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Viabilidade de células do sistema nervoso central fetal no tratamento da lesão medular em ratos

Resumos

OBJETIVOS: Propor um modelo experimental de transplante de células do sistema nervoso fetal de ratos Wistar para o sítio de lesão medular de ratos adultos que permitisse sua sobrevivência e integração para possibilitar protocolos de pesquisa que identificarão outros fatores de regeneração e recuperação funcional pós trauma raquimedular. MÉTODOS: Vinte ratos adultos foram submetidos a laminectomia, e lesão de 5mm de hemimedula realizada com auxílio de microscópio óptico. Quinze deste ratos tiveram seu sítio de lesão medular transplantado com células do sistema nervoso central de fetos de rato; os ratos foram monitorados por 2 dias e tiveram sua coluna vertebral extraída para análise histológica. RESULTADOS: Evidenciou-se que em 60% dos casos as células transplantadas permaneciam viáveis no sítio da lesão e que a reação inflamatória no grupo transplantado era sempre maior que no grupo controle. CONCLUSÃO: O presente trabalho demonstrou a possibilidade de contar com o modelo de pesquisa para transplante de células fetais que permanecem viáveis 2 dias após seu implante.

Traumatismos da medula espinal; Células fetais; Ratos


OBJECTIVE: To propose an experimental model for transplantation of fetal cells from the nervous system of Wistar rats to the site of spinal cord injury in adult rats, to enable their survival and integration for research protocols that identify other factors of regeneration and functional recovery following spinal cord trauma. METHODS: Twenty adult rats were submitted to laminectomy and a 5mm incision was made, using an optical microscope, In fifteen of these rats, the site of the spinal cord lesion was transplanted with cells from the fetal rat central nervous system; the rats were monitored for two days, then the spinal cord was removed for histological analysis. RESULTS: In 60% of cases, the transplanted cells remained viable in the site of the lesion; the inflammatory response in the transplanted group was always greater than in the control group. CONCLUSION: This study demonstrates the potential use of this research model for use in the transplantation of fetal cells that remain viable two days after their implantation.

Spinal cord injury; Fetal cells; Rats


ARTIGO ORIGINAL

Viabilidade de células do sistema nervoso central fetal no tratamento da lesão medular em ratos

Alexandre Fogaça Cristante; Marcelo Loquette Damasceno; Raphael Martus Marcon; Reginaldo Perilo de Oliveira; Tarcísio Eloy Pessoa de Barros Filho

Laboratório de Investigação Médica do Sistema Músculo Esquelético - LIM41 do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da FMUSP

Correspondência Endereço para Correspondência: Rua Ovídio Pires de Campos, 333 - 3º. Andar - Cerqueira César CEP: 05403-010 São Paulo, SP , Brasil E-mail: aacristante@uol.com.br

RESUMO

OBJETIVOS: Propor um modelo experimental de transplante de células do sistema nervoso fetal de ratos Wistar para o sítio de lesão medular de ratos adultos que permitisse sua sobrevivência e integração para possibilitar protocolos de pesquisa que identificarão outros fatores de regeneração e recuperação funcional pós trauma raquimedular.

MÉTODOS: Vinte ratos adultos foram submetidos a laminectomia, e lesão de 5mm de hemimedula realizada com auxílio de microscópio óptico. Quinze deste ratos tiveram seu sítio de lesão medular transplantado com células do sistema nervoso central de fetos de rato; os ratos foram monitorados por 2 dias e tiveram sua coluna vertebral extraída para análise histológica.

RESULTADOS: Evidenciou-se que em 60% dos casos as células transplantadas permaneciam viáveis no sítio da lesão e que a reação inflamatória no grupo transplantado era sempre maior que no grupo controle.

CONCLUSÃO: O presente trabalho demonstrou a possibilidade de contar com o modelo de pesquisa para transplante de células fetais que permanecem viáveis 2 dias após seu implante.

Descritores: Traumatismos da medula espinal. Células fetais. Ratos.

INTRODUÇÃO

A lesão traumática da medula espinal consiste numa das mais incapacitantes lesões que o ser humano pode sofrer e tem despertado grande interesse no conhecimento das alterações histopatológicas, bioquímicas, funcionais e, principalmente, na busca de métodos de prevenção e tratamento.

Outrora tida com uma doença sem tratamento1, as lesões agudas da medula espinhal provenientes do traumatismo raquimedular podem ser minimizadas com o uso de drogas, desde que administradas num curto espaço de tempo após o trauma2,3. Tal avanço deveu-se sobretudo a observações histológicas que permitiram melhor compreensão da sequência de eventos envolvidos na lesão espinal.4

No início deste século foram realizados os primeiros experimentos acerca da fisiopatologia da lesão espinal. Contudo, estes trabalhos só foram retomados na década passada por investigadores que começaram a valorizar as mudanças tempo dependentes na patologia do trauma raquimedular.

