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Estabilização primária da diáfise umeral: estudo experimental de diferentes métodos de osteossíntese

Resumos

OBJETIVO: Estudo experimental idealizado com o objetivo de se avaliar a estabilização primária das fraturas da diáfise umeral com três diferentes métodos de osteossíntese, representados por uma placa tipo DCP aplicada com técnica em ponte, uma síntese incomum, denominada SPS®, ainda sem similar na literatura, aplicada pela técnica em ponte, e um terceiro método constituído de uma haste intramedular com um método de bloqueio também incomum proporcionado por um parafuso cortical distalmente e por um fio do tipo Ender proximalmente. MATERIAL E MÉTODO: Vinte e um pares de úmeros humanos foram divididos em três grupos, utilizando-se um tipo de material para cada grupo, os quais foram submetidos a osteotomias, aos procedimentos de fixação e a ensaios não destrutivos de flexo-compressão e de torção, com limites de carga de 200N e de 100N, respectivamente e, num mecanismo de "crossing", foram submetidos secundariamente a novos ensaios de torção e de flexo-compressão, amparados por análise estatística. RESULTADOS: O grupo da placa DCP em ponte mostrou boa resistência às cargas aplicadas, o que também ocorreu no grupo do SPS®, que apesar de mostrar maiores índices de deflexão, apresentou grande capacidade elástica. O grupo da haste intramedular mostrou bons resultados nos ensaios de flexo-compressão, devido ao seu mecanismo de tutor, mas não demonstrou resistência às cargas de torção.

Fixação interna de fraturas; Fraturas do úmero; Placas ósseas; Biomecânica


OBJECTIVE: The purpose of this study was to assess primary stabilization of humeral shaft fractures using three different methods of fixation, represented by a DCP type plate, applied as a bridge plate, an uncommon synthesis material named SPS®, not previously described in literature and also used as a bridge plate, and a third type of material constituted by an intramedullary nail, with an uncommon locking provided by a distal cortical screw and a proximal Ender-type wire. MATERIAL AND METHOD: Twenty-one pairs of human humeri were divided into three groups, each using one type of material for fixation, the bones of which were osteotomized, stabilized and submitted to nondestructive flexion-compression and torsion assays up to 200 N and 100 N respectively, and, in a crossing mechanism, the groups were again submitted to other torsion and flexion-compression assays, supported by statistical analysis. RESULTS: The bridge-DCP group showed good resistance to the applied forces, similarly to the SPS® group, which, although presenting greater deflection, showed great elastic capacity. The intramedullary nail group showed good results in the flexion-compression assay due to the tutor mechanism of the intramedullary nails, but did not show resistance to the torsion forces.

Internal fracture fixation; Humeral fractures; Bone plates; Biomechanics


ARTIGO ORIGINAL

Estabilização primária da diáfise umeral: estudo experimental de diferentes métodos de osteossíntese

Vilson UlianI; Nilton MazzerII; Cláudio Henrique BarbieriIII; Carlos Alberto MoroIV; Luiz Antonio Alcântara de OliveiraV

IDoutor em Ciências Médicas, Área de Concentração em Ortopedia e Traumatologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - FMRP-USP, e Professor Adjunto de Ortopedia e Traumatologia do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia

IIProfessor Associado-Livre Docente do Departamento de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - FMRP-USP

IIIProfessor Titular do Departamento de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - FMRP-USP

IVEngenheiro do Laboratório de Bioengenharia do Departamento de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - FMRP-USP

VProfessor Visitante, Doutor do Departamento de Saúde da Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS, Bahia

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua A, Quadra I, Lote 02, Condomínio Parque Costa Verde - Piatã Salvador, Bahia - Brasil - CEP 41650-120 E-mail: vilsonulian@terra.com.br Trabalho recebido em 26/05/06 aprovado em 10/08/06

RESUMO

OBJETIVO: Estudo experimental idealizado com o objetivo de se avaliar a estabilização primária das fraturas da diáfise umeral com três diferentes métodos de osteossíntese, representados por uma placa tipo DCP aplicada com técnica em ponte, uma síntese incomum, denominada SPS®, ainda sem similar na literatura, aplicada pela técnica em ponte, e um terceiro método constituído de uma haste intramedular com um método de bloqueio também incomum proporcionado por um parafuso cortical distalmente e por um fio do tipo Ender proximalmente.

