Acessibilidade / Reportar erro

Aspectos relacionados aos efeitos da desigualdade de renda na saúde: mecanismos contextuais

Issues regarding the effects on health of income inequality: contextual mechanisms

Resumos

O Brasil é um dos países mais desiguais em distribuição de renda e a influência desse fator na saúde das pessoas é controversa. Este artigo revisou a metodologia para estudos contextuais e mecanismos de ação que podem explicar o efeito contextual da desigualdade de renda na saúde. O estudo de efeitos contextuais necessita de teorias multiníveis bem formuladas que identifiquem o papel de cada variável no modelo, e o nível de agregação ideal das variáveis contextuais. Foram identificadas quatro explicações: (1) artefato estatístico; (2) comparação social;(3) subinvestimento público; (4) capital social. A contribuição relativa de cada um desses mecanismos não está ainda bem avaliada. Concluímos que a existência de diferentes mecanismos de ação pode explicar parte da heterogeneidade dos resultados. Outra explicação é que a desigualdade de renda pode captar outros construtos, como estratificação social ou políticas públicas e, em alguns casos, pode não ser um bom marcador de tais construtos. Estudos com maior poder de estabelecimento de relação causal são necessários. Uma possibilidade é a avaliação do impacto de políticas de intervenção direcionadas para redistribuição de renda.

Desigualdade; Renda; Efeitos contextuais; Mecanismos de ação; Multinível


Brazil is one of the most unequal countries in income distribution. The influence of this factor on people's health is controversial. This article reviews the contextual effects and possible pathways linking income inequality to health. Contextual effect studies need well-developed multilevel theories, identifying the roles of variables in the explaining model, especially the role of individual level variables and the level of aggregation of contextual variables. Four explanations for the relationship between income inequality and health were identified: (1) statistical artifact; (2) social comparison; (3) underinvestment in social police; (4) social capital. The relative contribution of each of these mechanisms has not been well evaluated yet. We concluded that part of the heterogeneity found in the studies results may be explained by different pathways. Alternatively, income inequality may be a proxy for social stratification and less investment in public policies, but the Gini coefficient may be an unsuitable marker for such constructs in certain circumstances. More powerful designs to ascertain cause relationship should be applied. One possibility is to study the effect of intervention policies aimed at income redistribution.

Income; Inequality; Multilevel; Contextual effects; Pathways


TEMAS LIVRES FREE THEMES

Aspectos relacionados aos efeitos da desigualdade de renda na saúde: mecanismos contextuais

Issues regarding the effects on health of income inequality: contextual mechanisms

Roger Keller Celeste; Paulo Nadanovsky

Departamento de Epidemiologia, Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rua São Francisco Xavier, 524/7º andar, Maracanã. 20550-900 Rio de Janeiro RJ. rk_celeste@hotmail.com

RESUMO

O Brasil é um dos países mais desiguais em distribuição de renda e a influência desse fator na saúde das pessoas é controversa. Este artigo revisou a metodologia para estudos contextuais e mecanismos de ação que podem explicar o efeito contextual da desigualdade de renda na saúde. O estudo de efeitos contextuais necessita de teorias multiníveis bem formuladas que identifiquem o papel de cada variável no modelo, e o nível de agregação ideal das variáveis contextuais. Foram identificadas quatro explicações: (1) artefato estatístico; (2) comparação social;(3) subinvestimento público; (4) capital social. A contribuição relativa de cada um desses mecanismos não está ainda bem avaliada. Concluímos que a existência de diferentes mecanismos de ação pode explicar parte da heterogeneidade dos resultados. Outra explicação é que a desigualdade de renda pode captar outros construtos, como estratificação social ou políticas públicas e, em alguns casos, pode não ser um bom marcador de tais construtos. Estudos com maior poder de estabelecimento de relação causal são necessários. Uma possibilidade é a avaliação do impacto de políticas de intervenção direcionadas para redistribuição de renda.

Palavras-chave: Desigualdade, Renda, Efeitos contextuais, Mecanismos de ação, Multinível

ABSTRACT

Brazil is one of the most unequal countries in income distribution. The influence of this factor on people's health is controversial. This article reviews the contextual effects and possible pathways linking income inequality to health. Contextual effect studies need well-developed multilevel theories, identifying the roles of variables in the explaining model, especially the role of individual level variables and the level of aggregation of contextual variables. Four explanations for the relationship between income inequality and health were identified: (1) statistical artifact; (2) social comparison; (3) underinvestment in social police; (4) social capital. The relative contribution of each of these mechanisms has not been well evaluated yet. We concluded that part of the heterogeneity found in the studies results may be explained by different pathways. Alternatively, income inequality may be a proxy for social stratification and less investment in public policies, but the Gini coefficient may be an unsuitable marker for such constructs in certain circumstances. More powerful designs to ascertain cause relationship should be applied. One possibility is to study the effect of intervention policies aimed at income redistribution.

Key words: Income, Inequality, Multilevel, Contextual effects, Pathways

Introdução

No Brasil, as desigualdades na distribuição de renda são grandes e urge que se aprofundem estudos sobre seus efeitos na incidência de doenças. No ranking de distribuição de renda das Nações Unidas1, dentre 124 países, a Dinamarca apresenta o menor nível de desigualdade de renda, com um Gini de 24,7. O Brasil está na posição 117, com um Gini de 59,3, e a Namíbia, o país com o maior índice, possui um Gini de 70,7. Não obstante, há muita variação no nível de desigualdade dentro do Brasil. Dos 5.507 municípios brasileiros, enquanto Santa Maria do Herval (Rio Grande do Sul) apresenta um Gini de 36,0, Jutaí (Amazonas) apresenta um valor de 82,02 . Além de estar associada à saúde das pessoas, a desigualdade de renda também é a principal explicação para as iniquidades em saúde, quando medida pelo índice de concentração3.

Apesar de antiga, só recentemente a discussão sobre efeitos contextuais na saúde tem despertado mais atenção dos pesquisadores. A magnitude do efeito contextual da renda média parece ser modesta4 e há quem acredite que não exista efeito contextual5,6. Já os efeitos da desigualdade de renda ainda são alvo de mais controvérsias7-9.

Efeitos de variáveis contextuais

Já em 1842, Edwin Chadwick relatava um forte gradiente em termos de classe social, mostrando que artesãos e camponeses morriam mais jovens do que os nobres. Além disso, apontava para uma diferença entre os locais de residência. Tanto os nobres como camponeses de Liverpool morriam mais cedo do que os de Bath10. Tal efeito é chamado de contextual e é atribuído às variáveis contextuais.

As variáveis contextuais, às vezes chamadas de ecológicas, são classificadas em três tipos: (1) ambientais; (2) agregadas e (3) globais/integrais11-14. Variáveis agregadas são características de grupo cuja origem são medidas individuais, como é o caso da renda média de um país. Nesse caso, a medida ecológica é obtida somente após a coleta de dados individuais.

