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“Quatro dias em setembro”: o sequestro do embaixador Charles Burke Elbrick e as negociações entre Brasil e Estados Unidos

“Four days in September”: the kidnapping of ambassador Charles Burke Elbrick and the negotiations between Brazil and United States

Resumo:

O objetivo deste artigo é analisar o sequestro do embaixador norte-americano no Brasil, Charles Burke Elbrick, em 1969, por integrantes da Ação Libertadora Nacional (ALN) e do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8). Ao mesmo tempo que essa ação é “reverenciada” e trazida à tona por sua ousadia e ineditismo, há certo silenciamento do que de fato o sequestro representou, não apenas no âmbito interno, mas, sobretudo, para as relações entre Brasil e Estados Unidos e para a compreensão da figura de Elbrick naquele momento. A partir da análise das fontes produzidas em ambos os países, foi possível mapear os sujeitos envolvidos nas negociações, as tensões e conflitos apresentados, além da identificação de duas temporalidades distintas: os debates que aconteceram nos dias que duraram o sequestro e as discussões posteriores até o momento que o embaixador é afastado do cargo, em 1970.

Palavras-chave:
Charles Burke Elbrick (1908-1983); Sequestros diplomáticos; Brasil; Estados Unidos

Abstract:

The purpose of this article is to analyze the kidnapping of the US Ambassador to Brazil, Charles Burke Elbrick, in 1969, by ALN and MR-8. At the same time that this action is “revered” and brought to light by its boldness and originality, there is a certain silencing of what in fact the kidnapping represented not only internally, but, above all, for the relations between Brazil and the United States and for the understanding of the figure of Elbrick at that moment. From the analysis of the sources produced, in both countries, it was possible to map the subjects involved in the negotiations, the tensions and conflicts presented, in addition to the identification of two distinct temporalities: the debates that took place in the days that the abduction took place and the subsequent discussions until the time the Ambassador was removed from office in 1970.

Keywords:
Charles Burke Elbrick (1908-1983); Diplomatic kidnappings; Brazil; United States

No dia 18 de junho de 1969, pouco tempo após retornar da sua missão na Iugoslávia,1 1 Charles Burke Elbrick permaneceu como embaixador na Iugoslávia entre 1964 e 1969. o diplomata norte-americano Charles Burke Elbrick foi convocado para fazer um juramento de posse como novo embaixador dos Estados Unidos para o Brasil. Como diplomata de carreira, posto mais alto no Serviço Exterior, a agenda de Elbrick foi exaustivamente documentada nos dias que antecederam sua partida para o Rio de Janeiro. Henry Kissinger, conselheiro de Segurança Nacional à época, alertava para a importância de um encontro entre Elbrick e Richard Nixon, pois “para que ele seja verdadeiramente eficaz como enviado do presidente, os brasileiros precisam saber que ele se encontrou pessoalmente com o presidente para falar sobre o Brasil”.2 2 As citações de documentação e textos em língua estrangeira têm tradução livre. Folder: Ambassador Elbrick 69-70 (Caixa 14). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC. Além disso, Kissinger argumentava que Elbrick “estará indo para o Brasil quando as relações entre os dois países estiverem sob algum tipo de tensão, como resultado de desenvolvimentos políticos internos, particularmente desde o 5o Ato Institucional de dezembro passado”.3 3 Folder: Ambassador Elbrick 69-70 (Caixa 14). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.

Conforme noticiou o Jornal do Brasil, em 8 de julho de 1969, as primeiras declarações do embaixador já em solo brasileiro foram no sentido de acentuar a importância da manutenção dos laços entre os dois países num momento em que o então governador de Nova York, Nelson Rockefeller, tinha acabado de retornar para os Estados Unidos com a incumbência de elaborar um relatório para o presidente Nixon sobre a situação política e econômica da América Latina. Em abril daquele mesmo ano, na ocasião do 21o aniversário da Organização dos Estados Americanos (OEA), Richard Nixon fez um discurso em Washington reafirmando o compromisso da sua administração em promover uma nova abordagem no que diz respeito ao desenvolvimento econômico e social da América Latina. Segundo ele,

o que precisamos é de uma nova política. O que precisamos são novos programas. O que precisamos é de uma nova maneira de ver os problemas. Eu gostaria que nossas políticas fossem elaboradas com olhos abertos, ouvidos abertos, espíritos abertos e corações abertos.4 4 RG III 4: Folder 1227; Box 152. Nelson A. Rockefeller Personal papers, Series O (FA 350), Subseries 8: Presidential Mission to Latin America. Rockefeller Archive Center (RAC).

Nos círculos mais próximos do presidente Nixon, discutia-se a viabilidade da permanência do programa da Aliança para o Progresso5 5 Criada no governo de John F. Kennedy, no ano de 1961, a Aliança para o Progresso foi um programa de cooperação destinado ao desenvolvimento econômico e social da América Latina com o objetivo de conter a expansão do comunismo na região. Para saber mais sobre a Aliança, ver Ribeiro (2006). na agenda da política externa dos Estados Unidos para a América Latina. Um dos argumentos era que a abordagem da Aliança estava esgotada a partir da construção da narrativa de que os latino-americanos estavam profundamente insatisfeitos e frustrados com as falsas expectativas construídas em torno do projeto arquitetado por John F. Kennedy e seus assessores.6 6 RG III 4: Folder 992; Box 121. Nelson A. Rockefeller Personal papers, Series O (FA 350), Subseries 8: Presidential Mission to Latin America. Rockefeller Archive Center (RAC).

Naquela conjuntura, a tarefa de Charles Burke Elbrick como embaixador era não apenas mediar a relação entre os governos dos dois países - Brasil e Estados Unidos -, mas demonstrar, sobretudo naquele momento, que a América Latina e, particularmente, o Brasil figuravam no horizonte imediato do presidente Nixon. Não à toa, no dia 14 de julho, quando Elbrick teve seu primeiro contato com o general Costa e Silva, entregou suas credenciais e uma carta enviada por Nixon afirmando que “aguarda o relatório da Missão Rockefeller para examinar com a mais cuidadosa consideração os assuntos que dizem respeito à comunidade americana”.7 7 Jornal do Brasil, 16 set. 1969. Elbrick estava mais cauteloso e, na sua avaliação, ainda era muito cedo para mensurar os efeitos reais da visita de Rockefeller, apesar de ressaltar que, enquanto nação amiga, os Estados Unidos estavam interessados em repensar as relações interamericanas, onde a responsabilidade pelo desenvolvimento da região seria tarefa de todos (Spektor, 2009SPEKTOR, Matias. Kissinger e o Brasil. Rio de Janeiro: Zahar , 2009., p. 20).

Em meio às especulações e indefinições, em ambos os países, sobre quais seriam as diretrizes de Richard Nixon para a América Latina, o desenrolar dos acontecimentos acabou por tensionar ainda mais a situação. Charles Burke Elbrick, o embaixador norte-americano recém-chegado ao Brasil, foi sequestrado nas ruas do Rio de Janeiro, num episódio que trouxe à tona questões como inviolabilidade diplomática e, sobretudo, como lidar com sequestros de representantes estrangeiros.8 8 Ainda que alguns trabalhos tenham chamado atenção para o sequestro de Charles Burke Elbrick, inclusive com a publicação de livros memorialísticos, nota-se certa ausência de questionamento acerca do alcance deste episódio e seus possíveis desdobramentos. No ano de 1997, com a publicação da coletânea Versões e ficções: o sequestro da história, temos a primeira iniciativa no sentido de problematizar a memória acerca do sequestro. Um grupo de intelectuais, jornalistas e ex-integrantes da ação se debruçou sobre o episódio com o objetivo de contestar a versão do filme O que é isso, companheiro?, dirigido por Bruno Barreto. Uma questão bastante discutida no conjunto de artigos é justamente o modo como foi construído e caracterizado o operário Virgílio Gomes da Silva (Reis Filho, 1997).

