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Tumor fibroso solitário maligno de extremidades

Resumos

Tumor fibroso solitário extrapleural (TFS) é neoplasia mesenquimal rara, sendo que há menos de 40 casos descritos com localização em extremidades até o presente momento. Acomete preferencialmente pacientes na quinta década e não tem predileção por sexo. Relatamos um caso com os aspectos clínicos, radiológicos, histológicos e imunoistoquímicos característicos, discutindo a importância do diagnóstico diferencial com outros sarcomas.Pouco é conhecido sobre o comportamento biológico do TFS. Fatores de risco para menor sobrevida livre de metástases incluem: margens cirúrgicas comprometidas, tamanho maior que 10 cm e histologia maligna. Excisão completa é o tratamento recomendado.

Hemangiopericitoma; Maligno; Tumor


Extrapleural solitary fibrous tumour (SFT) is a rare mesenchymal neoplasm, with less than 40 cases reported affecting the extremities so far. This tumour affects preferentially middle-aged patients (median: 50 years) and shows no predilection for sex. We report a case with typical clinical, radiologic, histopathologic and immunohistochemical features, discussing the importance of differential diagnosis of other sarcomas. Little is known about the biological behavior of SFT. Risk factors for shorter metastasis-free survival include impaired surgical margins, tumor size greater than 10 cm and malignant histology. Complete excision is the recommended treatment.

Haemangiopericytoma; Malignant; Tumour


RELATO DE CASO

Tumor fibroso solitário maligno de extremidades

Daniel ChangI; Cláudia Regina Gomes Cardim Mendes de OliveiraII; Carlos Fernando SaitoII

IFleury Medicina e Saúde

IILIM 41 – Laboratório de Investigação Médica do Sistema Músculo–Esquelético do Departamento de Ortopedia e Traumatologia HC/FMUSP

Endereço para correspondência Endereço para Correspondência: Fleury Medicina e Saúde Av. Gal. Waldomiro de Lima, 508 Jabaquara – São Paulo–SP.Brasil 04344–070 e–mail: daniel.chang@fleury.com.br

RESUMO

Tumor fibroso solitário extrapleural (TFS) é neoplasia mesenquimal rara, sendo que há menos de 40 casos descritos com localização em extremidades até o presente momento. Acomete preferencialmente pacientes na quinta década e não tem predileção por sexo. Relatamos um caso com os aspectos clínicos, radiológicos, histológicos e imunoistoquímicos característicos, discutindo a importância do diagnóstico diferencial com outros sarcomas.Pouco é conhecido sobre o comportamento biológico do TFS. Fatores de risco para menor sobrevida livre de metástases incluem: margens cirúrgicas comprometidas, tamanho maior que 10 cm e histologia maligna. Excisão completa é o tratamento recomendado.

Descritores: Hemangiopericitoma. Maligno. Tumor.

INTRODUÇÃO

Tumor fibroso solitário extrapleural (TFS) é tumor mesenquimal de provável tipo fibroblástico com presença de vasos exibindo padrão de ramificação que lembra o do hemangiopericitoma.1,2 Os tumores fibrosos solitários extrapleurais, muitos dos quais no passado foram denominados de hemangiopericitomas, se assemelham morfologicamente com os tumores fibrosos solitários pleurais.

Ocorrem em adultos numa ampla faixa etária dos 20 aos 70 anos, mais freqüentemente em torno de 54 anos, sem predileção por sexo.1,3 Quanto à localização, 40% aparecem em tecido subcutâneo, mas ocorrem também em tecidos moles profundos das extremidades, cabeça e pescoço (principalmente órbita), parede torácica, mediastino, pericárdio, retroperitônio e cavidade abdominal. Também podem surgir em locais mais raros como meninges, glândulas salivares, pulmões, fígado, trato gastrointestinal, adrenais, bexiga, próstata e testículos.3–5 Em 5% dos casos são a origem de síndromes paraneoplásicas relacionadas à hipoglicemia decorrente da produção de fatores insulina–símile.4

Até o presente momento há menos de 40 casos descritos na literatura em partes moles de extremidades.1,3 Na grande maioria são benignos e curados por excisão completa simples da lesão. Em 10 a 30% dos casos, todavia, têm comportamento biológico agressivo com recorrências, metástases ou ambos.6,7

Ao exame de imagem, tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética, o TFS representa lesão circunscrita, por vezes infiltrativa, com áreas sólidas e císticas, podendo ter calcificações.8

Relatamos um caso com os aspectos clínicos, radiológicos, histológicos e imunoistoquímicos característicos, bem como se discute os critérios de malignidade, os diagnósticos diferenciais e o tratamento, à luz de uma revisão da literatura pertinente.

MATERIAL E MÉTODO

Paciente do sexo feminino, de 53 anos, com quadro clínico de aumento progressivo de volume e dor em região da coxa direita há sete meses, sem outros sintomas constitucionais. Foram realizados exames de imagem: tomografia computadorizada e ressonância nuclear magnética, e, em seguida, ressecção cirúrgica da lesão. O material foi analisado macroscopicamente e amostras representativas submetidas a processamento histológico rotineiro para inclusão em parafina e coloração de hematoxilina e eosina (H&E) para avaliação microscópica. Além disso, reações imunoistoquímicas para os seguintes marcadores: CD34 (clone QBEnd/10 – Biogenex®, Dinamarca; diluição 1:500), CD99 (clone 12E7 – Dakocytomation®, EUA; diluição 1:800), Bcl–2 (clone 124 – Dakocytomation®, EUA; diluição 1:1000), Vimentina (clone V9 – Dakocytomation®, EUA; diluição 1:800), EMA (clone E29 – Dakocytomation®, EUA; diluição1:200) e Ki–67 (clone MIB–1 – Dakocytomation®, EUA; diluição 1:200), também foram realizadas.