Um verdadeiro efeito contextual, quando se estuda uma variável agregada, deve ser separado do efeito individual da variável que o originou. O efeito de uma média incorpora a noção holística de que o conjunto é mais do que a soma das partes15,16. Quando isso ocorre, a variável agregada não mede o mesmo que a variável individual que a originou, mas representa um outro construto16. Por exemplo, a renda média de uma comunidade pode representar um construto diferente da média aritmética das rendas dos indivíduos. Ela pode medir a presença de outras características não trazidas pela renda individual, tais como a presença de áreas de lazer, arborização, facilidades de transporte, entre outros atributos do local. A separação dos efeitos individuais e contextuais, quando se analisam variáveis agregadas, só pode ser feita quando variáveis em ambos níveis, individual e contextual, estiverem presentes na análise4,17.

A existência de um verdadeiro efeito contextual do local de moradia sobre a saúde das pessoas é tema de ampla discussão acadêmica e ainda precisa ser mais bem explicada18 Segundo Diez-Roux19, existe efeito contextual quando uma característica particular do grupo apresenta um efeito sobre a saúde dos indivíduos após o controle por variáveis de confundimento, que podem estar no nível ecológico ou individual.

Para alguns autores, uma vez que a doença é um atributo individual, qualquer efeito contextual deve ser incorporado individualmente, via mecanismos biológicos13,20,21, e os confundimentos devem ser controlados nesse nível22,23. Tentativas de controle de confundimento no nível ecológico são difíceis, pois variáveis que são confundimento no nível individual podem não ser confundimento no nível agregado21,24. A escolha das variáveis que funcionam como intermediárias entre os dois níveis depende de uma teoria multinível4,20,25. Tal teoria definiria de forma operacional quais variáveis seriam mediadoras do processo e, portanto, não poderiam ser fatores de confundimento. Por exemplo, se o efeito contextual da riqueza municipal na saúde ocorre porque municípios mais pobres fornecem menos e/ou piores serviços públicos de saúde, então a oferta/qualidade dos serviços é uma variável intermediária entre o efeito da pobreza municipal e a saúde da população, e não confundimento.

Entretanto, pode ser que variáveis contextuais atuem diretamente, sem a intermediação de variáveis individuais26,27. Fica implícito nesta ideia que qualquer variável individual poderia ser fator de confundimento, dado que não seria mediadora. Quando isto ocorre, qualquer diferença na prevalência/incidência de uma doença entre duas áreas geograficamente definidas poderia ser atribuída ao desbalanceio de alguma variável individual e não ao efeito contextual. Isto é o que se chama de confundimento composicional20 ou de nível cruzado26. Como forma de minimizar confundimento, Oakes22,28 propôs a adoção de ensaios randomizados comunitários para avaliação de efeitos contextuais.

Um problema particular para a criação de variáveis agregadas relacionadas a áreas é o nível de agrupamento geográfico, isto é, se a variável individual de origem será agregada em nível de município, bairro, nação, etc. Variáveis integrais, como, por exemplo, uma empresa ser pública ou privada, por si só já definem uma população de indivíduos a priori. Entretanto, variáveis agregadas podem ser estudadas em diferentes níveis e cada nível pode expressar um diferente mecanismo causal17. Áreas geográficas definidas por razões políticas podem estar ligadas a mecanismos políticos; áreas definidas pela vizinhança percebida pelos moradores podem estar ligadas a mecanismos de coesão e suporte social entre os habitantes; por fim, áreas definidas com base na organização dos serviços de saúde, tais como distritos sanitários, podem indicar mecanismos causais relacionados ao acesso aos serviços de saúde4. Áreas definidas por critérios geográficos/ambientais podem revelar mecanismos relacionados à natureza, como a influência das correntes de ar em termos de poluição ou alagamentos29.

Em relação ao problema do agrupamento de análise, três aspectos devem ser considerados. Primeiramente, seria inapropriado testar a hipótese de que um efeito contextual possui um determinado mecanismo de ação baseando-se em áreas definidas por razões que não definem tal mecanismo. Por exemplo, testar a hipótese de que o efeito contextual atua por coesão social em áreas exclusivamente definidas por critérios políticoadministrativos. Segundo, agrupar indivíduos em áreas muito pequenas pode não refletir a verdadeira exposição contextual, pois um indivíduo pode estar exposto a diferentes áreas ao longo de sua vida, devido ao seu ir e vir através de áreas próximas. Terceiro, o estudo de múltiplos mecanismos contextuais fica dificultado quando as áreas geograficamente definidas não são coincidentes. Seria difícil interpretar os resultados de um estudo sobre o efeito de um mecanismo de ação (e.g. acesso aos serviços de saúde), controlando por outro mecanismo (e.g. capital social), se ambos tivessem limites geográficos definidos inadequadamente (e.g. código postal). A errada localização geográfica poderia levar a um erro de classificação dos indivíduos e, consequentemente, confundimento residual considerável.

A forma como indivíduos são agrupados pode trazer complexidade hierárquica e a proposta para reduzir tais problemas é o uso de modelos multiníveis30,31. Em epidemiologia, a complexidade hierárquica tem sido baseada em modelos aninhados (e.g. indivíduos agrupados em bairros); no entanto, métodos que decompõem variância em modelos cruzados (e.g. indivíduos pertencentes a dois níveis superiores cujas bordas geográficas não são equivalentes) foram descritos em estudos na área da educação32.

Um aspecto pouco estudado é a defasagem no tempo ou lag time entre a exposição à alguma variável contextual e uma doença17,26. É pouco provável que variáveis contextuais tenham um efeito imediato33. Se a exposição contextual permanece constante por algum tempo, a medição atual pode ser uma especificação adequada, do contrário um real efeito pode não ser detectado26. Outra dificuldade para se estabelecer um período exato de indução pode ocorrer porque, dado que uma exposição contextual é vista como causa de várias doenças com diferentes mecanismos de ação, deve haver diferentes tempos de indução para cada uma, ao invés de um tempo universal de indução8,34.

Efeitos da desigualdade de renda

Origens da hipótese sobre o efeito da desigualdade de renda na saúde

Preston34, em 1975, foi o primeiro autor conhecido a sugerir que uma redução na desigualdade de renda pudesse aumentar a expectativa de vida, mesmo sem alterar a renda média. Preston baseou sua conclusão na suposição de que a curva observada na relação ecológica entre renda média e expectativa de vida fosse verdadeira também para o nível individual. Originalmente, Preston utilizou dados de vários países das décadas de 1900, 1930 e 1960. Embora ele não tenha testado empiricamente, inferiu que um aumento da renda das pessoas mais pobres teria efeito maior em elevar a longevidade delas do que redução da renda dos mais ricos teria em diminuir a longevidade desses. Realizamos análise semelhante com dados dos 5.507 municípios brasileiros para os anos de 1991 e 2000 com técnica de suavização de Lowess, com bandwith de 25%35 (Figura 1).