MATERIAL E MÉTODO: Vinte e um pares de úmeros humanos foram divididos em três grupos, utilizando-se um tipo de material para cada grupo, os quais foram submetidos a osteotomias, aos procedimentos de fixação e a ensaios não destrutivos de flexo-compressão e de torção, com limites de carga de 200N e de 100N, respectivamente e, num mecanismo de "crossing", foram submetidos secundariamente a novos ensaios de torção e de flexo-compressão, amparados por análise estatística.

RESULTADOS: O grupo da placa DCP em ponte mostrou boa resistência às cargas aplicadas, o que também ocorreu no grupo do SPS®, que apesar de mostrar maiores índices de deflexão, apresentou grande capacidade elástica. O grupo da haste intramedular mostrou bons resultados nos ensaios de flexo-compressão, devido ao seu mecanismo de tutor, mas não demonstrou resistência às cargas de torção.

Descritores: Fixação interna de fraturas; Fraturas do úmero; Placas ósseas; Biomecânica.

INTRODUÇÃO

Os tratamentos cirúrgicos apresentaram notável evolução desde que, em 1917, Hoglund(1) descreveu o método de transplante ósseo autógeno realizando fixação intramedular em uma fratura de fêmur através de emprego de enxerto ósseo retirado do próprio fêmur. Hey Groves, em 1919 relatou a utilização de um tubo axial para fixação intramedular de fratura subtrocantérica do fêmur. Küntscher(2), durante a Segunda Guerra Mundial utilizou hastes intramedulares para fixação de fraturas diafisárias de fêmur. Hackethal(3) desenvolveu técnica de fixação intramedular do úmero com múltiplos fios. Porém, devido ao fraco desempenho das hastes intramedulares, que não proporcionavam estabilização rotacional, Müller(4) desenvolveu outra técnica de fixação interna com placas e parafusos com o objetivo de se obter rigidez da fixação e compressão no foco de fratura. A busca pelo método ideal de fixação ainda permanece, tanto para os ossos do membro inferior como os do superior.

Tanto a fixação intramedular com hastes como as osteossínteses com placas evoluíram em seus desenhos e montagens, surgindo as hastes bloqueadas, descritas por vários autores(5,6) com bloqueio proximal e distal, e placas(7,8) modificando os conceitos de fixação rígida que deram lugar aos de fixação "biológica", priorizando o alinhamento sem estabilidade absoluta e promovendo a consolidação pelo estímulo à formação de calo ósseo, buscando-se também minimizar as lesões de partes moles(9).

Com base neste novo conceito de fixação biológica, objetivou-se, neste trabalho, testar a estabilidade relativa de três diferentes tipos de osteossíntese em fraturas instáveis da diáfise umeral através de ensaios mecânicos de flexo-compressão e torção.

MATERIAL E MÉTODO

Foram estudados 21 pares de úmeros humanos coletados de cadáveres a fresco, respeitando-se a normalização bioética, com exigência prioritária e absoluta do Consentimento Livre e Esclarecido da doação, assinado pelos familiares ou responsáveis, e as normas de funcionamento do CEMEL - Centro de Medicina Legal da FMRP-USP para coleta de material humano, com a colaboração direta do setor de coleta de doação de córneas do Banco de Olhos da FMRP. Foi realizada a distribuição randomizada dos 21 pares de úmeros entre três grupos experimentais, numerados segundo a ordem natural da coleta dos ossos, obtendo-se a seguinte distribuição: Grupo I, pares de números 3, 4, 5, 12, 18, 20 e 21; grupo II, pares de números 2, 6, 8, 11, 13, 14 e 19; grupo III, pares de números 1, 7, 9, 10, 15, 16 e 17. Todos os espécimes foram submetidos a estudo radiográfico prévio para se detectar alterações macroscópicas que pudessem interferir nos resultados.

