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Aspectos sociodemográficos relacionados à gravidade da maloclusão em crianças brasileiras de 12 anos

Socio-demographic aspects related to severity of malocclusion among 12-year-old Brazilian children

Resumo

Estudo transversal e analítico para caracterizar a maloclusão em crianças brasileiras de 12 anos e identificar os aspectos sociodemográficos associados, utilizando dados do SB Brasil 2010. Foram incluídas 5539 crianças dentre as quais 41% possuíam algum grau de maloclusão, de acordo com o índice Dental Aesthetic Index (DAI). Conduziu-se análises descritivas, bivariadas e múltiplas por regressão logística multinomial. A maloclusão definida foi maior entre os que avaliaram sua saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito (OR 1,24; IC 95%; 1,03-1,50) e insatisfeito (OR 1,76; IC 95%; 1,50-2,08). A maloclusão grave foi maior entre crianças do Sudeste (OR 1,44; IC 95%; 1,06-1,96) e Sul (OR 1,52; IC 95%; 1,05-2,19), sexo masculino (OR 1,24; IC 95%; 1,03-1,48), raça negro/pardo (OR 1,39; IC 95%; 1,14-1,69) e que avaliaram sua saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito (OR 1,79; IC 95%; 1,41-2,26) e insatisfeito (OR 2,20; IC 95%; 1,77-2,72). O nível muito grave foi maior entre os residentes de capitais (OR 1,36; IC 95%; 1,07-1,71) e que avaliaram sua saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito (OR 1,58; IC 95%; 1,22-2,05) e insatisfeito (OR 2,44; IC 95%; 1,96-3,03). A prevalência da maloclusão é alta entre crianças brasileiras, sendo suas diferentes gravidades associadas a aspectos sociodemográficos.

Má oclusão; Oclusão dentária; Criança; Saúde bucal

Abstract

The scope of this study was to characterize malocclusion in 12-year-old Brazilian children and identify associated socio-demographic aspects. It is a cross-sectional and analytical study based on an Oral Health Survey (SB Brasil 2010). A sample of 5,539 was included, among which 41% had some degree of malocclusion according to the Dental Aesthetic Index (DAI). Descriptive, bivariate and multiple multinomial logistic regression analyses were conducted. Defined malocclusion was greater among those who rated their oral health as neither satisfied/nor dissatisfied (OR 1.24; CI95%1.03-1.50) and dissatisfied (OR 1.76; CI95%1.50-2.08). Severe malocclusion was greater among children in the Southeast (OR 1.44; CI95%1.06-1.96) and South (OR 1.52; CI95%1.05-2.19), male (OR 1.24; CI95%1.03-1.48), black/brown (OR 1.39; CI95%1.14-1.69) who rated their oral health as neither satisfied/nor dissatisfied (OR 1.79; CI95%1.41-2.26) and dissatisfied (OR 2.20; CI95%1.77-2.72). Very severe malocclusion was higher among residents of capitals (OR 1.36; CI95%1.07-1.71) who evaluated their oral health as neither satisfied/nor dissatisfied (OR 1.58; CI95%1.22-2.05) and dissatisfied (OR 2.44; CI95%1.96-3.03). The prevalence of malocclusion is high among Brazilian children, the severity being associated with socio-demographic aspects.

Malocclusion; Dental occlusion; Child; Oral health

Introdução

A maloclusão caracteriza-se como um transtorno do desenvolvimento que afeta o complexo craniofacial, sendo resultado da interação de fatores genéticos e ambientais, que compromete aspectos funcionais e estéticos dos indivíduos11. Shaw WC, Addy M, Ray C. Dental and social effects of malocclusion and effectiveness of orthodontic treatment: a review. Community Dent Oral Epidemiol 1980; 8(1):36-45.

2. Petersen PE. The World Oral Health Report 2003: continuous improvement of oral health in the 21st century--the approach of the WHO Global Oral Health Programme. Community Dent Oral Epidemiol 2003;31(Supl. 1):3-23.

