EDITORIAL
Em qualquer sociedade, os sistemas científicos e tecnológicos - como um todo - formam uma extensa rede de objetos materiais, culturais e simbólicos. No caso do setor saúde, fortemente inundado por máquinas e produtos químicos e biológicos, as tecnologias leves são fundamentais particularmente em dois sentidos: (1) para mediar, de forma humanizada, os artefatos de todos os tipos que se interpõem entre a pessoa do profissional de saúde e a pessoa do paciente; e (2) para tornar os cuidados mais eficientes, eficazes e efetivos.
Embora a lógica do sistema necessite, para manejo dos equipamentos e produtos e para os cuidados oferecidos pelos profissionais, da presença de pessoas tecnicamente preparadas, a incorporação de tecnologias leves e o seu aprimoramento são muito pouco valorizados quando comparados ao apreço que se tem às máquinas. A pouca atenção dada às tecnologias leves ocorre por efeito do acúmulo de valor agregado - que nada mais é que trabalho humano objetivado subsumido nas mercadorias - no complexo médico-hospitalar: trata-se de um dos setores econômicos mundialmente mais dinamismos. Sua imponência e capacidade de gerar riqueza criam no sistema e na própria sociedade uma cegueira quanto ao lugar indiscutível e imprescindível da participação humana e relacional na produção da saúde: na verdade as boas práticas são sempre cobradas, principalmente pela população, mas geralmente são representadas como atributo de uma pessoa mais ou menos sensível e, muito pouco, como um campo de desenvolvimento tecnológico.
Neste número temático, entende-se que as tecnologias leves, embora menos ostensivas, são imprescindíveis para o manejo dos artefatos e produtos e para ir muito além daquilo que as máquinas podem fazer. Por isso, defende-se que nunca se deveria pensar separadamente a esfera das tecnologias mecânicas, eletrônicas, químicas e biológicas das que asseguram a efetividade do planejamento, da gestão, das relações médico-pacientes, do acolhimento e da avaliação, dentre outros.
Os leitores encontrarão neste número da revista, várias abordagens da questão em pauta. Além do artigo de debate escrito por Gastão Wagner que trata da importância e do sentido das tecnologias leves em saúde, há vários textos de pesquisa que mostram o avanço de métodos e técnicas que podem contribuir para o aprimoramento do SUS: estudos sobre controle de infecção hospitalar; apresentação e validação de instrumentos de medidas e escalas; tecnologias de cuidado em saúde mental; desenvolvimento de indicadores quantitativos e qualitativos; cuidados para a segurança alimentar; intervenções interdisciplinares frente a vários problemas e à promoção da saúde; instrumentos para detecção de vulnerabilidades, de qualidade de vida e para avaliação.
Por fim, entende-se que o tema das 'tecnologias leves' converge para o mesmo foco da humanização, conceito que passou a informar e a realçar o olhar do cuidado em saúde no Brasil nos últimos anos.
Maria Cecília de Souza Minayo
Editora-chefe da Revista Ciência & Saúde Coletiva
A ação humana como determinante para a efetividade dos tratamentos de saúde
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
21 Jul 2011 -
Data do Fascículo
Jul 2011