RESULTADOS

Nos exames de imagem, tomografia computadorizada e ressonância nuclear magnética, identificou–se lesão expansiva e infiltrativa em tecido subcutâneo e plano muscular com componentes sólidos e císticos. (Figura 1)


A análise macroscópica evidenciou lesão nodular, medindo 4,0 cm de diâmetro, de consistência firme, pardo–clara, com áreas amolecidas e císticas de permeio, além de bordos infiltrativos em áreas focais. (Figura 2)


O estudo histopatológico da lesão mostrou proliferação de células na sua maioria fusiformes, com áreas focais constituídas por células arredondadas, com atipias, além de componente vascular de padrão hemangiopericitomatoso de permeio (padrão de vasos finos e ramificados à maneira de chifre de veado – staghorn branching pattern), focos de necrose e mitoses, inclusive atípicas, com contagem de 5 mitoses por 10 campos de grande aumento (400x). (Figura 3)


As reações de imunoistoquímica revelaram positividade para os seguintes marcadores: CD34, CD99, Bcl–2, Vimentina e Ki–67 em 15% das células neoplásicas. O EMA resultou negativo. (Figura 4)


Assim, concluiu–se, com os dados apresentados, o diagnóstico de tumor fibroso solitário de comportamento biológico agressivo (variante maligna).

DISCUSSÃO

O tumor fibroso solitário (TFS) é uma neoplasia de natureza mesenquimal com histogênese incerta, porém de provável tipo fibroblástico. As características ultra–estruturais são inespecíficas com as células tumorais freqüentemente apresentando fenótipo fibroblástico, miofibroblástico e/ou com diferenciação pericítica. Além disso, o TFS é heterogêneo do ponto de vista citogenético e tem graus variáveis de comportamento biológico.2.

Até o presente momento há menos de 40 casos descritos na literatura em partes moles de extremidades.1,3 Na grande maioria são benignos e curados por excisão completa simples da lesão. Em 10 a 30% dos casos, todavia, têm comportamento biológico agressivo com recorrências, metástases ou ambos.6,7

A distinção entre TFS benigno e maligno é freqüentemente difícil e divergente na literatura corrente. Alguns autores consideram o caráter infiltrativo o critério mais importante para o diagnóstico de malignidade.9,10 Outros autores definem que as atipias citológicas, presença de necrose e o limite acima de 4 mitoses por 10 campos de grande aumento são critérios de comportamento maligno, principalmente nos localizados em extremidades3, o que observamos no presente caso reportado.

Além disso, alguns autores têm considerado que o Ki–67 a partir de 6,1% poderia ser um dos critérios para avaliação de prognóstico e comportamento agressivo.9–11 No caso relatado verificou–se Ki–67 de 15%, o que é compatível com comportamento agressivo.

Os diagnósticos diferenciais incluem lesões benignas e malignas como: fibromatose, fibrosarcoma, sarcoma sinovial, tumor maligno de bainha nervosa periférica, fibroistiocitoma maligno e dermatofibrossarcoma protuberans.3,7,12

Além dos achados histológicos, o exame imunoistoquímico é fundamental para o diagnóstico preciso, sendo que no TFS há positividade para o CD34 (90–95% dos casos), CD99 (70% dos casos) e Bcl–2 (50% dos casos).2

Dentre os diagnósticos diferenciais expostos, o sarcoma sinovial também é positivo para os marcadores CD99 e Bcl–2, sendo necessário, portanto, realizar a reação imunoistoquímica para EMA, que é positiva no sarcoma sinovial e negativa no TFS, permitindo, assim, a distinção entre estas entidades, conforme realizado neste caso, que apresentava aspecto fusocelular semelhante ao do sarcoma sinovial.

No que tange ao tratamento, há alguns pontos relevantes nos TFS que devem ser analisados, tais como: a extensão da ressecção é o principal fator de prognóstico, sendo que invasão ou metástase pode ocorrer em tumores com aspecto benigno com ressecção incompleta; a localização extratorácica aumenta o risco de recorrência7; margens cirúrgicas comprometidas e presença de histologia com características de malignidade são fatores de recorrência; e, por fim, margens comprometidas, tumor maior que 10 cm e componente histológico maligno relacionam–se com menor sobrevida livre de metástases.8,10

Assim sendo, no presente caso, a lesão foi excisada com margens cirurgicas livres e não apresentou recidiva e/ou metástase num acompanhamento de um ano e meio. Porém, as recidivas e metástases são bastante tardias (até 30 anos após a primeira cirurgia), razão pela qual o seguimento clínico desses pacientes deve ser mantido indefinidamente.6,13

CONCLUSÃO

O tumor fibroso solitário extrapleural é uma neoplasia mesenquimal rara com menos de 40 casos descritos na literatura com localização em extremidades. Acomete preferencialmente pacientes na quinta década e não tem predileção por sexo. Na grande maioria são benignos e curados por excisão completa da lesão. Todavia, 10 a 30% dos casos têm comportamento biológico agressivo com recorrências e/ou metástases tardias, razão pela qual o seguimento clínico desses pacientes deve ser mantido indefinidamente.

Trabalho recebido em 24/01/08 aprovado em 23/05/08

Todos os autores declaram não haver nenhum potencial conflito de interesses referente a este artigo.

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  • Endereço para Correspondência:
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Abr 2010
    • Data do Fascículo
      2010

    Histórico

    • Aceito
      23 Maio 2008
    • Recebido
      24 Jan 2008
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