nos “ensaios amazônicos” de Euclides da Cunha, a apropriação desses enunciados por intelectuais vinculados ao regime militar e o programa de integração econômica da Floresta Amazônica. Apesar dessas proximidades, Geisel (1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979.) questiona as posições negativas e ultrapassadas do escritor fluminense. De acordo com o presidente:

Setenta anos atrás, o renomado autor de “Os sertões”, Euclides da Cunha, resumia sua experiência da Amazônia no título de uma obra que a descrevia como tendo permanecido “à margem da história”. O homem não passava ali de “intruso impertinente”, incapaz de deixar traço permanente em meio a uma natureza opulenta e inacabada. A visão pessimista do passado e talvez a necessidade de ênfase levaram o escritor a dar reduzida significação à riqueza da trama histórica, que, já então, se havia tecido entre a terra e o homem (Geisel, 1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979., p. 383).

Ao defender que Euclides era detentor de uma visão pessimista, o presidente destaca que “é exagero ver na Amazônia de ontem apenas o império bruto da natureza antes do homem” e, talvez, o “conceito de ‘terra sem história’ se preste melhor a resumir o que foi” (Geisel, 1978 GEISEL, Ernesto. Discursos, v. V, 1978. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República , 1979., p. 284). Com essas palavras, Geisel deixa claro para a Nação que os programas de integração amazônica desenvolvidos desde a “revolução de 64” conseguiram solucionar os problemas apontados por Euclides da Cunha, ou seja, o isolamento, a falta de integração econômica, o desconhecimento das riquezas e, o mais importante, a necessidade de defender a soberania contra as intromissões estrangeiras.

Considerações finais

Com base na revisão bibliográfica realizada neste artigo, destacamos algumas interpretações referentes aos “ensaios amazônicos” de Euclides da Cunha, vejamos: as similitudes entre esses textos e Os sertões, a ideia de que o progresso deveria alcançar a Amazônia, a continuidade/rompimento com a literatura científica e naturalista do século XIX, a perspectiva dualista na representação da floresta e, por fim, a manutenção da soberania brasileira sobre o território amazônico. Como dito em outro momento, esses autores ignoraram as interfaces entre a publicação póstuma do “segundo livro vingador” de Euclides e os projetos de integração amazônica empreendidos durante o governo do presidente Ernesto Geisel (1974GEISEL, Ernesto. Discursos, v. I, 1974. Brasília: Assessoria de Imprensa da Presidência da República, 1975.-1979).

Outra importante contribuição deste estudo é a exposição da maneira como o regime militar caracterizou o território amazônico. Nessa representação oficial, as populações amazônicas foram adjetivadas com termos como, por exemplo, “hospitaleiros”, “dedicados”, “voluntariosos”, “empreendedores” e “entusiastas dos empreendimentos governamentais”. Por outro lado, essa mesma representação ignorou a desolação, a violência e o isolamento dessas mesmas populações. Esse silêncio é compreensível se considerarmos que, de acordo com o discurso do presidente Geisel, a “revolução de 64” reverteu a visão pessimista encontrada nos escritos de Euclides da Cunha.

Assim como os habitantes, a Floresta Amazônica - enquanto paisagem natural - também foi incorporada aos pronunciamentos de Geisel. Nos discursos presidenciais, o território foi exaltado por seus pontos positivos, principalmente com relação aos rios que poderiam ser utilizados para a navegação fluvial e para o aproveitamento energético. Paralelamente à visão otimista, a floresta também é descrita negativamente, em especial, pelos “imensos espaços vazios”. No que refere às interfaces entre os discursos de Geisel e os enunciados expostos por Euclides, vemos a redefinição da dualidade na descrição da Floresta Amazônia, principalmente na noção dos “vazios demográficos” que devem ser ocupados pelo desenvolvimento econômico.

Além da apropriação da dualidade na composição do discurso oficial de integração econômica da Floresta Amazônica, um terceiro ponto merece ser destacado; a defesa da soberania do território. Em Euclides, observamos o temor do caráter não nacional da Amazônia, já nos pronunciamentos do presidente Geisel é possível destacar a crença na efetiva incorporação desse território à nacionalidade brasileira, a qual defenderia o território contra intromissões estrangeiras.

Através desses três exemplos - os habitantes, as potencialidades naturais e a soberania -, constata-se a construção da imagem da região como universo extra-histórico, inventado e manipulado. Essa distorção foi devidamente calcada em uma releitura dos projetos de intervenção anteriores, do impacto das condições naturais, da permanência dos empreendimentos de povoamento e da ocupação produtiva do território que, até certo ponto, responderam às políticas públicas elaboradas no período militar. Há, portanto, uma interpretação científico-sociológica - por parte de intelectuais próximos ao regime - sobre o ambiente amazônico, a qual interferiu na apropriação da obra Um paraíso perdido e no estabelecimento de um modelo específico de intervenção naquele espaço.