3. Peres KG, Barros AJD, Peres MA, Victora CG. Effects of breastfeeding and sucking habits on malocclusion in a birth cohort study. Rev Saude Publica 2007; 41(3):343-350.
-44. Perillo L, Monsurro A, Bonci E, Torella A, Mutarelli M, Nigro V. Genetic Association of ARHGAP21 Gene Variant with Mandibular Prognathism. J Dent Res 2015; 94(4):569-576.. Sua ocorrência tem sido associada a diferentes fatores, tais como, desigualdades sociais55. Freitas CV, Souza JGS, Mendes DC, Pordeus IA, Jones KM, Martins AMEBL. Necessidade de tratamento ortodôntico em adolescentes brasileiros: avaliação com base na saúde pública. Rev Paul Pediatr 2015; 33(2):204-210., comportamentos66. Morais SPT, Mota ELA, Amorim LDAF. Fatores associados à incidência de maloclusão na dentição decídua em crianças de uma coorte hospitalar pública do nordeste brasileiro. Rev Bras Saúde Matern Infant 2014; 14(4):371-382. e outras doenças bucais, como a cárie dentária77. Nalcaci R, Demirer S, Ozturk F, Altan BA, Sokucu O, Bostanci V. The relationship of orthodontic treatment need with periodontal status, dental caries, and sociodemographic factors. Scientific World Journal 2012; 2012:498012.. Além disso, a maloclusão tem sido associada ao impacto negativo na vida diária das pessoas88. Michel-Crosato E, Biazevic MGH, Crosato E. Relação entre maloclusão e impactos nas atividades diárias: um estudo de base populacional. Rev Odontol UNESP 2005; 34(1):37-42.,99. Masood Y, Masood M, Zainul NNB, Araby NBAA, Hussain SF, Newton T. Impact of malocclusion on oral health related quality of life in young people. Health Qual Life Outcomes 2013; 11:25., ressaltando a necessidade do reconhecimento de grupos mais acometidos, além do diagnóstico e tratamento adequado, a fim de minimizar tais impactos.

Apesar disto, no campo da saúde bucal, observou-se historicamente uma desvalorização da maloclusão como problema de saúde pública1010. Brasil. Ministério da Saúde (MS). SB Brasil 2010 pesquisa nacional de saúde bucal: projeto técnico. Brasília: MS; 2009., assim como outros agravos bucais, em vista da prioridade conferida ao tratamento da cárie dentária e suas sequelas1010. Brasil. Ministério da Saúde (MS). SB Brasil 2010 pesquisa nacional de saúde bucal: projeto técnico. Brasília: MS; 2009.

11. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Projeto SB Brasil 2003: condições de saúde bucal da população brasileira 2002-2003: resultados principais. Brasília: MS; 2004.
-1212. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Projeto SB Brasil 2010: Condições de Saúde Bucal da População Brasileira, Resultados Principais. Brasília: MS; 2011.. No entanto, devido ao evidente declínio da cárie dentária na população mundial nos últimos anos1313. Fejerskov O, Kidd E, organizadores. Dental caries: The disease and its clinical manegement. 2nd ed. Oxford: Blackwell & Munksgaard; 2008., observa-se uma valorização de outros problemas bucais, com destaque para a maloclusão1414. Brizon VSC, Cortellazzi KL, Vazquez FL, Ambrosano GMB, Pereira AC, Gomes VE, Oliveira AC. Fatores individuais e contextuais associados à má oclusão em crianças brasileiras. Rev Saude Publica 2013; 47:118-28.. Dessa forma, os problemas ortodônticos ganharam maior enfoque no processo de atenção à saúde, decorrente da sua alta prevalência, impacto na estética e influência em aspectos funcionais e sistêmicos1414. Brizon VSC, Cortellazzi KL, Vazquez FL, Ambrosano GMB, Pereira AC, Gomes VE, Oliveira AC. Fatores individuais e contextuais associados à má oclusão em crianças brasileiras. Rev Saude Publica 2013; 47:118-28., os quais podem comprometer a qualidade de vida.

Nesse contexto, foram desenvolvidos diferentes índices com o intuito de diagnosticar e mensurar a presença e gravidade dos problemas relacionados a oclusão dentária77. Nalcaci R, Demirer S, Ozturk F, Altan BA, Sokucu O, Bostanci V. The relationship of orthodontic treatment need with periodontal status, dental caries, and sociodemographic factors. Scientific World Journal 2012; 2012:498012.,1515. Jenny J, Cons NC. Establishing malocclusion severity levels on the Dental Aesthetic Index (DAI) scale. Aust Dent J 1996; 41(1):43-46.,1616. Jarvinen S. Indexes for orthodontic treatment need. Am J Orthod Dentofacial Orthop 2001; 120(3):237-239., entre eles destaca-se o DAI (Dental Aesthetic Index)1515. Jenny J, Cons NC. Establishing malocclusion severity levels on the Dental Aesthetic Index (DAI) scale. Aust Dent J 1996; 41(1):43-46.. O DAI foi indicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como forma de avaliar a presença de oclusopatias a nível populacional, sendo caracterizado pela combinação de medidas as quais expressam a condição oclusal do indivíduo e sua necessidade de tratamento1717. World Health Organization (WHO). Oral Health Surveys: Basic methods. 4th ed. Geneva: WHO; 1997.. Tal índice vem sendo amplamente utilizado em estudos populacionais em diferentes populações55. Freitas CV, Souza JGS, Mendes DC, Pordeus IA, Jones KM, Martins AMEBL. Necessidade de tratamento ortodôntico em adolescentes brasileiros: avaliação com base na saúde pública. Rev Paul Pediatr 2015; 33(2):204-210.,1818. Hamanci N, Basaran G, Uysal E. Dental Aesthetic Index scores and perception of personal dental appearance among Turkish university students. Eur J Orthod 2009; 31(2):168-173.

