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Efeito da heparina sódica e da enoxaparina na consolidação de fratura da tíbia no rato: avaliação clínica e anatomopatológica e biomecânica

Resumos

Foi realizado estudo experimental em ratos para avaliar o efeito do anticoagulante na consolidação óssea, conforme critérios clínicos, anatomopatológicos e biomecânicos. Manualmente, após perfuração do osso, foi produzida fratura aberta, na diáfise da tíbia direita, mantida sem imobilização, em 72 ratos machos da linhagem Wistar, com 60 dias de idade e peso médio de 242 gramas. Doze horas após a fratura, foi iniciado tratamento anticoagulante, mantido por 28 dias. Via subcutânea, um grupo recebeu heparina sódica na dose de 200UI/Kg de 12 em 12 horas, enquanto outro, recebeu enoxaparina na dose de 1mg/Kg de 12 em 12 horas, doses preconizadas para tratamento do tromboembolismo em humanos. O terceiro grupo, controle, recebeu água destilada. Durante o experimento, os animais foram avaliados clinicamente e após 28 dias, sacrificados. Nos animais dos três grupos, a evolução clínica foi semelhante. Mediante análise anatomopatológica efetuada por estudo descritivo e quantitativo, foi observada presença de fibrose, cartilagem e osso igualmente nos três grupos, sempre com predomínio de tecido ósseo. O estudo biomecânico, realizado por intermédio de ensaios de flexão, demonstrou coeficiente de rigidez e carga máxima semelhantes nos três grupos. Nenhuma diferença clínica, anatomopatológica e biomecânica foi encontrada, resultando todas as fraturas em consolidação de acordo com os critérios adotados, concluindo-se, portanto, que a heparina sódica e a enoxaparina nas doses, via e tempo de administração utilizados não interfiriram na consolidação da fratura da tíbia do rato.

Fraturasda tíbia; Cicatrização de feridas; Ratos de cepas endogâmicas; Heparina; Heparina de baixo peso molecular; Biomecânica; Histologia


An experimental study in rats was accomplished to evaluate the effect of anticoagulant on fracture union, according to clinical, anatomopathological, and biomechanical approaches. Manually, after bone perforation, fracture was produced in the diaphysis of the right tibia, and maintained without immobilization in 72 male rats of Wistar lineage, each 60 days in age with a medium weight of 242 grams. Twelve hours after the fracture, anticoagulant treatment was initiated, and maintained for 28 days. One group received subcutaneous heparin-sodium in a dose of 200 UI/kg every 12 hours, while another group received enoxaparin in a dose of 1mg/kg every 12 hours, doses preconized for treatment of thromboembolism in humans. The third group, the control, received distilled water. During the experiment, the animals were clinically evaluated and after 28 days, sacrificed. In the animals of the three groups, the clinical evolution was similar. By means of anatomopathological analysis made by descriptive and quantitative study, the presence of fibrosis, cartilage, and bone was homogeneous among in the three groups, always with a prevalence of osseous tissue. The biomechanical study, accomplished through a flexion test, demonstrated a stiffness rate and maximum load similar in the three groups. No clinical, anatomopathological, or biomechanical differences were found, resulting in consolidation of all the fractures in agreement with the adopted approaches, concluding that the heparin-sodium and the enoxaparin in these doses, method, and time of administration used did not interfere with the consolidation of tibia fracture in the rat.

Tibia fractures; Wound healing; Rats, Inbred strains; Heparin; Low molecular weight heparin; Biomechanics; Histology


ARTIGO ORIGINAL

Efeito da heparina sódica e da enoxaparina na consolidação de fratura da tíbia no rato: avaliação clínica e anatomopatológica e biomecânica

Emilio Carlos CurcelliI; Sérgio Swain MüllerII; Anete Kinumi UedaIII; Carlos Roberto PadovaniIV; Francisco Humberto de Abreu MaffeiV; William Saad HossneVI

