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Globalização dos movimentos sociais: a resposta social à Globalização Corporativa Neoliberal

Social movement globalization: the social response to Corporate Neoliberal Globalization

DEBATEDORES DISCUSSANTS

Globalização dos movimentos sociais: a resposta social à Globalização Corporativa Neoliberal

Social movement globalization: the social response to Corporate Neoliberal Globalization

Guilherme Franco Netto

Funasa. guilherme.netto@funasa.gov.br

A tese central do artigo "A globalização dos movimentos sociais: resposta social à Globalização Corporativa Neoliberal", de autoria de Carlos Eduardo Siqueira, Hermano Castro e Tânia Araújo, é que, em resposta aos diversos impactos negativos da Globalização Corporativa Neoliberal, apresentada como o modelo hegemônico do capitalismo no final do século 20, os movimentos sociais internacionais têm tecido uma nova forma de luta, por meio da construção de redes, que coordenam e conduzem as suas ações via internet.

A Globalização Corporativa Neoliberal é caracterizada, de acordo com a revisão bibliográfica realizada pelos autores, como uma forma particular de capitalismo, onde, a partir do Consenso de Washington, a tese do Estado de Bem-Estar Social foi abandonada pelos países do Primeiro Mundo e pelos organismos financiadores internacionais, apresentando-se como alternativa um conjunto de princípios de reordenamento do mercado, caracterizado pela necessidade de estabilização das economias e do controle inflacionário; reformas estruturais do Estado, incluindo a sua redução e a privatização; e abertura da economia. A isso, soma-se uma nova onda de aprimoramento tecnológico, tendo como base a microeletrônica e o microprocessamento, determinando profundos impactos, principalmente nas áreas de informação, transporte e telecomunicações, possibilitando a automação e a flexibilização da produção, facilitando, por seu turno, a intensificação da concentração global do poder e do capital.

Os autores evidenciam que este modelo foi aplicado em quase toda a América Latina e África, e em menor grau na Ásia, gerando diversos impactos negativos no ambiente, na economia, na vida social e na saúde. Interessante observar que considerando a relação dos "indicadores" negativos apresentados pelos autores: poluição ambiental; expansão da pobreza e da desigualdade; enfraquecimento das relações trabalhistas; ciranda especulativa do mercado financeiro; e, erosão da democracia, a deterioração de alguns destes foi extremamente evidente em nosso país ao longo das últimas duas décadas. Entretanto, vale destacar que alguns outros graves problemas mundiais, embora não citados pelos autores, devam ser considerados como resultantes da Globalização Corporativa Neoliberal, em particular a violência social urbana, que no Brasil, como exemplo, é responsável por grande parte da mortalidade, principalmente entre homens jovens.

Como resposta a esse estado de coisas, os autores apresentam uma breve discussão sobre as bases filosóficas e teóricas que explicam a "construção" das redes mundiais de movimentos sociais antiglobalização, que são redes anti-hegemônicas à Globalização Corporativa Neoliberal, que coordenam e conduzem ações via internet. Citam como exemplos de êxito desta forma de ação o Fórum Social Mundial, nas suas três versões – cujo lema é "Um outro mundo é possível" – bem como o que se caracterizou como a Revolta dos Zapatistas e a Batalha de Seattle.

Identificam que essas redes têm algumas características comuns, tais como a organização policêntrica; flexibilidade, fluidez e autonomia – aqui também incluiria a volatilidade, uma vez que podem ser fenômenos temporais, não necessariamente contínuos; táticas foquistas; desafiadoras de limites geopolíticos e de legalidade; e apresentam tipologias variadas. São também discutidos potenciais mecanismos de avaliação dessas redes.

Ao indagar a natureza dessas redes, ou seja, a favor do que elas se mobilizam, os autores apresentam alguns princípios ou eixos agregadores, os quais aqui estão parcialmente modificados: 1) direitos humanos, ambientais e sociais; 2) fortalecimento da democracia representativa e participativa; 3) equidade (por uma nova ordem econômica internacional); 4) sustentabilidade socioecológica; 5) prosperidade como resultado da satisfação das necessidades humanas e ambientais, e 6) controle da especulação e da ganância do capital.

Carlos Eduardo Siqueira, Hermano Castro e Tânia Araújo concluem o artigo destacando que a humanidade caminhará nas próximas décadas dependendo do resultado do embate entre esses dois grandes blocos de força, a Globalização Corporativa Neoliberal e as Redes Mundiais de Movimentos Sociais Anti-Globalização. Entretanto, também afirmam que, acerca do Fórum Social Mundial, ainda é cedo, no entanto, para avaliar até que ponto esta praça (o Fórum Social Mundial) permitirá a construção de plataformas comuns de luta e unidade entre setores sociais e grupos políticos com propostas político-ideológicas distintas e muitas vezes divergentes.

Considero o artigo sob debate uma excelente oportunidade para que os leitores de Ciência & Saúde Coletiva possamos identificar subsídios para compreender o contexto no qual essas redes estão sendo germinadas e construídas, bem como investigar suas naturezas e objetivos.

Por fim, o artigo suscitou-me a curiosidade de refletir se, no processo de construção, consolidação e ampliação da reforma sanitária brasileira, temos, de alguma forma, construído vínculo com essas redes. Se sim, onde e como? Se não, por quê?

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Fev 2004
  • Data do Fascículo
    2003
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