Complicações das endopróteses em pacientes com tumores ósseos do joelho

Resumos

Non-conventional endoprostheses (NCE) are frequently used in orthopedic oncology. The complications associated with this procedure have prompted research, due to the fact that it is commonly performed on young patients, with a higher survival rate. We conducted a systematic review of the literature, searching for the best scientific evidence on the subject. The research was carried out in the following databases: MEDLINE, EMBASE, CINAHL and the Cochrane Central Register of randomized controlled trials (CCTR), seeking to identify studies that report complications, and compare patellar resurfacing versus retention. The studies were selected according to the best methodological quality that exists for the subject. One hundred and forty six (146) studies were evaluated. No randomized clinical trial was found. We conducted a qualitative and quantitative evaluation of the work found (evidence levels IV and V). We used the Mann-Whitney U test for the statistical analysis. The results indicate a need for further studies that will enable us to reach a more solid conclusion. The rate of complications after NCE can be considered high, despite the low quality of the studies, as demonstrated by the studies that exist in the literature.

Bone neoplasms; Knee; Arthroplasty, Replacement, Knee; Osteosarcoma

ARTIGO DE REVISÃO

Complicações das endopróteses em pacientes com tumores ósseos do joelho

Vinicius Ynoe de Moraes; Guilherme Conforto Gracitelli; Fernando Cury Rezende; Maria Stella Peccin da Silva; Dan Caraí Maia Viola; Reynaldo Jesus Garcia Filho

Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP

^{Endereço para Correspondência}

RESUMO

As endopróteses não convencionais (ENC) são frequentemente utilizadas na ortopedia oncológica. As complicações do procedimento é motivo de pesquisa, pois há a instituição deste em população jovem e com grande potencial de sobrevida. Nós conduzimos uma revisão da literatura com o objetivo de buscar a melhor evidência científica relativa ao tema. A pesquisa englobou as bases: MEDLINE, EMBASE, CINAHL e o Registro Central Cochrane de ensaios clínicos randomizados (ECR), objetivando identificar estudos reportando complicações, e a substituição ou não da superfície articular da patela. Os estudos foram selecionados de acordo com a melhor qualidade metodológica existente para o assunto. Cento e quarenta e seis (146) estudos foram avaliados. Nenhum ERC foi encontrado. Realizamos uma avaliação qualitativa e quantitativa dos trabalhos encontrados (níveis de evidência IV e V). Utilizou-se o teste de U de Mann-Whitney para a análise estatística. Os resultados apontam para a necessidade de produção de novos estudos, para que se possa chegar a uma conclusão mais sólida. Pode-se considerar altas as taxas de complicações pós ENC, a despeito da baixa qualidade dos estudos, conforme demonstra os estudos existentes na literatura.

Descritores: Neoplasias ósseas. Joelho. Artroplastia do joelho. Osteosarcoma.

INTRODUÇÃO

O uso de endopróteses não convencionais (ENC) para o tratamento de tumores ósseos ao nível do joelho é uma realidade da ortopedia oncológica. O fato dessas lesões serem frequentes em pacientes jovens e com potencial de sobrevida acima de 10 anos nos leva à preocupação de determinar o melhor método de tratamento, em especial para a reconstrução articular do joelho.

A endoprótese não convencional (ENC) apresenta vantagens em relação aos outros métodos, uma vez que possibilita a preservação do membro e suas de funções articulares.^1-3 É também fato que a preservação do membro não está associada com diminuição da sobrevida do paciente oncológico.^1,2 Isso torna possível a indicação de endopróteses não-convencionais em 85% dos casos.^3-5

Neste escopo surge o questionamento da taxa de complicações inerentes ao procedimento, dentre estes - e em especial - aos relacionados a função do mecanismo extensor. Este encontra-se melhor resolvido em população não-oncológica.^6,7 A literatura mundial descreve diversas complicações relativas à substituição da patela, como a soltura do componente patelar, fratura patelar e ruptura do tendão patelar.^6,8,9

Na realidade da ortopedia oncológica, há dificuldade na abordagem do tema já que as pesquisas são focadas em sobrevida, tamanho da ressecção e escores funcionais do membro afetado, o que transforma o tema num campo de pesquisa e exploração.^1,2,5,10-12 Entretanto, parece-nos difícil a realização de estudos clínicos sem colaboração multicêntrica.

As revisões sistemáticas são uma síntese da literatura que aborda os dados disponíveis e promove a aquisição de informações racionais para decisões clínicas.^13-15 O objetivo desta pesquisa é promover uma revisão sistemática para responder as seguintes perguntas clínicas: 1) Qual a taxa de complicações pós ENC? 2) Qual a contribuição das complicações patelares nesta população?