IProfessor Assistente

IIProfessor Assistente Doutor

IIIProfessora Assistente Doutora - Departamento de Patologia

IVProfessor Titular - Departamento de Bioestatística

VProfessor Titular

VIProfessor Emérito

Endereço para Correspondência Endereço para correspondência Departamento de Cirurgia e Ortopedia Faculdade de Medicina de Botucatu - Unesp Campus de Rubião Júnior Cep: 18.618-970 Botucatu - SP E-mail: curcelli@fmb.unesp.br

RESUMO

Foi realizado estudo experimental em ratos para avaliar o efeito do anticoagulante na consolidação óssea, conforme critérios clínicos, anatomopatológicos e biomecânicos. Manualmente, após perfuração do osso, foi produzida fratura aberta, na diáfise da tíbia direita, mantida sem imobilização, em 72 ratos machos da linhagem Wistar, com 60 dias de idade e peso médio de 242 gramas. Doze horas após a fratura, foi iniciado tratamento anticoagulante, mantido por 28 dias. Via subcutânea, um grupo recebeu heparina sódica na dose de 200UI/Kg de 12 em 12 horas, enquanto outro, recebeu enoxaparina na dose de 1mg/Kg de 12 em 12 horas, doses preconizadas para tratamento do tromboembolismo em humanos. O terceiro grupo, controle, recebeu água destilada. Durante o experimento, os animais foram avaliados clinicamente e após 28 dias, sacrificados. Nos animais dos três grupos, a evolução clínica foi semelhante. Mediante análise anatomopatológica efetuada por estudo descritivo e quantitativo, foi observada presença de fibrose, cartilagem e osso igualmente nos três grupos, sempre com predomínio de tecido ósseo. O estudo biomecânico, realizado por intermédio de ensaios de flexão, demonstrou coeficiente de rigidez e carga máxima semelhantes nos três grupos. Nenhuma diferença clínica, anatomopatológica e biomecânica foi encontrada, resultando todas as fraturas em consolidação de acordo com os critérios adotados, concluindo-se, portanto, que a heparina sódica e a enoxaparina nas doses, via e tempo de administração utilizados não interfiriram na consolidação da fratura da tíbia do rato.

Descritores: Fraturasda tíbia; Cicatrização de feridas; Ratos de cepas endogâmicas; Heparina; Heparina de baixo peso molecular; Biomecânica; Histologia.

INTRODUÇÃO

Os anticoagulantes têm sido cada vez mais indicados como medida terapêutica ou profilática da doença tromboembólica, em pacientes com fraturas(8). Considerando-se a freqüência com que se administram anticoagulantes em pacientes com fraturas, torna-se pertinente indagar se os anticoagulantes podem alterar o processo de reparação óssea.

Trueta(19) e Buckwalter & Cruess(3), em textos clássicos da literatura traumato-ortopédica, afirmaram que os anticoagulantes retardam o processo de consolidação. Outros autores confirmam esta hipótese(1,4,10,12,16,18,20) Entretanto, em outros estudos, não se encontrou interferência de anticoagulants no processo de reparação das fraturas ósseas(2,5,13,14,17).

Considerando as divergências encontradas na literatura, esta investigação foi desenvolvida com o objetivo de estudar, por meio de avaliação clínica, anatomopatológica e biomecânica, o efeito da heparina sódica e da enoxaparina na consolidação óssea, utilizando modelo experimental de fratura aberta em tíbia de rato. A presente investigação foi aprovada pela Comissão de Ética na Experimentação Animal da Faculdade de Medicina de Botucatu, Unesp.

