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Direitos humanos e infância: construindo a Convenção sobre os Direitos da Criança (1978-1989)

Resumo:

Entre 1978 e 1989, a Organização das Nações Unidas promoveu um debate com o objetivo de produzir uma normativa internacional para a população infantojuvenil. O artigo analisa o documento que sistematizou essas discussões, produzido pela organização não governamental Save the Children, acerca da Convenção sobre os Direitos da Criança, intitulado Legislative history of the Convention on the Rights of the Child. São abordados os debates que deram origem aos Artigos 1 e 2, pilares no processo de construção da “criança universal”, sob a perspectiva dos direitos humanos. A definição do início e do fim da infância sob a perspectiva do direito internacional público e da garantia da igualdade jurídica para meninas e meninos balizaram o debate do Artigo 1. Já o debate sobre o Artigo 2 foi pautado pelos temas da garantia de direitos para a prole nascida fora dos casamentos considerados legais e para as crianças migrantes internacionais.

Palavras-chave:
Infância; Direitos Humanos; Convenção sobre os Direitos da Criança

Abstract:

Between 1978 and 1989, the United Nations held a debate aimed at producing a treaty for the child and youth population. This paper analyzes the document that systematized these discussions, produced by the non-governmental organization Save the Children, which addresses the Convention on the Rights of the Child, entitled Legislative history of the Convention on the Rights of the Child. The debates that gave rise to Articles 1 and 2 are discussed, pillars in the process of building the “universal child,” from the perspective of Human Rights. The definition of beginning and end of childhood from an international public law viewpoint and the guarantee of legal equality for girls and boys marked the debate on Article 1. In turn, the debates on Article 2 were guided by the themes of guaranteeing rights for the offspring outside legal marriages and for international migrant children.

Keywords:
Childhood; Human Rights; Convention on the Rights of the Child

Introdução1 1 Uma versão resumida deste texto foi apresentada no 56˚ Congresso Internacional de Americanistas (ICA), ocorrido entre os dias 15 e 20 de julho de 2018, na Universidad de Salamanca (Espanha). O artigo apresenta os resultados parciais da pesquisa intitulada “Do ‘menor’ à criança: Direitos Humanos e infância pobre (Brasil, 1976-1990)”, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)/Brasil. A investigação contou com a participação de Mateus Viera de Souza, licenciado em História pela Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc).

Há aproximadamente 30 anos, em 20 de novembro de 1989, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a Resolução 44/25, que continha o texto da Convenção sobre os Direitos da Criança. O tratado entrou em vigor um ano depois, quando, conforme o Artigo 49 da referida normativa internacional, mais de vinte países haviam ratificado a legislação. A Convenção sobre os Direitos da Criança é considerada pelos profissionais que atuam no campo do direito internacional público como bem-sucedida, pois, além de ter sido ratificada ao longo das décadas por mais de 190 países (mesmo que sob várias cláusulas de reserva), a visão sociojurídica presente na legislação foi sendo paulatinamente adotada pelas populações de países localizados em diferentes continentes. Os organismos internacionais, notadamente as agências da Organização das Nações Unidas (ONU), tiveram um papel de destaque nesse processo histórico que incentivou mudanças no tratamento dos problemas envolvidos nas vidas de milhões de crianças e jovens (Oestreich, 1998OESTREICH, Joel E. Unicef and the implementation of the Convention on the Rights of the Child. Global Governance (Boston). n. 4, p. 183-198, 1998.; Pilloti, 2001).

A Convenção sobre os Direitos da Criança, assim como outros tratados multilaterais produzidos pela ONU, apresenta um preâmbulo e um conjunto de artigos dispostos em três partes. As bases jurídicas e sociológicas que orientaram a produção da normativa internacional são enunciadas no preâmbulo. A Parte I, composta por 41 artigos, prescreve que direitos devem ser garantidos às crianças pelos estados membros da instituição que ratificarem a normativa internacional. Já a Parte II apresenta, nos artigos 42, 43, 44 e 45, os procedimentos diplomáticos e administrativos que os países devem efetuar após a ratificação do documento junto à ONU. Por fim, a Parte III, formada pelos artigos 46 a 54, regulamenta como deve ser o processo de ratificação da normativa internacional pelos estados nacionais.

Desde o advento dos direitos sociais no mundo ocidental, durante o século XIX, as legislações adquiriram uma importância ainda maior para homens, mulheres, jovens e crianças, pois, além regulamentar as práticas sociais, passaram a nortear a formulação das políticas públicas. A história das legislações nacionais e internacionais, entre outras possibilidades, pode ser estudada a partir da produção de um campo discursivo por países, blocos econômicos/políticos e agências internacionais. Ou então, a partir da aplicação do prescrito nas leis, jurisprudências e tratados para as populações. A presente reflexão tem como foco o processo da construção dos artigos que compõem o texto da Convenção sobre os Direitos da Criança. A edificação desse tratado ocorreu entre os anos de 1978 e 1989, por meio de debates, acontecidos sobretudo durante as reuniões da Comissão de Direitos Humanos da ONU. Este texto pretende construir uma análise dos debates de caráter legislativo que deram origem aos Artigos 1 e 2 da normativa internacional, pelos quais se instituíram a definição de criança e os princípios jurídicos gerais que embasaram a formulação dos demais direitos. A seleção desses dois artigos se deve aos critérios estabelecidos pela ONU para a confecção de relatórios sociais que os países signatários do tratado se comprometeram a enviar à instituição a cada 5 anos.2 2 Organização das Nações Unidas (ONU). Convenção sobre os Direitos da Criança (1989, Artigo 44). Com o presente estudo, além das discussões relativas à história da infância e juventude, busca-se contribuir para uma possível história do direito com foco nas regulamentações das sociedades em seus diferentes níveis - global, nacional e local - e nas disputas que se dão no campo sociopolítico em determinado momento histórico.

A fonte que norteará a construção desta narrativa é a obra publicada em língua inglesa em 2007, pela organização não governamental sueca Save The Children Sweden/Rädda Barnen, intitulada Legislative history of the Convention on the Rights of the Child. Essa obra, de 948 páginas distribuídas em dois volumes, apresenta uma compilação dos debates legislativos realizados pelos diplomatas dos países membros da ONU com assento na Comissão de Direitos Humanos entre 1979 e 1989, e pelos representantes das organizações não governamentais e das agências internacionais que deram origem a cada um dos artigos, assim como ao preâmbulo da normativa internacional. Os operadores do direito internacional público denominam a esse tipo de texto de travaux préparatoires.