As negociações, consensos e dissensos envolvendo o “caso Elbrick”

No momento em que foi confirmado o sequestro de Charles Burke Elbrick, na tarde do dia 4 de setembro, a ação repercutiu por toda parte. Nos bastidores da Junta Militar, o clima estava especialmente tenso, já que parte da corporação considerava inadmissível que o governo negociasse com “terroristas”. Além do episódio envolvendo Elbrick, a política interna do país também tinha acabado de sofrer um revés: um acidente vascular cerebral sofrido pelo general Costa e Silva afastou-o definitivamente das suas funções de presidente. Segundo a Constituição de 1967, o vice-presidente Pedro Aleixo deveria ocupar o cargo, mas, para o Alto Comando das Forças Armadas, Aleixo carregava “o duplo estigma de ser civil e de ter votado, sozinho, contra o AI-5 no Conselho de Segurança Nacional, em dezembro de 1968” (Chirio, 2012CHIRIO, Maud. A política nos quartéis: revoltas e protestos de oficiais na ditadura militar brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 2012., p. 147).

A saída encontrada acabou resultando na edição do Ato Institucional n. 12 (AI-12), que nomeava uma Junta Militar provisória composta pelo almirante Augusto Hamann Rademaker Grunewald, da Marinha; general Aurélio de Lira Tavares, do Exército; e o brigadeiro Márcio de Sousa e Melo, da Aeronáutica. De acordo com Maud Chirio, “a imposição hierárquica causa um mal-estar na oficialidade contestadora mais afastada dos círculos do poder, que, por sua vez, transfere para a Junta toda a desconfiança que lhe inspiravam o círculo presidencial e parte do governo” (Chirio, 2012CHIRIO, Maud. A política nos quartéis: revoltas e protestos de oficiais na ditadura militar brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 2012., p. 148-149).

É válido ressaltar que os conflitos intramilitares certamente não começaram ou tiveram fim em 1969. As disputas palacianas percorreram toda a ditadura civil-militar, e o período em que a Junta Militar esteve no poder trouxe à tona mais uma vez esses dissensos. De modo que, aliadas às discussões sobre a legitimidade da Junta Militar e a crise sucessória instaurada, o sequestro de Charles Burke Elbrick contribuiu para tensionar ainda mais os diferentes grupos dentro da corporação militar.

A divulgação de um manifesto revolucionário, assinado conjuntamente pela Aliança Libertadora Nacional (ALN) e o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), em rede nacional e a exigência da libertação de 15 presos políticos9 9 A lista final foi composta por: Ricardo Vilas Boas, Mario Zanconato, José Ibrahin, Ricardo Zarattini, Flávio Tavares, Vladimir Palmeira, José Dirceu, Agonalto Pacheco, Maria Augusta Carneiro Ribeiro, Gregório Bezerra, Ivens Marchetti, João Leonardo da Silva Rocha, Luís Travassos, Onofre Pinto e Rolando Frati. em troca da vida do embaixador fez com que o jornalista Carlos Chagas, secretário de Imprensa de Costa e Silva, fizesse a seguinte observação:

Se se registravam sinais de inquietação militar e inconformidade quanto à permanência da Junta, foi com o sequestro que eles cresceram. Vejo o primeiro bilhete dos raptores, impondo condições, de início que todas as emissoras de rádio, televisão e os jornais divulgassem seu manifesto conclamando o povo à revolução. Depois, exigindo a troca do americano por um grupo de estudantes e líderes operários, presos em vários estados, aparentemente sem a menor ligação entre eles. Os mais radicais tiveram reação imediata, especialmente no Rio: ‘jamais compactuar com os subversivos. Lutar até o fim. Para cada ação violenta de um lado, três ou quatro do outro. Deixar os acontecimentos como estavam e, caso cumprida a promessa e morto o embaixador, fuzilar os quinze exigidos em troca (Chagas, 1979CHAGAS, Carlos. 113 dias de angústia - impedimento e morte de um presidente. Porto Alegre: L&PM, 1979., p. 100).

Cabe esclarecer, no entanto, que o Alto Comando militar também não parecia satisfeito com a ideia de “se render” às exigências dos sequestradores. A partir do momento em que o manifesto foi lido em rede nacional, em plena Semana da Pátria, um dos objetivos da ação tinha sido alcançado: a denúncia, no Brasil e no exterior, das violações de direitos humanos praticadas pelo regime. Além disso, o que estava sendo veiculado nos círculos militares e na imprensa era o fato de que Elbrick havia dispensado a segurança pessoal oferecida pela Secretaria de Segurança do Estado, alegando que estava há pouco tempo no Brasil e era pouco conhecido.10 10 Jornal do Brasil, 5 set. 1969.

Ao nos debruçarmos sobre as conversas trocadas entre membros da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil e os funcionários em Washington, além das análises que saíram na mídia impressa, em ambos os países, foi possível compreender com mais clareza o que estava sendo discutido nos dias que o sequestro durou e as posições dos governos envolvidos.

O chefe-adjunto de missão da embaixada norte-americana, William Belton, foi um dos principais articuladores nas negociações pela soltura de Elbrick junto ao governo brasileiro e, em especial, com o ministro das Relações Exteriores, José de Magalhães Pinto. Em Washington, Belton reportava os rumos das negociações aqui no Brasil, via de regra, para Robert W. Dean, funcionário do Departamento de Estado. Uma das funções de Dean era não apenas transmitir as notícias e análises à alta cúpula do governo norte-americano, mas sugerir estratégias de ação. A partir do intenso fluxo de informações que se seguiu durante os três dias em que Elbrick permaneceu no cativeiro, Belton insistia que a libertação com vida do embaixador não dependia apenas da “boa vontade” do governo brasileiro. Os descontentamentos no interior das Forças Armadas eram notáveis e indicavam um dissenso absoluto sobre o “caso Elbrick”. No dia que o embaixador foi sequestrado, Dean registrara que:

Belton pediu orientação sobre a recomendação de Washington ao governo do Brasil em relação ao cumprimento dessas demandas. Eu disse que o deixaria saber qual era a nossa posição o mais cedo possível, mas que minha reação inicial foi que, por todos os meios, se fizesse tudo o que fosse necessário para salvar o embaixador.11 11 Folder: Pol 23-8 - Kidnapping Amb. Elbrick 1969 (Caixa 11). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.