Preston queria explicar porque a curva referente a 1960 era mais alta do que a curva de 1930. Semelhante situação é vista na nas décadas de 1991 e 2000 no Brasil (Figura 1). Assim, se todos os países (ou municípios) tivessem reduzido entre seus cidadãos a desigualdade de renda no período de 1930 até 1960, esta poderia ser uma das explicações para o aumento generalizado da expectativa de vida em quase todos os países.

Em 1979, Rodgers36 testou, entre 56 países, a hipótese de que a desigualdade de renda estivesse associada à mortalidade infantil, expectativa de vida ao nascer e expectativa de vida aos cinco anos. A consistência da relação, mesmo depois de controlada pela renda média, fez com que Rodgers considerasse este o mais importante resultado do seu trabalho.

O tema da desigualdade de renda continuou sendo pesquisado durante a década de oitenta, mas somente em 1992 ganhou repercussão com uma publicação de Wilkinson37. Esse autor mostrou que a correlação entre a renda média e a expectativa de vida em 23 países da Organização para Desenvolvimento e Cooperação Econômica da Europa (ODCE) era de 0,38 em 1986 e de 0,08 em 1993 (Figura 2)38. O coeficiente de correlação entre crescimento econômico e expectativa de vida foi de apenas 0,07. Por outro lado, o coeficiente de correlação entre expectativa de vida e desigualdade de renda foi de 0,86 no Luxembourg Income Study.


A discussão subsequente sobre o assunto gerou diferentes versões sobre como a desigualdade de renda afeta a saúde. Mellor e Milyo39 apresentaram duas versões. Na versão fraca (weak version), a redistribuição de renda melhora a saúde dos pobres num grau maior do que as perdas em saúde dos ricos. Essa versão é consistente com a curvilinearidade observada na relação entre renda e mortalidade40, chamado de efeito do retorno diminuido41,42. Na versão forte (strong version), a redistribuição de renda teria capacidade de melhorar a saúde das pessoas pobres, que recebem renda, e dos ricos, que perdem renda. Postula-se que os mecanismos ligados a esta versão estejam associados à corrosão na coesão social. Assim, indivíduos, ricos ou pobres, de sociedades com baixa coesão social seriam alvo de problemas como crime, falta de investimentos públicos, bem como levar as pessoas a adotarem comportamentos insalubres como fumar, beber em excesso e ter uma vida sedentária39.

Wagstaff e Van Doorslaer43 propuseram quatro diferentes versões para o efeito da renda. Nas quatro, a saúde populacional média está relacionada à desigualdade de renda, devido à curvilinearidade na relação individual entre renda e saúde. Entretanto, em apenas uma delas, foi postulado um verdadeiro efeito contextual da desigualdade de renda na saúde das pessoas.

Críticas aos estudos sobre o efeito da desigualdade de renda na saúde

Sete tipos de críticas foram feitas acerca dos estudos ligando a desigualdade de renda à saúde8,44-47: (1) possíveis fatores de confundimento não foram explorados; (2) a existência da relação parece ter sido afetada pela escolha do indicador de desigualdade de renda; (3) alguns estudos não consideraram políticas de transferência de renda e benefícios recebidos, no cálculo da desigualdade de renda; (4) em alguns estudos, a renda domiciliar per capita não foi equivalizada (equivalized household income); (5) análises de tendências não deram o mesmo apoio a essa associação que análises seccionais; (6) as correlações encontradas que apoiaram essa teoria foram instáveis e (7) fatores que originam a desigualdade de renda não foram discutidos.

As críticas relacionadas a confundimentos7,17,44,48,49, incluindo problemas sobre tamanho de área de agregação, não serão detalhadas nesta parte, uma vez que vêm sendo discutidas ao longo do texto.

Judge46,50, em reanálise dos dados do Luxembourg Income Study, não obteve os mesmos achados de Wilkinson37 e atribuiu isso a razões metodológicas como incorporação de escalas de equivalência para o cálculo da renda domiciliar. Judge também argumentou que a escolha do indicador de desigualdade de renda foi baseada nos resultados e não em teoria46. Entretanto, não existe consenso sobre o melhor indicador de desigualdade51, cada indicador parece revelar algo diferente45. Por exemplo, o coeficiente de Gini, baseado na renda domiciliar líquida, parece ser pouco influenciado por transferência de renda e ajuste por tamanho de domicilio, como o índice Robin Hood. Diferentemente, o índice Atkinson incorpora na sua fórmula julgamentos de valor sobre equidade45. Acredita-se que, quando se utilizam diferentes formas de mensurar um objeto e mesmo assim os resultados são semelhantes, então a conclusão é mais robusta. Seguindo essa ideia, Kawachi e Kennedy52 correlacionaram nove indicadores de desigualdade de renda entre si. Os resultados mostraram que o menor coeficiente de correlação foi de 0,86.

A Figura 3 mostra a tendência secular de mortalidade, de pobreza e de desigualdade de renda nos Estados Unidos. A tendência de mortalidade foi mais fortemente relacionada à pobreza do que à desigualdade de renda.


Com base no gráfico acima, Lynch et al.8 e Smith44 concluíram que, mesmo em países ricos, as taxas de mortalidade, ao contrário do que alegou Wilkinson38, foram mais ligadas às condições materiais, como pobreza absoluta, do que à desigualdade de renda. Kaplan et al.53 mostraram que, apesar de ter ocorrido um aumento da desigualdade de renda nos Estados Unidos na década de oitenta, este fato não foi capaz de reverter a tendência de queda da mortalidade. Por outro lado, Wilkinson54 argumenta que a tendência de declínio de mortalidade foi amenizada na mesma época em que a desigualdade de renda aumentou na Inglaterra e País de Gales.

O fato da correlação entre renda per capita e expectativa de vida ser baixa (r=0,08) entre países desenvolvidos tem sido forte argumento a favor da hipótese de que a desigualdade de renda seja mais importante do que renda absoluta37. Entretanto, opositores da hipótese de desigualdade de renda afirmam que este argumento não é estável. Lynch et al.55 refizeram as análises de Wilkinson dentre os 23 países da ODCE, acrescentando outros dez países do resto do mundo com renda superior a 10US$ mil, como Arábia Saudita, Barein e Bahamas, e mostraram que a correlação entre renda per capita e expectativa de vida era 0,51 (p<0,01). No entanto, é importante ressaltar que países ricos não são necessariamente países desenvolvidos. Wilkinson56 argumentou que, se o critério fosse exclusivamente a renda, a correlação com expectativa de vida entre os 21 países mais ricos do mundo em 1995 seria de -0,11. Aparentemente, o valor dessa correlação é dependente do ponto de corte em relação à renda per capita. A análise da Figura 1 mostra que há uma forte correlação entre renda e expectativa de vida até uma dada faixa de renda. Um ponto de corte razoável é considerar desenvolvidos os países que atravessaram a transição epidemiológica54.