19. Dimberg L, Lennartsson B, Arnrup K, Bondemark L. Prevalence and change of malocclusions from primary to early permanent dentition: A longitudinal study. Angle Orthod 2015; 85(5):728-734.
-2020. Sanadhya S, Chadha M, Chaturvedi MK, Chaudhary M, Lerra S, Meena MK, Bakutra G, Acharya S, Pandey A, Tak M, Asawa K, Kamate S. Prevalence of malocclusion and orthodontic treatment needs among 12–15-year-old schoolchildren of fishermen of Kutch coast, Gujarat, India. Int Marit Health 2014; 65(3):106-113., sendo indicado e aplicado, principalmente, para crianças de 12 anos de idade. Dessa forma, este instrumento tem sido utilizado por estudos prévios com intuito de estimar os diferentes níveis de gravidade da maloclusão1818. Hamanci N, Basaran G, Uysal E. Dental Aesthetic Index scores and perception of personal dental appearance among Turkish university students. Eur J Orthod 2009; 31(2):168-173.

19. Dimberg L, Lennartsson B, Arnrup K, Bondemark L. Prevalence and change of malocclusions from primary to early permanent dentition: A longitudinal study. Angle Orthod 2015; 85(5):728-734.
-2020. Sanadhya S, Chadha M, Chaturvedi MK, Chaudhary M, Lerra S, Meena MK, Bakutra G, Acharya S, Pandey A, Tak M, Asawa K, Kamate S. Prevalence of malocclusion and orthodontic treatment needs among 12–15-year-old schoolchildren of fishermen of Kutch coast, Gujarat, India. Int Marit Health 2014; 65(3):106-113., assim como a necessidade de tratamento ortodôntico55. Freitas CV, Souza JGS, Mendes DC, Pordeus IA, Jones KM, Martins AMEBL. Necessidade de tratamento ortodôntico em adolescentes brasileiros: avaliação com base na saúde pública. Rev Paul Pediatr 2015; 33(2):204-210..

A prevalência da maloclusão entre crianças de 12 anos tem variado em diferentes países, com taxas próximas aos 30% em países como Índia2020. Sanadhya S, Chadha M, Chaturvedi MK, Chaudhary M, Lerra S, Meena MK, Bakutra G, Acharya S, Pandey A, Tak M, Asawa K, Kamate S. Prevalence of malocclusion and orthodontic treatment needs among 12–15-year-old schoolchildren of fishermen of Kutch coast, Gujarat, India. Int Marit Health 2014; 65(3):106-113. e Espanha2121. Puertes-Fernandez N, Montiel-Company JM, Almerich-Silla JM, Manzanera D. Orthodontic treatment need in a 12-year-old population in the Western Sahara. Eur J Orthod 2011; 33(4):377-80.. Ressalta-se que apesar de serem países com diferentes níveis de desenvolvimento socioeconômico a prevalência é próxima entre estes países, o que pode ser atribuído a características locais restritas a população alvo dos estudos, dificultando assim a diferenciação entre países desenvolvidos e em desenvolvimento em termos de prevalência de maloclusão. Além disso, estudos de abrangência nacional abordando a maloclusão são escassos, o que dificulta essas comparações. No Brasil, tal prevalência é ainda mais elevada, segundo dados dos dois últimos levantamentos epidemiológicos de base nacional realizados no pais: 58,1% e 38,9%, respectivamente, em 2002/2003 e 20101111. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Projeto SB Brasil 2003: condições de saúde bucal da população brasileira 2002-2003: resultados principais. Brasília: MS; 2004.,1212. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Projeto SB Brasil 2010: Condições de Saúde Bucal da População Brasileira, Resultados Principais. Brasília: MS; 2011.. Apesar da representativa redução dessa prevalência, considerando os levantamentos realizados, sua ocorrência ainda é preocupante, principalmente ao considerar as desigualdades sociais e regionais associadas a presença desse agravo na população brasileira1414. Brizon VSC, Cortellazzi KL, Vazquez FL, Ambrosano GMB, Pereira AC, Gomes VE, Oliveira AC. Fatores individuais e contextuais associados à má oclusão em crianças brasileiras. Rev Saude Publica 2013; 47:118-28..

No entanto, apesar da reconhecida associação entre aspectos sociodemográficos com a maloclusão entre crianças brasileiras, tal fato tem sido investigado apenas em relação a presença geral de maloclusão, não diferenciado por gravidade de acometimento, ou com seus níveis de gravidade mais severos1414. Brizon VSC, Cortellazzi KL, Vazquez FL, Ambrosano GMB, Pereira AC, Gomes VE, Oliveira AC. Fatores individuais e contextuais associados à má oclusão em crianças brasileiras. Rev Saude Publica 2013; 47:118-28.,2222. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica 2013;47(Supl. 3):109-117.. A influência dos aspectos sociodemográficos pode variar de acordo com a gravidade da maloclusão, possibilitando a identificação de grupos vulneráveis e adoção de medidas de diagnóstico e tratamento. Neste sentido, o presente estudo teve por objetivo estimar a prevalência de maloclusão em escolares brasileiros e verificar a influência dos aspectos sociodemográficos em função da gravidade da maloclusão.

