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EDITORIAL

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Se pensarmos nas clássicas tábuas de mortalidade devido a condições mórbidas diversas, é possível fazer remontar a epidemiologia ao século XVII. Como ramo específico da ciência (enquanto ciência que estuda a distribuição das doenças e outros agravos e seus determinantes nas populações), entretanto, a epidemiologia existe enquanto tal a partir somente do século XIX. Trata-se, portanto, de uma ciência muito jovem e em processo de consolidação e (re) definição de seus paradigmas.

Na formulação de Morabia, o bom epidemiologista seria aquele que, ao ser flexível e consistente o suficiente para adaptar um conjunto de conceitos e métodos a objetos específicos de pesquisa, é capaz igualmente de fazer com que os próprios métodos e conceitos se redefinam.

Neste início de milênio, a epidemiologia tem de se haver com um avanço vertiginoso do conhecimento, não apenas intrínseco à disciplina, mas, especialmente, nas interfaces que mantém e vem ampliando com campos que vão da biologia molecular à ecologia e às ciências sociais. Por outro lado, o mundo contemporâneo apresenta à epidemiologia, e diferentes campos do conhecimento que com ela estabelecem interfaces, desafios prementes, referentes, por exemplo, à análise e formulação de respostas a questões como a degradação da qualidade de vida nas metrópoles, as mudanças climáticas em curso ou a eventual sinergia entre problemas estruturais e agravos à saúde (pense-se a propósito na inter-relação entre consumo e tráfico de drogas, violência, pauperização e degradação ambiental, e disseminação de doenças infecciosas).

Por ocasião do XVIII Congresso Mundial de Epidemiologia/VII Congresso Brasileiro de Epidemiologia, que tem lugar em 20-24 de setembro de 2008, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, mostra-se oportuno proceder a um balanço da epidemiologia contemporânea nas suas interfaces com diferentes ciências, como a biologia molecular, a geografia, a história e a antropologia, assim como com novos métodos, na fronteira com a matemática, a estatística, a biologia e a medicina.

Uma epidemiologia em constante processo de renovação, dúvida e proposição de conceitos e métodos é essencial à compreensão e avaliação das questões contemporâneas das ciências biomédicas na era da genômica e pós-genômica (pois está em curso a revolução da assim denominada "genômica funcional") e do estudo dos determinantes da saúde e da doença, não apenas neste nível micro e intra-individual, como também no nível meso e inter-individual (como na análise da dinâmica das redes sociais), e ainda no nível propriamente ecológico, da sociedade e do espaço geográfico.

Desejamos aos leitores uma agradável leitura deste número de Ciência e Saúde Coletiva, em que procuramos auscultar algumas das linhas de força da epidemiologia contemporânea nas suas interfaces com as demais ciências e o mundo contemporâneo. Não resta dúvida de que outras dimensões poderiam ser exploradas, mas num número que é basicamente fruto da prospecção de tendências recentes no âmbito da epidemiologia brasileira, temos aqui o que nos foi possível fazer emergir, como na máxima socrática de que o conhecimento existe ou está em processo de fazer-se, mas que cabe ao pensamento organizado (no caso de Sócrates à filosofia, no processo que denominou "maiêutica", sinônimo de "obstetrícia") partejá-lo, para que ele possa vir à luz.

Francisco Inácio Bastos, Michael Reichenheim, Claudio José Struchiner

Editores convidados

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Out 2008
  • Data do Fascículo
    Dez 2008
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