A fonte documental básica desta análise é constituída por documentos emitidos ao longo de 10 anos pela ONU e compilados por uma instituição filantrópica - Save the Children -, que há um século tem como “missão” a difusão, em nível internacional, do ideário dos direitos de crianças e jovens sob a perspectiva jurídica protecionista. Tal característica do material sugere problemas e limitações, pois a perspectiva adotada para a seleção e disponibilização dos debates pode ter sido circunscrita por um determinado posicionamento. Além dessa questão, possivelmente o cenário geopolítico da primeira década dos anos 2000, relativo ao fim da Guerra Fria, também pode ter influenciado o processo de seleção dos textos.3 3 Por exemplo, no website da Faculdade de Direito, da University of Virginia (EUA), encontramos outro conjunto de documentos que pautou a construção da Convenção sobre os Direitos da Criança. Ver: <https://hr-travaux.law.virginia.edu/international-conventions/convention-rights-child-crc>. Para Robert Kolb (2005KOLB, Robert. Mondialisation et droit international. Relations Internationales. n. 123, p. 69-86, 2005.), após a extinção da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), o direito internacional público caminhou sobretudo nas seguintes direções: a hegemonia estadunidense, a busca pela chamada globalização de ideias e o reacender dos nacionalismos.

Conforme mencionado, a obra Legislative history of the Convention on the Rights of the Child é constituída por dois volumes. O primeiro é composto de três partes, iniciando-se pela apresentação dos documentos das autoridades com a abordagem da importância da publicação da obra para o campo do direito da infância; a segunda parte do volume descreve o que sucedeu em reuniões ocorridas entre 1976 e 1989 na ONU, além de outras instituições; segue-se, por fim, a narrativa das discussões relativas ao preâmbulo e aos artigos 1 a 17. O segundo volume contém os debates subsequentes acerca dos temas envolvidos nos artigos 18 a 44 da convenção.Na última parte, “Other issues and matters”, são apresentados os artigos que, embora discutidos, não foram incorporados na normativa internacional; são também inseridos os protocolos adicionais aprovados até 2000. Os debates legislativos ocorridos em determinados marcos temporais estão presentes de forma constante na obra, a saber: o anteprojeto esboçado pelos representantes diplomáticos da Polônia em 1978; a primeira discussão do texto, acontecida em 1980; os debates de 1984 e de 1988-1989; e os de 1989, no momento da revisão final do rascunho da normativa.

As discussões que deram origem a cada artigo são apresentadas no texto da seguinte forma: são informados o nome do país ou da instituição e, logo abaixo, os argumentos proferidos por seus representantes. Raras vezes se mencionaram, no texto, nomes de pessoas - fossem diplomatas, autoridades das agências internacionais ou gestores das organizações não governamentais - que tenham participado dos eventos ao longo de mais de uma década. Para os propósitos desta análise, será focalizada sobretudo a compilação dos debates que deram origem ao preâmbulo (Legislative history..., 2007, p. 227-299) e aos Artigos 1 e 2 (p. 301-334). É indispensável, todavia, travar contato com as partes relativas aos debates realizados no processo de construção de outros artigos e trazer informações sobre elas.

Do ponto de vista do metodológico, a fonte foi analisada sob a perspectiva enunciada por Michel Foucault em relação ao discurso. Esse método de análise visa a apreender como são construídos determinados sujeitos sociais a partir dos movimentos realizados no âmbito da ordem do discurso. Afirma o autor:

Por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as interdições que o atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e o poder. Nisto não há nada de espantoso, visto que o discurso - como a Psicanálise nos mostrou - não é simplesmente aquilo que manifesta (ou oculta) o desejo; é, também, aquilo que é o objeto do desejo; e visto que - isto a História não nos cessa de ensinar - o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar (Foucault, 1996FOUCAULT, Michel.A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996., p. 10).

Foucault demonstra, sobretudo nas obras A arqueologia do saber e A ordem do discurso, que há um conjunto de procedimentos que operam no sentido de edificar um discurso denominado por ele de “regras de formação”. Entre essas, destacam-se as condições de emergência (históricas e socioculturais), as instâncias de delimitação e as grades de especificação/classificação. No que tange ao conteúdo do discurso, o autor sugere haver um “jogo” (quase sempre) controlado entre a inclusão e a exclusão de temáticas. É nesse duplo processo - de ordem estrutural e de conteúdo - que se dá a produção das “verdades” que, posteriormente, referendam o exercício das relações de poder pelos diferentes atores sociais (Estados, instituições ou indivíduos) (Foucault, 1996FOUCAULT, Michel.A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996.).

A Convenção sobre os Direitos da Criança é tema de estudos de diferentes áreas do conhecimento. De maneira geral, essas reflexões procuram analisar os impactos provocados pelos direitos enunciados pela normativa internacional em determinada sociedade.4 4 Ver, por exemplo, o artigo de autoria das educadoras brasileiras Fúlvia Rosenberg e Carmen Lúcia Sussel Mariano (2010), em que se discute a relevância do tratado no processo de edificação de leis no Brasil, a partir da década de 1990. No âmbito da história, todavia, a temática ainda é muito pouco explorada. Cabe, então, acentuar a necessidade de dialogar com outros campos do saber, especialmente com o do direito internacional público. Dentre os estudos que têm como foco essa temática, destacam-se o da pesquisadora alemã na área das relações internacionais, Anna Holzscheiter, publicado em 2010HOLZSCHEITER, Anna. Children’s rights in international politics: the transformative power of discurse. London: Palgrave Macmillan, 2010., sobre as características do discurso presente na Convenção sobre os Direitos da Criança; o da educadora suíça Zoe Moody, lançado em 2016MOODY, Zoe. Les droits de l’enfant: genèse, institutionnalisation et diffusion (1924-1989). Neuchâtel: Alfril-Presses Universitaires Suisses, 2016., que apresenta uma análise acerca da emergência e difusão do discurso de normativas internacionais produzidas pela Sociedade das Nações e pela ONU acerca da infância entre 1924 e 1989; o do pesquisador alemão Manfred Liebel (2010LIEBEL, Manfred. Enfants, droits et citoyenneté: faire émerger la perspective des enfants sur leurs droits. Paris: L’Harmattan , 2010.), sobre os pressupostos teóricos que embasaram a construção direito da infância nos últimos 100 anos; e o do sociólogo chileno Francisco Pilotti (2001PILOTTI, Francisco. Globalización y Convención sobre los Derechos del Niño: el contexto del texto. Santiago de Chile: Naciones Unidas, 2001.), que analisa a circulação dos enunciados do tratado em termos globais, bem como infere sobre críticas feitas por diferentes atores sociais acerca da perspectiva de infância propalada na normativa internacional.