A preparação dos espécimes foi realizada no laboratório de Bioengenharia da FMRP-USP, após descongelamento em temperatura ambiente. No grupo I usou-se placa DCP aplicada em ponte; no grupo II, o Sistema Pengo de Síntese - SPS®; e no grupo III, haste intramedular bloqueada. Cada osso foi osteotomizado no terço médio a uma distância de 10 a 12 cm do bordo proximal da fossa olecraneana, em ângulo reto com o eixo longo do osso, com ressecção de segmento de 8 mm nos grupos da placa DCP em ponte e do sistema SPS®, com o objetivo de provocar uma falha com o máximo de instabilidade. No grupo da haste intramedular não foi realizada a ressecção segmentar. Todos os grupos foram submetidos aos testes de flexo-compressão e torção com carga máxima de 200N e 100N respectivamente.

No grupo I padronizou-se o uso de placas de 12 orifícios, fixadas com três parafusos consecutivos (seis corticais) em cada extremidade, mantendo-se a falha segmentar de 8 mm (Figura 1).


No grupo II padronizou-se o uso de duas placas de três orifícios para instalação proximal e distal em montagem sobre haste em U de comprimento variável conforme o comprimento dos espécimes, mantendo-se a falha segmentar de 8 mm (Figuras 2, 3A e 3B).




No grupo III padronizou-se o uso de haste intramedular de 7 mm de diâmetro, de inserção retrógrada a 1 cm acima do bordo da fossa olecraneana, bloqueada proximalmente com fio tipo Ender, intramedular, também de introdução retrógrada, com impacção no osso esponjoso da região da cabeça umeral; e distalmente, com parafuso de fixação bicortical (Figura 4).


Após a fixação, todos os espécimes foram radiografados para identificação de possíveis falhas e visualização do posicionamento dos implantes.

Os sete pares de úmero de cada grupo foram distribuídos em dois novos grupos, com randomização simples tipo cara/coroa, obtendo-se, assim, dois novos grupos de sete úmeros, que foram submetidos a ensaios de flexo-compressão ou de torção denominados de experimentação primária. Através de um mecanismo de "crossing", os experimentos foram invertidos em uma segunda etapa e denominados experimentação secundária. O mecanismo de "crossing" consiste na utilização de dois tipos de teste em um mesmo espécime com o objetivo de aumentar o número de testes realizados no trabalho, aumentando, assim, o "n" do experimento, já que esses experimentos são do tipo não destrutivo, sendo essa experimentação secundária validada através da análise estatística (Kruskal-Wallis). Para os ensaios de flexo-compressão, foi adotada carga máxima de 200N e limite de deflexão de 5 mm. Para os ensaios de torção, foi adotada carga máxima de 100N, torque de 2 Nm e limite de deflexão de 30º.

Para a realização dos ensaios os modelos foram fixados nas extremidades através de inclusão com polimetilmetacrilato (PMMA), possibilitando aplicação de força excêntrica anteromedial, a 3 cm do centro axial flexo-compressão, e aplicação de força rotacional de 2 Nm nos ensaios de torção (Figura 5).


A avaliação dos valores médios de Força e Deflexão entre os três grupos foi realizada através do teste de Kruskal-Wallis. Os testes foram realizados com o auxílio do software SPSS® (Statistical Package for Social Sciences), versão 10.0, sendo considerados como estatisticamente significantes os valores bicaudais de p inferiores a 5% (p<0,05).

RESULTADOS

Nos ensaios biomecânicos de flexo-compressão, em que as montagens foram submetidas a forças de até cerca de 200N, o grupo da placa DCP em ponte apresentou deflexões que variaram de 0,15588 mm a 0,4457 mm no experimento primário, e de 0,21914 mm a 0,34688 mm no experimento secundário. O grupo do SPS® apresentou deflexões que variaram de 0,45813 mm a 1,8082 mm no experimento primário, e de 0,27032 mm a 0,56801 mm no experimento secundário. O grupo da haste intramedular apresentou deflexões que variaram de 0,29708 mm a 0,56283 mm no experimento primário e 0,24538 mm a 0,66605 mm no experimento secundário.