MATERIAL E MÉTODO

Foram utilizados 72 ratos machos da linhagem Wistar, com 60 dias de idade, peso médio de 242g, fornecidos pelo Biotério Central da UNESP - Campus de Botucatu. Por sorteio, foram formados seis grupos: A1 e A2, controles, que receberam água destilada, B1 e B2, enoxaparina e C1 e C2, heparina sódica. Três grupos, compostos por oito animais cada, foram utilizados para o estudo anatomopatológico (A1, B1 e C1) e outros três, de 16 animais cada, para estudo biomecânico (A2, B2 e C2). Após sete dias de adaptação, foi produzida fratura aberta na diáfise da tíbia. Para a realização da fratura, utilizando-se de técncas de assepsia e antissepsia, inicialmente foi feita perfuração no ponto médio da tíbia com broca de 1mm acoplada a furadeira elétrica. Após a perfuração a fratura foi completada manualmente. Não foi utilizado qualquer tipo de imobilização. A administração das drogas foi iniciada 12 horas após a fratura e repetida a cada 12 horas, durante 28 dias. No grupo A (controle) os animais receberam 0,1ml/kg/dia de água destilada; no grupo B, 2 mg/kg/dia de enoxaparina e no grupo C, 400 UI/kg/dia de heparina sódica. As drogas foram administradas por via subcutânea. Não foram realizados testes para controle da coagulação, em razão das alterações esperadas (com estas drogas e nestas doses) já serem conhecidas em nosso laboratório, a partir de dados da padronização do modelo disponíveis na literatura e de outros trabalhos realizados em nosso serviço(6,9).

Após 28 dias da produção da fratura, os animais foram mortos com dose letal de pentobarbital sódico e a tíbia direita removida. As análises efetuadas foram clínica, anatomopatológica e biomecânica. As características histológicas dos calos de fratura foram descritas de acordo com a quantidade dos diferentes tecidos (fibrose, cartilagem e osso); dimensão do calo de fratura; alinhamento das extremidades ósseas primárias presença de necrose no local da fratura e nas extremidades ósseas primárias; aspectos das medulas ósseas (primária e neoformada); presença de processo inflamatório (inespecífico e granulomatoso tipo corpo estranho).

A quantidade dos diferentes tipos de tecidos foi classificada em escala de 0 a 3 (0-ausente; 1-pequena quantidade; 2-moderada quantidade; 3-grande quantidade). O resultado foi submetido a teste estatístico não paramétrico de Friedman e Kruskal-Wallis.

Para a análise biomecânica foi realizado ensaio de flexão de três pontos com a máquina universal de ensaios tipo eletromecânica do Laboratório Experimental do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP. A carga foi aplicada até a ruptura do corpo de prova. Não foi utilizada pré-carga. O ensaio mecânico foi realizado conforme a seguinte padronização: célula de carga: 5000 N; sentido: compressão; velocidade de aplicação da carga: 30x10-3m/min; escalas:3000N(ordenada)e 2,5 m 10-3 (abscissa) (Figura 1 a-b).


RESULTADO

Aspectos Clínicos

Não foram observadas diferenças no comportamento dos animais nos três grupos. Não foram constatadas presença de infecção, ou formação de hematoma no local de aplicação do medicamento.

No 27º dia pós-operatório, um rato do grupo controle morreu., não sendo possível identificar a causa da morte.Três animais foram excluídos do experimento. Um do grupo controle, por morte. Um do grupo B (enoxaparina) e outro do grupo C (heparina sódica), em virtude da quebra do osso no momento da dissecção.

Análise Anatomopatológica

Nos oito animais do subgrupo A1 (controle), o calo de fratura apresentou tecido ósseo predominante em todos os animais e, em geral, em grande quantidade; ilhas de tecido cartilaginoso em cinco animais: dois, em pequena e três, em moderada quantidade; áreas de fibrose em sete animais, na maioria em pequena quantidade; havia concomitância de tecido cartilaginoso, em cinco.

O tecido ósseo mostrou-se, em geral, maduro ou em maturação, com aspectos de ossificação endocondral, apresentando rima de osteoblastos e raros focos de osteoclastos. A neoformação óssea localizava-se, principalmente, na região periférica do calo, em continuidade com o periósteo do osso primário; estava presente também em menor quantidade na região central. A proliferação de tecido ósseo foi sempre mais intensa quando, no local da fratura, as extremidades ósseas primárias não estavam justapostas. Nestes casos, o tamanho do calo de fratura também foi maior.

O tecido cartilaginoso, quando presente, era maduro e sem localização preferencial no calo.

Nos sete casos com fibrose, havia cinco de associação a fragmentos ósseos necróticos e cinco em associação a granuloma tipo corpo estranho a pêlos dos animais.

