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A formação e consolidação de um grupo de produtores de açúcar da nobreza da terra. Capitania de Pernambuco, séculos XVI-XVIII

The formation and consolidation of a group of sugar producers from the land’s nobility.Captaincy of Pernambuco, XVI-XVIII centuries

Resumo:

A sociedade pernambucana desenvolveu-se por meio de uma economia açucareira agrícola e escravagista que ditou as relações sociais da época. O objetivo central deste artigo é analisar como a organização espacial e as possibilidades geradas pelo ambiente natural viabilizaram o sucesso dos senhores de engenho e lavradores de cana-de-açúcar, dependentes do potencial natural e logístico dos lugares onde se assentaram. Assim, o acesso às terras mais propícias para o cultivo da cana-de-açúcar possibilitou a ascensão e uma maior permanência na longa duração do período colonial de um grupo de senhores de engenho e lavradores de cana-de-açúcar. Este artigo apresenta resultados parciais de uma investigação de doutorado.

Palavras-chave:
História ambiental; Pernambuco; atividade açucareira

Abstract:

Pernambuco’s society developed through an extractive and slave-based sugar economy which dictated the social relations of that society. The main objective of this article is to analyze how the spatial organization and the possibilities generated by the natural environment made possible the success of sugarcane plantation owners and farmers depended on the natural and logistical potential of the places where they settled. Thus, access to the most favorable lands for sugarcane cultivation enabled the rise and greater permanence in the long duration of the colonial period of a group of sugar mill owners and sugarcane farmers. This article presents partial results of a doctoral research.

Keywords:
Environmental history; Pernambuco; sugar activity

A sociedade vem enfrentando conflitos e inquietações pautadas nas relações antropocêntricas sobre o espaço natural (Rodrigues, 2009RODRIGUES, Arlete Moysés. A abordagem ambiental: questões para reflexão. GeoTextos, v. 5, n.1, p. 183-201, 2009.; Yeager et al., 2011YEAGER, David Scott et al. Measuring Americans’ issue priorities: a new version of the most important problem question reveals more concern about global warming and the environment. Public Opinion Quarterly, v. 75, n. 1, p. 125-138, 2011.). Trata-se de uma profunda crise ecológica, expressão de um desequilíbrio da representação humana em relação à natureza (Stroh, 2004STROH, Paula Yone. Não há sociedade humana fora do espaço geográfico. In: ARAÚJO, Lindemberg Medeiros de(ed.). Geografia: espaço, tempo, planejamento. Maceió: Ufal, 2004.). No centro dessas questões está a perda dos ecossistemas naturais, da biodiversidade e dos serviços ambientais. A Mata Atlântica nordestina - que tem início no norte do rio São Francisco e estende-se pelo litoral dos estados de Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte (Barreto, 2013BARRETO, Cristiane Gomes. Devastação e proteção da Mata Atlântica nordestina: formação da paisagem e políticas ambientais. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Sustentável), Universidade de Brasília. Brasília, 2013., p. 18) - se destaca dentre os ecossistemas brasileiros como o mais ameaçado pelas perdas florestais (Tabarelli et al., 2006TABARELLI, Marcelo et al. Fragmentação e perda de habitats na Mata Atlântica ao norte do rio São Francisco. In: SIQUEIRA FILHO, José Alves; LEME, Elton Martinez Carvalho(ed.). Fragmentos de Mata Atlântica do Nordeste: biodiversidade, conservação e suas bromélias. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson, 2006.). Outro agravante à garantia de perpetuidade dessas florestas encontra-se no fato de a maior parte estar sob a tutela privada sem proteção formal. Quase toda a floresta remanescente em questão está dentro de propriedades particulares, notadamente em poder das grandes usinas produtoras de açúcar e álcool, derivados da cana-de-açúcar, a Saccharum officinarum (Uchôa Neto, Tabarelli, 2002UCHÔA NETO, Carlos Alberto Mergulhão; TABARELLI, Marcelo. Diagnóstico e estratégia de conservação do Centro de Endemismo Pernambuco. Recife: Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste; Conservation International do Brasil, 2002.).

A origem da degradação do bioma da Mata Atlântica nordestina é antiga e essa degradação se intensificou ao longo do período colonial, quando europeus, especialmente os portugueses, se assentaram e instalaram os primeiros núcleos urbanos e as plantações de cana-de-açúcar para a produção do “ouro branco”, isto é, do açúcar, como têm demonstrado as pesquisas de vários historiadores, biólogos, geógrafos, entre outros cientistas (Ferlini, 1986FERLINI, Vera Lúcia Amaral. A subordinação dos lavradores de cana aos senhores de engenho: tensão e conflito no mundo dos brancos. Revista Brasileira de História (São Paulo). v. 6, n. 12, p. 151-168, 1986.; Schwartz, 1988SCHWARTZ, Stuart B. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. São Paulo: Companhias das Letras, 1988.; Pádua, 2002PÁDUA, José Augusto. Um sopro de destruição:pensamento político e crítica ambiental no Brasil escravagista (1786-1888). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.; Warren, 2011WARREN, Dean. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, [1996]2011.; Cabral, 2014CABRAL, Diogo de Carvalho. Na presença da floresta: Mata Atlântica e história colonial. Rio de Janeiro: Garamond Universitária, 2014.; Barreto, 2013BARRETO, Cristiane Gomes. Devastação e proteção da Mata Atlântica nordestina: formação da paisagem e políticas ambientais. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Sustentável), Universidade de Brasília. Brasília, 2013.; Barreto, Drummond, 2016BARRETO, Cristiane Gomes; DRUMMOND, José Augusto. Com açúcar e sem afeto: a cana e a devastação da Mata Atlântica Nordestina. In: CABRAL, Diogo de Carvalho; BUSTAMANTE, Ana Goulart (org.). Metamorfoses florestais: culturas, ecologias e as transformações históricas da Mata Atlântica. Curitiba: Prismas, 2016.).

A reflexão acerca das relações do meio social com a paisagem natural não é algo novo. Grandes nomes da historiografia brasileira, como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Júnior, ainda na primeira metade do século XX, tomaram o meio ambiente como personagem ativo na construção histórica da sociedade brasileira.1 1 O papel do ambiente nas interpretações desses três autores foi analisado no seguinte estudo: Barreto, Lopes, Vital (2017).

Todavia, essas relevantes reflexões e pesquisas sobre o impacto da produção açucareira não tiveram como foco profundo de análise as relações entre as dinâmicas sociais patrimoniais do período colonial e os processos ecológicos. Para compreender tais dinâmicas emerge a necessidade de entendimento de como o ambiente natural influenciou os fatores econômicos, socioculturais e biofísicos na área atualmente conhecida como Mata Atlântica nordestina - especialmente na capitania de Pernambuco - no período colonial.

Assim, este artigo analisará a organização espacial e as possibilidades geradas pelo ambiente natural, que facilitou a fixação dos colonizadores e o desenvolvimento da atividade açucareira por meio do plantio da cana-de-açúcar. Acredita-se que o domínio do potencial natural do ambiente propiciou não somente o desenvolvimento da atividade açucareira, mas também a consolidação de um grupo de produtores de açúcar, a nobreza da terra, ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII.