Uma normativa internacional para as crianças sob a perspectiva dos direitos humanos

A Convenção sobre os Direitos da Criança foi edificada a partir dos pressupostos doutrinários e sociojurídicos dos direitos humanos. Segundo Lynn Hunt, os direitos humanos emergem enquanto arcabouço jurídico na segunda metade do século XVIII. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, emitida em 1789, conjuntamente com a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, produzida 13 anos antes, são os principais documentos que sinalizaram uma mudança de paradigmas no âmbito jurídico da sociedade burguesa que se anunciava naquele momento histórico. Ou seja, após a circulação do ideário que havia norteado a confecção das declarações históricas, tornava-se mais difícil afirmar que as pessoas eram diferentes em função da “tradição”, dos “costumes” ou da “história” na Europa e nas Américas. Ao longo do século XIX, contudo, em razão, particularmente, da construção dos Estados-nações e da conquista da África, da Ásia e da Oceania pelos europeus, os “direitos do homem” foram “atropelados” por discursos de caráter biologizante, que recolocavam sob outros argumentos as consideradas diferenças. Para a referida autora:

Ironicamente, portanto, a própria noção de direitos humanos abriu inadvertidamente a porta para as formas mais virulentas de sexismo, racismo e antissemitismo. Com efeito, as afirmações de alcance geral sobre igualdade natural de toda humanidade suscitavam asserções igualmente globais sobre a diferença natural, produzindo um novo tipo de opositor aos direitos humanos, até mais poderoso e sinistro que os tradicionalistas. As novas formas de racismo, antissemitismo e sexismo ofereciam explicações biológicas para o caráter natural da diferença humana. No novo racismo, os judeus não eram apenas os assassinos de Jesus: a sua inerente inferioridade racial ameaçava macular a pureza dos brancos por meio da miscigenação. Os negros já não eram inferiores por serem escravos: mesmo quando a abolição da escravatura avançou por todo o mundo, o racismo se tornou mais, e não menos, venenoso. As mulheres não eram simplesmente menos racionais que os homens por serem menos educadas: a sua biologia as destinava à vida privada e doméstica e as tornava inteiramente inadequadas para a política, os negócios ou as profissões. Nessas novas doutrinas biológicas, a educação ou as mudanças no meio ambiente jamais poderiam alterar as estruturas hierárquicas inerentes à natureza humana (Hunt, 2009HUNT, Lynn. A invenção dos direitos humanos: uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 2009., p. 188).

Além desses discursos de caráter biologizante que nortearam a construção de uma parcela significativa das legislações dos Estados-nações dos vários continentes, as críticas feitas ao ideário dos direitos humanos no século XIX e início do XX provieram de diferentes correntes de pensamento. Entre essas críticas, destaca-se a de Karl Marx, que associava o referido repertório jurídico a práticas e a valores burgueses (Tosi; Fragoso, 2017TOSI, Giuseppe; FRAGOSO, Williard Scorpion. As críticas de direita e esquerda aos direitos humanos. Problemata: Revista Internacional de Filosofia(João Pessoa). v. 8, n.1, p. 122-162, 2017.).

Foram, sobretudo, as violências cometidas pelos estados beligerantes contra as populações civis durante a Segunda Guerra Mundial - as deportações em massa de populações de territórios ocupados, o trabalho escravo, as violências e os assassinatos em série ocorridos nos campos de concentração, a utilização de homens, mulheres, jovens e crianças como cobaias em experimentos médicos, as mortes e as mutilações físicas, psicológicas e genéticas advindas das bombas atômicas lançadas sobre as pessoas das cidades de Hiroshima e Nagasaki, atos notoriamente conhecidos e condenados - que fizeram com que o ideário dos direitos humanos voltasse à cena pública internacional com destaque. Mas, é importante assinalar, esse retorno do ideário dos direitos humanos aconteceu associado a uma nova posição ocupada pelo direito internacional público no cenário global. Esse processo, de caráter geopolítico, foi capitaneado pela ONU, criada em 1945 por mais de cinquenta países, logo após o fim do conflito bélico. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, elaborada em 1948 sob o impacto das violações de direitos mencionadas, foi o principal documento que inaugurou a retomada dessa perspectiva jurídica (Hoffmann, 2016HOFFMANN, Stefan-Ludwig. Human rights and history. Past and Present(Oxford). n. 232, p. 280-309, 2016.). O Artigo 2° da referida normativa internacional, que embasou a produção de legislações posteriores da ONU, delineia um conjunto de visões que se pretendem generosas e amplas acerca dos direitos, embasadas em visões sobre o futuro da humanidade que remetem a diversas perspectivas filosóficas, expressas em utopias modernas:

Artigo 2° Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania (ONU, Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948).

Segundo Robert Kolb (2005KOLB, Robert. Mondialisation et droit international. Relations Internationales. n. 123, p. 69-86, 2005.), o direito internacional público adquiriu, durante a época da denominada Guerra Fria - entre 1945 e 1990 -, algumas características diferenciadas do que ocorria sob os auspícios da chamada Sociedade das Nações, organismo que antecedeu a ONU, criada após a Primeira Guerra Mundial, em 1919. Entre essas características, destacam-se duas, de extrema importância para o presente estudo. Em primeiro lugar, os indivíduos, além dos Estados e dos organismos internacionais, passaram a ser sujeitos do direito internacional público, fenômeno associado, em parte, à emergência de um direito internacional público penal que nasceu do afã de responder às violações de direitos ocorridas durante a Segunda Guerra Mundial. Por outro lado, e correlacionado ao aspecto anterior, as normativas internacionais que preconizam regulamentações de caráter mais amplo (global, continentais, relativas aos blocos econômicos etc.), produzidas por um número cada vez maior de organismos internacionais e pela ONU, passaram a embasar parte das legislações nacionais. Esse processo de “interpenetração crescente” do direito internacional público nas legislações dos países foi fomentado especialmente por relações que se davam nos planos da economia e da geopolítica. Paulatinamente, essa maior e obrigatória circulação/apropriação das proposições advindas dos organismos internacionais no âmbito do universo jurídico dos países ensejou a produção de legislações que, muitas vezes, colocavam em xeque os interesses de grupos sociais nacionais. Fenômeno que raramente ocorria nas décadas iniciais do século XX, quando o direito internacional público estava em sua fase de consolidação.

A gênese da história dos direitos da infância pode ser localizada na segunda metade do século XIX, quando os estados nacionais começaram a regulamentar as matérias que diziam respeito ao direito civil, penal e social relativo às crianças e aos jovens. Posteriormente, emergiu, na Europa e nas Américas, uma legislação que tinha como sujeitos os considerados menores de idade que trabalhavam, os acusados de cometerem infrações e os que eram órfãos ou viviam em situação de pobreza e/ou “perigo moral”. Essa legislação nacional, conjuntamente com um aparato burocrático, constituiu a denominada Justiça de Menores (depois, Infância e Juventude), presente até hoje em inúmeros países. Os pressupostos doutrinários e sociojurídicos das normativas internacionais globais que antecederam a Convenção sobre os Direitos da Criança estão presentes de diferentes formas nessas legislações nacionais.