O imenso déficit neurológico decorrente da lesão da medula espinal advém da somatória de dois eventos distintos: a lesão mecânica inicial e a lesão endógena secundária conseqüente à primeira.5,6 A lesão primária é produzida pelo trauma em si, com morte celular e liberação de eletrólitos, metabólitos e enzimas, sendo portanto um processo mecânico que independe de controle celular. A lesão secundária da medula espinal envolve complexas mudanças bioquímicas, surgindo como cascata de eventos envolvendo edema, inflamação, isquemia, reperfusão, fatores de crescimento, metabolismo do cálcio e peroxidase lipídica onde os esforços científicos se concentram para possibilitar seu controle.7-9 Farmacologicamente, drogas moduladoras das respostas endógenas à lesão primária estão sendo progressivamente introduzidas a fim de limitar o dano tecidual e melhorar o potencial de recuperação funcional destes pacientes. Estas drogas visam interromper os mecanismos fisiopatológicos de lesão neuronal secundária.10

Avanços clínicos e científicos indicam que as lesões agudas na medula espinal podem ser manipuladas por terapêuticas farmacológicas utilizadas num curto espaço de tempo. A metilprednisolona administrada dentro das primeiras 8 horas pós-trauma é o primeiro agente farmacológico a demonstrar melhora significativa na recuperação do trauma raquimedular em seres humanos.11-13 Outras drogas, como tirilizade14 e o GM-115,16, ainda sob investigação clínica, apresentam promissores resultados preliminares. Estes avanços podem representar grande melhora na qualidade de vida de pacientes com lesão da medula espinal, desde que sejam adotados pela prática clínica.

Após lesões do sistema nervoso central há um período de déficit seguido de período de variável recuperação funcional. Tal recuperação se deve principalmente a alterações nos circuitos não lesados, mas o processo exato de recuperação ainda não foi completamente esclarecido. Transplante de células neurais tem auxiliado nos estudos para compreensão do desenvolvimento do SNC e sua resposta a lesões. Mais recentemente, tais transplantes tem sido empregados na tentativa de otimizar a recuperação funcional pós lesão. O mecanismo específico através do qual tais transplantes atuam também não foram esclarecidos mas existem teorias apontando desde ação trófica como também liberação de hormônios e neurotransmissores e até reinervação das células hospedeiras por células transplantadas.17 Pesquisas atuais buscam determinar qual o grau de recuperação que pode ser conseguida com estes transplantes.

A possibilidade de emprego de células de sistema nervoso fetais para o tratamento de grande diversidade de patologias do Sistema Nervoso fez com que houvesse crescente número de estudos acerca da fisiologia da sobrevivência e integração do transplante. Hoje se sabe que o transplante de células fetais potencializa a recuperação motora tanto de indivíduos imaturos como adultos; mas o mecanismo responsável por tal observação permanece desconhecido.18

Foram descritos diversos protocolos de transplante de células do sistema nervoso fetais, mas ainda não há consenso quanto ao melhor método.18

OBJETIVO

O objetivo do presente trabalho é avaliar a viabilidade de um transplante de células do sistema nervoso fetal de ratos que permita sua sobrevivência e integração para possibilitar protocolos de pesquisa que identificarão outros fatores de regeneração e recuperação funcional pós trauma raquimedular.

MATERIAL E MÉTODOS

Modelo de Lesão Medular e preparação do tecido doador

Seguindo o protocolo de Barros Filho19 em seu trabalho, foram agrupados, em cinco gaiolas, um rato e duas ratas, e após 12h foram colhidos swabs vaginais das ratas que foram analisados em microscópio óptico para verificação da presença de espermatozóides. As ratas cujos swabs vaginais continham espermatozóides foram consideradas gravídicas e separadas em outra gaiola. Repetiu-se o processo até a obtenção de quatro ratas gravídicas.

O tecido doador foi obtido através de cirurgia cesariana em ratas gravídicas no 14º dia de gestação tendo como dia 0 o dia da fertilização. Imediatamente após a cesárea, cada feto teve removido seu sistema nervoso central que seria inoculada no defeito medular produzido nos ratos adultos.

Foram analisadas inicialmente as lesões produzidas em 15 ratos. As lesões foram produzidas através de laminectomia nível de T10 e aspiração e microdissecção gentil de 5mm de hemimedula do rato.