Metodologia

Trata-se de um estudo observacional, transversal e analítico que utilizou a base de dados do levantamento epidemiológico das condições de Saúde Bucal da população brasileira, realizado pelo Ministério da Saúde no ano de 20101212. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Projeto SB Brasil 2010: Condições de Saúde Bucal da População Brasileira, Resultados Principais. Brasília: MS; 2011., conduzido de acordo com os princípios éticos da Resolução do Conselho Nacional de Saúde n°196/96, sendo aprovado e registrado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).

Seguindo os critérios propostos pela OMS (1997)1717. World Health Organization (WHO). Oral Health Surveys: Basic methods. 4th ed. Geneva: WHO; 1997., uma amostra representativa da população brasileira nas faixas etárias índices foi entrevistada e examinada em seus domicílios quanto às condições de saúde bucal, demográficas e socioeconômicas, uso de serviços odontológicos e questões subjetivas de saúde bucal.

Em relação à idade de interesse, foram entrevistadas e examinadas 7328 crianças de 12 anos, residentes em 177 municípios, incluindo as 27 capitais brasileiras, das cinco macrorregiões brasileiras (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul), selecionados por amostragem probabilística por conglomerados, em múltiplos estágios, com probabilidade proporcional ao tamanho e considerando um efeito de desenho (deff) igual a 22323. Roncalli AG, Silva NN, Nascimento AC, Freitas CHSM, Casotti E, Peres KG, Moura L, Peres MA, Freire MCM, Cortes MIS, Vettore MV, Júnior MP, Figueiredo N, Goes PSA, Pinto RS, Marques RAA, Moyses SJ, Reis SCGB, Narvai PC. Aspectos metodológicos do Projeto SBBrasil 2010 de interesse para inquéritos nacionais de saúde. Cad Saude Publica 2012; 28(Supl.):s40-s57..

Na presente investigação utilizou-se um recorte do banco de dados, sendo incluídas apenas as crianças que tiveram suas condições oclusais clinicamente avaliadas a partir do DAI. Optou-se pela exclusão daqueles indivíduos que autodeclaram sua raça como “amarelo” ou “indígena”, devido sua baixa representatividade de acordo com estudo prévio2222. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica 2013;47(Supl. 3):109-117..

A gravidade da maloclusão – variável dependente – foi avaliada utilizando o índice DAI, composto por dez características oclusais dispostas em três dimensões: (1) dentição; (2) espaço, o qual se baseia na presença ou ausência de apinhamento no segmento incisal, espaçamento no segmento incisal, diastema incisal, desalinhamento no maxilar e mandibular anterior; e (3) a dimensão da oclusão com os componentes overjet maxilar anterior e mandibular anterior, mordida aberta anterior e relação molar ântero-posterior1515. Jenny J, Cons NC. Establishing malocclusion severity levels on the Dental Aesthetic Index (DAI) scale. Aust Dent J 1996; 41(1):43-46.,1717. World Health Organization (WHO). Oral Health Surveys: Basic methods. 4th ed. Geneva: WHO; 1997..

Para a interpretação dos resultados da maloclusão estimou-se uma equação matemática na qual as dez características oclusais foram medidas e os valores a elas atribuídos foram multiplicados pelos seus respectivos pesos e os resultados totalizados com a adição de uma constante (Quadro 1). Ao final, foi obtido um escore compreendido entre treze e oitenta, que permitiu a classificação dos indivíduos em uma de quatro categorias: ausência de anormalidade ou maloclusão leve, cujo tratamento ortodôntico é desnecessário (DAI ≤ 25); maloclusão definida, cujo tratamento é eletivo (DAI = 26 a 30); maloclusão grave, cujo tratamento é altamente desejável (DAI = 31 a 35) e maloclusão muito grave ou incapacitante, cujo tratamento ortodôntico é fundamental (DAI ≥ 36).

Quadro 1
Componentes, dimensões e equação do DAI.

Em relação aos aspectos sóciodemográficos avaliados, considerou-se as seguintes variáveis independentes: macrorregião brasileira (Norte, Centro-Oeste, Nordeste, Sudeste, Sul) localização geográfica (capital, interior), sexo (masculino, feminino), cor de pele (branco, negro/pardo), renda familiar (mais de R$ 1500,00, Até R$ 1500,00) e avaliação da saúde bucal (satisfeito, nem satisfeito nem insatisfeito, insatisfeito).