De permeio ao calo de fratura, havia também neoformação de medula óssea, normocelular, ao passo que a medula óssea do osso primário mostrou-se sempre hipercelular. Em ambas, foram observados vários focos de hemorragia e, em alguns animais, presença de macrófagos com pigmentos de hemossiderina.

Em todos os animais, observaram-se extremidades ósseas primárias viáveis, em continuidade com a neoformação óssea do calo e ausência de processo inflamatório inespecífico (Figura 2).


Nos calos de fratura dos animais tratados com enoxaparina, observaram-se predominância de tecido ósseo; tecido cartilaginoso presente em apenas dois animais; um, com pequena, e outro, com moderada quantidade; fibrose em cinco animais, predominantemente, em pequena quantidade.

Esse subgrupo demonstrou semelhanças com o controle, pela neoformação predominante de tecido ósseo no calo de fratura, com proliferação preferencialmente periférica e presença de ossificação endocondral. Houve também correspondência entre a quantidade de tecido ósseo neoformado e o tamanho do calo. Quanto à quantificação desta neoformação, foram observados dois animais com pequena, três com moderada e os outros três com grande quantidade. Os tamanhos dos calos de fratura dos animais tratados com enoxaparina foram, em geral, menores do que os do controle.

O tecido cartilaginoso, maduro e de distribuição aleatória no calo, foi observado em apenas dois animais, número menor que no controle.

Encontrou-se fibrose em cinco casos; em três, estava relacionada a processo granulomatoso a pêlos, lamelas córneas, tecido necrótico e hemossiderina. Em um animal, a fibrose estava associada a mínimos fragmentos ósseos necróticos. As medulas ósseas, tanto a preexistente (hipercelular) quanto a neoformada (normocelular), demonstraram morfologias semelhantes às do subgrupo controle, com focos de hemorragia.

Em todos os animais observaram-se extremidades ósseas primárias viáveis, em continuidade com a neoformação óssea e ausência de processo inflamatório inespecífico (Figura 3).


Nos animais tratados com heparina foram encontrados no calo de fratura predomínio, em todos, de tecido ósseo neoformado, em geral, em moderada quantidade; tecido cartilaginoso em quatro animais um, em pequena e três, em moderada quantidade; fibrose em sete animais, seis, com mínima ou pequena quantidade e um, em moderada quantidade.

Comparado aos dois subgrupos anteriores, notou-se semelhança quanto ao predomínio de tecido ósseo, aos aspectos de ossificação endocondral e à localização principal periférica. Porém, nos animais desse subgrupo, a quantidade de osso neoformado foi, em geral, menor que nos do subgrupo controle e, também do subgrupo tratado com enoxaparina. Quanto ao tamanho dos calos de fratura, houve sempre correlação entre a quantidade de tecido ósseo neoformado com o alinhamento das extremidades ósseas, como observado nos subgrupos anteriores. A maioria dos animais submetidos ao tratamento com heparina demonstrou calos ósseos menores do que os dos subgrupos controle e da enoxaparina.

O tecido cartilaginoso mostrou-se semelhante ao dos demais subgrupos no que se refere à sua maturação e distribuição aleatória no calo. Esteve presente em quatro animais: um, em pequena e três em moderada quantidade, número semelhante aos do controle (cinco) e maior do que nos tratados com enoxaparina (dois casos).

A fibrose, também semelhante à dos outros subgrupos, esteve, geralmente, relacionada aos fragmentos ósseos necróticos (quatro casos) ou aos granulomas tipo corpo estranho a pêlos, lamelas córneas e material necrótico (quatro casos).

Os aspectos das medulas ósseas, preexistente (hipercelular) e neoformada (normocelular), ambas com focos hemorrágicos, foram equivalentes aos dos animais dos subgrupos anteriores.

Em todos os animais foram observadas extremidades ósseas primárias viáveis e ausência de inflamação inespecífica. (Figura 4).


A avaliação quantitativa dos diferentes tipos de tecido encontrados no calo de fratura dos animais utilizados para estudo anatomopatológico (subgrupos A­1, B1, C1) (Tabela 1).