A Convenção sobre os Direitos da Criança foi precedida de dois documentos jurídicos de cunho global.5 5 No âmbito do direito constitucional vale ressaltar que a constituição mexicana de 1917 abordou de forma pioneira temas relativos aos direitos da infância (ainda que indiretamente) (México, Constitución Politica de los Estados Unidos Mexicanos que reforma la del 5 de febrero de 1857, 5 fev. 1917). A Declaração de Genebra, idealizada por dirigentes da Save the Children no contexto pós-Primeira Guerra Mundial, foi aprovada pelos estados membros da Sociedade das Nações em 1924. Essa normativa internacional, composta por cinco pontos, buscava proteger a população infantojuvenil da “exploração” de cunho econômico e de outras naturezas, bem como garantir o desenvolvimento físico, intelectual e emocional das crianças e adolescentes, para que esses pudessem chegar à idade adulta.

O segundo documento foi produzido em 1959, no âmbito da ONU, tendo em vista as repercussões da Segunda Guerra Mundial sobre a população infantojuvenil. De acordo com Manfred Liebel, por 9 anos discutiu-se, em reuniões da mencionada instituição, se os direitos das crianças estavam comtemplados na Declaração Universal dos Direitos Humanos ou se seria necessário um documento específico sobre o tema (Liebel, 2010, p. 23). A Declaração Universal dos Direitos da Criança, finalmente aprovada por unanimidade pela Assembleia Geral da ONU em 1959, apresenta uma inovação jurídica de grande relevância, pois introduz a perspectiva das crianças e adolescentes como sujeitos de direitos (Monaco, 2005MONACO, Gustavo Ferraz de Campos. A proteção da criança no cenário internacional. Belo Horizonte: Livraria Del Rey Editora, 2005.). A prescrição estabelecida logo na frase inicial do primeiro artigo da normativa internacional não deixa dúvidas quanto a isto: “a criança desfrutará de todos os direitos enunciados nesta Declaração” (Declaração..., 1959, 1˚ Princípio). Para o referido autor, o documento, composto por dez princípios (redigidos em forma de artigos), visou garantir os direitos das crianças sob o enfoque das teorias psicológicas do desenvolvimento infantil em voga na época. O texto aprovado em 1959 é considerado como o principal ponto de partida para a formulação da Convenção sobre os Direitos das Crianças.

De acordo com Holzscheiter (2010HOLZSCHEITER, Anna. Children’s rights in international politics: the transformative power of discurse. London: Palgrave Macmillan, 2010.), em 1978 o governo da Polônia apresentou uma proposta para a criação de uma normativa internacional, que não foi aceita pela Comissão de Direitos Humanos da ONU, em função de a linguagem jurídica do texto ter sido considerada inadequada e pela falta de consenso entre os estados membros da necessidade da criação dessa normativa, além de muitos países não possuírem conhecimentos jurídicos sobre os direitos da criança. No ano seguinte, foi realizada a Convenção de Varsóvia sobre a Proteção Jurídica da Criança, com a participação de muitos juristas da Europa, de representantes de importantes organizações não governamentais e de agências da ONU. Emergiu, desse processo, a segunda versão do texto, novamente submetida, em 1979, à Comissão de Direitos Humanos, sendo dessa vez aceito.

Para a referida autora, há diferentes narrativas sobre o fato de a representação diplomática da Polônia ter proposto a criação do tratado. Durante as décadas de 1930 e 1940, a Polônia contava com intelectuais que debatiam, de forma inovadora para a época, a situação da infância. Muitas crianças polonesas haviam passado por graves violações de direitos humanos durante o período entre guerras, na ocupação do país pelos alemães, e no imediato pós-Segunda Guerra Mundial. Os médicos Ludwik Rajchman, idealizador do Unicef (United Nations International Children’s Emergency Fund), e Janusz Korczak (pseudônimo de Henryk Goldszmit), este também um pedagogo com uma trajetória que o levou à morte em um campo de concentração em 1942, destacaram-se por suas atuações incisivas. Uma e outra narrativa acentuam que, como os países alinhados às posições internacionais dos Estados Unidos da América buscaram construir a convenção internacional sobre a tortura, os países socialistas, em contrapartida, capitaneados pela Polônia, propuseram uma normativa internacional que tivesse por objetivo discutir a situação da infância em âmbito global.

O jurista polonês Adam Lopatka, presidente do grupo de trabalho que construiu o texto da convenção, afirmou, no prólogo da obra Legislative history of the Convention on the Rights of the Child (2007, p. XXXVII-XLIII), que os debates ocorreram em dois momentos distintos. No primeiro, entre 1979 e 1981, as tensões oriundas da Guerra Fria travada entre os Estados Unidos da América e a União Soviética interferiam sobremaneira no andamento dos trabalhos legislativos. Nesse período, a participação das organizações não governamentais e das agências da ONU foi discreta nas discussões. Posteriormente, entre 1981 e 1989, a situação alterou-se em vários pontos. As reuniões do grupo de trabalho passaram a acontecer em um período anterior e posterior às sessões da Comissão de Direitos Humanos e contaram com a participação de representantes das agências internacionais e das organizações não governamentais.

Segundo Lopatka, a redação final do texto dos artigos do tratado só era concluída depois de os membros do grupo de trabalho chegarem a um consenso (Legislative history..., 2007, p. XXXVII-XLIII). Entende-se, porém, ser de fundamental importância observar que as “vozes” dos países membros da Comissão de Direitos Humanos possuíam ressonâncias diferenciadas no cenário da geopolítica mundial na década de 1980. De acordo com Holzscheiter (2010HOLZSCHEITER, Anna. Children’s rights in international politics: the transformative power of discurse. London: Palgrave Macmillan, 2010.), percebe-se tal fato na atuação dos representantes diplomáticos soviéticos que, depois de 1985, com a ascensão de Mikhail Gorbachev ao posto de governante daquele país, arrefeceram suas posições na defesa dos chamados direitos econômicos e sociais. Lopatka afirma, ainda, que o texto da normativa, antes de sua aprovação final, foi submetido a uma leitura de todos os países membros da ONU e dos consultores jurídicos do Unicef.

Em debate os Artigos 1 e 2 da Convenção sobre os Direitos da Criança

Os Artigos 1 e 2 da normativa internacional são considerados pelos operadores do direito de suma importância, pois são denominados pelos pensadores do direito internacional público como “cláusulas de obrigações”. Ou seja, são os artigos que deram suporte à construção do conjunto da normativa internacional. Além dessa questão de ordem epistemológica, relativa ao campo da escrita da legislação, os mencionados artigos são fundamentais no processo que se dá após a ratificação do tratado pelos Estados, uma vez que estes entes nacionais possuem, em tese, o “dever” de tentar cumpri-los, seja por sua incorporação nas respectivas legislações nacionais, seja na formulação e execução das políticas sociais.

O Artigo 1 da Convenção sobre os Direitos da Criança, tem a seguinte redação:

Nos termos da presente Convenção, criança é todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo (ONU, Convenção sobre os Direitos da Criança, 1989, Artigo 1).

