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Classificação de McCormack e colapso sagital na fratura toracolombar explosão

Resumos

O aumento da cifose toracolombar após tratamento conservador da fratura tipo explosão é complicação constatada por vários autores. Realizamos estudo retrospectivo com 33 portadores de fratura toracolombar do tipo explosão submetidos ao tratamento conservador entre 1992 a 2004 para verificar a correlação entre a cifose toracolombar e a Classificação de McCormack, que pontua a gravidade da fratura conforme a cominuição do corpo, o deslocamento dos fragmentos no corpo vertebral e a quantidade de correção da deformidade em cifose após o tratamento. Após 30 meses de seguimento médio, verificamos correlação entre a pontuação da Classificação de McCormack, conhecida na literatura como load sharing classification, e o colapso vertebral sagital nestes pacientes (p<0,05;r=0,65). A despeito de ser descrita para avaliação do colapso sagital após o tratamento cirúrgico, a aplicabilidade desta Classificação pode ser considerada para os portadores de fratura toracolombar explosão submetidos ao tratamento conservador.

Traumatismos da medula espinal; Fraturas da coluna vertebral; Vértebras lombares


The increasing incidence of thoracolumbar kyphosis after conservative treatment of burst fractures is a complication reported by several authors. We performed a retrospective study on a consecutive series of 33 patients with thoracolumbar burst fractures treated with cast or brace immobilization between 1992 and 2004 to check for a correlation between thoracolumbar kyphosis and Load Sharing Classification, which provides fracture severity scores according to body comminution, vertebral body fragments displacement and the amount of kyphosis correction delivered after treatment. After an average of 30 months of follow-up we found a correlation between Load Sharing Classification scores (also known as McCormack's Classification), and the sagittal kyphotic deformity on these patients (p<0.05;r=0.65). Despite of being described for assessing sagittal deformity after surgical treatment, the applicability of this Classification can be considered for patients with thoracolumbar burst fractures submitted to conservative treatment.

Spinal cord injuries; Spinal fractures; Lumbar vertebrae


ARTIGO ORIGINAL

Classificação de McCormack e colapso sagital na fratura toracolombar explosão

Osmar AvanziI; Lin Yu ChihII; Robert MevesIII; Maria Fernanda Silber CaffaroII; Rodrigo RezendeIV; Carlos Abdalla CastroV

IProfessor Doutor Adjunto do Grupo de Coluna do DOT-FCMSCSP

IIMédico Assistente do Grupo de Coluna do DOT-FCMSCSP

IIIProfessor Doutor Assistente do Grupo de Coluna do DOT-FCMSCSP

IVPós-Graduando do DOT-FCMSCSP

VMédico Estagiário do Grupo Coluna do DOT-FCMSCSP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Dr. Cesário Motta Junior 112,Vila Buarque,São Paulo,Capital CEP:01221-020 e-mails: coluna@santacasasp.org.br; robertmeves@hotmail.com

RESUMO

O aumento da cifose toracolombar após tratamento conservador da fratura tipo explosão é complicação constatada por vários autores. Realizamos estudo retrospectivo com 33 portadores de fratura toracolombar do tipo explosão submetidos ao tratamento conservador entre 1992 a 2004 para verificar a correlação entre a cifose toracolombar e a Classificação de McCormack, que pontua a gravidade da fratura conforme a cominuição do corpo, o deslocamento dos fragmentos no corpo vertebral e a quantidade de correção da deformidade em cifose após o tratamento. Após 30 meses de seguimento médio, verificamos correlação entre a pontuação da Classificação de McCormack, conhecida na literatura como load sharing classification, e o colapso vertebral sagital nestes pacientes (p<0,05;r=0,65). A despeito de ser descrita para avaliação do colapso sagital após o tratamento cirúrgico, a aplicabilidade desta Classificação pode ser considerada para os portadores de fratura toracolombar explosão submetidos ao tratamento conservador.

Descritores: Traumatismos da medula espinal; Fraturas da coluna vertebral/terapia; Vértebras lombares.