O tecido doador foi então inoculado no sítio da lesão através de micropipetas e o sítio da lesão devidamente suturado. Foi analisado conjuntamente um grupo controle de cinco ratos que foram submetidos a mesma lesão medular do grupo experimental, mas que tiveram seu sítio de lesão inoculado apenas com soro fisiológico.

Decorridos dois dias do implante, os ratos foram sacrificados, tiveram suas medulas excisadas cirurgicamente e submetidas a análise histológica para analisar a viabilidade das células transplantadas.

Ratos

Foram utilizados ratos da raça Wistar de um único fornecedor. A idade dos ratos deve ser de 20 semanas e o peso de 240±40g para as fêmeas, 270-315g para os machos. Os ratos foram obtidos uma semana antes da cirurgia, podendo assim serem aclimatizados e se tornarem manuseáveis. Os ratos devem ter a garantia de serem livres de patógenos. Se mais de um rato for mantido junto após a cirurgia, atenta-se para a identificação dos ratos da mesma gaiola e tenta-se manter ratos de uma mesma ninhada ou relacionados juntos.

Procedimentos Anestésicos

Anestesia-se os ratos com pentobarbital intraperitoneal. Para as fêmeas usa-se uma dose de 35-55 mg/kg e para os machos uma dose de 55-75 mg/kg. A dose ótima deve variar dependendo de muitos fatores. Mas, os ratos devem começar a ficar anestesiados em 5 minutos. Recomenda-se 35 mg/kg para fêmeas e 55 mg/kg para machos. Se a dose inicial não anestesiar o rato, não se deve dar mais pentobarbital. Esta dose de pentobarbital deve anestesiar o rato por aproximadamente 2 horas. Doses suplementares não são recomendadas. Se um rato torna-se inaceitavelmente desperto durante a cirurgia, deve-se parar o experimento.

Laminectomia

Expõe-se a medula espinal com uma laminectomia para a contusão.

• Faz-se uma abertura na pele da linha média dorsal para se expor T10 da coluna espinal. (Figura 1A)


• Corta-se e afasta-se os músculos inseridos nos processos espinhosos de T9-11, usando-se um coagulador bipolar para se estancar hemorragias se necessário.

• Remove-se T10 e a metade distal do processo espinhoso de T9 com um micro sacabocados. Começa-se pela borda caudal de T10 e delicadamente retira-se pequenos fragmentos ao longo da lâmina com o micro sacabocados orientado em direção a cabeça até a metade caudal da lâmina de T9. (Figura 1B) Não se lesa a medula. (Figura 2)


Produção de lesão medular

• Procede-se a remoção de segmento de cerca de 5mm da hemimedula do rato através de aspiração e microdissecção com auxílio de microscópio.

• Retira-se o rato colocando o mesmo em uma superfície aquecida. Inspeciona-se o sítio de contusão. Estanca-se qualquer hemorragia. Lava-se o sítio de contusão com soro fisiológico.

Material para implante

• As ratas fêmeas com 14 dias de gestação foram anestesiadas e então submetidas a laparotomia e histerectomia. (

Figura 3A

)


Os fetos foram removidos individualmente e ressecados com auxílio de técnica microcirúrgica para isolar células embrionárias do SNC (Sistema Nervoso Central) (Figura 3B). O material obtido foi seccionado transversalmente em segmentos de 5mm para implante no sítio da lesão.

Implante de células fetais no sítio de lesão

• O segmento de SNC fetal já previamente seccionado foi implantado no sitio da lesão medular nos ratos adultos.

• Após o implante o saco dural foi fechado com cola de fibrina e procedeu-se fechamento dos planos musculares, subcutâneo e pele.

Grupo controle

Cinco ratos foram submetidos aos mesmos procedimentos que o grupo experimental, mas ao invés de terem seus sítios de lesão inoculados com células fetais, tiveram seu sítio de lesão inoculado com soro fisiológico.

Procedimentos pós-lesão

Durante dois dias após a lesão, os ratos foram observados e tiveram seus déficts registrados.

Eutanásia e Amostras de Tecido para Experimentos Agudos

A eutanásia foi realizada após 2 dias de lesão. Os procedimentos para a eutanásia e a remoção de amostras de tecidos foram os que se seguem.

• Pesa-se o rato para obter o peso corporal ao "sacrifício".

• Anestesia-se o rato com uma dose de 40 mg/Kg de pentobarbital dado intravenosamente.

• A artéria aorta do rato foi cateterizada através de toracotomia para que o rato fosse perfundido com solução de paraformaldeído. (Figura 4 A,B)


• Amostra da medula espinal.