Definir o que é “ser criança” em uma perspectiva global não era considerada uma tarefa fácil pelos legisladores oriundos dos corpos diplomáticos, das agências internacionais ou das organizações independentes. Em 1978, no início das discussões dos artigos que comporiam a normativa internacional, o representante diplomático da Nova Zelândia enunciou o problema do ponto de vista sociocultural. Conforme a afirmação do diplomata:

Um ponto importante deste artigo, e que todos os artigos levantam em algum grau, é a definição de criança. A definição começa na concepção, no nascimento, ou em algum momento no meio (desse processo)? Talvez de igual importância, tendo em vista a cláusula especial de proteção (artigo II), é a definição do fim da infância. Parece que seria muito difícil declarar uma idade generalizada e que o fim da infância estaria relacionado com questões específicas (direito de sair de casa, votar, conduzir um veículo motorizado, manter relações sexuais, etc.) que seriam abrangidos por legislação específica em cada país (Legislative history..., 2007, p. 301; tradução nossa).

A questão, de caráter ontológico e jurídico, sobre o momento em que a vida de uma pessoa tem seu início, foi um dos temas discutidos pelo grupo de trabalho, especialmente nas primeiras reuniões da década de 1980. Três países manifestaram-se a respeito, associando-os aos direitos da infância. Os diplomatas de Barbados, Malta e Portugal questionaram acerca de possíveis direitos do feto antes do nascimento. O debate desse tema não foi levado adiante nas sessões seguintes pelos diplomatas dos diferentes países, concluindo-se, então, que os direitos das crianças poderiam ser garantidos pelos Estados após o seu nascimento. Sendo assim, não foi possível verificar se a discussão da temática foi levantada pelos diplomatas das referidas nações em função de argumentos de ordem demográfica e religiosa, ou em função de ambos os aspectos. Malta e Portugal eram constituídos, na época, por uma população que majoritariamente professava a fé católica apostólica romana. O catolicismo, por sua vez, era a religião oficial do Estado de Malta na época e havia sido de Portugal por longa data. O ideário proferido pelos arautos do catolicismo naquele momento histórico era contrário à prática da interrupção voluntária da gravidez.6 6 Santa Sé, Encíclica Humanae Vitae, 25 de julho de 1968; Santa Sé, Encíclica Familiaris Consortio, 22 de novembro de 1981.

Posteriormente, nas reuniões em que foi debatido o Artigo 6, cuja matéria jurídica garantia o direito de sobrevivência à criança, os diplomatas da Santa Sé manifestaram-se afirmando de forma peremptória que a vida se iniciava no momento da concepção (Legislative history..., 2007, p. 366). A solução encontrada para resolver essa questão sem alterar a redação do Artigo 1 foi colocar no Preâmbulo da normativa internacional a menção de que a criança necessitava de proteção antes e depois do nascimento, citando o disposto na Declaração dos Direitos da Criança de 1959 (ONU, 1989, Preâmbulo).

O tema que gerou maior polêmica em relação à construção do Artigo 1 foi, sem sombra de dúvidas, o relativo ao “fim da infância”. Ou seja, em que momento uma pessoa deixava de “ser criança” sob uma perspectiva jurídica global. Os debates ocorreram em três frentes diferentes: a relativa aos fatores econômicos, a relativa às relações de gênero e a relativa ao campo jurídico. Os representantes diplomáticos do Nepal afirmaram acerca do tema:

O representante do Nepal considerou que se deveria fixar uma idade limite superior a 16 anos para a definição de criança, de modo a ter em conta as preocupações dos Estados mais pobres, que podem não ser capazes de arcar com os encargos impostos por esta convenção às crianças até 18 anos de idade. Ele considerou que tal proposta deixaria os Estados mais ricos com a opção de expandir a sua definição (de criança) conforme julgassem adequado (Legislative history..., 2007, p. 311; tradução nossa).

A preocupação dos diplomatas dos países pobres, em relação à faixa etária limite para o “fim da infância”, estava associada a duas pautas principais que estavam interligadas.7 7 Nesse estudo, utiliza-se as expressões países pobres e países ricos conforme são citadas na fonte documental. Os Estados que ratificassem a normativa internacional seriam obrigados a garantir a escolarização em nível primário e secundário, se possível de caráter público, aos indivíduos considerados menores de idade do ponto de vista jurídico de cada país. A implementação de um sistema escolar público para a população infantojuvenil na faixa etária de 7 a 16 anos já demandaria dos países pobres vultosos recursos financeiros. É importante observar que o debate quanto à garantia da escolarização para crianças, adolescentes e jovens, presente principalmente nos Artigos 28 e 29 do tratado, gerou grandes polêmicas entre os legisladores (Legislative history..., 2007, p. 632-671).

A outra questão tinha como alvo a permanência ou a exclusão da população infantojuvenil do mercado de trabalho em âmbito rural ou urbano. Para os países pobres, que tinham sua economia baseada ainda em grande parte nas atividades agropecuárias, retirar abruptamente um grande contingente de pessoas menores de idade do mercado de trabalho poderia gerar muitos problemas. Os países considerados ricos, por sua vez, já desde o final do século XIX haviam realizado esse movimento, com a implementação da escolarização em larga escala (Arend, 2015AREND, Silvia Maria Fávero. Convenção sobre os Direitos da Criança: em debate o labor infantojuvenil (1978-1989). Tempo e Argumento (Florianópolis). v. 7, n. 14, p. 29-47, 2015.). Ainda sobre a questão etária, mas nos debates do Artigo 2, alguns países, tal como o Reino Unido, manifestaram sua preocupação em relação à maioridade jurídica e ao direito de herança sobre propriedades e outros bens. A faixa etária dos 18 anos, preconizada pelos países ricos, acabou sendo a “vencedora” nesse debate do “fim da infância”. Os diplomatas do Japão foram os únicos representantes dos países ricos que polemizaram de forma mais veemente em relação à fixação da idade dos 18 anos como marco etário, tendo em vista as preocupações enunciadas acima.

Os representantes diplomáticos de Marrocos, presentes nas reuniões da Comissão dos Direitos Humanos no início dos anos 1980, afirmaram que faixa etária delimitadora da maioridade jurídica não poderia ser a mesma para as crianças e adolescentes de ambos os sexos. Em função da idade do casamento em sua sociedade, a maioridade jurídica das meninas deveria acontecer entre 14 ou 15 anos, e a dos meninos, mais tarde. Tal tema foi intensamente debatido, sendo rechaçado por diferentes representações diplomáticas, tais como a Áustria e os Países Baixos. Os representantes da agência Unicef também se manifestaram contra essa clivagem relativa às relações de gênero quanto ao “fim da infância” da população infantojuvenil. Nesse debate, ficava expresso o papel ocupado pelas mulheres nas diferentes sociedades do globo na década de 1980. Enquanto em determinadas sociedades a população feminina ainda era percebida como parte da linhagem/família, situada nas posições sociais de filhas, irmãs, esposas ou mães, em outras, as mulheres eram percebidas a partir da noção de indivíduo, construída no mundo “ocidental” nos últimos duzentos anos (Zonabend, 1996ZONABEND, Françoise. Da família: olhar etnológico sobre o parentesco e a família. In: BURGUIÈRE, André et al. (dir.). História da família: mundos longínquos. Lisboa: Terramar, 1996. p. 13-66.). Os representantes do Unicef buscavam, por meio da defesa da igualdade no âmbito da maioridade jurídica de meninos e meninas, difundir valores e conquistas das mulheres ocidentais sobre o tema.