A nobreza da terra diz respeito às antigas estirpes proeminentes, quinhentistas e seiscentistas, que iniciaram, em meados do século XVII, uma pretensão de enobrecimento galgado no discurso do nativismo. Os argumentos aduzidos incidiram sobre as consecutivas conquistas da capitania: contra os índios no século XVI e com a expulsão dos holandeses em meados do século XVII, esta última conhecida como Restauração. Tal discurso implicava em um imaginário contratual das relações entre aqueles que participaram desses processos e a Coroa portuguesa, a qual lhes devia, em agradecimento, várias mercês. Destarte, os participantes da Restauração, juntamente com os seus descendentes, se autointitularam “nobreza da terra”, e se conceberam como os únicos com a dignidade necessária para exercer os mais altos postos hierárquicos locais. Tratava-se de uma estratégia de diferenciação social por parte do “velho estamento agrário” - sucessores dos senhores de engenho e lavradores de cana-de-açúcar que atuaram na Restauração -, e visava protegerem-se da ascensão de um novo estrato social emergente, os mercadores de grosso trato. Esse discurso foi conceituado por Evaldo Cabral de Mello (1997MELLO, Evaldo Cabral de. Rubro veio: o imaginário da restauração pernambucana. 2ª ed.Rio de Janeiro: Topbooks, 1997., p. 127, 155) como o primeiro nativismo pernambucano. Muitas dessas famílias mantiveram-se com alto status social na capitania de Pernambuco ao longo de todo o período colonial e até o imperial (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021.).

O presente artigo analisa a seguir como ocorreu a evolução da produção do açúcar por meio da expansão da ocupação das principais freguesias produtoras de açúcar nas Capitanias do Norte do Estado do Brasil durante os séculos XVII e XVIII. Atenta-se que a introdução do termo “Capitanias do Norte” para designar as capitanias de Pernambuco, Itamaracá, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, em substituição ao termo “capitanias anexas a Pernambuco” faz jus aos novos debates sobre a jurisdição dessa localidade. Evita-se utilizar o termo “anexas” devido à generalização das jurisdições e das temporalidades que Pernambuco possuía com relação às demais capitanias referidas (Menezes, 2006MENEZES, Mozart Vergetti de. Jurisdição e poder nas capitanias do Norte (1654-1755). Saeculum: Revista de História (João Pessoa). n. 14, p. 11-25, 2006.). Em seguida, busca-se analisar quais foram as freguesias açucareiras de maior atuação da nobreza da terra e como o acesso a estas terras colaborou para o sucesso das famílias do grupo em sua gestão patrimonial.

Nessa análise, a história ambiental se destaca como uma ciência que contribui para a melhor compreensão das relações entre as sociedades e o meio natural através do tempo (Moraes, 2005MORAES, Antonio Carlos Robert. Território e história no Brasil. 2ª ed. São Paulo: Annablume, 2005.). O conhecimento dos movimentos históricos poderá esclarecer a influência dos componentes social, cultural, político e ambiental que modelaram a paisagem da Mata Atlântica nordestina no período colonial do Brasil.

Esta pesquisa ampara-se em diferentes tipos de fontes de vários arquivos históricos, sobretudo do Arquivo Histórico Ultramarino (AHU) e do Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT). Foram consultadas desde fontes institucionais - provenientes das câmaras municipais de Pernambuco, da Mesa de Inspeção do Açúcar de Pernambuco, da Companhia Geral do Comércio de Pernambuco e Paraíba e do Conselho Ultramarino -, bem como relatos de cronistas e ainda de petições coletivas de senhores de engenho e lavradores de cana-de-açúcar.

O negócio do açúcar e a importância da qualidade da terra como fator de produção

A sociedade das Capitanias do Norte do Estado do Brasil, especialmente Pernambuco, ao longo de todo seu período colonial desenvolveu-se por meio de uma economia açucareira agrícola e escravista que ditou as relações sociais daquela sociedade. Os primeiros registros acerca da implementação da atividade açucareira na capitania de Pernambuco são de finais de 1530 e início de 1540 (Mello, Albuquerque, 1967MELLO, José Antônio Gonsalves de; ALBUQUERQUE, Cleonir Xavier de. 2ª ed. Cartas de Duarte Coelho a El Rei. Recife: Fundação Joaquim Nabuco; Massangana, 1967., p. 100-105).2 2 Em 1546, o donatário de Pernambuco, Duarte Coelho, informava ao rei que os engenhos se encontravam espalhados pela capitania. Há ainda estudiosos que afirmam que a primeira feitoria de Pernambuco data de 1516, embora sem boas comprovações (Costa, 1983, p. 84). A partir de então o número de engenhos daquela capitania cresceu significativamente, ultrapassando três centenas no final do terceiro quartel do século XVIII, como se pode ver no Quadro 1.

Quadro 1
Número de engenhos das Capitanias do Norte (séculos XVI-XVIII)

A produção açucareira da América portuguesa teve Pernambuco como o principal produtor até o momento da invasão dos holandeses (1630). Essa capitania possuía mais engenhos e uma maior produção do que a Bahia e o Rio de Janeiro (Strum, 2012STRUM, Daniel. O comércio do açúcar: Brasil, Portugal e os Países Baixos (1595 - 1630). Rio de Janeiro: Versal; São Paulo: Odebrecht, 2012.). Todavia, os conflitos da Guerra de Resistência (1630-1637) contra os holandeses resultaram em uma grande baixa do número de engenhos - devido às queimas de muitos engenhos e canaviais, e às fugas de seus senhores e das pessoas que escravizavam - o que, consequentemente, diminuiu a produção açucareira. Estima-se que metade dos engenhos das Capitanias do Norte foi abandonada por seus senhores nesse processo (Mello, 2012MELLO, Evaldo Cabral de. O bagaço da cana: os engenhos de açúcar do Brasil holandês. São Paulo: Penguin/Companhia das Letras, 2012.). Embora a administração da West Indische Company (WIC) tenha, em poucos anos, estimulado a produção do açúcar, por meio de contratos de arrendamentos e leilões de engenhos e plantações de cana com pagamentos em prestações, no final do período de dominação holandesa, também devido aos conflitos da Restauração (1645-1654), o número total de engenhos das Capitanias do Norte era inferior ao de quando de sua chegada (Mello, 2007MELLO, José Antônio Gonsalves de(ed.). Fontes para a história do Brasil holandês, v. 1: a economia açucareira. 2ª ed. Recife: Cepe, 2004., p. 319). Pernambuco, embora tenha perdido o status de maior produtor de açúcar da América portuguesa, continuou a ter essa atividade econômica como sua principal fonte de rendimentos até finais do século XVIII (Lopes, 2008LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da costa da Mina e comércio Atlântico: tabaco, açúcar, ouro e tráfico de escravos: Pernambuco (1654-1760). Tese (Doutorado em História Econômica), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2008., p. 16).7 7 A atividade açucareira continua até a atualidade, sendo os estados de Pernambuco e Alagoas responsáveis por mais de 7% de toda a cana-de-açúcar cultivada no Brasil (Nocelli et al., 2017, p. 23).