INTRODUÇÃO

Holdsworth et al.(1), em 1963, classificaram as fraturas toracolombares com base no modelo de duas colunas, divididas pelo ligamento longitudinal posterior, e ainda descreveram a fratura do tipo explosão, como sendo uma lesão secundária à ruptura do corpo vertebral após carga axial. Denis(2), em 1983, redefiniu estas fraturas com três colunas: coluna anterior, média e posterior. A fratura explosão apresentava falha na coluna média e anterior.

Não há consenso quanto ao tratamento nestas fraturas, especialmente nos pacientes sem déficit neurológico. Nestes casos, o risco de colapso sagital – piora da cifose toracolombar - é uma das complicações do tratamento não operatório. Assim, uma das vantagens do tratamento cirúrgico é o melhor resultado em relação à cifose pós-traumática(3,4). A possibilidade de prever o colapso sagital pode, portanto, auxiliar a definição do tratamento(5,6).

Muitas classificações foram criadas, como a de Denis(2) e de Gertzbein(7,8) com o intuito de definir a melhor proposta de tratamento(3,6,9), mas a Classificação de McCormack, conhecida na literatura internacional como Load Sharing, mostra que a cominução do corpo vertebral, o deslocamento dos fragmentos da fratura e a correção da cifose são elementos que influenciam a falha de instrumentação metálica pelo colapso sagital nestas fraturas.(3) Posteriormente, Aligizakis et al (4,6)mostram a aplicabilidade desta classificação para predizer a cifose pós-traumática e o resultado funcional dos pacientes submetidos ao tratamento conservador nestas fraturas.

A proposta deste estudo foi avaliar a correlação entre a Classificação de McCormack e o colapso vertebral no plano sagital nos pacientes portadores de fratura toracolombar explosão tratados conservadoramente mediante uso de gesso ou órtese TLSO em hiper-extensão.

MATERIAIS E MÉTODOS

Foi realizado estudo retrospectivo por meio da análise de prontuários do Serviço de Arquivos do Departamento de Ortopedia da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo (SAME-SCSP) do período compreendido entre 1992 a 2004 após aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos do nosso hospital. Um total de 33 pacientes com fratura toracolombar do tipo explosão de T10 a L2 foram tratados com confecção de gesso ou órtese TLSO em hiper-extensão com seguimento mínimo de seis meses. Filmes de radiografias-incidências ântero-posterior e de perfil-e tomografia axial computadorizada (TAC)-cortes axiais e sagitais-foram revistos. O déficit neurológico foi avaliado com base na escala de Frankel(10). A manobra de redução foi realizada mediante tração e hiper-extensão da região toracolombar com fulcro de apoio na mesa de tração ortopédica nos casos submetidos à imobilização gessada. Excluímos portadores de fraturas com mais de dez 10 dias do trauma, em osso patológico ou com documentação incompleta.

Avaliamos a pontuação de McCormack et al.(3). (Load Sharing Classification), segundo o achado das radiografias e TAC na ocasião da internação, que avalia: - a quantidade de cominuição vertebral no plano sagital; - a posição de deslocamento dos fragmentos da fratura no corte axial da tomografia (Figura 1 e 2);L; a quantidade de correção da deformidade em hiper-extensão pelo método de Cobb(11) (Tabela 1).



Os resultados foram analisados pelo programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), em sua versão 13.0. Aplicamos a Correlação de Pearson a fim de correlacionar a pontuação de Load Sharing com o valor angular da piora da cifose (colapso sagital). Adotamos o nível de significância de 5% (0,050).

RESULTADOS

Os mecanismos de trauma encontrados foram o acidente automobilístico (64%) e queda de altura (36%). A vértebra T10 foi acometida em dois pacientes (6%), T11, em dois (6%), T12 , em cinco (15%), L1, em 16 (49%) e, L2, em oito (24%). Com predomínio de pacientes do sexo masculino (22 pacientes), a média de idade foi de 43,6 anos, variando de 12 a 65 anos. O seguimento variou de 6 a 168 meses, com média de 30 meses. Todos os pacientes estavam neurologicamente intactos no momento da internação.