Segundo noticiou o Jornal do Brasil, no dia 5 de setembro, John Mackerman, do setor de imprensa da Embaixada dos Estados Unidos, teria dito que “Washington não fez nenhum comentário sobre o sequestro do embaixador Elbrick, limitando-se apenas a pedir à Chancelaria que mantivesse o governo atualizado, enviando informações precisas com a maior rapidez”.12 12 Jornal do Brasil, 5 set. 1969. Esse é um ponto importante a ser destacado porque a questão da comunicação seria um tema fundamental - e por isso mesmo sensível - naqueles dias, justamente porque eram muitos os sujeitos envolvidos. Para a grande imprensa, um sequestro político aparecia como uma espécie de trailer cinematográfico: emergiam confrontos, divergências e tensões. As trocas de mensagens entre os funcionários do Departamento de Estado e a embaixada no Rio de Janeiro indicavam a necessidade de tomar cuidado na disseminação de notícias falsas, já que em ambos os países havia muitas informações sendo compartilhadas ao mesmo tempo.

A ideia de que a busca pelo furo de reportagem poderia comprometer o discernimento necessário para lidar com a situação fica evidente em uma avaliação elaborada, em 6 de setembro, por Robert W. Dean para Charles A. Meyer, secretário de Estado adjunto para Assuntos Interamericanos. Naquele momento, o governo brasileiro já havia manifestado sua posição de ceder às exigências dos sequestradores em troca da libertação de Elbrick, mas, na visão de Dean, ainda era necessária muita cautela justamente porque os rumores de descontentamento no interior da corporação militar não haviam cessado.

Na visão de parte da corporação, a saída encontrada pela Junta Militar era considerada “uma humilhação inadmissível: a vida de um embaixador estrangeiro em troca de feridas na honra nacional”.13 13 Folder: Pol 23-8 - DemonstrationsRiots (Caixa 34). São Paulo: Classified Central Subject Files. Record Group 84: Brazil U.S. Consulate General (1962-1974). National Archives Building, Washington, DC. Em documento amplamente veiculado nos bastidores do governo brasileiro, em 6 de setembro, embaixadores eram vistos como soldados em território estrangeiro, ou seja, o risco era inerente à função:

No Vietnã, os Estados Unidos perdem semanalmente uma média de 2.000 homens. Seria fácil não mais perdê-los fugindo do campo de batalha, capitulando às exigências do inimigo. Eles não fazem isso, no entanto. A defesa do princípio pelo qual eles lutam, a causa das liberdades do mundo, está acima das vidas daqueles que morrem no Vietnã, ou daqueles que correm riscos de vida em outros lugares. Como se pode esperar que o Brasil, para salvar a vida de um único embaixador norte-americano se entregue às exigências do inimigo, deponha a seus pés todos os braços. Não, nós também defendemos princípios, lutamos por uma causa cuja importância está acima de uma vida, embora essa vida seja muito querida para nós e mereça toda nossa simpatia.14 14 Folder: Pol 23-8 - Demonstrations Riots (Caixa 34). São Paulo: Classified Central Subject Files. Record Group 84: Brazil U.S. Consulate General (1962-1974). National Archives Building, Washington, DC.

Em destaque temos apenas uma parte da argumentação utilizada pelos descontentes para tentar dissuadir a Junta Militar da decisão de ceder às demandas dos sequestradores. Merece atenção a ideia de que o embaixador Elbrick, assim como qualquer outro membro de missão diplomática, não desfrutaria de garantias absolutas. Além disso, novamente foi colocado em pauta o fato de Elbrick ter dispensado a segurança oferecida pelo Brasil.

No entanto, os debates parlamentares que ocorreram no Congresso norte-americano naqueles dias, indicavam outra postura sobre os deveres do governo brasileiro. Argumentava o senador do Partido Republicano, John Sherman Cooper, que era “dever do governo do Brasil, nos termos dos acordos internacionais, proporcionar proteção ao embaixador Elbrick. Caso contrário, é seu dever dar todos os passos, inclusive a libertação dos presos políticos”.15 15 United States of America. Congressional Record. Proceedings and Debates of the 91st Congress - First Session, v. 115, p. 24603. U.S. Government Printing Office, 1969. Em outras palavras, Cooper chamava atenção para a questão da inviolabilidade diplomática.

Com efeito, missões diplomáticas ao redor do mundo nunca estiveram imunes a riscos, no entanto, o cenário politicamente convulsionado do pós-guerra na América Latina e em regiões como África e Ásia tornou a profissão do diplomata mais arriscada. Aliado a isso, o aumento substancial das missões diplomáticas ao redor do mundo alertava para o fato de que esses representantes estrangeiros como agentes interlocutores e mediadores de conflitos deveriam ter suas funções regulamentadas pactos e tratados que garantissem a sua segurança contra qualquer tipo de ataque que atentasse contra sua dignidade. Em 18 de abril de 1961, foi aprovado o tratado intitulado Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas elaborado pela Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas. Tal documento é emblemático porque sistematizou definitivamente os direitos e deveres de todos os membros de uma missão diplomática, além das obrigações do Estado receptor em relação a essas pessoas. O artigo 29 da Convenção de Viena afirma claramente o caráter inviolável dos funcionários diplomáticos:

A pessoa de um agente diplomático será inviolável. Ele não será responsável por qualquer forma de prisão ou detenção. O Estado receptor o tratará com o devido respeito e tomará todas as medidas apropriadas para impedir qualquer ataque à sua pessoa, liberdade ou dignidade.16 16 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Antigos/D56435.htm Acesso em: 5 set. 2020.

Na prática, a inviolabilidade diplomática prevê que um embaixador não pode ser preso no país anfitrião e que o Estado receptor deve zelar não apenas pela dignidade desse enviado, mas tomar os cuidados necessários em relação à segurança das instalações da missão diplomática (art. 22), à residência privada dos diplomatas e agentes consulares (art. 30) e à preservação da documentação oficial da missão diplomática (art. 24 e 27).

Apesar da Convenção de Viena ser considerada um marco regulatório para a discussão acerca dos privilégios e imunidades que gozam uma missão diplomática no exterior, diferentes abordagens foram criadas com o intuito de sistematizar os significados desses acordos para o mundo da diplomacia. Ira Stechel mapeou as principais teorias discutidas no âmbito do direito para lidar com o tema:

Historicamente, os juristas ofereceram várias teorias para justificar a concessão de privilégios e imunidades diplomáticas. No entanto, as três teorias que, em diferentes épocas, ganharam a maior aceitação são: 1) a teoria da extraterritorialidade, ou que o embaixador deve ser tratado como se ainda estivesse morando no território do Estado remetente, ou que as instalações da missão do diplomata são uma extensão do território do Estado que o enviava; 2) a teoria da representação pessoal de que a missão diplomática e seu pessoal personificam ou incorporam o Estado remetente, de modo que uma ofensa à dignidade do diplomata é um insulto ao soberano que ele representa; 3) a teoria da necessidade funcional de que a imunidade do diplomata em relação à jurisdição local é necessária para permitir que as nações mantenham relações internacionais com o mínimo de interferência (Stechel, 1972STECHEL, Ira. Terrorist kidnapping of Diplomatic Personnel. Cornell International Law Journal, v.5, n. 2, p. 189-217, 1972., p. 197).