Outra crítica feita à teoria de desigualdade de renda refere-se ao fato de que seus propositores não fazem menção às origens das desigualdades47. Segundo Muntaner e Lynch47, estas origens estão ligadas à estrutura de classes. Na concepção weberiana, o conceito de classes sociais está ligado à distribuição dos recursos, mas na concepção marxista, as classes são definidas pela distribuição dos meios de produção. Desta forma, na concepção marxista, a desigualdade de renda é fruto da estrutura política, social e econômica que privilegia a acumulação de renda pelos detentores dos meios de produção. Em resposta, Wilkinson57 argumenta que, nos dias de hoje, não é mais possível adotar uma abordagem marxista, pois a sociedade é muito mais estratificada do que a simples divisão burgueses/proletários.

O estado da arte

Com o intuito de definir se existe um efeito da desigualdade de renda sobre a saúde, destacam-se duas amplas revisões7,8. As tabelas 1 e 2 mostram os resultados em relação ao nível de agregação geográfica das análises, o tipo de estudo e o tipo de resultado obtido. A principal diferença entre as duas revisões é o número de artigos incluídos. Observa-se que a maior parte da evidência que dá suporte a teoria da desigualdade de renda vem de comparações internacionais, em especial de estudos ecológicos. A ausência de homogeneidade nos resultados não significa que a hipótese de desigualdade de renda não seja verdadeira; explicar a heterogeneidade dos resultados deve servir para clarificar lacunas na teoria.

A partir da revisão apresentada na Tabela 1, Lynch et al.8 concluíram que o efeito contextual da desigualdade de renda, se existe, não é universal e é pequeno. Os autores não incluíram estudos associando violência e desigualdade de renda, porque consideraram essa relação já estabelecida58. Segundo os autores, a evidência ligando desigualdade de renda e saúde provém basicamente de estudos ecológicos e de análises feitas nos Estados Unidos. Para eles, a explicação do efeito chamado de "exceção norteamericana" pode revelar diferenças de políticas relacionadas ao acesso aos serviços de saúde, transferência de renda e segregação geográfica de pobreza e afluência.

Wilkinson e Pickett7 incluíram setenta estudos a mais do que a revisão de Lynch et al.8, 27 desses referentes a homicídios. Retiramos esses estudos da Tabela 2, para aumentar a comparabilidade dessas duas revisões, dado que homicídios não foram incluídos na revisão de Lynch et al.8. Wilkinson e Pickett7 concluíram que existe evidência em favor do efeito da desigualdade de renda quando essa é uma medida de desigualdade de posição socioeconômica no nível individual. Uma vez que a ideia é medir a posição socioeconômica dos indivíduos, é inadequada a utilização de regressões multiníveis em que as variáveis de controle sejam variáveis que expressem a posição socioeconômica, como renda individual ou educação. Além disso, de acordo com os autores, o Gini não seria capaz de detectar o efeito da desigualdade de renda na saúde em áreas pequenas, onde as pessoas mais provavelmente possuem semelhante posição socioeconômica.

Apesar de uma aparente divergência nas conclusões das duas revisões, é importante notar que elas possuíam objetivos diferentes; os autores analisaram a evidência científica focando em diferentes mecanismos de ação. Lynch et al.8 revisaram a literatura em busca de um efeito contextual do Gini. Nesse caso, o uso de regressões multiníveis e controle por variáveis individuais é importante. Na interpretação de Wilkinson e Pickett7, o Gini é uma variável substituta para a estratificação social e, em tese, não possui efeito contextual.

A evidência brasileira

Nossa revisão de literatura identificou oito estudos realizados no Brasil sobre os efeitos da desigualdade de renda na saúde59-66. Na maioria, as associações brutas mostraram que, quanto maior as desigualdades de renda, piores as condições de saúde, mas esse efeito desaparecia após o controle por outras variáveis. Nenhum deles, entretanto, avaliou mecanismos que explicassem os efeitos brutos, uma vez que nenhum modelo teórico foi apresentado. Assim, mediadores podem ter sido misturados com confundimentos na tentativa de controle59-66. Alguns estudos selecionaram as variáveis para os modelos de regressão através de técnicas stepwise59-61,64,65. Em outros, somente poucos ajustes foram feitos62,63. O único estudo multinível encontrado ajustou por uma série de variáveis e também parece ter sobreajustado66.

Os estudos brasileiros, além de desafiar a "exceção norteamericana", lançam dúvidas sobre o fato de que a relação entre desigualdade de renda e saúde possui efeitos mais fracos, ou inexistentes, em áreas geográficas menores7. Diferentes níveis de agregação foram analisados no contexto brasileiro: bairros61,66, áreas administrativas intramunicipais59,64,65, municípios60,62,64 e estados63.

Teoria de que a associação entre desigualdade de renda e saúde é um artefato estatístico

Esta explicação tem origem no efeito do retorno diminuído41, que é visto em função da curvilinearidade da relação individual renda-saúde. De acordo com esta interpretação, parte do efeito da desigualdade de renda visto em estudos ecológicos seria artificial e não haveria um real efeito contextual após o controle por renda individual40 A implicação da curvilinearidade da relação renda-saúde é de que o aumento da renda de uma pessoa pobre tem mais poder de melhorar a saúde do que igual redução teria em piorar a saúde de uma pessoa rica.

Alguns autores afirmam que não existe um artefato e que esse é um dos mecanismos de funcionamento da desigualdade de renda17,67. Uma redistribuição de renda levaria a uma real melhora na saúde média da população, mesmo que por vias puramente matemáticas17.

Wilkinson68 argumentou que a referida curvilinearidade, necessária para explicar a relação entre desigualdade de renda e expectativa de vida, não existe nos países desenvolvidos da ODCE, mas ainda assim a relação entre desigualdade de renda e expectativa de vida permanece. Wolfson et al.41 analisaram o quanto a curvilinearidade era capaz de explicar as associações e concluíram que a curvilinearidade existente não é suficiente para explicar os efeitos da desigualdade de renda.

A teoria de que o efeito da desigualdade de renda na saúde ocorre através do estresse crônico causado por comparações sociais

Os efeitos via comparação social são também chamados de efeitos psicosociais. Segundo essa explicação, a saúde depende não somente das condições materiais de vida, mas também da posição relativa que cada pessoa ocupa na hierarquia da sociedade38. Não há dúvidas sobre os efeitos da renda absoluta e das condições materiais de vida na saúde das pessoas, mas os efeitos da posição social relativa ainda são controversos. Postula-se que esses se dão pela incapacidade de um indivíduo de sustentar um padrão de consumo que mantenha a dignidade e respeitabilidade que a sociedade espera69. O problema da hierarquia social é que ela coloca as relações humanas no sentido vertical, do mais capaz e bem-sucedido no topo para os mais inadequados na parte de baixo57,69. Os mecanismos pelos quais a saúde é afetada estão associados ao estresse crônico. Indiretamente, o estresse induziria comportamentos de risco como fumar, comer compulsivamente e beber em excesso38,54. Diretamente, sentimentos oriundos de comparações sociais, como inferioridade, depressão, isolamento social, ansiedade e outros, afetam a saúde por mecanismos neuroendócrinos54,70,71. Evidências de que vias neuroendócrinas (e.g. altos níveis de cortisona por longos períodos) afetam a saúde são encontradas em estudos observacionais em humanos e estudos experimentais em outros primatas69-73.