O valor médio da pontuação de Load Sharing foi de cinco pontos, variando de três a seis pontos. O colapso sagital (piora do ângulo de Cobb) variou de um a 13 graus, com média de cinco graus (Tabela 2).

Verificamos correlação significante entre a pontuação de Load Sharing e colapso vertebral. Como o sinal do coeficiente de correlação é positivo (Tabela 3), podemos constatar que quanto maior o valor de pontuação, maior o valor de colapso vertebral no final do seguimento.

DISCUSSÃO

A distribuição destas fraturas predominando em L1 e L2 é similar ao encontrado em outros estudos. McCormack et al.(3), em 1994, com 28 portadores de fratura toracolombar explosão, indicaram que vértebra mais envolvida foi a de L1 (40%). Em 1993, Mumford et al. (12) encontraram este tipo de fratura principalmente em T12 (15%), L1 (30%) e L2 (15%). Weinstein et al.(13), em 1987, analisaram o tratamento conservador de 42 fraturas, onde 64% estavam entre T12 e L2. Em nosso estudo, a vértebra T10 foi acometida em dois pacientes (6%), T11, em dois (6%), T12 em cinco (15%), L1 em 16 (49%) e L2 em oito (24%).

O predomínio destas fraturas nos indivíduos do sexo masculino era esperado, porque os homens estão mais envolvidos em acidentes(3,6,12), em especial o automobilístico, que foi a principal causa das fraturas no nosso estudo. Mumford et al.(12), em 1993, descreveram relação entre homens e mulheres de 2 para 1. A média de idade no nosso trabalho foi de 43,6 anos, variando de 12 a 65 anos. Para comparar, Mumford et al.(12), em 1993, relataram média de idade de 38,5 anos, variando de 15 a 60 anos, enquanto na série de. Weinstein et al.(13), em 1987, a média de idade foi de 43 anos,variando de 28 a 70 anos.

Na osteossíntese de fraturas de ossos longos, a divisão de cargas entre o implante e o osso hospedeiro é um princípio fundamental observado em qualquer fixação interna, o que permite a consolidação óssea e previne a falha do implante(3,8). No tratamento da fratura de ossos longos com aparelho gessado, a aposição entre os ossos, o grau de cominução e a deformidade na fratura interferem na divisão de cargas que passam no local da fratura. A escala de Load Sharing aplica este mesmo princípio na fratura toracolombar(3).

Diversos autores avaliaram a aplicabilidade da escala de Load Sharing em pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico de fraturas toracolombares com objetivo de definir a extensão e via de acesso da área de artrodese(4). Em nosso estudo, avaliamos a utilidade desta escala para o tratamento conservador destas fraturas. Esta informação pode influenciar a opção de tratamento nestes pacientes, dada que a cifose é complicação indesejável após a utilização do gesso ou órtese em hiper-extensão(3,4).

McCormack et al.(3), em 1994, criaram a classificação Load Sharing por meio da análise de 28 portadores de fratura explosão toracolombar tratados cirurgicamente. Para estes autores, este sistema de classificação pode predizer a falha no material de implante nestas fraturas após artrodese posterior. Similarmente, nosso trabalho mostra a relação da escala de Load Sharing com o colapso vertebral sagital nos casos tratados não operatoriamente.

Hadjipavlou et al.(6) em 2002, reportaram os resultados funcionais de 100 portadores de fratura toracolombar tratados conservadoramente. Estes autores mostraram excelentes resultados nos casos com pontuação de Load Sharing de três a quatro pontos. Os pacientes com cinco ou seis pontos, por sua vez, apresentaram dor e dificuldade para retornar ao trabalho.