MATERIAIS E MÉTODOS

Foram pesquisadas as seguintes bases na língua inglesa, espanhola e portuguesa, até junho de 2009: MEDLINE; EMBASE; CINAHL; LILACS; Cochrane Database of Systematic Reviews. Os critérios de inclusão estão expostos no Quadro 1. Foi utilizada a estratégia de pesquisa para ensaios clínicos randomizados de acordo com a metodologia da colaboração Cochrane.^14,16

Usou-se estratégia para procura de publicações não-ECR com o uso de termos MeSH/DeCS (quando disponíveis) e não MeSH/DeCS. Os termos utilizados estão descritos no Quadro 2. Quando na impossibilidade da utilização de termo MeSH/DeCS, procedeu-se a utilização de termos não-MESH. Após a localização de trabalhos congruentes aos parâmetros a serem analisados, deu-se, em seguida, a avaliação metodológica de cada trabalho elegível por dois pesquisadores (V.Y.M. e D.C.V) com a inclusão e exclusão baseada em critérios metodológicos estabelecido por instrumentos conhecidos.^17,18

RESULTADOS

Cento e quarenta e seis (146) artigos foram analisados. Ensaios Clínicos randomizados não foram encontrados. Não se encontrou alocação em grupos distintos para o desfecho proposto por esta publicação, tanto como desfecho primário ou secundário. Quatro estudos foram incluídos na análise, pois representavam as melhores evidências sobre o tema previsto. Encontrou-se um trabalho que trata do assunto de interesse desta publicação, tratado como desfecho secundário e com amostra identificada pelos autores como insuficiente.⁸ As características metodológicas, assim como a análise descritiva e inferencial destes estudos estão resumidos nas Tabelas 1, 2 e 3.

DISCUSSÃO

Os ensaios clínicos randomizados, alvos preferidos das revisões sistemáticas sobre terapêutica, não foram encontrados até o momento para o tema em questão. No âmbito da ortopedia, muito se tem discutido sobre a validade e a necessidade de que se conduzam ERCs e há um esforço mundial para tal, principalmente quando relacionados a doenças de alta complexidade e de baixa prevalência, como é o caso dos tumores ósseos malignos. Nesta contexto, o desenho de estudo ideal seria o de ensaio clínico (multicêntrico), e que previsse como desfecho as complicações.¹⁹

Neste panorama, o uso da literatura disponível nos parece ser evidência que deve ser valorizada, em especial em situações clínicas, como as que envolvem populações oncológicas. Destarte, os resultados desta pesquisa devem servir de parâmetro e como possível ferramenta para nortear a validade externa de prováveis trabalhos sobre o assunto gerados por outros pesquisadores.

Quanto aos métodos de pesquisa que utilizados para o projeto, devemos atentar para alguns vieses de seleção. São vieses importantes: a restrição da linguagem, a ausência da procura de pesquisas não publicadas e/ou não indexadas (exemplo: anais de congresso). Houve também dificuldade, em algumas ocasiões, de definir e caracterizar desfechos, por vezes pouco precisos e específicos, e em geral, tratando as complicações como desfechos secundários.

A falta de estudos de melhor qualidade metodológica foi uma barreira ao nosso estudo. No entanto, causaram-nos grande surpresa os achados que a literatura nos fornece sobre o assunto. Encontramos diversos trabalhos com baixo nível de evidência (nível de evidência III ou IV).^{1-5,8,10,11,20,21,22-25} Isso é reflexo do desafio e da dificuldade em que se insere a pesquisa clínica sobre oncologia ortopédica.

CONCLUSÃO

Existe a necessidade de que haja a produção de trabalhos com o enfoque no tema proposto, em especial os ensaios clínicos randomizados, para que se possa chegar a uma conclusão mais sólida, no que diz respeito à substituição da patela em pacientes portadores de tumores ósseos no joelho. Novas pesquisas são necessárias para se chegar a conclusões sobre o tema proposto. A despeito da baixa qualidade metodológica, podem-se considerar altas a taxas de complicações pós ENC, na literatura mundial.

Artigo recebido em 05/09/09, aprovado em 27/05/10.

Trabalho realizado no Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Escola Paulista de Medicina - UNIFESP/EPM - São Paulo, SP, Brasil.

Todos os autores declaram não haver nenhum potencial conflito de interesses referente a este artigo.