É um fato que o sucesso da atividade açucareira dependia do acesso às melhores terras: férteis, de solo do tipo argiloso escuro e vertissolo, conhecidos como “massapê”; próximas à floresta para extração da lenha que alimentava as fornalhas que coziam o caldo da cana-de-açúcar; e próximas aos rios para o transporte do açúcar até ao porto, de onde o produto era exportado (Barreto, Drummond, 2016BARRETO, Cristiane Gomes; DRUMMOND, José Augusto. Com açúcar e sem afeto: a cana e a devastação da Mata Atlântica Nordestina. In: CABRAL, Diogo de Carvalho; BUSTAMANTE, Ana Goulart (org.). Metamorfoses florestais: culturas, ecologias e as transformações históricas da Mata Atlântica. Curitiba: Prismas, 2016.). A competitividade por esse tipo de terra gerou, no Estado do Brasil, na segunda metade do século XVII, a discussão se deveria ser proibido o estabelecimento de novos engenhos em determinadas áreas, como se concretizou na capitania da Bahia em 1661, e em 1682 para todas as zonas açucareiras do Estado do Brasil.8 8 Arquivo Histórico Ultramarino (AHU), “Carta Régia (cópia) da rainha regente D. Luísa de Gusmão proibindo a abertura de novos engenhos no Recôncavo da Bahia em lugares prejudiciais à lenha e à cana-de-açúcar”, Bahia, Cx. 2, doc. 123. AHU, “Parecer do Conselho Ultramarino sobre o levantamento de novos engenhos no Estado do Brasil, recomendando que o vice-rei daquele Estado, conde de Óbidos, faça todas as diligências possíveis para informar a respeito da viabilidade da criação desses novos engenhos sem prejuízo dos que ali já existem, atendendo aos gastos que tal representaria com as despesas em terras, escravos, gados, canaviais e lenha”, Brasil, Cx. 1, doc. 62. AHU, “Alvará do príncipe regente [D. Pedro], proibindo a partir daquele momento a construção de novos engenhos de açúcar no Brasil, sem licença dos governadores das capitanias”, Brasil, Cx. 1, doc. 94.

A qualidade das terras possuía implicações diretas na qualidade do açúcar que era produzido, e, portanto, no preço dos diferentes tipos de açúcar, o que provocou, nos séculos XVII e XVIII, querelas em Pernambuco acerca das diferenças e alterações da qualidade do açúcar e do peso das caixas que o armazenavam. Em 1752, os produtores de açúcar afirmaram que as alterações do peso eram causadas pela umidade das caixas usadas, as quais, dependendo da madeira utilizada e das condições climáticas, alteravam-se, devido à maior absorção de água.9 9 AHU, Pernambuco, Cx. 73, doc. 6140, “Carta dos oficiais da Câmara de Olinda ao rei [D. José I], sobre o envio de um manifesto dos fabricantes de açúcar indignados com a nova Mesa da Inspeção”. Essa queixa também foi relatada pelos produtores em um abaixo-assinado datado de 1768.10 10 AHU, Pernambuco, Cx. 73, doc. 6140. AHU, “Carta dos senhores de engenho sobre a injustiça de os punir sobre as alterações da qualidade de diminuição dos pesos das caixas do açúcar”, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364.

Mapa 1
Litoral açucareiro das Capitanias do Norte do Estado do Brasil em meados do século XVIII

A umidade também alterava a qualidade do açúcar, pois acelerava o seu processo de liquefação, tornando-o de qualidade inferior. Os produtores de açúcar, no referido abaixo-assinado, explicaram que muitas das alterações tomadas como fraudes ocorriam porque havia mais de trezentos engenhos naquela capitania e que algumas lavouras de cana-de-açúcar, por terem sido iniciadas há pouco tempo e por se localizarem em terras de má qualidade, não produziam boa matéria-prima para fabricação do açúcar. Tal fato fazia com que alguns senhores de engenho, cujo açúcar era oriundo de uma cana de má qualidade, considerassem fabricar açúcar fino, que era o de melhor qualidade, enquanto na realidade somente conseguiam produzir açúcar redondo e os demais de qualidade inferior.11 11 AHU, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364.

De fato, a diminuição da qualidade do açúcar e a influência da qualidade da cana-de-açúcar no processo de purgar foram apontados como problemas recorrentes desde o início do século XVIII por André João Antonil (2001ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e minas. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2001., p. 86-88, 169-172) em sua obra Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e minas.

A qualificação do açúcar, que ocorria em seu processo de purificação, era de suma importância na atribuição dos preços ao gênero, principalmente pelo fato de em muito se diferenciar o preço do açúcar de maior qualidade do de menor qualidade. Em meados do século XVIII, a diferença poderia chegar até mil réis por cada arroba de açúcar.12 12 DECRETO sobre o que deve pagar o açúcar nas Alfândegas desse reino. 27 de janeiro de 1751. Coleção dos regimentos reais. Fls. 86-87. In: Projeto “O governo dos outros: imaginários políticos no Império português”. Disponível em: http://www.governodosoutros.ics.ul.pt/imagens_livros/20_sistema_regimentos/vol_ii/0086.jpg. Acesso em: set. 2020. Assim, qualquer variação da qualidade do gênero e, por consequência, de seu preço, poderia acarretar grandes prejuízos aos produtores. Esse fato justifica muitas das querelas que dizem respeito às alterações e fraudes na qualidade do açúcar, e das caixas de seu transporte, incluindo suas marcas de identificação.

Atenta-se aqui para o fato de a qualificação do açúcar não ter sido a mesma ao longo dos séculos XVII e XVIII, diferindo, sobretudo, por localidade de produção.13 13 Observou-se na capitania da Bahia em meados do século XVIII, a produção de quase todas as qualidades de açúcar arroladas pelo mencionado decreto de 1751 que regulou os preços do gênero. A ordem régia de 1687, sobre as marcações das caixas de açúcar, deixava claro que eram três os tipos de açúcar branco: fino (F), redondo (R) e baixo (B). Contudo, já em 1712, em um bando - declaração pública de uma lei -, lançado em Pernambuco sobre as marcações das caixas, constava que as qualificações do açúcar branco eram somente duas: fino (F) e redondo (R).14 14 AHU, “Carta (2ª via) do [governador da capitania de Pernambuco], Félix José Machado [de Mendonça Eça Castro e Vasconcelos], ao rei [D. João V], sobre um bando que lançou com relação às marcações das caixas de açúcar”, Pernambuco, Cx. 26, doc. 2356. Em 1752, senhores de engenho e lavradores de cana de Pernambuco queixavam-se que os homens de negócio da praça de Recife acreditavam haver três qualidades de açúcar branco, sendo que eles somente fabricavam duas: fino e redondo. A esse respeito, os produtores reclamavam que os homens de negócio, ao classificarem o açúcar em maior número de qualidades, buscavam pagar menos pelo açúcar que consideravam inferior.15 15 AHU, Pernambuco, Cx. 73, doc. 6140.