Inicialmente, as variáveis foram descritas por meio de suas distribuições de frequências, sendo estimados os intervalos de 95% de confiança para as prevalências dos componentes do DAI, bem como para o desfecho (gravidade da maloclusão). Na análise bivariada, utilizou-se teste do Qui-quadrado para avaliar a existência de associação entre o desfecho e as variáveis independentes. As variáveis que apresentaram nível descritivo (valor-p) menor ou igual a 0,20 foram selecionadas para o modelo múltiplo. Na análise múltipla adotou-se o modelo de regressão logística multinomial, utilizando a razão de chances (OR) como medida de associação. Foram estimadas OR brutas (análise bivariada), bem como OR ajustadas (análise múltipla) com seus respectivos intervalos de 95% de confiança. Na análise múltipla o nível de significância adotado foi de 0,05. Foi adotado o teste da deviance para avaliar a qualidade do modelo ajustado. Todas as análises estatísticas foram realizadas no programa SPSS 18.0.

Resultados

Foram incluídas no presente estudo 5539 crianças de 12 anos de idade. A amostra foi composta, em sua maioria, por crianças do sexo feminino, residentes no Nordeste e que se avaliaram como “satisfeito” quanto às suas condições de saúde bucal (Tabela 1). No que diz respeito a prevalência da maloclusão e sua gravidade, como pode ser observado na Tabela 2, 41,0% das crianças avaliadas foram classificados com a presença de oclusopatia em um de seus níveis de gravidade, sendo que a oclusopatia definida acometeu 21,2%, a grave, 10,4% e a muito grave, 9,4% dos indivíduos examinados. Além disso, a amostra foi caracterizada quanto aos componentes do DAI, sendo identificada uma baixa prevalência de overjet mandibular ≥ 4 mm (0,2%), de crianças com dentes ausentes nas arcadas superior (3,2%) ou inferior (2,7%) ou com presença de mordida aberta anterior (5,0%).

Tabela 1
Distribuição das crianças de 12 anos de idade segundo região, localização geográfica, sexo, cor de pele, renda familiar e avaliação da saúde bucal. Brasil, 2010.

Tabela 2
Prevalência das maloclusões e componentes avaliados pelo Índice de Estética Dental (DAI) entre crianças de 12 anos. Brasil, 2010.

Na análise bivariada identificou-se que apenas a renda familiar (p = 0,388) não se manteve associada (p ≤ 0,20) às diferentes gravidades da maloclusão para compor o modelo múltiplo, mantendo-se na regressão as variáveis região, localização, sexo, cor da pele e avaliação da saúde bucal (Tabela 3).

Tabela 3
Análise bivariada da gravidade da maloclusão segundo região, localização, sexo, cor de pele, renda familiar, avaliação da saúde bucal entre crianças de 12 anos. Brasil, 2010.

Na análise múltipla de regressão logística multinomial, identificou-se associações (p ≤ 0,05) da maloclusão definida apenas com auto avaliação da saúde bucal, sendo a presença deste tipo de maloclusão maior entre aqueles que avaliaram a saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito e insatisfeito. A chance da maloclusão grave foi maior nos residentes das macrorregiões brasileiras Sudeste e Sul, indivíduos do sexo masculino, que se declararam com cor de pele negro/pardo e entre aqueles que avaliaram a saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito e insatisfeito. Para maloclusão muito grave, a chance foi maior entre os residentes em capitais e entre aqueles que avaliaram a saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito e insatisfeito (Tabela 4).

Tabela 4
Resultados da análise de regressão logística multinomial múltipla para gravidade da maloclusão entre crianças de 12 anos. Brasil, 2010.