Nos ensaios biomecânicos de torção, em que as montagens foram submetidas a forças de até cerca de 100N e torque de 2Nm, o grupo da placa DCP em ponte apresentou deflexões que variaram de 7,1904 mm a 8,5592 mm no experimento primário, e de 4,9192 mm a 8,2074 mm no experimento secundário. O grupo do SPS® apresentou deflexões que variaram de 13,298 mm a 26,206 mm no experimento primário, e de 22,035 mm a 26,280 mm no experimento secundário. O grupo da haste intramedular apresentou deflexões que variaram entre 9,6932 mm a 26,187 mm no experimento primário e de 26,104 mm a 26,215 mm no experimento secundário.

Análise Estatística

Com relação aos experimentos de flexo-compressão, estes foram realizados com uma carga excêntrica, sobre o eixo longitudinal dos espécimes e limitada em cerca de 200N. A deflexão apresentada pelos três grupos mostrou capacidades e características diferenciadas de resistência, onde a maior estabilidade foi obtida pelo grupo de placa DCP em ponte (p= 0,30) (Tabela 1). Devido à dificuldade técnica de manutenção de uma falha óssea segmentar no grupo da haste intramedular, realizou-se apenas a osteotomia, mantendo-se o contato entre as extremidades dos fragmentos ósseos. Isto permitiu uma maior resistência da montagem, fazendo com que o grupo tivesse uma boa resistência às cargas nos ensaios de flexo-compressão e que mostrasse menor deformidade, com resistência superior à montagem da síntese SPS®, ou SE (síntese elástica) (Gráficos 1 e 2).



Com relação aos experimentos com carga em torção, estes mostraram que os valores de carga atingidos não foram estatisticamente significantes entre os grupos da placa DCP em ponte e do SPS® (SE) (variação de p = 0,54), mas foram superiores aos valores atingidos pelo grupo da haste intramedular (com p = 0,001) (Gráfico 3; Tabela 1).


Os valores obtidos para as deflexões foram estatisticamente significativos entre o grupo da placa DCP em ponte e os grupos do SPS® (SE) e haste intramedular (p = 0,99) (Gráfico 4).


DISCUSSÃO

As fixações internas têm evoluído de prioridades mecânicas para biológicas. Uma fixação flexível deve estimular a formação do calo ósseo(10) enquanto que uma redução indireta e menos precisa da fratura pode reduzir o trauma operatório, método de tratamento este descrito como "fixação interna biológica"(11). A reconstrução precisa e a estabilização absoluta da fixação que eram consideradas condições essenciais para o sucesso do tratamento(12,13) estão evoluindo para novos conceitos de estabilização com mínimos danos biológicos(9,14), com reduções indiretas e menos precisas(8,15), e desenvolvimento de implantes que reduzem o contato com o osso, como a placa em ponte(16,17), fixadores internos(18) e inovações técnicas como porcas que bloqueiam parafusos(19). No presente trabalho utilizaram-se três técnicas de fixação consideradas biológicas visando mínimos descolamentos de tecidos moles.

A observação de estudos experimentais mostrou grande variação dos valores das cargas aplicadas nos ensaios mecânicos, na maioria das vezes do tipo destrutivo e com objetivo de determinação de valores máximos. Neste trabalho idealizou-se um ensaio mecânico do tipo não destrutivo utilizando valores comprovadamente superiores ao necessário para a realização dos movimentos básicos do segmento umeral.

As cargas utilizadas foram baseadas nos trabalhos de Poppen e Walker(20). Os valores aproximados das forças de flexo-compressão exercidas sobre o úmero no local da osteotomia em um indivíduo de 1,70 m de estatura e de peso corporal de 80 kg é de cerca de 52N, porém por medida de segurança foram utilizadas cargas de até 200N nesse ensaio. Da mesma forma, nos ensaios de torção foram utilizadas cargas de até 100N, que são superiores às cargas submetidas ao segmento umeral nos movimentos de rotação do membro superior, estimadas em cerca de 20N, quando empregado um torque de 10Nm, calculadas através da tabela de comprimentos segmentares expressos como porcentagem, desenvolvida por Drillis e Contini, conforme relato de Winter(21).