Opositores da interpretação psicossocial apresentaram quatro limitações relacionadas a via direta de atuação8. Primeiro, permanece em aberto como são feitas as comparações sociais. Em relação a quem as pessoas se comparam? Por exemplo, pode ser que todas as pessoas se comparem ao indivíduo mais rico, ou ao indivíduo que esteja em posição central na estratificação social, mas pode ser também que não exista um padrão de comparação. Segundo, pode ser que as pessoas possuam múltiplos padrões de comparação, um para cada setor na vida (trabalho, relacionamentos sociais, etc.). Assim, dependendo do setor na vida, as pessoas podem ter sentimentos de superioridade ou inferioridade de forma variada74. Terceiro, se os sentimentos de inferioridade têm efeitos negativos, é possível que sentimentos de superioridade tenham efeitos positivos. Nesse caso, o balanço entre perdas e ganhos poderia ser compensado. Por último, deve-se considerar a dificuldade de separar os efeitos absolutos dos efeitos relativos. Se uma pessoa está abaixo de outra na escala relativa, é porque na dimensão absoluta ela também está, gerando colinearidade de dados75.

Embora a ideia de comparação social não postule um efeito contextual da desigualdade de renda, uma alternativa para testar este mecanismo é avaliar a média das distâncias relativas entre todos os pares de pessoas de um grupo. Tal avaliação genericamente é expressa pelo coeficiente de Gini8. Visto desta forma, o Gini é uma aproximação, no nível ecológico, para o grau de distanciamento de renda entre indivíduos. As tabelas 1 e 2 mostram que o Gini é mais fortemente associado à saúde em estudos ecológicos do que em estudos multiníveis. Uma possível explicação para isso é que os estudos multiníveis, na tentativa de controlar pelo efeito composicional, também controlaram o efeito do Gini por variáveis que representam a hierarquia social. O fato do efeito da desigualdade ser maior nas análises entre estados e países pode significar que o padrão de comparação social está situado nesse nível. Áreas muito pequenas são homogêneas socialmente em função da segregação residencial e o padrão de comparação pode estar fora do grupo7,57. Assim, a desigualdade entre áreas pode ser mais importante do que a desigualdade entre indivíduos em uma área61,76.

A teoria de que o efeito da desigualdade de renda na saúde ocorre através do subinvestimento público

A interpretação neomaterial55 apresenta uma explicação alternativa para o efeito contextual da desigualdade de renda. A desigualdade de renda pode influenciar diferentes políticas públicas, que reflitam os diferentes interesses dos mais pobres e dos mais ricos. Tanto maior a distância econômica entre eles, tanto mais distantes estão os interesses de ambos grupos77. Desse modo, cria-se um sistemático subinvestimento nos setores mais necessários para os pobres, em várias estruturas sociais, físicas, humanas e também de políticas de saúde pública55,78. Essas conclusões partem do pressuposto que as políticas públicas são definidas pelos interesses dos mais ricos e os investimentos necessários para os ricos não beneficiam e podem ser prejudiciais os pobres. Tais pressupostos podem não ser verdadeiros, em especial em países em desenvolvimento, onde a necessidade de infraestrutura básica requerida pelos ricos também beneficia os mais pobres79, de forma que regiões com mais desigualdade de renda podem apresentar melhor saúde66.

O principal suporte científico para esse mecanismo está nos achados de Kaplan et al.53. Os autores mostraram uma correlação de -0,62 entre o percentual do total da renda recebido pelos 50% mais pobres em cada estado dos Estados Unidos e mortalidade. Nesse mesmo estudo, o nível de desigualdade de renda também apresentou correlações com uma série de indicadores sociais, como o percentual de pobres com auxílio alimentação, qualidade da educação primária, percentual de indivíduos com seguro saúde e desemprego.

Estudos subsequentes, que avaliaram as políticas públicas como mediadores da desigualdade de renda, apresentaram resultados inconclusivos80,81. Por exemplo, indicadores de políticas sociais removeram o efeito da desigualdade de renda quando o desfecho foi mortalidade geral, mas não quando o desfecho foi mortalidade por causas preveníveis81. A desigualdade de renda pode, em algumas circunstâncias, ser um mero marcador de políticas públicas.

Outro aspecto importante a ser considerado é o significado do efeito residual. Se o mecanismo postulado é de que as políticas públicas são mediadores do efeito da desigualdade de renda, mas elas apenas removem parcialmente esse efeito, a que se deve o efeito residual? Três explicações podem ser pensadas. Uma possibilidade é que outro mecanismo pode existir. Outra explicação é que os indicadores usados podem não representar verdadeiramente as políticas públicas82. Por fim, a desigualdade de renda pode não estar causalmente ligada a políticas públicas82, é plausível que a desigualdade de renda seja uma consequência de políticas públicas.

A teoria de que o efeito da desigualdade de renda na saúde ocorre através do capital social

Ligações da desigualdade de renda com capital social e desse com a saúde das pessoas foram postuladas por Wilkinson54, comparando sociedades igualitárias com outras desiguais. Kawachi et al.83, num estudo ecológico nos Estados Unidos, relataram correlações entre níveis de confiança e desigualdade de renda da ordem de -0,70 e de níveis de confiança com mortalidade de -0,80. Numa recente revisão de estudos sobre esse assunto, Islam et al.84 encontraram associações fortes/moderadas em dezenove de 26 estudos ecológicos e em dez de onze estudos multiníveis. Ainda assim, os autores concluíram que cautela é necessária. Primeiro, porque a maioria dos achados positivos era de um único país, Estados Unidos. Segundo, porque nos estudos multiníveis pouca variação nos níveis de saúde entre áreas foi encontrada, isto é, as correlações intraclasse (ICC, que pode ser interpretado como o percentual da variação total que é atribuível a características contextuais, sendo o restante atribuível a fatores individuais) foram próximas de zero e, deste modo, a variabilidade entre áreas deve ser explicada por fatores individuais e não contextuais.