Discussão

A prevalência da maloclusão entre crianças brasileiras de 12 anos incluídas no presente estudo foi de 41,0%, considerando-se os diferentes níveis de gravidade. Ao considerar a totalidade das crianças de 12 anos examinadas nos inquéritos epidemiológicos de saúde bucal da população brasileira realizado em 20031111. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Projeto SB Brasil 2003: condições de saúde bucal da população brasileira 2002-2003: resultados principais. Brasília: MS; 2004. e 20101212. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Projeto SB Brasil 2010: Condições de Saúde Bucal da População Brasileira, Resultados Principais. Brasília: MS; 2011., observa-se não apenas uma redução de 19% na prevalência geral da maloclusão, mas também de 14% nos níveis mais severos. A prevalência da presença de oclusopatia foi semelhante àquelas identificadas em estudos prévios realizados em outros países, tais como Índia (33,4%)2020. Sanadhya S, Chadha M, Chaturvedi MK, Chaudhary M, Lerra S, Meena MK, Bakutra G, Acharya S, Pandey A, Tak M, Asawa K, Kamate S. Prevalence of malocclusion and orthodontic treatment needs among 12–15-year-old schoolchildren of fishermen of Kutch coast, Gujarat, India. Int Marit Health 2014; 65(3):106-113. e Irã (45,5%)2424. Borzabadi-Farahani A, Eslamipour F, Asgari I. Association between orthodontic treatment need and caries experience. Acta Odontol Scand 2011; 69(1):2-11.. Resultados próximos também foram identificados em estudos realizados em localidades brasileiras, como Pelotas-RS (40,2%)2525. Peres MA, Barros AJ, Peres KG, Araujo CL, Menezes AMB, Hallal PC, Victora CG. Oral health follow-up studies in the 1993 Pelotas (Brazil) birth cohort study: methodology and principal results. Cad Saude Publica 2010; 26(10):1990-1999. e Manaus-AM (42,3%)2626. Herkrath FJ, Rebelo MAB, Herkrath APCQ, Vettore MV. Comparison of Normative Methods and the Sociodental Approach to Assessing Orthodontic Treatment Needs in 12-year-old Schoolchildren. Oral Health Prev Dent 2013; 11(3):211-220., mas prevalência superior foi identificada em Belo Horizonte-MG (62,0%)2727. Marques LS, Barbosa CC, Ramos-Jorge ML, Pordes IA, Paiva SM. Prevalência da maloclusão e necessidade de tratamento ortodôntico em escolares de 10 a 14 anos de idade em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil: enfoque psicossocial. Cad Saude Publica 2005; 21(4):1099-1106.. Ressalta-se que apesar desses estudos terem utilizado o DAI como critério de avaliação, considera-se as diferenças regionais e culturais, assim como o acesso ao tratamento ortodôntico de cada localidade. Considerando os relevantes avanços alcançados no processo de atenção à saúde bucal no Brasil, assim como a possibilidade de acesso ao tratamento ortodôntico em alguns serviços públicos no pais a partir de 201155. Freitas CV, Souza JGS, Mendes DC, Pordeus IA, Jones KM, Martins AMEBL. Necessidade de tratamento ortodôntico em adolescentes brasileiros: avaliação com base na saúde pública. Rev Paul Pediatr 2015; 33(2):204-210.,2828. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Saúde da Família: passo a passo do departamento de atenção básica. Brasília: MS; 2011., a prevalência da maloclusão entre crianças brasileiras ainda é bastante elevada. Além disso, possivelmente essa prevalência pode estar relacionada a adoção de comportamentos inadequados que podem agir como fatores de risco para ocorrência desse agravo.

Além disso, nota-se iniquidades sociais no perfil de acometimento de oclusopatias nesse contingente populacional1414. Brizon VSC, Cortellazzi KL, Vazquez FL, Ambrosano GMB, Pereira AC, Gomes VE, Oliveira AC. Fatores individuais e contextuais associados à má oclusão em crianças brasileiras. Rev Saude Publica 2013; 47:118-28., o que salienta a compreensão dos aspectos sociodemográficos associados as diferentes gravidades da maloclusão com intuito de descentralização das ações de saúde.

Adicionalmente, constatou-se a associação entre as diferentes gravidades da maloclusão com variáveis referentes aos aspectos sociodemográficos e auto avaliação da saúde bucal. A prevalência da maloclusão definida foi maior entre aqueles que avaliaram sua saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito e insatisfeitos. A auto percepção da saúde bucal refere-se ao quanto os indivíduos se sentem afetados pelo seu estado de saúde ou pela presença de problemas bucais, sendo uma interpretação das expectativas e do estado de saúde no contexto da vida diária2929. Martins AMEBL, Barreto SM, Silveira MF, Santa-Rosa TTA, Pereira RD. Autopercepção da saúde bucal entre idosos brasileiros. Rev Saude Publica 2010; 44(5):912-922.. Portanto, considerando os impactos funcionais e estéticos decorrentes da presença da maloclusão11. Shaw WC, Addy M, Ray C. Dental and social effects of malocclusion and effectiveness of orthodontic treatment: a review. Community Dent Oral Epidemiol 1980; 8(1):36-45., é de se esperar que sua presença, independente da gravidade, possa afetar a percepção que as crianças possuem de suas condições de saúde bucal, levando à insatisfação. A associação entre condições normativas com a autopercepção da saúde bucal também tem sido identificada entre outros contingentes populacionais no Brasil, como o de adultos3030. Vale EB, Mendes ACG, Moreira RS. Autopercepção da saúde bucal entre adultos na região Nordeste do Brasil. Rev Saude Publica 2013; 47(Supl. 3):98-108. e idosos2929. Martins AMEBL, Barreto SM, Silveira MF, Santa-Rosa TTA, Pereira RD. Autopercepção da saúde bucal entre idosos brasileiros. Rev Saude Publica 2010; 44(5):912-922.. Estudos prévios realizados no Brasil têm demostrado que as crianças brasileiras, em sua maioria, demonstraram estar satisfeitas com suas condições de saúde bucal, como aqueles realizados em Caruaru-PE3131. Menezes VA, Lorena RPF, Rocha LCB, Leite AF, Ferreira JMS, Granville-Garcia AF. Oral hygiene practices, dental service use and oral health self-perception of schoolchildren from a rural zone in the Brazilian Northeast region. Rev Odonto Cienc 2010; 25(1):25-31. e Aracaju-SE3232. Carvalho RWF, Santos CNA, Oliveira CCC, Gonçalves SRJ, Novais SMA, Pereira MAS. Aspectos psicossociais dos adolescentes de Aracaju (SE) relacionados à percepção de saúde bucal. Cien Saude Colet 2011; 16(Supl. 1):1621-1628.. Um estudo conduzido em Maringá-PR entre escolares (12 a 15 anos) identificou que a presença de problemas oclusais, avaliados a partir dos itens que compõem o DAI, mantiveram-se associados a uma pior percepção da fala e da mastigação3333. Peres SHCS, Goya S, Cortellazzi KL, Ambrosano GMB, Meneghim MC, Pereira AC. Self-perception and malocclusion and their relation to oral appearance and function. Cien Saude Colet 2011; 16(10):4059-4066., fatores estes que podem compor a auto percepção da saúde bucal. A associação entre a presença de maloclusão e a auto avaliação negativa da saúde bucal também foi identificada entre adolescentes japoneses3434. Kojima A, Ekuni D, Mizutani S, Furuta M, Irie K, Azuma T, Tomofuji T, Iwasaki Y, Morita M. Relationships between self-rated oral health, subjective symptoms, oral health behavior and clinical conditions in Japanese university students: a cross-sectional survey at Okayama University. BMC Oral Health 2013; 13:62., porém utilizando outro critério de diagnóstico. Ressalta-se que tal associação também foi identificada para os níveis grave e muito grave.