• Rapidamente remove-se a coluna de C5 a L5, removendo-se a maioria dos músculos; (Figura 5)


• Coloca-se a coluna em um tubo de centrífuga, tampa-se e sela-se com Parafilme;

• Etiqueta-se o tubo com o a identificação do rato (experimento, número, etc.).

Necrópsia

Os seguintes procedimentos e informações devem ser usados e agrupados com todos os ratos.

• Pesa-se o animal e confirma-se a identidade e o sexo do mesmo.

• Remove-se a coluna e a medula espinal.

• Checa-se e anota-se a presença de anormalidades grosseiras. Em particular,

- cistites ou cistites hemorrágicas;

- infarto renal, hepático ou cardíaco, visível ou palpável;

- infecção no sítio cirúrgico;

- hemorragia na cavidade abdominal;

- edema pulmonar.

• Dispõe-se o corpo de acordo com as regras e regulamentações da Comissão de Ética de nosso serviço.

Análise histológica da medula transplantada

A medula transplantada foi submetida a cortes histológicos e teve analisada a magnitude da lesão provocada, presença e localização das células implantadas e viabilidade das células implantadas.

RESULTADOS

Através do pareamento de um rato e duas ratas, quatro ratas tiveram swabs vaginais positivos para espermatozóides. Todas estas ficaram gravídicas e no 14º dia de gestação foram submetidas a cesariana e sacrificadas.

Após a lesão medular, todos os ratos apresentaram déficits neurológicos, que variaram de monoplegia completa a paraplegia completa. O achado clínico pode posteriormente ser correlacionado com o achado histológico da magnitude de lesão medular produzida segundo a Tabela 1:

Após dois dias do implante de células fetais, todos os vinte ratos sobreviveram, não sendo encontrados casos de autofagia, úlceras de pressão ou infecção.

A análise histológica de cortes da medula correspondentes ao sítio da lesão revelou que a lesão medular resultante da microdissecção não foi uniforme, variando de lesões de 40% da medula até lesões subtotais. (Figura 6) Em três casos foi encontrado hematoma no sítio da lesão resultante de lesão da artéria espinal anterior. (Figura 7 A,B e Tabela 2)



Em todos os casos em que houve implante de células fetais no sítio da lesão, a análise de cortes histológicos do sítio da lesão após 48 horas revelou a presença das células fetais implantadas. Contudo em 40% dos casos não foram identificadas células fetais no sítio da lesão, mas somente no trajeto da lesão. (Tabela 3) (Figura 8 A,B e Figura 9 A,B)



Comparando os cortes histológicos das medulas em que houve transplante de células fetais com os cortes das medulas onde não houve, verificou-se a presença de processo inflamatório nitidamente mais intenso nas medulas onde houve transplante de células fetais. Tal processo inflamatório em geral agrupava-se em torno das células implantadas. (Tabela 4)

DISCUSSÃO

A lesão traumática da medula espinal consiste numa das mais incapacitantes lesões que o ser humano pode sofrer e tem despertado grande interesse no conhecimento das alterações histopatológicas, bioquímicas, funcionais e principalmente na busca de métodos de prevenção e tratamento das sequelas resultantes do trauma raquimedular.

Para o desenvolvimento do tratamento da lesão medular no humano, são necessários modelos experimentais para o teste de drogas, cirurgias e outros procedimentos terapêuticos como o transplante de células para o sítio da lesão. Ainda não existe na literatura um modelo universalmente aceito de lesão medular experimental sobretudo em função da grande diversidade de parâmetros que pode ser analisada e a grande diversidade de técnicas terapêuticas testadas.

As lesões medulares experimentais abertas são as que criam as melhores condições para estudo. As lesões fechadas produzem fraturas cujos fragmentos alteram o curso natural que se pretende estudar. A medula exposta diretamente pode ser seccionada ou contundida. Existem métodos experimentais que empregam o impacto como a queda de peso causando a lesão medular; esmagamento da medula espinal com pinças especiais de aneurisma; balões extradurais que são gradualmente insuflados; lesão por radiofrequência e microdissecção. O modelo considerado ideal seria aquele que aliasse o mecanismo de trauma geralmente encontrado em humanos, reprodutibilidade e possibilidade de ser quantificável. Contudo, tal modelo ainda não foi descrito.

Nosso estudo empregou o método de laminectomia e microdissecção de 5mm de hemimedula para adaptar-se aos objetivos deste primeiro trabalho da linha de pesquisa que consiste em analisar a localização e viabilidade de um segmento de 5mm de SNC fetal implantado no sítio da lesão.