Para a maioria dos juristas e pesquisadores, a teoria da extraterritorialidade é desacreditada justamente porque a imunidade diplomática não pressupõe que o diplomata tenha o direito de se considerar alheio à jurisdição do Estado que o recebe. A teoria mais aceita é aquela cujo objetivo é garantir a relação entre os Estados, além de prevenir contra abusos e arbitrariedades que possam acometer uma determinada missão diplomática. Além disso, essa teoria “também explicava a manutenção das relações diplomáticas entre países comunistas e não comunistas e a preservação dos direitos de seus respectivos funcionários diplomáticos, apesar das hostilidades geradas pela Guerra Fria” (Stechel, 1972STECHEL, Ira. Terrorist kidnapping of Diplomatic Personnel. Cornell International Law Journal, v.5, n. 2, p. 189-217, 1972., p. 199).

Nesse sentido, a Junta Militar sabia que, no final das contas, a responsabilidade pelas negociações e pela proteção física e moral do embaixador Elbrick era do governo brasileiro. Após intensas negociações, a decisão sobre o “caso Elbrick” havia sido tomada, e a Junta Militar optou por ceder às exigências dos sequestradores. No dia 5 de setembro, Magalhães Pinto fez o seguinte comunicado à imprensa nacional e internacional:

São do conhecimento público as circunstâncias ligadas ao sequestro do embaixador dos Estados Unidos da América, Sr. Charles Burke Elbrick, por terroristas empenhados na subversão da ordem pública nacional. Em manifesto lançado na ocasião do delito, os terroristas exigem, sob a ameaça de matar o embaixador, que o governo faça divulgar na íntegra aquele manifesto e envie para o exterior quinze indivíduos atualmente detidos por atividades subversivas. Convencido de interpretar com fidelidade os sentimentos profundos e autênticos do povo brasileiro, o governo decidiu fazer o que está a seu alcance para evitar que se sacrifique mais uma vida humana, sobretudo quando se trata da pessoa de um representante diplomático, ao qual o Estado brasileiro, tradicionalmente hospitaleiro, deve proteção especial. O governo já autorizou a divulgação do manifesto e determinará a transferência para o exterior dos 15 detidos, cujos nomes já lhe foram indicados. Desse modo, recairá totalmente sobre os sequestradores a responsabilidade por qualquer dano à incolumidade da pessoa do embaixador Charles Burke Elbrick.17 17 Jornal do Brasil, 6 set. 1969.

A declaração de Magalhães Pinto não foi apenas uma mensagem informando que o governo havia decidido se curvar às demandas dos guerrilheiros. A Junta Militar sabia que a leitura do manifesto representaria, ao menos no plano simbólico, uma derrota muito grande para o regime civil-militar. O governo se antecipou e, antes de divulgar o manifesto em rede nacional, decidiu construir a sua própria narrativa a ser intensamente divulgada nos meios nacionais e internacionais sobre aquele episódio. Magalhães Pinto enfatizava que os sequestradores eram terroristas, e os presos políticos a serem libertados, autores de atividades subversivas. O governo lembrava ao povo brasileiro a tradição hospitaleira e, por isso, a inadmissibilidade de colocar em risco a vida de Elbrick. O fato é que estava fora de questão relativizar, pelo menos publicamente, a importância de preservar a integridade do embaixador, mesmo que para isso fosse necessário que o governo militar sofresse um revés político e simbólico. Por mais que Elbrick estivesse sendo duramente criticado, o foco naquele momento era demonstrar a boa vontade do governo brasileiro, que, como nação amiga, estava concentrando todos seus esforços para a resolução do caso.

Nos bastidores, no entanto, o clima era outro. No momento em que a Junta Militar resolveu negociar com os sequestradores, foi a vez de Magalhães Pinto pressionar Belton que, imediatamente, respondeu com uma mensagem não mais para Robert W. Dean, mas para o secretário de Estado, William P. Rogers:

O ministro do Exterior Magalhães Pinto me disse essa tarde que a decisão de negociar com os sequestradores foi muito difícil para os ministros militares e que há grupos dentro das Forças Armadas que estão descontentes com a decisão. [...] Magalhães Pinto também afirmou que alguma manifestação de apreço por parte do governo dos EUA, que poderia ser publicada na imprensa de amanhã também poderia ser muito útil. Ele acha que deve vir de Washington, em vez de partir daqui.18 18 Folder: Per Elbrick, Charles Burke. Pol 23-9 Brazil (Box169).Subject Numeric Files (1967-1969), General Records of the Department of State, Record Group 59, National Archives Building, Washington, DC.

Belton foi ainda mais enfático na mensagem seguinte ao afirmar que, por mais que o Departamento de Estado estivesse enviando notas de agradecimento ao governo brasileiro pelos esforços que estavam sendo feitos, era um erro subestimar como o impacto daquele episódio poderia ter um custo político muito alto para as relações entre os dois países. Assim como Magalhães Pinto, Belton considerava que as manifestações de apreço deveriam vir de Washington, mas, sobretudo da alta cúpula do governo: “peço que o presidente e o secretário de Estado enviem mensagens adequadas o mais rapidamente possível depois de sabermos da libertação segura de Elbrick”.19 19 Folder: Per Elbrick, Charles Burke. Pol 23-9 Brazil (Box169). Subject Numeric Files (1967-1969), General Records of the Department of State, Record Group 59, National Archives Building, Washington, DC. Solicitava, ainda, que o texto fosse endereçado à Junta Militar. Em Washington, a pressão de Belton se espalhou pelo Departamento de Estado. Em 5 de setembro de 1969, Charles A. Meyer recebeu a seguinte mensagem de Robert W. Dean:

Belton também afirmou que a decisão de negociar com os sequestradores e cumprir com suas exigências era muito difícil para o governo e que certos elementos nas fileiras não estavam muito felizes com isso. Ele disse que foi perguntado em bases confidenciais (presumivelmente por Magalhães Pinto) que nós fazemos o que podemos para que isso pareça ser a coisa certa a ser feita. [...] Uma mensagem do próprio presidente Nixon seria ótima, mas, se isso fosse difícil, uma do secretário Rogers seria de grande ajuda. Sugiro a seguinte mensagem ao presidente Costa e Silva ou ao ministro das Relações Exteriores, Magalhães Pinto: ‘Em meu próprio nome e em nome do Governo dos Estados Unidos, gostaria de expressar-lhe nossa profunda gratidão pelas ações que você e o Governo do Brasil tomaram e estão adotando para o retorno seguro do embaixador Elbrick’. Pessoalmente, acredito que uma mensagem do secretário Rogers ao ministro das Relações Exteriores, Magalhães Pinto, pode ser o nível correto nesse caso. Talvez devêssemos reservar qualquer palavra do nosso presidente para o momento da libertação do embaixador Elbrick. No entanto, se decidirmos enviar uma mensagem de presidente para presidente neste momento, eu recomendaria acrescentar uma nota sobre a saúde do presidente, talvez na seguinte linha: ‘Fiquei muito triste por saber de sua doença recente, mas sou encorajado por relatos que tenho tido sobre a melhora de sua saúde e envio meus melhores votos pessoais para uma rápida recuperação.20 20 Folder: Pol 23-8 - Kidnapping Amb. Elbrick 1969 (Box11).Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.