O tema ausente, pelo menos dos debates compilados sobre o Artigo 1, foi o relativo à idade em que os menores de idade do sexo masculino poderiam ingressar nas forças armadas nacionais. Possivelmente, a temática já não tinha mais a importância que tivera no início do século XX, devido à descolonização dos territórios da África e da Ásia ocorrida nas décadas de 1950 e 1960, às mobilizações pacifistas nos Estados Unidos da América por ocasião da Guerra do Vietnã e à descompressão das relações entre as potências atômicas, projetando o arrefecimento da Guerra Fria (Hobsbawm, 1995HOBSBAWM, Eric. A Era dos extremos: o breve século XX, 1914-1991. São Paulo: Companhia da Letras, 1995.). A guerra e a segurança dos territórios, em função das novas tecnologias, na década de 1980, estavam sendo realizadas em bases que não demandavam mais um grande contingente de jovens soldados.8 8 Em 2003, a ONU aprovou o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança relativo ao envolvimento de crianças em conflitos armados. O tema dos adolescentes soldados (sobretudo do sexo masculino) voltou a ser discutido em nível global devido à presença da população infantojuvenil em grupos armados localizados em diferentes países do globo.

Por fim, as experiências médicas, especialmente na área da genética, no campo da reprodução humana, foi tema tratado apenas pela organização não governamental World Association of Children’s Friends, cuja sede, desde sua criação até os dias atuais, é no Principado de Mônaco. Por um lado, é importante observar que o primeiro “bebê de proveta” - a menina britânica Louise Brown - chegara ao mundo em 1978. De outra parte, o “espectro” do ocorrido durante a Segunda Guerra Mundial em relação às experiências médicas com seres humanos, sobretudo na Alemanha, assim como a implementação de uma política social de caráter eugênico em vários países desde o início do século XX, gerava temores (Agamben, 2004AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer: o poder soberano e a vida nua. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2004. v. I.). A discussão dessa temática parece não ter sido levada adiante nas demais sessões que debateram o Artigo 1. A referida organização não governamental listou um conjunto de restrições que deveriam nortear os procedimentos biomédicos em relação à reprodução humana, a saber:

  1. Qualquer criação de seres humanos idênticos por clonagem ou outros métodos, com ou sem fins de seleção racial;

  2. implantação de um embrião humano no útero de outra espécie ou vice-versa;

  3. a fusão dos gametas humanos com os de outra espécie;

  4. a criação de embriões utilizando esperma de outros indivíduos;

  5. a fusão de embriões ou qualquer outra operação suscetível de resultar em terata; ectogênese;

  6. a possível criação de crianças de pessoas do mesmo sexo;

  7. a seleção de sexo por manipulação genética para fins não terapêuticos;

  8. a criação de gêmeos idênticos;

  9. investigação e experimentação de embriões humanos, viáveis ou não;

  10. experimentação em embriões vivos, viáveis ou não.

(Legislative history…, 2007, p. 310; tradução nossa).

O Artigo 2 da Convenção sobre os Direitos da Criança, tem a seguinte redação:

  1. Os Estados Partes comprometem-se a respeitar e a garantir os direitos previstos na presente Convenção a todas as crianças que se encontrem sujeitas à sua jurisdição, sem discriminação alguma, independentemente de qualquer consideração de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra da criança, de seus pais ou representantes legais, ou da sua origem nacional, étnica ou social, fortuna, incapacidade, nascimento ou de qualquer outra situação.

  2. Os Estados Partes tomam todas as medidas adequadas para que a criança seja efetivamente protegida contra todas as formas de discriminação ou de sanção decorrentes da situação jurídica, de atividades, opiniões expressas ou convicções de seus pais, representantes legais ou outros membros da sua família (ONU, Convenção sobre os Direitos da Criança, 1989, Artigo 2).

Talvez este dispositivo da Convenção seja um dos enunciados de normativas da ONU, constituído a partir do axioma dos direitos humanos, que melhor e mais objetivamente expresse as utopias da modernidade (Moyn, 2010MOYN, Samuel. The last utopie: human rights in history. Harvard: Harvard University Press, 2010.). As palavras dos representantes diplomáticos da República Democrática Alemã exemplificam o que se está afirmando em relação a utopia. Para um país socialista, tal como o mencionado acima, a garantia de direitos deveria se dar além do indivíduo. Ou seja, questionando e combatendo um conjunto de relações sociais nas quais as crianças estavam inseridas, produzidas sob a perspectiva do colonialismo dos séculos XIX e XX:

A República Democrática Alemã considera que os princípios enunciados no projeto de convenção sobre os direitos da criança, e em particular as disposições do artigo sobre não discriminação e o direito de todas as crianças ao desenvolvimento físico e espiritual sem distinção, estão de acordo com uma das principais tarefas das Nações Unidas, ou seja, apoiar os povos na sua luta contra o colonialismo, neocolonialismo, discriminação racial e apartheid. Este é o entendimento da República Democrática Alemã que, ao implementar a Convenção, deve-se estar ciente da unidade inseparável da luta pela paz e pelo fim das tensões, bem como da felicidade, do avanço e da proteção das crianças em todo o mundo (Legislative history..., 2007, p. 315; tradução nossa).

Percebe-se, na redação do Artigo 2, a tentativa de abarcar uma gama de problemas de diferentes ordens que impossibilitariam que os direitos da criança pudessem ser garantidos pelos Estados. Outra questão importante, expressa na redação do Artigo 2, refere-se aos princípios doutrinários que nortearam a construção dos direitos da infância desde o início do século XX: o protecionista e o autonomista (este último, denominado também de emancipatório, ou liberacionista).9 9 As pesquisadoras Fúlvia Rosenberg e Camem Lúcia Sussel Mariano (2010) apresentam, no artigo intitulado “A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança: tensões e debates”, uma síntese do debate doutrinário no âmbito do direito da criança sob um enfoque diferenciado do apresentado por Manfred Liebel. As pesquisadoras dão ênfase aos processos históricos ocorridos nos Estados Unidos da América, enquanto que o autor alemão centra sua análise na Europa. Manfred Liebel afirma o seguinte sobre a perspectiva autonomista:

Paralelamente aos esforços para alcançar um acordo internacional para a proteção das crianças, a partir do início do século XX, surgiram movimentos, em alguns países, que se engajaram expressamente com os direitos de autodeterminação das crianças. Eles foram criados a partir de tentativas de alcançar maior participação (política) das crianças e identificá-las como cidadãos e cidadãs, (em perspectiva) de igualdade de direitos. Essas tentativas não se limitaram aos direitos à liberdade, mas também se estenderam aos direitos econômicos e sociais das crianças. Estes nasceram ou no contexto de revoluções políticas e tentativas de reforma, ou como modelos para os movimentos sociais de grupos populacionais desfavorecidos (Liebel, 2010LIEBEL, Manfred. Enfants, droits et citoyenneté: faire émerger la perspective des enfants sur leurs droits. Paris: L’Harmattan , 2010., p. 23-24; tradução nossa).10 10 No original: “Parallèlement aux efforts pour parvenir à un accord international pour la protection des enfants, dès le début du XXème siècle, des mouvements émergèntes dans certains pays, qui s’engagèrent expressément pour les droits à l´autodétermination des enfants. Ils se créèrent à partir de tentatives de parvenir à une plus grande participation (politique) des enfants et afin de lês identifier comme citoyens et citoyennes, égaux en droits. Ces tentatives ne se limitèrent pás aux droits à la liberte, mais s’étendirent aussi aux droits économiques et sociaux des enfants. Ceux-ci naquirent soit dans le contexte de revolutions politiques et de tentatives de réformes, soit en prenant pour modele les mouvements sociaux de groupes de population défavorisés.”

A perspectiva jurídica autonomista está presente na escrita do Artigo 2, uma vez que a opinião da criança possui o mesmo estatuto jurídico que as demais questões. A referida perspectiva jurídica está mais patente sobretudo no Artigo 12 da normativa, que aborda a edificação da “opinião das crianças”, bem como a garantia da oitiva das crianças em processos de cunho judicial e administrativo. Certamente, nessa questão de cunho doutrinário, reside uma das principais diferenças entre a Convenção sobre os Direitos da Criança e os documentos internacionais anteriores, produzidos para a população infantojuvenil.

Os debates no grupo de trabalho sobre o Artigo 2 caminharam sobretudo em relação a três questões: a necessidade de garantir os direitos das crianças nascidas fora de casamentos considerados legais nas sociedades nacionais; a importância de garantir os direitos para as crianças em situação jurídica precária ou irregular no interior das fronteiras de determinados países, ou seja, a prole das famílias migrantes internacionais; e a perspectiva da igualdade de direitos para meninas e meninos.

Grande parte das legislações de estados nacionais, sobretudo dos países da Europa e da América do Norte, Central e Sul foi erigida - seja ela de caráter consuetudinário ou expressa na forma de códigos (geralmente denominado de código civil) -, desde o século XIX, a partir do ideário do liberalismo, tendo como um de seus pilares principais a defesa da propriedade privada. As regras de sucessão e herança nessa legislação são geralmente baseadas no parentesco consanguíneo (a chamada relação social de filiação), construído a partir de matrimônios considerados legais. Sendo assim, garantir a igualdade jurídica aos filhos e/ou filhas nascidos fora dos casamentos considerados legais, conforme sugeriam os representantes diplomáticos da República Popular da China, gerava grandes debates. Uma das principais críticas feitas à Convenção sobre os Direitos da Criança está relacionada com a preponderância dos valores e das práticas dos países ocidentais na versão final na normativa. O texto compilado pela organização não governamental sueca afirmava sobre o tema:

Os representantes da Austrália, do Japão, do Reino Unido e dos Estados Unidos sublinharam que a proposta apresentada pela delegação da China estava em conflito com o seu direito interno de sucessão. As delegações da Argélia, do Iraque e de Marrocos objetaram especificamente a inclusão no projeto de convenção de uma disposição relativa às crianças nascidas fora do casamento, enquanto o representante da República Democrática Alemã salientava que tal disposição deveria ser incluída no projeto de convenção (Legislative history..., 2007, p. 326; tradução nossa).

Os representantes diplomáticos que defenderam de forma mais enfática o tema da garantia de direitos para as crianças nascidas fora de casamentos legais proposto pela República Popular da China foram os da República Federal Alemã. Em 1987, seus representantes diplomáticos apresentaram uma proposta, redigida em nove artigos, sobre o tema da igualdade de direitos no que tange aos diferentes tipos de filiação. O inciso oitavo da mencionada proposta apresentava a seguinte redação: “A criança nascida fora do casamento terá o mesmo direito de sucessão na herança de seu pai e sua mãe, e de um membro da família do seu pai ou mãe, como se tivesse nascido em casamento” (Legislative history..., 2007, p. 327). A proposta legislativa da República Federal Alemã não foi incorporada na íntegra na normativa internacional. Porém, a perspectiva da igualdade da filiação no processo de garantia de direitos está presente na letra da lei do tratado. A pressão dos países socialistas, tal como a República Popular da China, surtira efeito no embate de “forças” da geopolítica internacional na década de 1980.

Os Estados Unidos da América e a República Federal da Alemanha (país de maior influência sociopolítica junto às nações que compõem a União Europeia) foram as nações que defenderam que a garantia de direitos deveria ser restrita às crianças que vivessem legalmente em seus territórios. O que estava em pauta, nesse debate, era o considerado problema da migração internacional, que adquiria contornos cada vez maiores na América do Norte e na Europa. Garantir direitos a crianças migrantes implicava investir as riquezas do país em pessoas consideradas não capazes de exercer plenamente a cidadania. Os princípios jurídicos dos direitos humanos, mais uma vez, chocavam-se com os do liberalismo, uma vez que a noção de cidadania, nessa última perspectiva jurídica, é construída geralmente a partir do jus solis ou/e do jus sanguinis. Na perspectiva dos direitos humanos, a garantia de direitos deveria ocorrer independente da nacionalidade da pessoa. A proposta estadunidense era a seguinte: “Cada Estado parte respeitará e promulgará todos os direitos previstos nesta Convenção para todas as crianças que se encontrem legalmente no seu território” (Legislative history..., 2007, p. 320-321). A referida proposta não foi aprovada, apesar da constante insistência dos diplomatas estadunidenses ao longo das reuniões do grupo de trabalho ocorridas bianualmente.

Por fim, a questão da igualdade de direitos de meninos e meninas, que já havia sido debatida durante a construção do Artigo 1, retornava à cena nas discussões do Artigo 2. A agência FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations), órgão da ONU dedicado à segurança alimentar e ao combate à fome, defendia que a normativa internacional devia incluir disposições para prevenir a discriminação contra as crianças do sexo feminino no que dizia respeito à alimentação e à educação escolar. Os representantes da Unesco (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization) também fazia o mesmo alerta em relação às meninas. Os representantes deste órgão na ONU, que atua junto às instituições de caráter educacional, científico e cultural de diferentes continentes, solicitavam que a asserção acerca das relações de gênero constasse no preâmbulo da normativa internacional, o que acabou não acontecendo. Vários países manifestaram-se favoráveis à igualdade de direitos entre meninos e meninas. Entre estas nações cabe destacar o Brasil, que foi favorável à eliminação de todo tipo de discriminação social.