Análise Biomecânica

Os dados referentes ao peso das tíbias dos animais utilizados para o estudo biomecânico (subgrupos A2, B2, C2) estão apresentados na tabela 2. A Tabela 3 apresenta os dados obtidos para carga máxima nos subgrupos A2, B2 e C2. Na Tabela 4, os valores do coeficiente de rigidez nos subgrupos A2, B2 e C2.

DISCUSSÃO

As doses de heparina sódica e enoxaparina utilizadas neste trabalho correspondem às preconizadas para tratamento da tromboembolia em humanos(15) A administração dos anticoagulante foi iniciada 12 horas após a produção da fratura e mantida por 28 dias, estando, portanto, os anticoagulantes presentes em praticamente todas as fases do processo de consolidação óssea, excetuando-se a fase de remodelação.

Os animais foram mortos após tempo considerado suficiente para a consolidação do osso, de acordo com Müller(11).

Análise Clínica

A uniformidade do comportamento dos animais nos três grupos e, sobretudo, o fato de todos os animais apoiaram a pata afetada aproximadamente uma semana após a realização da fratura, mantendo evolução clínica semelhante, possibilita inferir que, clinicamente, o tratamento anticoagulante não interferiu na consolidação do osso desde as suas fases iniciais.

Análise Anatomopatológica

Ham(7) identificou três fases no processo de consolidação: granulação, proliferação e remodelação, que podem estar presentes simultaneamente, com predomínio de uma ou outra, dependendo do instante do processo de consolidação.

A primeira fase, intitulada granulação, caracteriza-se pela formação do hematoma e presença de células inflamatórias, incluindo leucócitos polimorfonucleares, macrófagos e linfócitos. Com a regressão da resposta inflamatória, o tecido necrótico e o exsudato são reabsorvidos e aparecem os fibroblastos(3). Distúrbios nesta fase como, formação insuficiente de coágulo de fibrina(18), presença mais persistente do hematoma(8), hemorragia no local da fratura(1), formação de extenso hematoma com conseqüente déficit de vascularização(16) e consistência mais fluida do hematoma(19), atribuídos à ação dos anticoagulantes, poderiam interferir no processo de consolidação.

Entretanto, Flatmark(5) não encontrou alterações na formação de fibrina nos animais tratados com anticoagulantes e nem interferência do tamanho do hematoma no processo de consolidação. Nosny et al.(13) promoveram lise do coágulo interfragmentário e não encontraram alterações na consolidação óssea.

A segunda fase, proliferativa, se caracteriza pela marcante presença de células mesenquimais pluripotentes no local da fratura. Segundo a maioria dos autores, os anticoagulantes podem induzir alterações na fase proliferativa da consolidação. Stinchfield et al.(18) encontraram diminuição do número de células da matriz óssea; Minola et al.(10), fibrose central e estágio cartilaginoso mais prolongado; Aulisa(1), retardo na formação de novo osso e calo maior e mais intensamente dominado por cartilagem; Rokkanen & Slätis(16), calo em maturação por tempo mais prolongado, com maior formação de cartilagem; Flatmark(5), abundante formação de tecido cartilaginoso; Dodds et al.(4), retardo da ossificação do calo de fratura, Nilsson & Granström(12), aumento da reação condróide; Wikesjo et al.(20), menor quantidade de tecido de reparação.

Excessiva formação de tecido cartilaginoso foi atribuída ao desvio da normalidade do processo de reparação(10), maior extensão do hematoma ou à "alguma propriedade intrínseca" do anticoagulante(1) e à pobre vascularização(16). Flatmark(5)e Nilsson & Granström (12) não explicaram o fenômeno.

Neste experimento, os animais foram mortos na quarta semana após fratura. Não foi encontrado predomínio de tecido condróide que pudesse evidenciar estágio cartilaginoso mais prolongado. Fibrose, cartilagem e osso foram encontrados simultaneamente em todos os subgrupos, com predomínio de tecido ósseo.