No dia 7 de setembro, uma breve mensagem do Departamento de Estado exaltando os esforços que foram feitos na condução do caso pelo governo brasileiro foi divulgada.21 21 Folder: Per Elbrick, Charles Burke. Pol 23-9 Brazil (Box169). Subject Numeric Files (1967-1969), General Records of the Department of State, Record Group 59, National Archives Building, Washington, DC. Não é possível afirmar se a carta enviada teria sido mesmo escrita por Nixon, mas o que importa notar aqui é a pouca disposição da alta cúpula do governo norte-americano em se enredar numa teia de trocas de informações, chantagens e pressões internas e externas. Ainda que o presidente Nixon não tivesse naquele momento o manual de como proceder em casos envolvendo sequestros diplomáticos, não há dúvidas sobre o entendimento de que as obrigações no que diz respeito à garantia da integridade das missões diplomáticas eram, em última instância, do governo anfitrião.

Nesse primeiro momento, ou seja, os três dias em que o embaixador Charles Burke Elbrick esteve com os sequestradores, muitas tensões foram expostas na tentativa de encontrar um modo de lidar com as demandas dos guerrilheiros, ao mesmo tempo em que isso não evidenciasse que o governo brasileiro não tinha mais o controle da situação. Por isso mesmo, a Junta Militar tratou de capitalizar rapidamente o sequestro: nos dias que sucederam a ação e nos meses seguintes, a repressão aos grupos armados mostrou-se cada vez mais intensa e sofisticada, já que quase metade dos participantes “caiu” antes que a libertação do embaixador tivesse completado um mês (Da-Rin, 2007DA-RIN, Silvio. Hércules 56: o sequestro do embaixador americano em 1969. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007., p. 20).

Além disso, como consequência direta do sequestro de Elbrick foram suspensos direitos como a nacionalidade e a inviolabilidade do direito à vida previstos, respectivamente, nos artigos 140 e 150 da Constituição de 1967. No dia 8 de setembro de 1969, com a promulgação do Ato Institucional n. 13 (AI-13) foi instituído o banimento do território nacional daqueles considerados “inconvenientes, nocivos ou perigosos à segurança nacional” (Ribeiro, 2012RIBEIRO, Denise Felipe. A anistia brasileira: antecedentes, limites e desdobramentos da ditadura civil-militar à democracia. Dissertação (Mestrado em História), Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2012., p. 60). Um dia após a decretação do banimento, 9 de setembro, outra medida discricionária foi tomada: a edição do Ato Institucional n. 14 (AI-14) que previa a pena de morte e a prisão perpétua para os chamados “subversivos” da ordem. No mesmo dia em que Elbrick foi libertado, a Junta Militar, em comunicado oficial, informava que não apenas a existência da Junta era legítima como todas as medidas tomadas a partir daquele momento:

Os acontecimentos que acabam de abalar profundamente os sentimentos do povo brasileiro, despertando-lhe a mais justa indignação, demonstram de modo inequívoco o quanto eram procedentes as razões que determinaram a decisão adotada pelo Alto Comando das Forças Armadas, no impedimento transitório do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, de editar o Ato Institucional n. 12 [...]. Serão preservadas a qualquer preço, a ordem e a tranquilidade da comunidade brasileira. Pode o povo confiar, nesta grave conjuntura, na ação serena e energética dos seus dirigentes, que contam com o apoio patriótico das Forças Armadas, unidas e coesas para a salvaguarda dos valores espirituais e dos ideais que inspiraram a Revolução de março (Berquó, 1997BERQUÓ, Alberto. O sequestro dia a dia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997., p. 129).

A mídia, no Brasil e no exterior, repercutia cada detalhe daquele episódio como um “incidente diplomático” que havia terminado bem, em parte pelo espírito hospitaleiro demonstrado pela Junta Militar a despeito de todas as adversidades. O jornalista Carlos Castello Branco, na sua conhecida “Coluna do Castello” no Jornal do Brasil, afirmou que “o governo agiu à altura das suas responsabilidades ao aceitar as condições dos terroristas para a libertação do embaixador dos Estados Unidos”.22 22 Jornal do Brasil, 6 set. 1969. Para o embaixador brasileiro na Inglaterra, Sérgio Correia da Costa, o governo “demonstrou alto domínio e maturidade”,23 23 Jornal do Brasil, 11 set. 1969. além de respeitar “a inviolabilidade dos enviados diplomáticos”.24 24 Idem. O senador Frank Church, do Partido Democrata, aproveitou o desfecho do caso Elbrick para tecer pesadas críticas ao presidente Nixon ao afirmar que o sequestro é “um sintoma da enfermidade que aflige nossa política externa”.25 25 Jornal do Brasil, 9 set. 1969. Na sua avaliação, a estreita vinculação do governo dos Estados Unidos com a ditadura brasileira teria sido a mola propulsora para que o sequestro de Elbrick se tornasse conveniente a partir de uma dupla perspectiva: funcionar como moeda de troca para libertar os 15 presos políticos, ao mesmo tempo que afrontava o governo norte-americano.26 26 Idem.

Essa avaliação não estava equivocada, mas o embaixador soube contornar a situação. Enquanto esteve em cativeiro, Elbrick envolveu-se em uma série de discussões com os guerrilheiros, como a legitimidade do uso da violência como prática política. Para ele, a violência não era a melhor saída para a resolução de conflitos, numa tentativa de explicar que ele não tinha nada a ver com o envolvimento direto de seu país no golpe que levou à instauração do regime civil-militar em 1964. No livro memorialístico Gracias a la vida, Cid Benjamin, membro do MR-8 e um dos integrantes da ação que sequestrou Elbrick, recorda que a relação com o embaixador foi muito amistosa porque viram nele não “um defensor da política do governo norte-americano, que, assentada nos preceitos da Guerra Fria, fomentava golpes de Estado e apoiava ditaduras de direita na América Latina” (Benjamin, 2013BERQUÓ, Alberto. O sequestro dia a dia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997., p. 116-117), mas sim um “diplomata de carreira com traços de humanista” (p. 116-117). Para Benjamin, a maior demonstração dos laços estabelecidos entre Elbrick e os guerrilheiros no aparelho da Tijuca teria ocorrido quando o embaixador já estava em liberdade. Quando questionado sobre o número de pessoas envolvidas na operação e detalhes da aparência física, teria se recusado a descrever ou identificar por fotos os integrantes do sequestro, sob a alegação de que estavam sempre de capuz. Benjamin (p. 117) alega que isso não era verdade.

No momento em que foi libertado, consta que Elbrick teria proferido a seguinte frase: “ser um embaixador não é sempre um mar de rosas”. Com certo tom de humor para quem havia acabado de passar por uma situação delicada, o sequestro havia terminado, mas as repercussões continuariam pelo menos até sua remoção do posto de embaixador no Brasil, em maio de 1970. As análises sobre o período pós-sequestro reiteram a todo momento a noção de que Elbrick tinha perdido seu poder de negociação com governo brasileiro.

Em coletiva de imprensa, concedida um dia após sua libertação, perguntaram porque ele não estava acompanhado de agentes de segurança no momento do sequestro e se pretendia adotar medidas de precaução. Elbrick surpreendeu ao afirmar que “um embaixador cercado por um esquema de segurança não pode ser um embaixador, não afirmaria que os embaixadores são elementos dispensáveis, mas acho que há um limite às medidas de segurança que podem ser oferecidas a eles”.27 27 Jornal do Brasil, 9 set. 1969.