Considerações finais

Conforme se demonstrou nos debates que deram origem aos Artigos 1 e 2 da Convenção sobre os Direitos da Criança, não foi uma tarefa fácil construir um tratado para a população infantojuvenil de todo o globo. Nos “jogos” de força da geopolítica internacional da década de 1980, as perspectivas dos países “ocidentais”, pautadas ainda em grande parte na perspectiva jurídica protecionista, foram as “vencedoras”. Nesse cenário, os embates entre as perspectivas jurídicas do liberalismo e dos direitos humanos, gestadas nas sociedades do Ocidente nos últimos 300 anos, foram uma constante. Superar a perspectiva do liberalismo em determinados temas foi certamente um passo dado no sentido de garantir uma ampliação do espectro dos direitos das crianças e adolescentes de ambos os sexos. Os debates, porém, também demonstraram que as divergências entre as propostas enunciadas pelas diferentes nações acabaram sendo resolvidas de outras maneiras: “silêncios” sobre determinados temas, incorporação de determinada enunciação conflitante no Preâmbulo, discussões não levadas adiante nas reuniões dos grupos de trabalho.

Entende-se que colocar em cena essas disputas ocorridas na ordem do discurso enunciado pelo direito internacional público da infância nos séculos XX e XXI é uma importante contribuição da disciplina história para os processos que ocorrem em nível nacional e local no tempo presente, uma vez que políticas sociais que afetam a vida de milhões de crianças, adolescentes e jovens de ambos os sexos nos vários continentes são formuladas e/ou implementadas tendo, muitas vezes, por diretriz, o que consta na letra da lei do tratado.

Referências

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  • HOBSBAWM, Eric. A Era dos extremos: o breve século XX, 1914-1991 São Paulo: Companhia da Letras, 1995.
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  • MONACO, Gustavo Ferraz de Campos. A proteção da criança no cenário internacional Belo Horizonte: Livraria Del Rey Editora, 2005.
  • MOODY, Zoe. Les droits de l’enfant: genèse, institutionnalisation et diffusion (1924-1989) Neuchâtel: Alfril-Presses Universitaires Suisses, 2016.
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  • OESTREICH, Joel E. Unicef and the implementation of the Convention on the Rights of the Child. Global Governance (Boston). n. 4, p. 183-198, 1998.
  • PILOTTI, Francisco. Globalización y Convención sobre los Derechos del Niño: el contexto del texto Santiago de Chile: Naciones Unidas, 2001.
  • ROSEMBERG, Fúlvia; MARIANO, Camem Lúcia Sussel. A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança: tensões e debates. Cadernos de Pesquisa(São Paulo). v. 40, n. 141, p. 693-728, 2010.
  • SANTA SÉ. Humanae Vitae, 25 jul. 1968.
  • SANTA SÉ. Familiaris Consortio, 22 nov. 1981.
  • TOSI, Giuseppe; FRAGOSO, Williard Scorpion. As críticas de direita e esquerda aos direitos humanos. Problemata: Revista Internacional de Filosofia(João Pessoa). v. 8, n.1, p. 122-162, 2017.
  • ZONABEND, Françoise. Da família: olhar etnológico sobre o parentesco e a família. In: BURGUIÈRE, André et al. (dir.). História da família: mundos longínquos Lisboa: Terramar, 1996. p. 13-66.
  • 1
    Uma versão resumida deste texto foi apresentada no 56˚ Congresso Internacional de Americanistas (ICA), ocorrido entre os dias 15 e 20 de julho de 2018, na Universidad de Salamanca (Espanha). O artigo apresenta os resultados parciais da pesquisa intitulada “Do ‘menor’ à criança: Direitos Humanos e infância pobre (Brasil, 1976-1990)”, financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)/Brasil. A investigação contou com a participação de Mateus Viera de Souza, licenciado em História pela Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc).
  • 2
    Organização das Nações Unidas (ONU). Convenção sobre os Direitos da Criança (1989, Artigo 44).
  • 3
    Por exemplo, no website da Faculdade de Direito, da University of Virginia (EUA), encontramos outro conjunto de documentos que pautou a construção da Convenção sobre os Direitos da Criança. Ver: <https://hr-travaux.law.virginia.edu/international-conventions/convention-rights-child-crc>.
  • 4
    Ver, por exemplo, o artigo de autoria das educadoras brasileiras Fúlvia Rosenberg e Carmen Lúcia Sussel Mariano (2010ROSEMBERG, Fúlvia; MARIANO, Camem Lúcia Sussel. A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança: tensões e debates. Cadernos de Pesquisa(São Paulo). v. 40, n. 141, p. 693-728, 2010.), em que se discute a relevância do tratado no processo de edificação de leis no Brasil, a partir da década de 1990.
  • 5
    No âmbito do direito constitucional vale ressaltar que a constituição mexicana de 1917 abordou de forma pioneira temas relativos aos direitos da infância (ainda que indiretamente) (México, Constitución Politica de los Estados Unidos Mexicanos que reforma la del 5 de febrero de 1857, 5 fev. 1917).
  • 6
    Santa Sé, Encíclica Humanae Vitae, 25 de julho de 1968SANTA SÉ. Humanae Vitae, 25 jul. 1968.; Santa Sé, Encíclica Familiaris Consortio, 22 de novembro de 1981SANTA SÉ. Familiaris Consortio, 22 nov. 1981..
  • 7
    Nesse estudo, utiliza-se as expressões países pobres e países ricos conforme são citadas na fonte documental.
  • 8
    Em 2003, a ONU aprovou o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança relativo ao envolvimento de crianças em conflitos armados. O tema dos adolescentes soldados (sobretudo do sexo masculino) voltou a ser discutido em nível global devido à presença da população infantojuvenil em grupos armados localizados em diferentes países do globo.
  • 9
    As pesquisadoras Fúlvia Rosenberg e Camem Lúcia Sussel Mariano (2010) apresentam, no artigo intitulado “A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança: tensões e debates”, uma síntese do debate doutrinário no âmbito do direito da criança sob um enfoque diferenciado do apresentado por Manfred Liebel. As pesquisadoras dão ênfase aos processos históricos ocorridos nos Estados Unidos da América, enquanto que o autor alemão centra sua análise na Europa.
  • 10
    No original: “Parallèlement aux efforts pour parvenir à un accord international pour la protection des enfants, dès le début du XXème siècle, des mouvements émergèntes dans certains pays, qui s’engagèrent expressément pour les droits à l´autodétermination des enfants. Ils se créèrent à partir de tentatives de parvenir à une plus grande participation (politique) des enfants et afin de lês identifier comme citoyens et citoyennes, égaux en droits. Ces tentatives ne se limitèrent pás aux droits à la liberte, mais s’étendirent aussi aux droits économiques et sociaux des enfants. Ceux-ci naquirent soit dans le contexte de revolutions politiques et de tentatives de réformes, soit en prenant pour modele les mouvements sociaux de groupes de population défavorisés.”

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    29 Mar 2019
  • Aceito
    23 Out 2019
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