Sobre as alterações das qualidades e dos pesos das taras, afirmaram os senhores de engenho e lavradores de cana-de-açúcar que eles próprios eram prejudicados por tais mudanças, pois perdiam 12 mil réis por cada caixa de açúcar fino que se transformava em redondo, e mais oito mil réis por cada caixa de açúcar redondo que se transformava em baixo.16 16 AHU, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364. Se levarmos em consideração que o valor de aquisição de uma pessoa escravizada, força motora da produção do açúcar, com suas variações de gênero e idade, oscilava entre 10 e 70 mil réis, as quantias apontadas pelos produtores eram de fato altas, uma vez que era o suficiente para a compra de uma criança escravizada (Lopes, 2008LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da costa da Mina e comércio Atlântico: tabaco, açúcar, ouro e tráfico de escravos: Pernambuco (1654-1760). Tese (Doutorado em História Econômica), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2008., p. 233-234).

O governador de Pernambuco, dando razão às justificativas dos produtores de açúcar, complementou que o açúcar era um dos “mais delicados gêneros”, e que o mesmo ia perdendo sua qualidade original por vários e sucessivos fatores para além dos já apontados pelos senhores de engenho e lavradores de cana: pelas grandes distâncias entre os engenhos e o porto do Recife, sendo necessário fazer o transporte do açúcar durante dias, passando por rios; pela má forma com que se transportavam as caixas de açúcar da Mesa de Inspeção do Açúcar até os navios, dos quais seguiam para a Alfândega de Lisboa; e por fim havia os danos que sofriam dentro dos navios devido às altas temperaturas dos porões e da elevada umidade.17 17 AHU, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364. AHU, Pernambuco, Cx. 128, doc. 9744, “Ofício do [governador da capitania de Pernambuco], José César de Meneses, ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar], Martinho de Melo e Castro, sobre o inverno chuvoso que prejudicou a plantação da cana e a safra”.

A explicação dos produtores de açúcar sobre as alterações do peso das caixas e da qualidade do açúcar foi usada como justificativa para solicitar que eles próprios não fizessem as marcações do peso das caixas e da qualidade do açúcar em seus engenhos, pois a demora da entrega das caixas de açúcar à Mesa de Inspeção era tempo suficiente para que o açúcar iniciasse seu processo de deterioração e, portanto, passasse a uma qualidade inferior à que fora inicialmente marcada.18 18 AHU, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364.

Dessa forma, muitos foram os conflitos acerca da qualidade do açúcar. Como se destacou, um dos primeiros elementos dessas quezílias foi a (pouca) qualidade das terras, que possuía implicações diretas na qualidade do açúcar que era produzido, e, consequentemente, no preço do produto. Assim, o acesso às melhores terras garantiu, através do domínio do potencial natural e logístico do ambiente, uma grande vantagem aos seus proprietários no negócio do açúcar. Nessa perspectiva, será analisado a seguir como o meio ambiente propiciou a consolidação social e econômica de algumas famílias da nobreza da terra ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII.

A geografia do poder: distribuição geográfica dos engenhos

Diante da importância da terra como fator de produção, fato que certamente implicou em disputa por recursos naturais, questiona-se em quais capitanias e freguesias as famílias da nobreza da terra tiveram propriedades e como estas colaboraram para a sua reprodução biossocial. Antes de mais, é necessário analisar como ocorreu a evolução da produção do açúcar por meio da expansão da ocupação das principais freguesias produtoras de açúcar nas Capitanias do Norte entre os séculos XVII e XVIII.

Essa análise irá incidir, sobretudo, na comparação entre os períodos de 1630-1654 e 1760-1777, pois para estes há dados suficientes para analisar os engenhos das capitanias de Pernambuco, Itamaracá e Paraíba por freguesia e elucidar algumas questões. Para verificar o número de engenho por freguesia para o primeiro período utilizou-se do levantamento organizado por Evaldo Cabral de Mello (2012MELLO, Evaldo Cabral de. O bagaço da cana: os engenhos de açúcar do Brasil holandês. São Paulo: Penguin/Companhia das Letras, 2012.), no qual consta o histórico da posse dos engenhos existentes durante o domínio holandês. Para tanto, Mello utilizou-se de uma série de documentos portugueses e da WIC - como relação dos engenhos, registros de entradas e saídas do porto do Recife, relação das dívidas, e ainda as Denunciações e Confissões de Pernambuco acerca das verificações e inquirições do Tribunal do Santo Ofício -; além de mapas e cronistas holandeses, e várias obras luso-brasileiras sobre os conflitos do período.

Para o segundo período utilizaram-se listas nominais de senhores de engenhos de açúcar das Capitanias do Norte elaboradas pela Companhia Geral do Comércio de Pernambuco e Paraíba (1760-1780) nos seguintes anos: 1760-1761 - levantamento realizado devido ao estabelecimento da Companhia; e 1777 - levantamento dos engenhos criados nas Capitanias do Norte no ano de fundação da Companhia até o referido ano.

Quadro 2
Número de engenhos das capitanias de Pernambuco, Itamaracá e Paraíba - por freguesia

No que concerne à capitania de Itamaracá, como se pode verificar no Quadro 2, as fontes tenderam a aglutinar algumas freguesias para apontar o número de engenhos existentes na capitania. A única exceção diz respeito à freguesia de Goiana, a qual teve o número de seus engenhos misturados a outra freguesia somente nas fontes elaboradas pela Companhia Geral do Comércio de Pernambuco e Paraíba, entre 1760 e 1777. Os dados do Quadro 2 revelam que os engenhos de Itamaracá tiveram um crescimento bastante tímido até meados do século XVIII, quando a capitania contava com 28 engenhos em atividade. É somente no terceiro quartel do século XVIII que há um crescimento mais notável. Os engenhos de Goiana, freguesia que possuía mais engenhos, entre 1749 e 1777, mais que dobraram em número. A capitania da Paraíba, do mesmo modo, apresentou um lento crescimento até o terceiro quartel do Setecentos, quando dobrou o número de engenhos que possuía, entre 1630-1654.

Foi na capitania de Pernambuco que se verificou um maior crescimento do número de engenhos. Entre o primeiro período (1630-1654) - durante o qual Pernambuco possuiu 118 engenhos - e o segundo período (1760-1777) - 318 engenhos -, observou-se que todas as freguesias açucareiras tiveram um aumento do número de engenhos, embora em proporções diferentes. A vila de Igarassu teve seu crescimento quintuplicado, a vila de Alagoas teve o seu quadruplicado, enquanto as vilas de Sirinhaém e de Porto Calvo tiveram seu número de engenhos triplicado. Todavia, as freguesias que possuíam mais engenhos durante o primeiro período, a cidade de Olinda e da vila do Recife, apresentaram um menor índice de crescimento de número de engenhos se comparado às demais freguesias apontadas, certamente pelo fato de já serem bastante povoadas e não suportarem o estabelecimento de novos engenhos.