Capital social tem sido definido de formas diferentes por diferentes autores e quase sempre em relação a sua função. James Coleman, citado por Kawachi e Berkman85, define capital social como características da estrutura social que facilitam a ação de membros dentro de um grupo social, e Putnam86 enfatiza fatores como confiança e redes sociais, especialmente associações voluntárias, como determinantes do bom funcionamento das instituições públicas. O modo de medir capital social pode ser através dos níveis de confiança social, reciprocidade percebida, densidade de participação em associações cívicas, taxa de criminalidade entre outras87. Capital social distingue-se de outras formas de capital, como o capital físico (i.e. recursos materiais e financeiros) e o capital humano (i.e. conhecimento e informação). Ele situa-se na qualidade das relações interpessoais e, por definição, é uma propriedade do grupo e não das pessoas. No nível individual, pode-se medir as redes sociais através do número de amigos que alguém tem. Porém, mesmo indivíduos com pequena rede social poderiam ser beneficiados por estarem expostos a uma comunidade com alto capital social.

Os mecanismos que ligam capital social e saúde são vários. Um deles é comportamental85. Isto ocorre porque sociedades com mais capital social difundem mais rapidamente informações dentro da comunidade e os altos níveis de confiança estimulam adoção de novos comportamentos. Além disso, comunidades com mais capital social exercem um controle mais rígido sobre comportamentos desviantes85. Um outro mecanismo é relacionado ao acesso e controle sobre serviços públicos25,85. Comunidades coesas buscam coletivamente os mesmos objetivos de forma organizada através de mais participação política. Isto está de acordo com a explicação de subinvestimento social descrita anteriormente, uma vez que comunidades divididas possivelmente terão investimentos direcionados para aqueles grupos no poder e não para toda comunidade. O terceiro modo de ação está ligado às vias psicossociais oriundas das comparações sociais69,70,77,85. Sociedades com mais capital social formariam relações sociais horizontais, menos hierarquizadas e com mais suporte social entre as pessoas, portanto, gerando menos estresses crônicos ligados a comparações sociais.

Críticas à explicação de capital social são de natureza variada. Uma delas é que não existe um conceito claro e definido. Assim, os estudiosos podem estar mensurando algo que não sabem o que seja85,88-90. Em função da dificuldade de se saber o que realmente os indicadores de capital social estão expressando, há a necessidade de saber se ele realmente representa um construto contextual ou está apenas representando relações interpessoais do nível individual, como isolamento social, que tem reconhecida importância na saúde das pessoas85,88. Uma terceira crítica vem das possíveis interpretações políticas85,90. Por um lado, os políticos podem entender que capital social seja substituto de investimento público para desenvolvimento; por outro, podem compreender que seja função do governo investir em mais capital social.

Há também críticas de que fortes ligações sociais possam ser prejudiciais89,90. Muntaner e Lynch47 argumentaram que excessos para mais ou para menos são prejudiciais para a comunidade. Exemplos nesta linha de raciocínio inclui o fato de que muitas vezes fortes laços de amizade servem para difundir comportamentos insalubres como fumar e beber em excesso57. Um alto nível de capital social de alguns grupos da sociedade pode ter consequências ruins. Por exemplo, os nazistas e mafiosos foram grupos com alto capital social interno, o que poderia ser bom para a saúde dos seus integrantes, porém danoso para os de fora e para a sociedade como um todo89. Por fim, indicadores de capital social apresentaram correlações mais fortes quando associados com renda per capita do que com desigualdade de renda89. A questão da causalidade entre capital social e saúde ainda irá permear a literatura científica por um longo tempo.

Conclusões

Metodologias com maior poder de estabelecer relação causal devem ser consideradas. Por exemplo, programas de redução de desigualdade de renda, em geral por agências de governo, podem ser usados como forma de avaliar relações temporais. Além disso, outras dificuldades metodológicas (e.g. separação dos efeitos da renda absoluta e relativa) não devem ser vistas como formas de invalidar teorias, mas como desafios metodológicos.

A discussão acerca da existência de efeitos do Gini depende do mecanismo de ação que se acredite que ele represente e do desfecho que ele cause. Por exemplo, é possível que ele tenha relação causal forte com desfechos relacionados à violência e ao bem-estar psicológico, porém não tão forte ou nenhuma com condições de saúde (morbidades físicas e mentais). A relação entre desigualdade de renda e saúde ainda precisa ser mais bem explicada.

Quando os desfechos analisados são condições de saúde, o Gini pode ser um substituto para outras variáveis e não ter efeito per si. A identificação e a mensuração das variáveis que ele pretende representar é importante, pois permite testar com mais acuidade aquilo que é postulado em teoria. O Gini pode ter sido uma variável substituta ruim em alguns estudos. Isso explicaria parte da heterogeneidade de resultados encontrada na literatura.

Colaboradores

RK Celeste e P Nadanovsky participaram igualmente de todas as etapas da elaboração do artigo.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer à BMJ Publishing Group LTD. e Wiley-Blackwell Editors pela cessão das figuras 2 e 3, respectivamente.