Outra declaração, em especial, causou espanto e desconforto aos que tinham contribuído para que o governo aceitasse as demandas dos guerrilheiros e a vida de Elbrick fosse entendida como prioridade. Quando questionado sobre o ferimento em sua cabeça, o embaixador disse que “eles não tinham a intenção de me fazer mal algum, mas eu ignorava isso e, por este motivo, resisti quando me disseram para fechar os olhos enquanto me transferiam para outro carro. Eu não estava disposto a fechar os olhos para ninguém naquele momento”.28 28 Última Hora, 8 set. 1969. Elbrick teria dito ainda que tinha sido muito bem tratado durante os dias que durou o sequestro: “eles até me deram charutos e lavaram a minha camisa”.29 29 Idem. Além disso, afirmou com alguma tranquilidade que “eles definitivamente não eram gângsters. Eles eram inteligentes - jovens, inteligentes, determinados fanáticos - o tipo com o qual você não argumentaria com muita veemência”.30 30 Disponível em: https://www.washingtonpost.com/archive/local/1983/04/15/c-burke-elbrick-career-ambassador-dies- at-75/0d9c40f7-6070-46b1-ad2d-71fd1014d48a/?noredirect=on&utm_term=.f522a0807844 Acesso em: 15 ago. 2020.

A Junta Militar, o governo norte-americano e até mesmo os funcionários da embaixada poderiam esperar qualquer tipo de declaração feita por Elbrick. Não contavam, no entanto, com tamanha compreensão em relação às motivações daqueles que haviam sido responsáveis pelos dias de caos e tensão nos círculos governamentais. Para Arthur J. Langguth, o clima na embaixada dos Estados Unidos era de total estarrecimento porque sabiam da pressão sofrida pela Junta Militar para não negociar com os sequestradores, e agora “a vítima declarava que aqueles terroristas, aqueles criminosos, não passavam de bons rapazes desencaminhados” (Langguth, 1979LANGGUTH, Arthur J. A face oculta do terror. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 169).

Naqueles dias, foram muitas as repercussões sobre a viabilidade da permanência de Elbrick no Brasil. O jornal The Baltimore Sun publicou em suas páginas um artigo afirmando que “observadores informados” relatavam que o embaixador pode ter perdido todo seu poder de negociação e agora está em dívida com o regime brasileiro.31 31 The Baltimore Sun, 9 ago. 1969. Segundo informações recolhidas pela embaixada no Rio de Janeiro, a expressão de descontentamento em função da decisão tomada pela Junta Militar estaria restrita a um pequeno setor das Forças Armadas e não encontraria ressonância expressiva nos meios civis. Avaliava-se, ainda, que “a capacidade da Junta de tomar decisões difíceis e mantê-las aumentou seu prestígio”.32 32 Folder: Pol 23-8 - Demonstrations Riots (Box 34). Classified Central Subject Files (1961-1975).Record Group 84: Brazil U.S. Embassy. National Archives Building, Washington, DC. Essa impressão teria sido compartilhada mais de uma vez por diferentes setores políticos, e a retórica utilizada com frequência recuperava a narrativa da tradição hospitaleira e o repúdio à violência como características do povo brasileiro.

Aos poucos se construía a ideia de que o sequestro de Elbrick teria contribuído para aprimorar sua missão diplomática no Brasil, inclusive porque sua simpatia pessoal teria aumentado: na embaixada no Rio de Janeiro não paravam de chegar cartas de pesar e manifestações de solidariedade ao embaixador (Langguth, 1997LANGGUTH, Arthur J. A face oculta do terror. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 172). Todas essas análises foram produzidas nos dias em que Elbrick esteve reunido com integrantes do Departamento de Estado, em Washington D.C., para avaliar o que deveria ser feito. Foi decidido que ele voltaria ao Brasil, reassumiria seu posto e faria uma posterior avaliação sobre as reais possibilidades de permanência. No entanto, nos bastidores do governo brasileiro crescia o descontentamento em relação ao embaixador. Além do desgaste causado pelo sequestro e a repercussão criada em torno das declarações de Elbrick, em fevereiro de 1970 o embaixador se viu enredado mais uma vez em questões “sensíveis” para o governo brasileiro.

No final de 1969, as denúncias envolvendo graves violações de direitos humanos no Brasil cresciam em tamanho e intensidade. A articulação de exilados brasileiros em países como Argélia, Paris e Chile contribuiu de maneira decisiva para que os casos de tortura, desaparecimento e prisões envolvendo o regime civil-militar viessem à tona. O esforço naquele momento era a criação de uma rede transnacional de denúncia que fizesse frente às sucessivas tentativas do governo brasileiro de desacreditar a opinião pública em relação às notícias que informavam que a tortura de presos políticos era política de Estado e, portanto, praticada de modo rotineiro e sistemático. Em 26 de fevereiro de 1970, a The New York Review of Books publicou uma carta intitulada “Tortura no Brasil”,33 33 The New York Review of Books, 26 fev. 1970. produzida pela Frente Brasileira de Informações, criada nos Estados Unidos naquele mesmo mês. De acordo com James Green,

A matéria da New York Review of Books fornecia um panorama sombrio da situação dos oposicionistas presos no Brasil. Dava descrições pormenorizadas dos prisioneiros, com nomes, idades e filiação política; as circunstâncias de sua detenção proporcionavam credibilidade às alegações. O destaque especial conferido ao tratamento desumano de prisioneiras do sexo feminino acentuava a natureza brutal do regime, como se a tortura, já de si inaceitável, ainda o fosse mais quando o objeto eram corpos de mulheres. As denúncias provavelmente foram fator significativo para provocar uma reação editorial de um dos principais diários da nação (Green, 2009GREEN, James. Apesar de vocês: oposição à ditadura brasileira nos Estados Unidos, 1964-1985. São Paulo: Companhia das Letras, 2009., p. 227).

O jornal mencionado por Green é o Washington Post. Em 28 de fevereiro, ou seja, apenas dois dias após a publicação da New York Review of Books, o editorial publicado no Post intitulado “Opression in Brazil” surpreendeu o governo brasileiro pelo tom presente no texto. A matéria argumentava que eram infrutíferas as tentativas do regime civil-militar no sentido de negar aquilo que estava evidente: a tortura e perseguição aos opositores eram incontestáveis. Afirmava ainda que “os patrões militares do Brasil, chefiados por um general bronco chamado Médici, querem impor sua vontade, e qualquer pessoa que critique ou questione essa vontade é automaticamente considerada inimiga do Estado” (Green, 2009GREEN, James. Apesar de vocês: oposição à ditadura brasileira nos Estados Unidos, 1964-1985. São Paulo: Companhia das Letras, 2009., p. 227). Como era de se esperar, o editorial do Washington Post não foi bem recebido nos círculos militares, causando claro desconforto entre o embaixador Charles Burke Elbrick e o ministro das Relações Exteriores, Mario Gibson Barboza.

Barboza pretendia capitalizar o máximo possível os desdobramentos envolvendo o editorial do Washington Post. Mobilizou o embaixador do Brasil em Washington, Mozart Gurgel Valente, que escreveu uma carta lembrando que, na ocasião da libertação dos 15 presos políticos trocados no sequestro de Elbrick, todos haviam chegado ao México sem nenhum sinal de violência ou maus-tratos.34 34 Washington Post, 5 mar. 1970. Na perspectiva de Barboza, o objetivo era tentar evitar o “efeito cascata” que o editorial poderia ter causado, já que, como demonstramos acima, as denúncias das graves violações de direitos humanos envolvendo o governo brasileiro já contavam com significativa base de apoio, inclusive na Europa e nos Estados Unidos.