Essas freguesias da cidade de Olinda (Várzea do Capibaribe, Santo Amaro de Jaboatão, São Lourenço da Mata, Nossa Senhora da Luz e Santo Antão) e da vila do Recife (Muribeca, Cabo e Ipojuca) foram as mais procuradas, desde o início do povoamento, por sua localização estratégica, fosse pela proximidade com o porto, fosse pelo acesso aos rios, importante para o escoamento da produção. A freguesia da Várzea do Capibaribe, nas primeiras décadas do Seiscentos, era considerada a “de cultivação de maior substância desta capitania [de Pernambuco]” (Salvado, Miranda, 2001SALVADO, João Paulo; MIRANDA, Susana Münch(eds.). Livro primeiro do governo do Brasil (1607-1633). Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses; Centro de História e Documentação Diplomática/MRE, 2001., p. 512). A falta de espaço para novos engenhos nas freguesias mais antigas e a busca por terras menos desgastadas pela atividade açucareira, e que disponibilizassem alimentos, lenha, entre outros suprimentos, fomentou a expansão da atividade para as demais freguesias de Pernambuco e mesmo de outras capitanias.

Os historiadores Breno Lisboa (2014LISBOA, Breno Almeida Vaz. Engenhos, açúcares e negócios na capitania de Pernambuco (c.1655- -c.1750). Clio: Revista de Pesquisa Histórica (Recife). n. 32.1, 2014. Disponível em: file:///D:/Downloads/24458-48886-1-PB.pdf. Acesso em: jan.2022.) e Gustavo Acioli Lopes (2008LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da costa da Mina e comércio Atlântico: tabaco, açúcar, ouro e tráfico de escravos: Pernambuco (1654-1760). Tese (Doutorado em História Econômica), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2008.) também se debruçaram sobre o crescimento do número de engenhos do termo de Olinda. Segundo eles a freguesia de São Lourenço da Mata, distante do porto do Recife cerca de 12-16 léguas, mais que triplicou entre os anos de 1655 e 1698, tornando-se a principal produtora do gênero no início do século XVIII. O crescimento acelerado dessa freguesia gerou ainda a necessidade de criação de uma outra, a Nossa Senhora da Luz, em 1689 (Lisboa, 2014LISBOA, Breno Almeida Vaz. Engenhos, açúcares e negócios na capitania de Pernambuco (c.1655- -c.1750). Clio: Revista de Pesquisa Histórica (Recife). n. 32.1, 2014. Disponível em: file:///D:/Downloads/24458-48886-1-PB.pdf. Acesso em: jan.2022., p. 198). Segundo Lopes (2008LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da costa da Mina e comércio Atlântico: tabaco, açúcar, ouro e tráfico de escravos: Pernambuco (1654-1760). Tese (Doutorado em História Econômica), Universidade de São Paulo. São Paulo, 2008., p. 19), a razão da preferência dos senhores de engenho pela freguesia de São Lourenço da Mata para situar novos engenhos devia-se, conforme afirmaram os próprios proprietários, pelo fato de as terras vizinhas à praça do Recife estarem “muito cansadas”, o que confirma o desgaste das terras pelo plantio da cana.

Isto posto, fica ainda a segunda questão: quais são as freguesias açucareiras de atuação da nobreza da terra e como estas colaboraram para seu sucesso na gestão patrimonial? Por meio do levantamento das propriedades de oito famílias da nobreza da terra realizado em um estudo anterior, é possível mapear as freguesias onde seus membros foram proprietários ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII, como se demonstra no Mapa 2. As famílias analisadas, a saber, são as seguintes: Albuquerque (1.5),23 23 Trata-se da descendência de Joana de Albuquerque, quinta filha que Jerônimo de Albuquerque teve com a índia tabajara Maria do Espírito Santo Arcoverde. Albuquerque (2.3),24 24 Trata-se da descendência de Cristóvão de Albuquerque, terceiro filho de Jerônimo de Albuquerque com dona Filipa de Melo, sua segunda união. Cavalcanti, Rego Barros, Pais Barreto - as quais chegaram em Pernambuco ainda no século XVI -, Carneiro da Cunha, Camelo Pessoa, e Vieira de Melo - as quais chegaram em Pernambuco no século XVII, antes ou durante a invasão holandesa (1630) (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021.).

O critério de escolha dessas famílias, em detrimento várias outras da nobreza da terra, consistiu na verificação da perpetuação das mesmas até ao menos finais do século XVIII, além da ativa atuação política e colaborativa nas Capitanias do Norte do Estado do Brasil, especialmente Pernambuco. Percebeu-se que os membros dessas famílias, além de atuarem por vezes nas mesmas câmaras municipais e instituições prestigiosas locais, realizaram vários requerimentos coletivos do início do século XVII até o terceiro quartel do século XVIII (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021., p. 85-90). Assim, as oito famílias analisadas, embora não se tratem da totalidade da nobreza da terra, compõem um universo de análise suficiente para algumas reflexões pertinentes.

Como se pode observar no Mapa 2, o sucesso dos produtores de açúcar da nobreza da terra dependeu do aproveitamento do potencial natural e logístico dos locais onde instalaram suas unidades produtivas. O mesmo mapa revela que a distribuição da propriedade dos engenhos da nobreza da terra analisada, embora não tenha seguido um único padrão, concentra ao menos metade de seus engenhos em uma única freguesia. A família Albuquerque (1.5) teve metade de seus engenhos (2) situados na freguesia do Cabo, Pernambuco. A família Albuquerque (2.3) teve metade de seus engenhos (4) situados na freguesia do Muribeca, Pernambuco. Os demais engenhos da família localizavam-se na freguesia da Luz, Pernambuco (2) e na capitania de Itamaracá (2).

Mapa 2
Distribuição geográfica dos engenhos da nobreza da terra nas capitanias de Itamaracá, Paraíba e Pernambuco (séculos XVI-XVIII)

A família Camelo Pessoa teve metade de seus engenhos (3) situados na freguesia da Várzea, Pernambuco, onde ainda arrendou um engenho, o que evidencia o interesse da família pela localidade. Os demais engenhos da família (3) situavam-se nas freguesias do Cabo e São Lourenço da Mata, ambas em Pernambuco, e ainda em Goiana, Itamaracá. A família Carneiro da Cunha, durante a primeira metade do século XVII, concentrou seus dois engenhos na freguesia de Ipojuca, Pernambuco. Mas, a partir de meados do século XVII, passou a estabelecer um sólido patrimônio na freguesia da Várzea, Pernambuco, onde deteve a propriedade de três engenhos. A partir de meados do século XVIII, essa família também passou a ter engenhos na freguesia de Igarassu, onde chegou a possuir quatro engenhos até o final do Setecentos (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021., p. 349).

A família Pais Barreto foi a que teve um maior sucesso no que se refere à concentração de bens em uma única freguesia, tendo em vista o número de engenhos que possuía. Dos 22 engenhos que possuiu, 12 situavam-se na freguesia do Cabo, Pernambuco. A família também concentrou muitos engenhos nas freguesias vizinhas, em Sirinhaém-Una (8) e Muribeca (1). Verificou-se que a família teve apenas um engenho situado fora dessas três freguesias de Pernambuco: o engenho Jacaré, em Itamaracá, cuja posse foi verificada apenas na primeira metade do século XVII (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021., p. 347).