Através deste estudo, vemos como as representações elaboradas pelos intelectuais ligados ao regime militar, assim como pelo próprio presidente Geisel, não são idênticas às que Euclides investiu em seus “ensaios amazônicos”. Essa “outra produção” buscou responder as indagações da década de 1970 e, concomitantemente, subsidiou a tentativa de pôr em prática um projeto governamental de ocupação territorial. Consideramos que, a partir do “consumo cultural” dos “ensaios amazônicos” na década de 1970 desenvolveu-se uma “outra produção” dos enunciados defendidos pelo autor de Os sertões. É possível afirmar que, a partir da edição póstuma de Um paraíso perdido (1976), podemos sugerir a abertura para múltiplas leituras e interpretações dos textos euclidianos. Dessa forma, a composição dessa obra ofereceu a possibilidade para novas apreensões e manipulações dos enunciados defendidos por Euclides da Cunha, os quais subsidiaram, no campo literário, os projetos de integração da Floresta Amazônica.

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  • 1
    Euclides da Cunha, no prefácio dessa obra, denuncia o conhecimento fragmentado, a incompreensão e a miséria das sociedades que vivem na Amazônia.
  • 2
    Hildon Rocha, além de ensaísta, memorialista, crítico literário e jornalista, pertenceu ao corpo editorial da Editora Vozes durante a década de 1970. Publicou, entre outras obras, O poeta e as potências abstratas (1956), Entre lógicos e místicos (1968) e Poesias escolhidas de Álvares de Azevedo (1971).
  • 3
    O presidente do Conselho Consultivo dessa coleção foi Arthur Cesar Ferreira Reis. Arthur Reis foi membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA) e da Academia Amazonense de Letras (AAL). Além de ser um intelectual de renome na região amazônica, também desempenhou várias funções públicas, dentre elas: governador do Estado do Amazonas entre 1964 a 1967, superintendente do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e delegado do Brasil em várias conferências de âmbito internacional.
  • 4
    O Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (Polamazônia) foi criado pelo Decreto n. 74.607, de 25 de setembro de 1974 “com a finalidade de promover o aproveitamento integrado das potencialidades agropecuárias, agroindustriais, florestais e minerais, em áreas prioritárias da Amazônia” (Brasil, 1974BRASIL. Decreto nº 74.607, de 25 de Setembro de 1974. Dispõe sobre a criação do Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (POLAMAZÔNIA). Disponível em: <Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1970-1979/decreto-74607-25-setembro-1974-423225-publicacaooriginal-1-pe.html > Acessado em: 03/06/2020
    https://www2.camara.leg.br/legin/fed/dec...
    ).
  • 5
    O Plano Nacional de Desenvolvimento II previa o ajustamento da economia nacional à situação de escassez de petróleo, um novo estágio da evolução industrial do país, a substituição da importação pela exportação e o incentivo à agropecuária como caminho para o desenvolvimento brasileiro.
  • 6
    Leandro Tocantins ocupou diversos cargos públicos, entre eles foi diretor de Operações Não Comerciais da Embrafilme S.A. (MEC), Fundação Brasil Central e auxiliar da Secretaria da Presidência da República. Também escreveu diversos livros, podemos citar: O rio comanda a vida (Uma interpretação da Amazônia) (1952); Formação histórica do Acre (1961); e Brasil: alguns valores essenciais (1966).
  • 7
    Em 1960 assumiu o cargo de juiz eleitoral em Brasília, mas em 1964, por ato do governo militar, foi colocado em disponibilidade por decreto. No período que intermediou sua disponibilidade e a execução da Lei da Anistia (1964-1979), publicou textos literários e históricos, entre eles: Atividades de um juiz (1964), Um cronista do sertão no século passado (1965), L´Inscription phénicienne de Parayba, un document apocryphe (1972), Brasília e sua ideologia (1977) e O juiz na Revolta da Chibata (1978).
  • 8
    Foi professor do Departamento de Economia vinculado à Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo. Publicou o livro Introdução às ciências sociais — roteiros de estudo (1986), Geografia e sociologia em Max Sorre (1983), Max Sorre (1984).
  • 9
    Em 1924 foi um dos fundadores da Associação Brasileira de Educação, da qual foi presidente. Exerceu a livre docência no Colégio Pedro II de junho de 1920 a dezembro de 1937, e as cátedras de Ciências Naturais e História da Educação no Instituto de Educação do Rio de Janeiro. No início de 1946, no Colégio Rio Branco, pronunciou diversas conferências sobre o autor de Os sertões. O falecimento precoce ocorreu no dia 12 de agosto de 1946, na cidade de São Paulo, quando se dirigia para São José do Rio Pardo, a fim de participar da Semana Euclidiana.
  • 10
    A integração da Amazônia ao Brasil poderia ser operada, acreditou Euclides da Cunha, através da realização do projeto da ferrovia Transacreana. Euclides idealizou a ferrovia em todos os detalhes: seu traçado, seu percurso, suas locomotivas, curvas, declives e até mesmo os materiais a serem utilizados, suas medidas e seu custo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    29 Jan 2019
  • Aceito
    07 Jun 2019
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