A análise histológica da lesão medular revelou que o método de microdissecção, mesmo sendo realizado com auxílio de microscópio produziu lesões desiguais, geralmente maiores que 50% da medula. Tal observação não prejudicou o objetivo deste estudo em avaliar a presença histológica de células fetais após 48h do implante, mas exige que alterações sejam realizadas para maior padronização da lesão em estudos subsequentes desta linha de pesquisa que incluirão estudos da fase crônica da lesão medular com avaliações funcionais com escalas de locomoção, estudos eletrofisiológicos e anatomopatológicos.

Optamos pelo uso de ratos da raça Wistar em função de sua disponibilidade em nosso meio e das menores dificuldades técnicas no manuseio desses animais. A espécie preferencial para experimentos com lesão medular deveria ser a dos primatas, mas sua utilização é limitada em função do custo elevado, pouca disponibilidade, dificuldades de manuseio e considerações éticas.5 O rato pode ser uma boa alternativa nestes experimentos posto que sua medula possui organização citoarquitetônica e vascularização similar ao humano.5

Em nosso estudo, não ocorreu óbito, infecção, autofagia ou úlceras de pressão em função do uso de técnica anestésica com pentobarbitol, técnica cirúrgica asséptica, manutenção dos ratos em ambiente com temperatura controlada e gaiolas forradas. Tais complicações provavelmente ocorreriam se os ratos fossem mantidos por períodos maiores.

O transplante de células do sistema nervoso central foi empregado nos últimos vinte anos e auxiliou a aumentar a compreensão acerca do desenvolvimento do sistema nervoso e da resposta dos neurônios às lesões. Mais recentemente, os estudos envolvendo transplante de células do sistema nervoso central tem sidos dirigidos para restaurar ou diminuir a perda de função resultante da lesão. Provou-se que os transplantes podem diminuir os déficits ou mesmo aumentar a recuperação funcional resultantes do dano do sistema nervoso central, sobretudo nos casos de doenças degenerativas. Os transplantes podem influenciar a recuperação da função pós-dano do SNC através de grande variedade de mecanismos: como consequências não específicas de transplantes, ações tróficas, liberação hormonal e transmissores, e inclusive através de mecanismos mais específicos envolvendo reinervação de células hospedeiras e estabelecimento de conexões recíprocas entre o tecido transplantado e o tecido hospedeiro.17

Os requisitos para reparação anatômica e funcional após lesão medular são mais complexos que os requisitos para recuperação de outros danos neurológicos que geralmente requerem apenas restauração dos níveis de neurotransmissores para que haja importante recuperação funcional.17

Existem vários mecanismos através dos quais o transplante de células fetais podem afetar a resposta tecidual a lesão e mediar a recuperação funcional pós lesão. O transplante de células do sistema nervoso central fetal pode servir como ponte entre a medula e os níveis supraespinais através do sítio da lesão; pode fornecer uma população de células no sítio da lesão que pode servir de substrato para o reestabelecimento de comunicação celular entre os níveis supra e infralesionais. Ao nível celular, o transplante pode fornecer suporte trófico para neurônios maduros e imaturos, inibir a formação de cicatriz glial no sítio da lesão, e fornecer substrato favorável mecânico, de matriz extracelular para o crescimento neuronal através do sítio da lesão.

Transplante usando células do sistema nervoso central pode melhorar a função locomotora pós-lesão medular e proporcionam um microambiente mais complexo que o ambiente proporcionado por transplante de nervos periféricos, suspensão de células ou de células geneticamente modificadas.18

Em nosso estudo, a análise histológica do sítio da lesão revelou a presença de células fetais viáveis no sítio de lesão em 9 dos 15 ratos (60%) submetidos ao transplante células do SNC fetal. Em 40% dos casos as células fetais não foram encontradas no sítio da lesão, mas somente no trajeto da mesma.

Em comparação com o grupo controle onde não foi realizado implante de células fetais, a análise histológica revelou processo inflamatório mais intenso nas medulas submetidas ao implante de células fetais. Tal processo estava localizado ao redor das células implantadas.

CONCLUSÕES

O presente trabalho demonstrou a viabilidade de células fetais de ratos tranplantadas no sítio de lesão medular em ratos adultos 48 horas após seu implante. Dentro desta linha de pesquisa serão realizados estudos da fase crônica da lesão medular e da viabilidade a longo e médio prazo das células fetais com avaliações funcionais pela escala de locomoção e anátomo-patológicos.

Trabalho recebido em 21/08/09, aprovado em 25/09/09

Todos os autores declaram não haver nenhum potencial conflito de interesses referente a este artigo.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Out 2010
    • Data do Fascículo
      2010

    Histórico

    • Aceito
      25 Set 2009
    • Recebido
      21 Ago 2009
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