• 1. Rougraff BT, Simon MA, Kneisl JS, Greenberg DB, Mankin HJ. Limb salvage compared with amputation for osteosarcoma of the distal end of the femur. A long-term oncological, functional, and quality-of-life study. J Bone Joint Surg Am. 1994;76:649-56.
• 2. Simon MA, Aschliman MA, Thomas N, Mankin HJ. Limb-salvage treatment versus amputation for osteosarcoma of the distal end of the femur. J Bone Joint Surg Am. 1986;68:1331-7.
• 3. Frink SJ, Rutledge J, Lewis VO, Lin PP, Yasko AW. Favorable long-term results of prosthetic arthroplasty of the knee for distal femur neoplasms. Clin Orthop Relat Res. 2005;438:65-70.
• 4. Lewis MM, Chekofsky KM. Proximal femur replacement for neoplastic disease. Clin Orthop Relat Res. 1982(171):72-9.
• 5. Zehr RJ, Enneking WF, Scarborough MT. Allograft-prosthesis composite versus megaprosthesis in proximal femoral reconstruction. Clin Orthop Relat Res. 1996;(322):207-3.
• 6. Nizard RS, Biau D, Porcher R, Ravaud P, Bizot P, Hannouche D, et al. A meta-analysis of patellar replacement in total knee arthroplasty. Clin Orthop Relat Res. 2005(432):196-203.
• 7. Pakos EE, Ntzani EE, Trikalinos TA. Patellar resurfacing in total knee arthroplasty. A meta-analysis. J Bone Joint Surg Am. 2005;87:1438-45.
• 8. Schwab JH, Agarwal P, Boland PJ, Kennedy JG, Healey JH. Patellar complications following distal femoral replacement after bone tumor resection. J Bone Joint Surg Am. 2006;88:2225-30.
• 9. Mendonça SM, Cassone AE, Brandalise SR. Avaliação funcional dos pacientes portadores de sarcomas ósseos submetidos à tratamento cirúrgico utilizando a endoprótese total ou parcial, na substituição da extremidade distal do fêmur. Acta Ortop Bras. 2008;16:13-8.
• 10. Kawai A, Backus SI, Otis JC, Healey JH. Interrelationships of clinical outcome, length of resection, and energy cost of walking after prosthetic knee replacement following resection of a malignant tumor of the distal aspect of the femur. J Bone Joint Surg Am. 1998;80:822-31.
• 11. Kawai A, Lin PP, Boland PJ, Athanasian EA, Healey JH. Relationship between magnitude of resection, complication, and prosthetic survival after prosthetic knee reconstructions for distal femoral tumors. J Surg Oncol. 1999;70:109-15.
• 12. Shin DS, Weber KL, Chao EY, An KN, Sim FH. Reoperation for failed prosthetic replacement used for limb salvage. Clin Orthop Relat Res. 1999(358):53-63.
• 13. Atallah AN. The Cochrane Collaboration: shared evidence for improving decision-making in human health. Sao Paulo Med J. 1999;117(5):183-4.
• 14. Castro AA, Clark OA, Atallah AN. Optimal search strategy for clinical trials in the Latin American and Caribbean Health Science Literature Database (LILACS). Sao Paulo Med J. 1997;115:1423-6.
• 15. Cook DJ, Mulrow CD, Haynes RB. Systematic reviews: synthesis of best evidence for clinical decisions. Ann Intern Med. 1997;126:376-80.
• 16. Cochrane Handbook for Systematic Reviews of Interventions 4.2.4 [updated March 2005]. In: Higgins JPT, Green S, editors. The Cochrane Library. Chichester, UK: John Wiley & Sons, Ltd.; 2005.
• 17. Jadad AR, Moore RA, Carroll D, Jenkinson C, Reynolds DJ, Gavaghan DJ et al. Assessing the quality of reports of randomized clinical trials: is blinding necessary? Control Clin Trials. 1996;17:1-12.
• 18. Schulz KF, Chalmers I, Hayes RJ, Altman DG. Empirical evidence of bias. Dimensions of methodological quality associated with estimates of treatment effects in controlled trials. Jama. 1995;273:408-12.
• 19. Wright JG, Gebhardt MC. Multicenter clinical trials in orthopaedics: time for musculoskeletal specialty societies to take action. J Bone Joint Surg Am. 2005;87:214-7.
• 20. Bickels J, Wittig JC, Kollender Y, Henshaw RM, Kellar-Graney KL, Meller I et al. Distal femur resection with endoprosthetic reconstruction: a long-term followup study. Clin Orthop Relat Res. 2002(400):225-35.
• 21. Kawai A, Muschler GF, Lane JM, Otis JC, Healey JH. Prosthetic knee replacement after resection of a malignant tumor of the distal part of the femur. Medium to long-term results. J Bone Joint Surg Am. 1998;80:636-47.
• 22. Kabukcuoglu Y, Grimer RJ, Tillman RM, Carter SR. Endoprosthetic replacement for primary malignant tumors of the proximal femur Clin Orthop Relat Res. 1999(358):8-14.
• 23. Shih LY, Sim FH, Pritchard DJ, Rock MG, Chao EY. Segmental total knee arthroplasty after distal femoral resection for tumor. Clin Orthop Relat Res. 1993(292):269-81.
• 24. Zeegen EN, Aponte-Tinao LA, Hornicek FJ, Gebhardt MC, Mankin HJ. Survivorship analysis of 141 modular metallic endoprostheses at early followup. Clin Orthop Relat Res. 2004(420):239-50.
• 25. Viola DCM, Cardozo Filho NS, Nunes RT, Godoy FAC, Petrilli MdT, Korukian M et al. O uso de espaçadores com antibiótico no tratamento das infecções em endopróteses de joelho. Acta Ortop Bras. 2009;17(3):144-8.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  11 Abr 2011
• Data do Fascículo
  2011

Histórico

• Recebido
  05 Set 2009
• Aceito
  27 Maio 2010