Artigo apresentado em 02/10/2007

Aprovado em 21/07/2008

Versão final apresentada em 20/08/2008

  • 1
    United Nations Development Programme. Human Development Report. International cooperation at a crossroads: aid, trade and security in an unequal world. [site da Internet] 2005 [acessado 2006]. Disponível em: http://hdr.undp.org/en/reports/global/hdr2005/
  • 2. Programa das Nações Unidas para Desenvolvimento, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Fundação João Pinheiro. Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil [CD ROM]. [Software]. Versão 1.0.0. Belo Horizonte: ESM Consultoria; 2003.
  • 3. Wagstaff A, Paci P, Joshi H. Causes of inequality in health: who you are? where you live? or who your parents were? World Bank Policy Research Working Paper No 2713 2001 [acessado 2008 ago]. Disponível em: http://econ.worldbank.org
  • 4. Pickett KE, Pearl M. Multilevel analyses of neighbourhood socioeconomic context and health outcomes: a critical review. J Epidemiol Community Health 2001; 55(2):111-122.
  • 5. Reijneveld SA. Explanations for differences in health outcomes between neighbourhoods of varying socioeconomic level. J Epidemiol Community Health2001; 55(11):847.
  • 6. Kaufman JS. Socioeconomic context. Epidemiology2006;17(1):4-5.
  • 7. Wilkinson RG, Pickett KE. Income inequality and population health: A review and explanation of the evidence. Soc Sci Med 2006; 62(7):1768-1784.
  • 8. Lynch J, Smith GD, Harper S, Hillemeier M, Ross N, Kaplan GA, Wolfson M. Is income inequality a determinant of population health? Part 1. A systematic review. Milbank Q 2004;82(1):5-99.
  • 9. Macinko JA, Shi L, Starfield B, Wulu JT, Jr. Income inequality and health: a critical review of the literature. Med Care Res Rev 2003; 60(4):407-452.
  • 10. MacIntyre S. Area Inequalities in health: Health Variations. The Official Newsletter of the Economic & Social Research Council 1998;1:6-7.
  • 11. Szklo M, Nieto FJ. Epidemiology: Beyond the Basics. Gaithersburg: Aspen; 2000.
  • 12. Hox JJ. Applied multilevel analysis. [site da Internet] 1995 [acessado 2008 jul]. Disponível em: http://www.cmm.bristol.ac.uk/links/
  • 13. Morgenstern H. Ecologic Studies. In: Rothman KJ, Greenland S, editors. Modern epidemiology 2nd ed. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1998. p. 459-479.
  • 14. Susser M. The logic in ecological: I. The logic of analysis. Am J Public Health 1994; 84(5):825-829.
  • 15. Diez Roux AV. Bringing context back into epidemiology: variables and fallacies in multilevel analysis. Am J Public Health 1998; 88(2):216-222.
  • 16. Schwartz S. The fallacy of the ecological fallacy: the potential misuse of a concept and the consequences. Am J Public Health 1994; 84(5):819-824.
  • 17. Subramanian SV, Kawachi I. Income inequality and health: what have we learned so far? Epidemiol Rev 2004; 26:78-91.
  • 18. Kaplan GA. What's wrong with social epidemiology, and how can we make it better? Epidemiol Rev 2004; 26:124-135.
  • 19. Diez Roux AV. A glossary for multilevel analysis. J Epidemiol Community Health 2002; 56(8):588-594.
  • 20. Diez Roux AV. Multilevel analysis in public health research. Annu Rev Public Health 2000; 21:171-192.
  • 21. Morgenstern H. Ecologic studies in epidemiology: concepts, principles, and methods. Annu Rev Public Health 1995; 16:61-81.
  • 22. Oakes JM. Causal inference and the relevance of social epidemiology. Soc Sci Med 2004; 58(10):1969-1971.
  • 23. Diez Roux AV. The study of group-level factors in epidemiology: rethinking variables, study designs, and analytical approaches. Epidemiol Rev 2004; 26:104-111.
  • 24. Morgenstern H. Uses of ecologic analysis in epidemiologic research. Am J Public Health 1982; 72(12):1336-1344.
  • 25. Sampson RJ, Morenoff JD. Public Health and Safety in Context: Lessons from Community-Level Theory on Social Capital. In: Smedley BD, Syme SL, editors. Promoting health: intervention strategies from social and behavioral research Washington, D.C.: National Academy; 2000. p. 366-389.
  • 26. Blakely TA, Woodward AJ. Ecological effects in multi-level studies. J Epidemiol Community Health2000; 54(5):367-374.
  • 27. McMichael AJ. Prisoners of the proximate: loosening the constraints on epidemiology in an age of change. Am J Epidemiol 1999; 149(10):887-897.
  • 28. Oakes JM. The (mis)estimation of neighborhood effects: causal inference for a practicable social epidemiology. Soc Sci Med 2004; 58(10):1929-1952.
  • 29. Diez Roux AV. Investigating neighborhood and area effects on health. Am J Public Health 2001; 91(11):1783-1789.
  • 30. Birch S, Stoddart G, Beland F. Modelling the community as a determinant of health. Can J Public Health 1998; 89(6):402-405.
  • 31. Subramanian SV. The relevance of multilevel statistical methods for identifying causal neighborhood effects. Soc Sci Med 2004; 58(10):1961-1967.
  • 32. Shavelson RJ, Webb NM. Generalizability theory: a primer. Measurement methods for the social sciences series, no 1 Newbury Park: Sage Publications; 1991.
  • 33. Blakely TA, Kennedy BP, Glass R, Kawachi I. What is the lag time between income inequality and health status? J Epidemiol Community Health 2000; 54(4):318-319.
  • 34. Preston SH. The changing relation between mortality and level of economic development. Bull World Health Organ 2003; 81(11):833-841 [Reproduced from Population Studies 1975; 29(2):231-248]
  • 35. Hastie TJ, Tibshirani RJ. Generalised additive models. Monographs on Statistics and Applied Probability 43 London: Chapman and Hall; 1990.
  • 36. Rodgers GB. Income and inequality as determinants of mortality: an international cross-section analysis. Int J Epidemiol 2002; 31(3):533-538. [Reproduced from Population Studies 1979; 33(3):343-351]
  • 37. Wilkinson RG. Income distribution and life expectancy. BMJ 1992; 304(6820):165-168.
  • 38. Wilkinson RG. Socioeconomic determinants of health. Health inequalities: relative or absolute material standards? BMJ 1997; 314(7080):591-595.
  • 39. Mellor JM, Milyo J. Income Inequality and Individual Health: Evidence from the Current Population Survey. J Hum Resour 2002; 37(3):510-539.
  • 40. Gravelle H. How much of the relation between population mortality and unequal distribution of income is a statistical artefact? BMJ 1998; 316(7128):382-385.
  • 41. Wolfson M, Kaplan G, Lynch J, Ross N, Backlund E. Relation between income inequality and mortality: empirical demonstration. BMJ 1999; 319(7215):953-955.
  • 42. Backlund E, Sorlie PD, Johnson NJ. The shape of the relationship between income and mortality in the United States. Evidence from the National Longitudinal Mortality Study. Ann Epidemiol 1996; 6(1):12-20.
  • 43. Wagstaff A, van Doorslaer E. Income inequality and health: what does the literature tell us? Annu Rev Public Health 2000; 21:543-567.
  • 44. Smith GD. Income inequality and mortality: why are they related? BMJ 1996; 312(7037):987-988.
  • 45. Kawachi I. Income Inequality and Health. In: Berkman LF, Kawachi I, editors. Social epidemiology New York: Oxford University Press; 2000. p. 76-94.
  • 46. Judge K. Income distribution and life expectancy: a critical appraisal. BMJ 1995;311(7015):1282-1285.
  • 47. Muntaner C, Lynch J. Income inequality, social cohesion, and class relations: a critique of Wilkinson's neo-Durkheimian research program. Int J Health Serv 1999; 29(1):59-81.