O estopim definitivo nas relações se deu nos meses seguintes do polêmico editorial do Washington Post, mais precisamente no mês de abril de 1970, após a frustrada tentativa de sequestro do cônsul norte-americano, Curtis Carly Cutter, veterano da Guerra da Coreia, em Porto Alegre por membros da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Naquela ocasião, Elbrick fez uma declaração pública demonstrando absoluta preocupação com a segurança dos agentes diplomáticos norte-americanos no Brasil. Mario Gibson Barboza, mais uma vez, reagiu com veemência, criticando a postura do embaixador e afirmando que “ele havia descoberto que Cutter havia demitido o segurança fornecido pelo governo brasileiro,35 35 Em notícia veiculada no Jornal do Brasil, em 9 de abril de 1970, há a informação que o secretário de Segurança de Porto Alegre, Jaime Mariath, teria negado que o cônsul Curtis Cutter dispensou a escolta fornecida pelo governo brasileiro. e que um comunicado seria emitido a esse respeito”.36 36 Folder: Kidnapping of Ambassadors and other U.S. personnel 1969-70 (Box15). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC. Além disso, Barboza fazia questão de frisar o estranhamento do governo brasileiro em relação às suas atitudes nesse caso.37 37 Jornal do Brasil, 9 abr. 1970. Nos círculos do governo norte-americano foi solicitado esclarecimento em relação às críticas de Barboza. O porta-voz do Departamento de Estado teria relatado os fatos e acrescentado: “ele [Elbrick] explicou que sentiu que era seu dever expressar preocupação após a tentativa de sequestro e ferimento de um oficial americano. Agora, o embaixador e nós estamos surpresos, e lamentamos que sua expressão de preocupação tenha sido interpretada como crítica pelo governo brasileiro”.38 38 No original: “He explained that he felt it was his duty to express concern in the aftermath of the attempted kidnapping and wounding of an American official.Now, the Ambassador and we are surprised, and regret that his expression of concern was interpreted as criticism by the Government of Brazil”. Folder: Kidnapping of Ambassadors and other U.S. personnel 1969-70 (Box 15). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.

Nos Estados Unidos, crescia a desconfiança em relação ao poder de negociação de ­Elbrick, já que foram sucessivas as “crises diplomáticas” envolvendo o embaixador. O conselheiro político de Nelson Rockefeller, Berent Friele, teria dito que a comunicação entre o presidente Nixon e o recém-empossado general Médici, estava sendo dificultada devido à posição de Elbrick.39 39 RG III 4:Folder 164; Box 13. Nelson A. Rockefeller gubernatorial records, Ann C. Whitman, Series 35 (FA 374), Subseries 3: Issues and People. Rockefeller Archive Center (RAC). No Brasil, a percepção era semelhante. Ainda em 1969, no dia 26 de dezembro, o general Tasso Villar de Aquino, encarregado do Inquérito Policial Militar para apurar os responsáveis pelo sequestro de Elbrick, remeteu um documento detalhado sobre o episódio para o chefe do Serviço Nacional de Informações (SNIServiço Nacional de Informações (SNI). Arquivo Nacional, Brasília), Carlos Alberto Fontoura. Sem nenhum constrangimento, Aquino teceu pesadas críticas ao embaixador e a seu comportamento pré- e pós-sequestro. Em destaque, as declarações de Elbrick em relação aos sequestradores eram consideradas inadmissíveis para o posto que ele ocupava. Chamado de ingênuo, malicioso e displicente, na avaliação de Villar, a representação diplomática de Elbrick estaria absolutamente comprometida em razão de seu comportamento.40 40 ACE 45000/72. Fundo: Serviço Nacional de Informações. Arquivo Nacional, Brasília.

Em maio de 1970, quase um ano após desembarcar no Brasil pela primeira vez, Charles Burke Elbrick foi chamado por uma equipe médica para fazer novos exames nos Estados Unidos. No momento que realizava os procedimentos, sofreu um derrame. A recuperação do embaixador foi completa, mas não havia possibilidade nem clima político para o retorno ao Brasil. Langguth (1997LANGGUTH, Arthur J. A face oculta do terror. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979., p. 173) afirma que “Elbrick participava a amigos no Departamento de Estado que, embora o Brasil fosse um belo país, havia adquirido a seu respeito um certo sentimento irracional, e gostaria de ser enviado a outra parte”. Não foi apenas a complicação médica que antecipou o retorno de Elbrick a seu país. O governo brasileiro, primeiro representado pela Junta Militar, e depois em nome do general Médici, não estava nem um pouco satisfeito com a atuação do embaixador.

Considerações finais

Com alguma frequência, a narrativa construída sobre o sequestro do embaixador Charles Burke Elbrick informa que o governo norte-americano, aqui representado pelo presidente Richard Nixon, teria feito uma pressão inconteste à Junta Militar para que o embaixador fosse libertado com vida. Não nos parece plausível afirmar que a ação envolvendo Elbrick não tenha sido objeto de preocupação e discussão intensa nos Estados Unidos.41 41 Cabe lembrar que, no ano anterior, John Gordon Mein, embaixador norte-americano na Guatemala, foi assassinado numa tentativa de sequestro. Além disso, sobretudo a partir do sequestro de Elbrick começaram a ser redesenhadas estratégias de seguranças para lidar e prevenir o sucesso de novas ações. Apesar dos detalhes da vida e carreira de Elbrick serem pouco conhecidos, o embaixador era personagem importante na política diplomática dos Estados Unidos e foi enviado ao Brasil num momento em que Nixon redefinia sua política para a América Latina.

No entanto, ao nos debruçarmos sobre telegramas, informes e declarações trocados entre membros da Embaixada no Rio de Janeiro e membros do Departamento de Estado, nos Estados Unidos, além das análises que saíram na mídia impressa, nos parece prematuro sugerir que havia uma ordem expressa vinda de Washington no sentido de exigir que o governo brasileiro aceitasse as exigências dos guerrilheiros. Os documentos sugerem que as negociações entre a Embaixada no Rio de Janeiro e a Junta Militar foram interpretadas como sendo a política formal dos Estados Unidos. Outro tópico fundamental também presente nos documentos é o questionamento sobre como o sequestro poderia interferir no futuro das relações entre os dois países, além da necessidade de reavaliar se seria prudente que o embaixador continuasse a ocupar o posto diplomático no Brasil a partir da observação que seu poder de negociação diplomática estava seriamente comprometido.

Os acontecimentos decorridos na temporalidade compreendida entre a nomeação de Charles Burke Elbrick (1969) e sua renúncia (1970) foram marcantes e decisivos. O embaixador acabou se transformando em personagem principal de um episódio delicado num momento em que as missões diplomáticas tornavam-se cada vez mais alvos da guerrilha urbana. Seus posicionamentos nem sempre foram objeto de concordância não apenas nos países em que foi embaixador, mas inclusive no interior do governo norte-americano. A curta passagem de Elbrick no Brasil e as repercussões envolvendo seu sequestro confirmam uma carreira intelectualmente bem construída, mas cujos acontecimentos a empurraram para águas turvas e movediças.