Para a confirmação das observações do estudo descritivo, utilizou-se método que permitisse a quantificação dos tecidos do calo, traduzindo em números a impressão subjetiva da descrição histológica. Foi adotado método similar ao de Müller (11).

A análise estatística dos resultados demonstrou que em todos os subgrupos houve predomínio de tecido ósseo, e que a quantidade de tecido fibroso, cartilaginoso e ósseo foi semelhante comparando-se os subgrupos. Assim, não foi constatada, histologicamente, nenhuma diferença na composição tecidual do calo de fratura, com evidentes aspectos de consolidação, compatível com os trabalhos citados na literatura, com exceção de Stinchfield et al.(19) e Dodds et al.(4).

Stinchfield et al.(18) e Dodds et al.(4) utilizaram ossos esponjosos em seus experimentos, diferentemente da maioria dos estudos citados e desta investigação, em que foram utilizados ossos corticais. Como os ossos esponjosos apresentam área de superfície, vascularidade e celularidade maiores que os corticais(3), talvez sejam mais susceptíveis à ação do anticoagulante, durante o processo de consolidação.

Análise Biomecânica

Os animais utilizados neste estudo apresentaram as mesmas características em relação à idade, sexo e peso corpóreo, variando somente o tratamento instituído a cada grupo. O peso das tíbias fraturadas e utilizadas para estudo biomecânico foi semelhante nos três subgrupos, indicando que o tratamento não interferiu no peso dos ossos e que se fossem encontradas diferenças nos testes biomecânicos, não poderiam ser atribuídas ao fator peso dos ossos.

A velocidade aplicada, de 30mm/min, é considerada média. Ensaios realizados com velocidades médias ou baixas permitem maior segurança e possibilitam a acomodação progressiva do corpo de prova, apoiado sem fixação, pois a própria carga fixa o material durante o ensaio.

Nesta investigação, optou-se pelo estudo das propriedades mecânicas relativas à estrutura: carga máxima necessária à ruptura e coeficiente de rigidez (constante K).

O valor da carga máxima é indicado pelo relatório de ensaio e corresponde ao limite de resistência do material antes da ruptura. O valor do coeficiente de rigidez é calculado valendo-se do diagrama carga-deformação, também fornecido pelo relatório de ensaio.

Os dados de carga máxima e coeficiente de rigidez são complementares. A análise baseada somente em uma dessas propriedades pode levar à errônea conclusão de que materiais diferentes apresentam as mesmas propriedades mecânicas, pois materiais de diferentes elasticidades podem exigir a mesma força para a ruptura ou vice-versa. A associação dos valores da carga máxima e do coeficiente de rigidez permite a avaliação mais precisa das propriedades mecânicas do material.

Flatmark(5) foi o único autor a realizar estudo biomecânico como critério para avaliar o efeito dos anticoagulantes na reparação óssea. Utilizando ensaio de tração, testou fraturas de rádio de coelhos em diversas fases do experimento e observou que, nos animais em tratamento anticoagulante, a rigidez do osso foi aumentando gradativamente até seis semanas após fratura, quando se tornou semelhante à do grupo controle.

No presente experimento, constatou-se semelhança das propriedades mecânicas analisadas, indicando que não houve influência dos anticoagulante na consolidação óssea, mediante estudo biomecânico.

CONCLUSÃO

Mediante a proposição, a metodologia aplicada e a análise dos resultados obtidos nas avaliações clínicas, anatomopatológicas e biomecânicas, foi possível concluir que a administração de enoxaparina e de heparina sódica, em ratos, não interferiu na consolidação óssea.

Trabalho recebido em: 14/01/04

Aprovado em 16/12/04

Trabalho realizado no Departamento de Cirurgia e Ortopedia (DCO) da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB) Unesp

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  • Endereço para correspondência

    Departamento de Cirurgia e Ortopedia Faculdade de Medicina de Botucatu - Unesp
    Campus de Rubião Júnior
    Cep: 18.618-970 Botucatu - SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Maio 2005
    • Data do Fascículo
      2005

    Histórico

    • Aceito
      16 Dez 2004
    • Recebido
      14 Jan 2004
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