Jeffrey et al.(5), em 2000, analisaram a aplicabilidade da classificação de Load Sharing na escolha da via anterior ou posterior em 51 pacientes com fraturas toracolombares tratados cirurgicamentee mostraram que as fraturas toracolombares com até seis pontos foram tratadas adequadamente com via posterior, enquanto os casos com sete pontos ou mais evoluíram satisfatoriamente após abordagem anterior e posterior. Este achado pode ser explicado pela maior instabilidade inerente das fraturas com maior pontuação. Em nosso trabalho, evidenciamos uma correlação positiva do colapso vertebral com a pontuação de Load Sharing. Este achado sugere que, nos casos com maior pontuação, a maior cominuição do corpo vertebral e a distância entre os fragmentos da fratura alteram a propriedade de transmissão de cargas da vértebra e, com isso, ocorre maior colapso toracolombar sagital. Além disso, a correção da deformidade em cifose em hiper-extensão determina falha na região anterior da vértebra, favorecendo o colapso vertebral.

A falta da avaliação dinâmica das imagens, da gravidade da lesão capsulo-ligamentar posterior e da presença de déficit neurológico são limitações desta classificação. Ademais, a relação entre a cifose pós-traumática e a função nestes pacientes é muito debatida na literatura(12). No entanto, a grande reprodutibilidade entre examinadores independentes e a utilidade para avaliação da relação entre o aumento da cifose toracolombar e a gravidade das lesões esqueléticas analisadas nesta classificação podem justificar sua aplicabilidade após a opção do tratamento conservador nestes pacientes(6,14).

Trabalho recebido em 6/10/06

aprovado em 20/02/07

Trabalho realizado no Grupo de Coluna do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (DOT-FCMSCSP).

  • 1. Holdsworth, FW. Fractures, dislocations and fractures-dislocations of the spine. J. Bone Joint Surgery (Br) 45:6-20,1963.
  • 2. Denis F. The three column spine and its significance in the classification of acute thoracolumbar spinal injuries. Spine 1983;8(8):817831.
  • 3. McCormack T, Karaikovic E, Gaines RW. The load sharing classification of spine fractures. Spine 1994;19(15):17411744.
  • 4. Aligizakis A, Katonis P, Stergiopoulos K, Galanakis I, Karabekios S, Hadjipavlou A. Functional outcome of burst fractures of the thoracolumbar spine managed non-operatively, with early ambulation, evaluated using the load sharing classification. Acta Orthop Belg 2002;68(3):279287.
  • 5. Jeffrey WP, Lane JR, Karaikovic EE, Gaines RW. Successful Short-Segment Instrumentation and Fusion for Thoracolumbar Spine Fractures. Spine 2000;25(9):11571169.
  • 6. Aligizakis AC, Katonis PG, Sapkas G, Papagelopoulos PJ, Galanakis I, Hadjipavlou A. Gertzbein and load sharing classifications for unstable thoracolumbar fractures. Clin Orthop Relat Res 2003;411:7785.
  • 7. Gertzbein SD. Spine update. Classification of thoracic and lumbar fractures. Spine 1994;19(5):626628.
  • 8. Magerl F, Aebi M, Gertzbein SD, Harms J, Nazarian S. A comprehensive classification of thoracic and lumbar injuries. Eur Spine J 1994;3(4):184201.
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  • 10. Frankel HL, Hancock DO, Hyslop G, Melzak J, Michaelis LS, Ungar GH, Vernon JD,Walsh JJ. The value of postural reduction in the initial management of closed injuries of the spine with paraplegia and tetraplegia. I. Paraplegia 1969;7(3):179-192.
  • 11. Cobb JR. Outline for the Study of Scoliosis. In: Instructional Course Lectures, The American Academy of Orthopaedics Surgeons 1984;5:261-275.
  • 12. Mumford J, Weinstein JN, Spratt KF, Goel VK. Thoracolumbar burst fractures. The clinical efficacy and outcome of nonoperative management. Spine 1993;18(8):955970.
  • 13. Winstein JN, Collalto P, Lehmann TR. Thoracolumbar "burst" fractures treated conservatively: a long-term follow-up. Spine 1988;13(1):33-38.
  • 14. Dai LY, Jin WJ. Interobserver and intraobserver reliability in the load sharing classification of the assessment of thoracolumbar burst fractures. Spine 2005;30(3):354358.
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Jan 2008
    • Data do Fascículo
      2007

    Histórico

    • Aceito
      20 Fev 2007
    • Recebido
      06 Out 2006
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