As demais famílias analisadas apresentaram a localização dos seus engenhos de maneira mais dispersa. A família Vieira de Melo concentrou dois dos seus engenhos na freguesia de Igarassu, Pernambuco, dois na capitania de Itamaracá, e os outros dois engenhos que possuíram situavam-se em duas freguesias distintas de Pernambuco: Cabo e Ipojuca. Dos dez engenhos que a família Rego Barros chegou a possuir, dois localizavam-se na capitania da Paraíba, dois na freguesia de São Lourenço da Mata, Pernambuco, três na freguesia do Cabo, Pernambuco, na segunda metade do século XVIII, onde Francisco do Rego Barros foi “sócio” do engenho Juriçaca, vinculado ao morgado da família Pais Barreto, devido ao fato de ser casado com a irmã do sucessor do vínculo.25 25 Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba (CGPP), Liv. 481, n° 559; Liv. 485, fls. 85-86. Um morgadio, também chamado de morgado, tratava-se de uma vinculação de bens, pelo qual ficavam todos os membros da família sujeitos às suas regras que, na maior parte dos casos, estabeleciam a indivisibilidade e inalienabilidade patrimonial, e a sucessão linhagística por meio da primogenitura e varonia (Caldeira, 2007CALDEIRA, João Luís Picão. O morgadio e a expansão no Brasil. Lisboa: Tribuna, 2007.). Dos 19 engenhos que a família Cavalcanti possuía, seis concentraram-se na capitania de Itamaracá, quatro na capitania da Paraíba, fronteiriça ao norte com Itamaracá. Os demais nove engenhos da família localizavam-se em quatro diferentes freguesias de Pernambuco: Santo Amaro de Jaboatão, São Lourenço da Mata, Cabo e Ipojuca (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021., p. 349-350).

O fato de ao menos metade dos engenhos de cada uma das famílias da nobreza da terra analisadas ter se concentrado em uma única freguesia sugere que essas famílias buscaram consolidar e ampliar o seu patrimônio em determinadas freguesias, o que corrobora a importância da posse de terras de qualidade e bem localizadas para a perpetuação dessas famílias.

As linhagens quinhentistas e seiscentistas, enquanto conquistadoras e povoadoras do novo território português, tiveram ao seu favor, a mercê de extensas sesmarias, doações condicionadas de terras, com as quais angariaram um capital inicial. As sesmarias, por vezes, abrigaram a fundação de engenhos e de partidos de cana-de-açúcar, e quando não havia investimento para sua fundação, foram vendidas ou usadas como dote das filhas para que se casassem com indivíduos que poderiam estabelecer um engenho (Mauro, 1997MAURO, Frédéric. Portugal, o Brasil e o Atlântico, v. 1: 1570-1670. Lisboa: Estampa, 1997., p. 265-266; Mello, 1997MELLO, Evaldo Cabral de. Rubro veio: o imaginário da restauração pernambucana. 2ª ed.Rio de Janeiro: Topbooks, 1997., p. 414; 2012MELLO, Evaldo Cabral de. Olinda restaurada: guerra e açúcar no Nordeste, 1630-1654. 3ª ed. São Paulo: Editora 34, 2007., p. 26-27). Tal estratégia também foi praticada pelas principais famílias da nobreza da terra do Rio de Janeiro e da Bahia, as quais concentraram grandes extensões de terras por meio do recebimento de sesmarias desde o início do povoamento daquelas (Fragoso, 2000FRAGOSO, João. A nobreza da República: notas sobre a formação da primeira elite senhorial do Rio de Janeiro (séculos XVI e XVIII). Topoi(Rio de Janeiro). n. 1, p. 45-122, 2000., p. 68; Schwartz, 1988SCHWARTZ, Stuart B. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. São Paulo: Companhias das Letras, 1988.,p. 196).

A posse de engenhos bem localizados, no litoral ou próximo aos rios, pela possibilidade de obtenção de alimentos, pela riqueza do solo e pelos custos mais baixos de transporte, permitiu a resistência das principais famílias do grupo dos senhores de engenho da Bahia diante de crises temporárias (Schwartz, 1988SCHWARTZ, Stuart B. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. São Paulo: Companhias das Letras, 1988., p. 228). Consequência disso seria ainda as estratégias familiares para a manutenção de grandes domínios sesmariais, como a prática de vedar o acesso à terra a outros indivíduos através do apossamento ao redor de grandes propriedades, engenhos e fazendas, por herdeiros e prepostos da família proprietária do núcleo principal, como evidenciaram Francisco Carlos Teixeira da Silva (1990SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. A morfologia da escassez: crises de subsistência e política econômica no Brasil colonial (Salvador e Rio de Janeiro, 1680-1790). Tese (Doutorado em História), Universidade Federal Fluminense. Niterói, 1990.), Carmen Alveal (2007ALVEAL, Carmen Margarida Oliveira. Converting land into property in the Portuguese Atlantic World, 16th-18th century. Tese (Doutorado em História), Johns ­Hopkins University. Baltimore, 2007.) e Márcia Motta (2008MOTTA, Márcia Maria Menendes. Nas fronteiras do poder:conflito e direito à terra no Brasil do século XIX. 2ª ed.Rio de Janeiro: Eduff, 2008.).

Nessa consideração, para Stuart Schwartz (1998SCHWARTZ, Stuart B. A “babilônia” colonial: a economia açucareira. In: BETHENCOURT, Francisco; CHAUDHURI, Kirti(dir.) História da expansão portuguesa, v. 2: do Índico ao Atlântico (1570-1697). Lisboa: Círculo de Leitores, 1998., p. 221) o fluxo do caixa da atividade açucareira não é a melhor base para avaliar o negócio da produção de açúcar. Segundo o historiador, grande parte dos lucros iniciais desta indústria pode ter ocorrido sob a forma de criação de capital à medida que o valor dos bens aumentava mais do que o lucro, o que sugere uma taxa de poupança elevada.

Neste sentido, importa perceber o discurso nativista como forma de organização social na qual a exclusão de diferentes estratos sociais no processo de acumulação social e econômica gerou um “mercado imperfeito” e de acumulação excludente. Nessa sociedade, tal qual João Fragoso (2000FRAGOSO, João. A nobreza da República: notas sobre a formação da primeira elite senhorial do Rio de Janeiro (séculos XVI e XVIII). Topoi(Rio de Janeiro). n. 1, p. 45-122, 2000.) constatou para o caso da elite açucareira do Rio de Janeiro no Seiscentos, as oportunidades econômicas dos colonos eram diferenciadas, isto é, não dependiam apenas de recursos econômicos, implicando na reprodução de desigualdades e hierarquias sociais. Destaca-se que os membros dessas famílias atuaram ativamente em diferentes ofícios administrativos e militares (Lisboa, 2017LISBOA, Breno Almeida Vaz. “Uma das principais dos domínios de Vossa Majestade”:poder e administração na capitania de Pernambuco durante o reinado de D. João V. Tese (Doutorado em História), Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2017.). O exercício de tais poderes viabilizou práticas de usura, apropriação e direcionamento de verbas dos cofres públicos, além da intromissão direta em assuntos de interesse próprio (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021.; Souza, 2015SOUZA, George Felix Cabral de. Elites e exercício de poder no Brasil colonial: a Câmara Municipal do Recife, 1710-1822. Recife: Editora UFPE, 2015.).