  • 48. Wilkinson RG. Income inequality and population health: better measures of social differentiation and hierarchy are needed. BMJ 2002; 324(7343):978.
  • 49. Mackenbach JP. Income inequality and population health. BMJ 20025; 324(7328):1-2.
  • 50. Judge K, Mulligan JA, Benzeval M. The relationship between income inequality and population health. Soc Sci Med 1998; 47(7):983-985.
  • 51. Wilkinson RG. Commentary: A reply to Ken Judge: mistaken criticisms ignore overwhelming evidence BMJ 1995; 311(7015):1285-1287
  • 52. Kawachi I, Kennedy BP. The relationship of income inequality to mortality: does the choice of indicator matter? Soc Sci Med 1997; 45(7):1121-1127.
  • 53. Kaplan GA, Pamuk ER, Lynch JW, Cohen RD, Balfour JL. Inequality in income and mortality in the United States: analysis of mortality and potential pathways. BMJ 1996; 312(7037):999-1003.
  • 54. Wilkinson RG. Unhealthy societies: the afflictions of inequality. London: Routledge; 1996.
  • 55. Lynch J, Smith GD, Kaplan GA, House JS. Income inequality and mortality: importance to health of individual income, psychosocial environment, or material conditions. BMJ 2000; 320(7243):1200-1204.
  • 56. Wilkinson RG. Inequality and the social environment: a reply to Lynch et al. J Epidemiol Community Health 2000; 54(6):411-413.
  • 57. Wilkinson RG. Income inequality, social cohesion, and health: clarifying the theory-a reply to Muntaner and Lynch. Int J Health Serv 1999; 29(3):525-543.
  • 58. Hsieh C-C, Pugh MD. Poverty, Income Inequality, And Violent Crime: A Meta-Analysis Of Recent Aggregate Data Studies. Criminal Justice Review1993; 18(2):182-202.
  • 59. Pattussi MP, Marcenes W, Croucher R, Sheiham A. Social deprivation, income inequality, social cohesion and dental caries in Brazilian school children. Soc Sci Med 2001; 53(7):915-925.
  • 60. Baldani MH, Vasconcelos AG, Antunes JL. Associação do índice CPO-D com indicadores sócioeconômicos e de provisão de serviços odontológicos no Estado do Paraná, Brasil. Cad Saude Publica2004; 20(1):143-152.
  • 61. Szwarcwald CL, Andrade CL, Bastos FI. Income inequality, residential poverty clustering and infant mortality: a study in Rio de Janeiro, Brazil. Soc Sci Med 2002; 55(12):2083-2092.
  • 62. Barata RB, Ribeiro MC. Correlation between homicide rates and economic indicators in Sao Paulo, Brazil, 1996. Rev. Panam. Salud Públ 2000; 7(2):118-124.
  • 63. Messias E. Income inequality, illiteracy rate, and life expectancy in Brazil. Am J Public Health2003; 93(8):1294-1296.
  • 64. Szwarcwald CL, Bastos FI, Viacava F, de Andrade CL. Income inequality and homicide rates in Rio de Janeiro, Brazil. Am J Public Health 1999; 89(6):845-850.
  • 65. Szwarcwald CL, Bastos FI, Esteves MA, de Andrade CL, Paez MS, Medici EV, Derrico M. Desigualdade de renda e situação de saúde: o caso do Rio de Janeiro. Cad Saude Publica 1999; 15(1):15-28.
  • 66. Tassinari WS, de Leon AP, Werneck GL, Faerstein E, Lopes CS, Chor D, Nadanovsky P. Contexto sócio-econômico e percepção da saúde bucal em uma população de adultos no Rio de Janeiro, Brasil: uma análise multinível. Cad Saude Publica 2007; 23(1):127-136.
  • 67. Sutton GC. Mortality and distribution of income. Widening income inequalities cause poorer health. BMJ 1998; 316(7144):1612.
  • 68. Wilkinson RG. Mortality and distribution of income. Low relative income affects mortality. BMJ1998; 316(7144):1611-1612.
  • 69. Wilkinson RG. Health, hierarchy, and social anxiety. Ann N Y Acad Sci 1999; 896:48-63.
  • 70. Wilkinson RG. Mind the gap: hierarchies, health and human evolution. New Haven: Yale University Press; 2001.
  • 71. Marmot M, Wilkinson RG. Psychosocial and material pathways in the relation between income and health: a response to Lynch et al. BMJ 2001; 322(7296):1233-1236.
  • 72. Brunner E, Marmot M. Social organization, stress and health. In: Marmot M, Wilkinson RG, editors. Social determinants of health Oxford: Oxford University Press; 1999. p. 17-43.
  • 73. Goldman N. Social inequalities in health. Disentangling the underlying mechanisms. Ann N Y Acad Sci 2001; 954:118-139.
  • 74. Lynch J, Smith GD. Commentary: Income inequality and health: the end of the story? Int J Epidemiol 2002; 31(3):549-551.
  • 75. Kawachi I, Subramanian SV, Almeida-Filho N. A glossary for health inequalities. J Epidemiol Community Health 2002; 56(9):647-652.
  • 76. Kawachi I, Kennedy BP. Health and social cohesion: why care about income inequality? BMJ 1997; 314(7086):1037-1040.
  • 77. Kawachi I, Kennedy BP. Income inequality and health: pathways and mechanisms. Health Serv Res1999; 34(1 Pt 2):215-227.
  • 78. Lynch JW, Kaplan G. Understanding how inequality in the distribution of income affects health. Journal of Health Psychology 1997; 2(3):297-314.
  • 79. Wilson WJ. The truly disadvantaged : the inner city, the underclass, and public policy. Chicago: University of Chicago Press; 1987.
  • 80. Ross NA, Wolfson MC, Dunn JR, Berthelot JM, Kaplan GA, Lynch JW. Relation between income inequality and mortality in Canada and in the United States: cross sectional assessment using census data and vital statistics. BMJ 2000; 320(7239):898-902.
  • 81. Dunn JR, Burgess B, Ross NA. Income distribution, public services expenditures, and all cause mortality in US States. J Epidemiol Community Health 2005; 59(9):768-774.
  • 82. Spencer N. The effect of income inequality and macro-level social policy on infant mortality and low birthweight in developed countries-a preliminary systematic review. Child Care Health Dev 2004; 30(6):699-709.
  • 83. Kawachi I, Kennedy BP, Lochner K, Prothrow-Stith D. Social capital, income inequality, and mortality. Am J Public Health 1997; 87(9):1491-1498.
  • 84. Islam MK, Merlo J, Kawachi I, Lindstrom M, Gerdtham UG. Social capital and health: Does egalitarianism matter? A literature review. Int J Equity Health 2006; 5(1):3.
  • 85. Kawachi I, Berkman LF. Social Cohesion, Social Capital and Health. In: Berkman LF, Kawachi I, editors. Social epidemiology New York: Oxford University Press; 2000. p. 174-190.
  • 86. Putnam RD, Leonardi R, Nanetti R. Making democracy work: civic traditions in modern Italy. Princeton: Princeton University Press; 1993.
  • 87. Pattussi MP, Moyses SJ, Junges JR, Sheiham A. Capital social e a agenda de pesquisa em epidemiologia. Cad Saude Publica 2006; 22(8):1525-1546.
  • 88. Whitehead M, Diderichsen F. Social capital and health: tip-toeing through the minefield of evidence. Lancet 2001; 358(9277):165-166.
  • 89. Lynch J, Due P, Muntaner C, Smith GD. Social capital - is it a good investment strategy for public health? J Epidemiol Community Health 2000; 54(6):404-408.
  • 90. Baum F. Social capital: is it good for your health? Issues for a public health agenda. J Epidemiol Community Health 1999; 53(4):195-196.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Ago 2010
  • Data do Fascículo
    Ago 2010

Histórico

  • Aceito
    20 Ago 2008
  • Revisado
    21 Jul 2008
  • Recebido
    02 Out 2007
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Av. Brasil, 4036 - sala 700 Manguinhos, 21040-361 Rio de Janeiro RJ - Brazil, Tel.: +55 21 3882-9153 / 3882-9151 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cienciasaudecoletiva@fiocruz.br