Dos três grupos de sete pares de úmeros constituídos para este trabalho experimental, dois deles foram formados por duas montagens com materiais de implante incomuns, representadas por uma haste intramedular, e por uma placa em ponte denominada de SPS®; e um outro grupo foi representado por uma placa DCP já utilizada na prática clínica.

Os sete pares de úmeros do primeiro grupo foram fixados por placas tipo DCP empregadas em forma de ponte, por este material já estar sendo aplicado no tratamento das fraturas dos ossos longos, inclusive o úmero(22), e por ainda haver restrita avaliação experimental(23,24).

No segundo grupo, os sete pares de úmeros foram fixados por um material denominado SPS® empregado de forma semelhante à técnica de aplicação da placa em ponte, desenvolvida segundo as modernas tendências de fixação biológica, de acordo com as apresentadas por Ring e Jupiter(25) e Rozbruck et al.(14). Este sistema preconiza a utilização de uma haste em U sobre a qual é acoplada uma placa em cada extremidade, proporcionando um mínimo contacto do material de síntese com a superfície óssea como preconizado por Leunig et al.(15). Este sistema também possibilita o deslizamento da placa sobre a haste em U, bem como o acoplamento de novos segmentos da placa para fixação de fragmentos intermediários em osteossínteses de fraturas cominutivas.(Figuras 2, 3A e 3B).

O terceiro grupo foi constituído por sete pares de úmeros fixados por material de implante intramedular, utilizando uma incomum forma de bloqueio da haste, de inserção retrógrada onde o travamento distal foi realizado através de um parafuso e o travamento proximal através de um fio do tipo Ender.

Quando analisados isoladamente, observou-se que cada um dos três grupos apresentava um comportamento homogêneo de seus espécimes. Na observação dos ensaios de flexo-compressão entre os grupos, ficou evidente uma maior rigidez da montagem da placa tipo DCP em ponte. As placas DCP aplicadas em compressão dinâmica e mesmo em neutralização conferem boa rigidez aos sistemas, o que também foi observado no Grupo I em que a placa foi aplicada em ponte (Gráfico 2), apesar de que uma maior rigidez não resulte necessariamente em maior taxa de consolidação óssea, como mostrado por Rubel et al.(24) em estudos comparativos com aplicação de uma e de duas placas.

O grupo das hastes intramedulares mostrou comportamento homogêneo e com boa resistência no ensaio de flexo-compressão. O mecanismo de ação como tutor proporcionado pela haste intramedular justifica este comportamento do grupo, pois mesmo sendo uma haste não fresada, ela preenche grande parte do canal medular, permitindo um bom apoio. Esses resultados são semelhantes aos achados de literatura que conferem boa resistência às forças de flexão e de compressão apresentadas pelas hastes intramedulares.(26,27). A manutenção do contato das extremidades da osteotomia neste grupo também contribuiu para o bom desempenho neste ensaio.

No ensaio de flexo-compressão, observou-se que o grupo do SPS® apresentou uma elasticidade maior da montagem devido a sua arquitetura, já que após o término do carregamento das forças aplicadas, a montagem voltava visualmente à sua posição original, fato este que não ocorreu com o grupo das hastes intramedulares que não possuem esta capacidade elástica. Observou-se que apesar de ter havido relevância estatística da variante deflexão para o grupo do SPS®, esta não se traduz em relevância clínica.

Os ensaios de torção evidenciaram a rigidez da montagem da placa DCP em ponte e manifestaram também as características de elasticidade da placa do SPS®, em que a deflexão apresentada ao carregamento tende a retornar à posição original após o término do mesmo (Gráfico 4). A rigidez da montagem apresentada pelas hastes intramedulares quando submetidas a forças de torção estão diretamente relacionadas às suas formas de travamento ou bloqueio. Trabalhos experimentais(26,28) como o deste estudo, têm sido realizados com o objetivo de verificar a estabilização conferida por diferentes formas de bloqueio das hastes, visando seu aperfeiçoamento.