Assim, outro aspecto relevante que deve ser considerado nesse processo de acumulação é a continuidade da posse dos engenhos por essas famílias.26 26 Thomas Piketty (2014, p. 565-636), mesmo para a sociedade atual, apontou a desigualdade como fruto de intensos processos históricos e da continuidade da acumulação de capital e de seus rendimentos, tendo destacado o papel fundamental da herança para acumulação a longo prazo. A este respeito observa-se que as famílias tiveram sucessos variáveis. Quatro das oito famílias analisadas conseguiram manter um ou mais engenhos como patrimônio por mais de uma centúria, e em alguns casos mais do que duas centúrias, especialmente as famílias quinhentistas. Os Albuquerque (2.3) continuaram com a propriedade do engenho Santo André e São João, também chamado de Novo, ambos na freguesia de Muribeca, Pernambuco, por ao menos 137 e 130 anos respectivamente. Os Rego Barros, por ao menos 187 anos continuaram com a propriedade do engenho Maciape, na freguesia de São Lourenço da Mata em Pernambuco. Os Cavalcanti, na capitania de Itamaracá, por pelo menos 146 anos foram proprietários do engenho Tracunhaém de Cima, também chamado de Mussumbú (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021., p. 300).

A família que mais se destacou no que concerne à continuidade da posse de engenhos, sem dúvida, foi a Pais Barreto. Essa família teve nada menos do que seis engenhos que continuaram em sua posse entre 171 e 257 anos. Trata-se dos engenhos Velho (257 anos), Algodoais (257 anos), Juriçaca (244 anos), Garapu (187 anos), Pirapama (174 anos) e Guerra (171 anos). Um dos fatores que viabilizaram a antiguidade da posse desses engenhos pela família Pais Barreto certamente deve-se à fortuna angariada pelo seu patriarca fundador, João Pais Barreto, o “velho”. Ele, até a segunda década do Seiscentos, fundou nove engenhos, sendo sete deles na freguesia do Cabo, e dois na freguesia do Una. Ademais, ele comprou o engenho Pirapama, também localizado no Cabo, em 1586, totalizando, assim, a propriedade de dez engenhos (Morais, 2021MORAIS, Ana Lunara da Silva. Em busca da perpetuação: reprodução social e poder econômico da nobreza da terra nas Capitanias do Norte, séculos XVI-XVIII. Tese (Doutorado em História), Universidade de Évora. Évora, 2021., p. 301). Tal fato corrobora que algumas famílias da nobreza da terra se beneficiaram da acumulação e valorização dos bens angariados ainda no início do povoamento da capitania.

As demais famílias que não tiveram a duração da posse de seus engenhos superior a um século também merecem atenção, pois a posse de engenhos em freguesias e mesmo em capitanias distintas poderia ser reflexo da busca dos membros dessas famílias por novos espaços de atuação nos quais se poderiam assentar e melhor se articular social e politicamente. Com efeito, a compra, troca ou arrematação de um engenho em um espaço novo poderia ter por objetivo a aproximação de determinadas famílias ou indivíduos. Ainda nesse sentido, devemos atentar que os casamentos e a consequente herança de engenhos e partidos de cana, ou mesmo a compra do engenho dos demais herdeiros por um casal, gerava a necessidade de mudança.

Temos notícia de um sólido exemplo para esse último caso. João Carneiro da Cunha, juntamente com sua esposa, Antônia da Cunha Souto Maior, comprou o engenho Araripe de Cima dos demais descendentes de seu falecido sogro na primeira metade do século XVIII. A família de João Carneiro da Cunha conservava em sua posse dois engenhos na central e disputada freguesia da Várzea, mas lhe coube de herança apenas um partido de cana de um dos engenhos e umas terras na capitania do Rio Grande do Norte. Tendo a possibilidade de ser proprietário de engenho, assim o fez, juntamente com a esposa, na freguesia de Igarassu, onde passou a atuar ativamente na câmara daquela localidade. Consta que o engenho permaneceu com os descendentes de João Carneiro da Cunha até pelo menos o ano de 1817 (Morais, 2020).

Dessa forma, diante da importância da terra como fator de produção, aponta-se que o acesso às melhores terras garantiu, através do domínio do potencial natural e logístico do ambiente, uma grande vantagem aos seus proprietários, especialmente aos assentados ainda no século XVI e início do século XVII.

As famílias da nobreza da terra, ao angariarem um capital inicial por meio da mercê de terras nas melhores localizações para a produção do açúcar, conseguiram, face à expansão dessa atividade nas Capitanias do Norte entre os séculos XVII e XVIII, um lugar privilegiado, fator que implicou uma disputa por recursos naturais. Suas propriedades foram sendo valorizadas e ampliadas, tendenciosamente, nas mesmas freguesias. Assim, o processo de consolidação social e econômica de famílias da nobreza da terra ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII dependeu do aproveitamento do potencial natural e logístico dos locais onde instalaram suas unidades produtivas.

Considerações finais

A degradação do bioma da Mata Atlântica nordestina, embora tenha ocorrido de maneira mais intensa a partir de meados do século XX (Barreto, 2013BARRETO, Cristiane Gomes. Devastação e proteção da Mata Atlântica nordestina: formação da paisagem e políticas ambientais. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Sustentável), Universidade de Brasília. Brasília, 2013.), remonta ao período colonial, especialmente pelas plantações de cana-de-açúcar para a produção do então valioso “ouro branco”. A atividade açucareira nas Capitanias do Norte, mesmo com o período de dificuldade durante a dominação holandesa (1630-1654), foi se expandindo, chegando Pernambuco a contar com mais de trezentos engenhos de produção de açúcar em finais do século XVIII.

O sucesso dessa atividade dependeu do acesso às melhores terras. Isto é, férteis - conhecidas como “massapê” -; próximas à floresta para extração da lenha que alimentava as fornalhas que coziam o caldo da cana-de-açúcar; e próximas aos rios para o transporte do açúcar até ao porto, de onde o produto era exportado. A qualidade das terras onde se cultivava a cana-de-açúcar influenciava diretamente na qualidade do açúcar que era produzido, logo, no preço dos diferentes tipos de açúcar. Em Pernambuco, nos séculos XVII e XVIII, ocorreram muitas querelas acerca das diferenças e alterações da qualidade do açúcar devido à má qualidade das terras de algumas lavouras entre outros fatores que aceleravam a deterioração do produto.

Pela importância da terra enquanto fator de produção observou-se que algumas famílias da nobreza da terra foram beneficiadas com a expansão da atividade açucareira. Isto porque estas famílias ocuparam, desde o início do povoamento, as principais freguesias produtoras de açúcar nas Capitanias do Norte. A posse de engenhos bem localizados, no litoral ou próximo aos rios, pela possibilidade de obtenção de alimentos, pela riqueza do solo e pelos custos mais baixos de transporte, isto é, do domínio do potencial natural do ambiente, propiciou a consolidação de algumas famílias da nobreza da terra ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII.