Fontes

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  • Rockefeller Archive Center, NY
  • Serviço Nacional de Informações (SNI). Arquivo Nacional, Brasília

Referências

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  • 1
    Charles Burke Elbrick permaneceu como embaixador na Iugoslávia entre 1964 e 1969.
  • 2
    As citações de documentação e textos em língua estrangeira têm tradução livre. Folder: Ambassador Elbrick 69-70 (Caixa 14). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives BuildingNational Archives, Washington DC, Washington, DC.
  • 3
    Folder: Ambassador Elbrick 69-70 (Caixa 14). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.
  • 4
    RG III 4: Folder 1227; Box 152. Nelson A. Rockefeller Personal papers, Series O (FA 350), Subseries 8: Presidential Mission to Latin America. Rockefeller Archive Center (RAC)Rockefeller Archive Center, NY.
  • 5
    Criada no governo de John F. Kennedy, no ano de 1961, a Aliança para o Progresso foi um programa de cooperação destinado ao desenvolvimento econômico e social da América Latina com o objetivo de conter a expansão do comunismo na região. Para saber mais sobre a Aliança, ver Ribeiro (2006RIBEIRO, Ricardo Allagio. A Aliança para o Progresso e as relações Brasil-Estados Unidos. Tese (Doutorado), Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2006.).
  • 6
    RG III 4: Folder 992; Box 121. Nelson A. Rockefeller Personal papers, Series O (FA 350), Subseries 8: Presidential Mission to Latin America. Rockefeller Archive Center (RAC).
  • 7
    Jornal do Brasil, 16 set. 1969.
  • 8
    Ainda que alguns trabalhos tenham chamado atenção para o sequestro de Charles Burke Elbrick, inclusive com a publicação de livros memorialísticos, nota-se certa ausência de questionamento acerca do alcance deste episódio e seus possíveis desdobramentos. No ano de 1997, com a publicação da coletânea Versões e ficções: o sequestro da história, temos a primeira iniciativa no sentido de problematizar a memória acerca do sequestro. Um grupo de intelectuais, jornalistas e ex-integrantes da ação se debruçou sobre o episódio com o objetivo de contestar a versão do filme O que é isso, companheiro?, dirigido por Bruno Barreto. Uma questão bastante discutida no conjunto de artigos é justamente o modo como foi construído e caracterizado o operário Virgílio Gomes da Silva (Reis Filho, 1997).
  • 9
    A lista final foi composta por: Ricardo Vilas Boas, Mario Zanconato, José Ibrahin, Ricardo Zarattini, Flávio Tavares, Vladimir Palmeira, José Dirceu, Agonalto Pacheco, Maria Augusta Carneiro Ribeiro, Gregório Bezerra, Ivens Marchetti, João Leonardo da Silva Rocha, Luís Travassos, Onofre Pinto e Rolando Frati.
  • 10
    Jornal do Brasil, 5 set. 1969.
  • 11
    Folder: Pol 23-8 - Kidnapping Amb. Elbrick 1969 (Caixa 11). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.
  • 12
    Jornal do Brasil, 5 set. 1969.
  • 13
    Folder: Pol 23-8 - DemonstrationsRiots (Caixa 34). São Paulo: Classified Central Subject Files. Record Group 84: Brazil U.S. Consulate General (1962-1974). National Archives Building, Washington, DC.
  • 14
    Folder: Pol 23-8 - Demonstrations Riots (Caixa 34). São Paulo: Classified Central Subject Files. Record Group 84: Brazil U.S. Consulate General (1962-1974). National Archives Building, Washington, DC.
  • 15
    United States of America. Congressional Record. Proceedings and Debates of the 91st Congress - First Session, v. 115, p. 24603. U.S. Government Printing Office, 1969.
  • 16
    Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Antigos/D56435.htm Acesso em: 5 set. 2020.
  • 17
    Jornal do Brasil, 6 set. 1969.
  • 18
    Folder: Per Elbrick, Charles Burke. Pol 23-9 Brazil (Box169).Subject Numeric Files (1967-1969), General Records of the Department of State, Record Group 59, National Archives Building, Washington, DC.
  • 19
    Folder: Per Elbrick, Charles Burke. Pol 23-9 Brazil (Box169). Subject Numeric Files (1967-1969), General Records of the Department of State, Record Group 59, National Archives Building, Washington, DC.
  • 20
    Folder: Pol 23-8 - Kidnapping Amb. Elbrick 1969 (Box11).Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.
  • 21
    Folder: Per Elbrick, Charles Burke. Pol 23-9 Brazil (Box169). Subject Numeric Files (1967-1969), General Records of the Department of State, Record Group 59, National Archives Building, Washington, DC.
  • 22
    Jornal do Brasil, 6 set. 1969.
  • 23
    Jornal do Brasil, 11 set. 1969.
  • 24
    Idem.
  • 25
    Jornal do Brasil, 9 set. 1969.
  • 26
    Idem.
  • 27
    Jornal do Brasil, 9 set. 1969.
  • 28
    Última Hora, 8 set. 1969.
  • 29
    Idem.
  • 30
    Disponível em: https://www.washingtonpost.com/archive/local/1983/04/15/c-burke-elbrick-career-ambassador-dies- at-75/0d9c40f7-6070-46b1-ad2d-71fd1014d48a/?noredirect=on&utm_term=.f522a0807844 Acesso em: 15 ago. 2020.
  • 31
    The Baltimore Sun, 9 ago. 1969.
  • 32
    Folder: Pol 23-8 - Demonstrations Riots (Box 34). Classified Central Subject Files (1961-1975).Record Group 84: Brazil U.S. Embassy. National Archives Building, Washington, DC.
  • 33
    The New York Review of Books, 26 fev. 1970.
  • 34
    Washington Post, 5 mar. 1970.
  • 35
    Em notícia veiculada no Jornal do Brasil, em 9 de abril de 1970, há a informação que o secretário de Segurança de Porto Alegre, Jaime Mariath, teria negado que o cônsul Curtis Cutter dispensou a escolta fornecida pelo governo brasileiro.
  • 36
    Folder: Kidnapping of Ambassadors and other U.S. personnel 1969-70 (Box15). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.
  • 37
    Jornal do Brasil, 9 abr. 1970.
  • 38
    No original: “He explained that he felt it was his duty to express concern in the aftermath of the attempted kidnapping and wounding of an American official.Now, the Ambassador and we are surprised, and regret that his expression of concern was interpreted as criticism by the Government of Brazil”. Folder: Kidnapping of Ambassadors and other U.S. personnel 1969-70 (Box 15). Bureau of Inter-American Affairs. Office of Brazilian Affairs. General Records of the Department of State, Record Group 59: Records Relating to Brazil (1962-1975). National Archives Building, Washington, DC.
  • 39
    RG III 4:Folder 164; Box 13. Nelson A. Rockefeller gubernatorial records, Ann C. Whitman, Series 35 (FA 374), Subseries 3: Issues and People. Rockefeller Archive Center (RAC).
  • 40
    ACE 45000/72. Fundo: Serviço Nacional de Informações. Arquivo Nacional, Brasília.
  • 41
    Cabe lembrar que, no ano anterior, John Gordon Mein, embaixador norte-americano na Guatemala, foi assassinado numa tentativa de sequestro.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    11 Set 2020
  • Aceito
    10 Nov 2021
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