A prevalência da maloclusão no nível grave foi maior entre as crianças residentes na região Sudeste e Sul, do sexo masculino, com pele negra/parda e que avaliaram sua saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito e insatisfeito. Diferenças regionais no acometimento de outros agravos e doenças bucais, tais como cárie3535. Freire MCM, Reis SCGB, Figueiredo N, Peres KG, Moreira RS, Antunes JLF. Determinantes individuais e contextuais da cárie em crianças brasileiras de 12 anos em 2010. Rev Saude Publica 2013; 47(Supl. 3):40-49. e fluorose dentária3636. Freitas CHSM, Sampaio FC, Roncalli AG, Moyses SJ. Reflexões metodológicas sobre prevalência da fluorose dentária nos inquéritos de saúde bucal. Rev Saude Publica 2013; 47(Supl. 3):138-147., entre crianças brasileiras tem sido identificada em estudos prévios. Ressalta-se ainda que tanto as desigualdades sociais, como a presença de agravos bucais, podem comprometer a qualidade de vida e impactar negativamente na vida diária das pessoas3737. Vasquez FL, Cortellazzi KL, Kaieda AK, Guerra LM, Ambrosano GMB, Tagliaferro EPS, Mialhe FL, Meneghim MC, Pereira AC. Quality of life and socio-dental impact among underprivileged Brazilian adolescents. Qual Life Res 2015; 24(3):661-669.. Ao considerar a totalidade das crianças de 12 anos incluídas no SB Brasil 2010, foi identificada em estudo prévio1414. Brizon VSC, Cortellazzi KL, Vazquez FL, Ambrosano GMB, Pereira AC, Gomes VE, Oliveira AC. Fatores individuais e contextuais associados à má oclusão em crianças brasileiras. Rev Saude Publica 2013; 47:118-28. a inexistência de diferenças significativas no acometimento de oclusopatias graves entre as regiões brasileiras, mas sim diferenças entre as cidades. Além disso, ao considerar que a maloclusão pode ser influenciada por questões comportamentais, acredita-se que diferentes comportamentos podem ser identificados entre as regiões brasileiras decorrentes das diferenças culturais e regionais.

Considera-se ainda que as condições socioeconômicas possam influenciar na saúde bucal das pessoas, estabelecendo uma complexa relação com outros determinantes, tais como escolaridade, adoção de certos comportamentos e acesso a bens e serviços básicos, sendo tais associações identificadas em estudos prévios2222. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica 2013;47(Supl. 3):109-117.,3838. Frazão P, Narvai PC. Socio-environmental factors associated with dental occlusion in adolescents. Am J Orthod Dentofacial Orthop 2006;129(6):809-816.. Dessa forma, as ações de saúde devem considerar tais diferenças com intuito de atender apropriadamente a população. Da mesma forma como a maloclusão definida manteve-se associada a avaliação negativa das condições de saúde bucal, considera-se que quanto maior a gravidade da oclusopatia maior a chance de autopercepção negativa.