Este estudo experimental mostrou que o grupo das hastes intramedulares evidenciou dificuldade deste implante em suportar cargas de rotação. Isto é observado também na literatura onde a revisão mostra que mesmo as melhores formas de bloqueio das hastes intramedulares como as proporcionadas pelas hastes de Russell-Taylor, UHN(29,30) e Polarus(27) ainda apresentam dificuldades de bloqueio para as forças rotacionais. Apresentam ainda restrições quanto às dificuldades técnicas e riscos cirúrgicos quando do bloqueio proximal.

No grupo experimental da haste intramedular, o bloqueio é efetuado distalmente por um parafuso e proximalmente por um fio tipo Ender, porém este não mostrou capacidade de suportar as cargas rotacionais. A técnica preconiza que o fio tipo Ender seja direcionado a ocupar a região do troquíter ou da cabeça umeral, mas não houve evidência que o osso esponjoso dessas regiões tenha resistência para suportar as forças transferidas ao fio do tipo Ender durante o carregamento em rotação. Uma maior capacidade de fixação poderia ser obtida se o fio pudesse ser fixado no osso cortical. Isso não é possível na região da cabeça ou do troquíter umeral, pois levaria a danos sobre a cartilagem articular ou ao manguito rotador.

Sugerem-se modificações no design da haste, com o deslocamento do orifício de saída do fio tipo Ender para uma localização mais distal à extremidade proximal da haste e que pudesse corresponder à região do colo umeral, permitindo a transfixação da cortical dessa região pelo fio e assim, conferir melhor oportunidade de travamento.

O grupo experimental do SPS® apresentou características incomuns de elasticidade, não sendo encontrada similaridade na literatura. Apresenta, ainda, menor quantidade de material metálico a ser implantado, e restrita área de contato ósseo permitindo menor manipulação dos tecidos moles, sem que haja prejuízo da sua resistência quando comparada à placa DCP em ponte.

As tendências modernas à "fixação biológica" são respeitadas na utilização de placas em ponte, tanto na placa tipo DCP como no SPS®, onde a abordagem por dois acessos cirúrgicos minimamente invasivos, acarretam menor lesão dos tecidos moles e menor prejuízo vascular de partes moles e ósseas.

CONCLUSÕES

1. As placas tipo DCP em ponte apresentaram boa resistência às cargas nos ensaios de flexo-compressão e torção evidenciando maior grau de estabilização.

2. O Sistema Pengo de Síntese (SPS®) apresentou boa resistência aos ensaios mecânicos de flexo-compressão e de torção, mostrando uma deflexão transitória e com retorno à posição inicial depois de cessada a carga, evidenciando sua capacidade elástica.

3. O Sistema Pengo de Síntese evidenciou boa estabilização da montagem com valores aproximados aos do grupo placa DCP em ponte, mostrando aplicabilidade de uso no úmero. Sua aplicação em ossos com carga necessita ainda de avaliação experimental.

4. As hastes intramedulares mostraram resistência às cargas de flexo-compressão somente nos experimentos com osteotomias sem falhas devido à manutenção do contato entre as extremidades e ao mecanismo de tutor dado pelo preenchimento do canal medular, porém não apresentaram resistência às cargas de torção aplicadas.

Trabalho realizado no Laboratório de Bioengenharia do Departamento de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - FMRP-USP

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  • Endereço para correspondência:
    Rua A, Quadra I, Lote 02, Condomínio Parque Costa Verde - Piatã
    Salvador, Bahia - Brasil - CEP 41650-120
    Trabalho recebido em 26/05/06
    aprovado em 10/08/06
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Maio 2008
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Recebido
      26 Maio 2006
    • Aceito
      10 Ago 2006
    ATHA EDITORA Rua: Machado Bittencourt, 190, 4º andar - Vila Mariana - São Paulo Capital - CEP 04044-000, Telefone: 55-11-5087-9502 - São Paulo - SP - Brazil
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