Essa sociedade agrícola açucareira, baseada na mercê de terras privilegiadas e da contínua exploração de mão-de-obra de pessoas escravizadas, foi acumulando capital material e simbólico ao longo dos séculos XVI, XVII e XVIII. Deve-se atentar ainda que o status social das famílias quinhentistas e seiscentistas, associado à sua antiguidade, ao mesmo tempo que legitimava as ações dos membros das famílias, também viabilizava o exercício do poder por outros meios. Nesse sentido, pode-se dizer que o acesso às posições prestigiantes, fosse pela outorga régia, fosse pelo exercício de patentes ou ofícios, por sua vez, viabilizava o acesso a outras posições igualmente nobilitantes, gerando um contínuo processo de acumulação de capital social e econômico, o que viabilizou a perpetuação das famílias da nobreza da terra.

Embora a perpetuação de algumas famílias da nobreza da terra seja consequência dessas atuações plurais e multifacetadas - além de terem utilizado continuamente o discurso nativista, pautado no merecimento de seus ancestrais - este artigo buscou demonstrar como a capacidade de maximização e domínio do potencial natural e logístico dos lugares onde se assentaram propiciou não apenas o desenvolvimento da atividade açucareira, mas ainda a consolidação de um grupo de produtores de açúcar durante os séculos XVI, XVII e XVIII.

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  • 1
    O papel do ambiente nas interpretações desses três autores foi analisado no seguinte estudo: Barreto, Lopes, Vital (2017).
  • 2
    Em 1546, o donatário de Pernambuco, Duarte Coelho, informava ao rei que os engenhos se encontravam espalhados pela capitania. Há ainda estudiosos que afirmam que a primeira feitoria de Pernambuco data de 1516, embora sem boas comprovações (Costa, 1983, p. 84).
  • 4
    Dos quais cinco eram engenhocas.
  • 5
    Dos quais 11 eram engenhocas que produziam apenas mel de cana-de-açúcar e rapadura.
  • 6
    Tratava-se de engenhos de fabricação de mel de cana-de-açúcar e rapadura, os quais quase não produziam açúcar.
  • 7
    A atividade açucareira continua até a atualidade, sendo os estados de Pernambuco e Alagoas responsáveis por mais de 7% de toda a cana-de-açúcar cultivada no Brasil (Nocelli et al., 2017, p. 23).
  • 8
    Arquivo Histórico Ultramarino (AHU), “Carta Régia (cópia) da rainha regente D. Luísa de Gusmão proibindo a abertura de novos engenhos no Recôncavo da Bahia em lugares prejudiciais à lenha e à cana-de-açúcar”, Bahia, Cx. 2, doc. 123. AHU, “Parecer do Conselho Ultramarino sobre o levantamento de novos engenhos no Estado do Brasil, recomendando que o vice-rei daquele Estado, conde de Óbidos, faça todas as diligências possíveis para informar a respeito da viabilidade da criação desses novos engenhos sem prejuízo dos que ali já existem, atendendo aos gastos que tal representaria com as despesas em terras, escravos, gados, canaviais e lenha”, Brasil, Cx. 1, doc. 62. AHU, “Alvará do príncipe regente [D. Pedro], proibindo a partir daquele momento a construção de novos engenhos de açúcar no Brasil, sem licença dos governadores das capitanias”, Brasil, Cx. 1, doc. 94.
  • 9
    AHU, Pernambuco, Cx. 73, doc. 6140, “Carta dos oficiais da Câmara de Olinda ao rei [D. José I], sobre o envio de um manifesto dos fabricantes de açúcar indignados com a nova Mesa da Inspeção”.
  • 10
    AHU, Pernambuco, Cx. 73, doc. 6140. AHU, “Carta dos senhores de engenho sobre a injustiça de os punir sobre as alterações da qualidade de diminuição dos pesos das caixas do açúcar”, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364.
  • 11
    AHU, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364.
  • 12
    DECRETO sobre o que deve pagar o açúcar nas Alfândegas desse reino. 27 de janeiro de 1751. Coleção dos regimentos reais. Fls. 86-87. In: Projeto “O governo dos outros: imaginários políticos no Império português”. Disponível em: http://www.governodosoutros.ics.ul.pt/imagens_livros/20_sistema_regimentos/vol_ii/0086.jpg. Acesso em: set. 2020.
  • 13
    Observou-se na capitania da Bahia em meados do século XVIII, a produção de quase todas as qualidades de açúcar arroladas pelo mencionado decreto de 1751 que regulou os preços do gênero.
  • 14
    AHU, “Carta (2ª via) do [governador da capitania de Pernambuco], Félix José Machado [de Mendonça Eça Castro e Vasconcelos], ao rei [D. João V], sobre um bando que lançou com relação às marcações das caixas de açúcar”, Pernambuco, Cx. 26, doc. 2356.
  • 15
    AHU, Pernambuco, Cx. 73, doc. 6140.
  • 16
    AHU, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364.
  • 17
    AHU, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364. AHU, Pernambuco, Cx. 128, doc. 9744, “Ofício do [governador da capitania de Pernambuco], José César de Meneses, ao [secretário de estado da Marinha e Ultramar], Martinho de Melo e Castro, sobre o inverno chuvoso que prejudicou a plantação da cana e a safra”.
  • 18
    AHU, Pernambuco, Cx. 108, doc. 8364.
  • 19
    Foram contabilizados somente os engenhos em atividade, ou seja, os “moentes”. Não foram adicionados na tabela os engenhos que por diferentes motivos encontravam-se fora de atividade, chamados de “fogo morto”. Essa relação de engenhos indica que existiam 39 engenhos de fogo morto em Pernambuco, e sete em Itamaracá.
  • 20
    Dos quais cinco eram engenhocas.
  • 21
    Dos quais cinco eram engenhocas.
  • 22
    As freguesias Muribeca, Cabo e Ipojuca pertenceram à jurisdição de Olinda até o ano da criação da vila do Recife em 1710, quando esta passou a ser detentora de tal jurisdição (Souza, 2009, p. 81-96).
  • 23
    Trata-se da descendência de Joana de Albuquerque, quinta filha que Jerônimo de Albuquerque teve com a índia tabajara Maria do Espírito Santo Arcoverde.
  • 24
    Trata-se da descendência de Cristóvão de Albuquerque, terceiro filho de Jerônimo de Albuquerque com dona Filipa de Melo, sua segunda união.
  • 25
    Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba (CGPP), Liv. 481, n° 559; Liv. 485, fls. 85-86.
  • 26
    Thomas Piketty (2014, p. 565-636), mesmo para a sociedade atual, apontou a desigualdade como fruto de intensos processos históricos e da continuidade da acumulação de capital e de seus rendimentos, tendo destacado o papel fundamental da herança para acumulação a longo prazo.
  • 3
    Acredita-se que esse número, apontado por Antonil em 1710, acerca dos engenhos de Pernambuco, tendo em vista o número de engenhos existentes nessa capitania no período anterior e posterior, seja exagerado. Possivelmente tal número inclui os engenhos das capitanias de Itamaracá, Paraíba e Rio Grande do Norte.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    30 Abr 2021
  • Aceito
    05 Nov 2021
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