Em relação a maloclusão no nível muito grave, identificou-se que sua prevalência foi maior entre as crianças residentes na capital e que avaliaram sua saúde bucal como nem satisfeito/nem insatisfeito e insatisfeito. Assim como para maloclusão grave, identificou-se diferenças regionais no seu acometimento, diferindo entre capitais e cidades do interior. Ressalta-se que iniquidades sociais, tais como aquelas relacionadas à renda e raça, tem sido associadas à maloclusão muito grave entre crianças (12 anos) e adolescentes (15 a 19 anos) brasileiros2222. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica 2013;47(Supl. 3):109-117.. Dessa forma, apesar de diferenças sociodemográficas, e maior concentração de recursos nas capitais, assim como um maior acesso aos serviços de sáude3939. Ferreira CO, Antunes JLF, Andrade FB. Fatores associados à utilização dos serviços odontológicos por idosos brasileiros. Rev Saude Publica 2013; 47(Supl. 3):90-97., considera-se que uma maior densidade populacional pode resultar em uma maior prevalência de agravos bucais e maior demanda a ser tratada pelos serviços de saúde. Considerando a possibilidade dos agravos bucais afetarem na percepção dos indivíduos quanto a sua saúde bucal2929. Martins AMEBL, Barreto SM, Silveira MF, Santa-Rosa TTA, Pereira RD. Autopercepção da saúde bucal entre idosos brasileiros. Rev Saude Publica 2010; 44(5):912-922., quanto maior sua gravidade, pior sua auto avaliação da saúde bucal. Dessa forma, assim como para os níveis definido e grave, era de se esperar que a maloclusão muito grave fosse associada à uma pior autoavaliação das condições de saúde bucal.

Ao considerar o impacto funcional e estético da maloclusão1414. Brizon VSC, Cortellazzi KL, Vazquez FL, Ambrosano GMB, Pereira AC, Gomes VE, Oliveira AC. Fatores individuais e contextuais associados à má oclusão em crianças brasileiras. Rev Saude Publica 2013; 47:118-28., assim como seu impacto na vida diária e qualidade de vida dos indivíduos acometidos88. Michel-Crosato E, Biazevic MGH, Crosato E. Relação entre maloclusão e impactos nas atividades diárias: um estudo de base populacional. Rev Odontol UNESP 2005; 34(1):37-42.,99. Masood Y, Masood M, Zainul NNB, Araby NBAA, Hussain SF, Newton T. Impact of malocclusion on oral health related quality of life in young people. Health Qual Life Outcomes 2013; 11:25., as investigações que buscam identificar seu perfil de prevalência e possíveis fatores associados podem subsidiar ações de saúde e melhoria nas políticas públicas de saúde que visem uma melhor saúde bucal entre crianças. Além disso, a avaliação de possíveis fatores sociodemograficos associados às diferentes gravidades da maloclusão podem ser úteis na distribuição e locação de recursos, assim como nas prioridades de tratamento ortodôntico fundamentados no princípio da equidade da atenção à saúde bucal2222. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica 2013;47(Supl. 3):109-117.. Ressalta-se que no Brasil os Centros de Especialidades Odontológicas, a partir no ano de 2011, podem incluir em suas atividades, a realização de tratamento ortodôntico. Porém, considerando a alta demanda de tratamento, o déficit no números e procedimentos realizados desde então e as diferenças regionais na distribuição desses procedimentos2222. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica 2013;47(Supl. 3):109-117., resultados positivos e uma redução na prevalência da maloclusão só serão visualizados a longo prazo.

Dentre as limitações do presente estudo, ressalta-se sua característica transversal, não sendo possível estabelecer relações de causa e feito entre os fatores associados. Apesar disso, os resultados apresentados são válidos e representativos da população de crianças de 12 anos do Brasil, situação que permitiu mais esclarecimentos sobre a associação de aspectos sociodemográficos com os diferentes níveis de gravidade da maloclusão nesta população. Salienta-se ainda que a maloclusão foi avaliada em um único momento, não sendo identificado há quanto tempo os indivíduos possuíam tal condição e, portanto, não explicando totalmente o papel das variáveis independentes no acometimento desse agravo bucal.

Considera-se que, no geral, as crianças brasileiras investigadas possuem uma alta prevalência de maloclusão em seus diferentes níveis de gravidade. Além disso, identificou-se que diferentes aspectos sociodemográficos, assim como auto avaliação da saúde bucal, mantiveram-se associados aos níveis de gravidade da maloclusão. Ressalta-se que, estudos futuros devem considerar a possível influência de características contextuais dos municípios, tais como a disponibilidade de serviços e profissionais especializados no tratamento desse agravo bucal e sua possível influência nos desfechos em saúde, em termos de maloclusão. Além disso, devem ser considerados em estudos epidemiológicos comportamentos prévios adotados durante a infância por parte das crianças e responsáveis, que possam representar fatores de risco à ocorrência da maloclusão.

Agradecimentos

À Coordenação Nacional de Saúde Bucal/Ministério da Saúde pela cessão e envio do banco de dados do SBBrasil 2010.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    13 Out 2015
  • Revisado
    23 Maio 2016
  • Aceito
    25 Maio 2016
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