Introdução
O estresse é um dos conceitos mais estudados e mencionados em psicologia, pois se manifesta na vida cotidiana como um fator que pode colocar em risco a saúde psicológica e física das pessoas1-4. As três principais perspectivas de abordagem do estresse são: i) a que enfatiza as respostas fisiológicas e reações do indivíduo aos estressores; ii) a que busca investigar os fatores estressores no ambiente que provocam danos ao bem-estar e à saúde dos indivíduos; e iii) a psicológica/cognitiva que foca a relação do indivíduo com o meio, ou seja, como a pessoa avalia e percebe o evento estressor5. Essa última abordagem é citada pela maior parte dos artigos pesquisados6-9.
De acordo com Lazarus10, a forma como avaliamos um evento determina como reagimos emocionalmente. Assim, o estresse laboral é influenciado pela percepção que o sujeito tem das demandas no ambiente de trabalho e sua capacidade para enfrentá-las. Em outras palavras, para que o processo de estresse laboral aconteça é necessário que o trabalhador avalie como estressoras a situação e as demandas do ambiente, e se perceba com poucos recursos para enfrentá-las, gerando reações com efeitos negativos em seu bem-estar. Considerando a complexidade do fenômeno do estresse, permeado por uma série de processos psicológicos, sociais e biológicos que envolvem a interação pessoa-ambiente, estudos recentes inspirados pelo movimento da Psicologia Positiva têm procurado compreender como esses processos podem interferir na saúde e bem-estar das pessoas11-13.
O movimento conhecido como Psicologia Positiva14 enfatiza os aspectos positivos da experiência humana, e busca compreender as qualidades que ajudam o indivíduo a desenvolver suas potencialidades, manter sua saúde física e psicológica e o bem-estar pessoal. Esse movimento se difundiu também entre os estudiosos das organizações, dando origem a diversas investigações desenvolvidas no contexto de trabalho, enfatizando o papel dos traços, estados afetivos positivos, comportamentos e virtudes que predispõem os indivíduos a vivenciar o bem-estar no trabalho (BET)15. Pode-se dizer que o bem-estar relacionado ao trabalho abrange uma diversidade de experiências que incluem estados afetivos positivos (p. ex., entusiasmo), baixos níveis de estados afetivos negativos (p. ex., ansiedade), boa saúde psicossomática e estados cognitivos como aspirações e julgamentos sobre a satisfação no trabalho16.
Além dos fatores estressores originados no trabalho, os recursos pessoais como autoestima e estabilidade emocional, e a interface trabalho-casa parecem influenciar as flutuações nos indicadores de bem-estar17. A experiência de estresse no trabalho tem sido consistentemente associada a resultados negativos para os empregados, medidos por uma gama de indicadores de bem-estar, tanto psicológicos quanto fisiológicos18-20. Entretanto, esses indivíduos diante de eventos percebidos como estressores reagem diferentemente. Embora muitos estudos concluam haver uma associação negativa entre estresse e bem-estar no trabalho1,18-22, tem crescido o número de pesquisas que buscam explicar em que condições os estressores podem não afetar negativamente o BET17,23-25. Ressaltam-se em diversas pesquisas o importante papel da resiliência e das estratégias usadas para controlar e lidar com as próprias emoções (autorregulação emocional) e para enfrentar situações estressantes (coping), podendo ser eficazes para reduzir o estresse e melhorar o bem-estar em diversos contextos26-30.
A revisão sistemática apresentada neste artigo procurou explorar e compreender as relações existentes entre estresse e bem-estar no trabalho, buscando encontrar evidências de quais variáveis pessoais e/ou ambientais possuem efeitos protetores para o bem-estar dos trabalhadores, com impactos positivos na sua saúde física, mental e social. O estudo contribui para uma visão geral do estado da arte desse campo de pesquisas, uma avaliação crítica dos resultados obtidos, além de gerar insumos para fundamentar propostas de melhoria do bem-estar no trabalho (BET) e redução do estresse nas organizações. Discute também as implicações teóricas e práticas relevantes a partir dos resultados encontrados e sugerem-se direções para futuras pesquisas no campo.
Procedimentos Metodológicos
Procedimento de coleta e análise de dados
A primeira etapa de busca dos artigos foi realizada no período de junho a julho de 2016, nas seguintes bases de dados: Ebsco, Google acadêmico, LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), SciELO (Scientific Electronic Library Online), e PubMed (National Library of Medicine). Foi feita busca também em seis revistas do Annual Reviews (Annual Review of Environment and Resources, Law and Social Science, Neuroscience, Organizational Psychology, Psychology, Public Health). As bases foram escolhidas por abrangerem grande e diversificado volume de publicações científicas representativas dos diversos campos de conhecimento, haja vista o estresse ser um construto bastante estudado. Os Annual Reviews são publicações dedicadas a artigos de revisão de literatura, o que permitiria identificar a evolução dos achados sobre estresse, bem-estar e trabalho. Para a busca dos artigos foram utilizadas as palavras-chave: “stress”, “wellbeing”, “job”, e “work” no idioma Inglês, visando abarcar a literatura nacional e internacional. As bases de dados foram configuradas para buscar as palavras nos campos “título”, “resumo” e “palavras-chave”. Foi utilizado o operador boleano “and” visando induzir que as palavras selecionadas constassem nos referidos campos. Determinou-se que as bases apresentassem os artigos publicados a partir de 2006 até 2016, abarcando os últimos 11 anos, período que se intensificaram os estudos sobre o bem-estar no contexto de trabalho impulsionados pelo movimento da Psicologia Positiva. Na base do Pubmed, especificamente, foram selecionados apenas os artigos de revisão e meta-análise, a fim de filtrar a primeira busca que resultou em 3.996 títulos. Mediante estes procedimentos, obteve-se um total de 675 referências.
Na segunda etapa foram lidos os títulos e resumos desses trabalhos, excluindo os que não correspondiam ao objetivo geral desta revisão, bem como teses, livros e editoriais, permanecendo então 134. Na terceira etapa, durante o processo de leitura mais acurada desses artigos foram descartados 81 deles, considerando os seguintes critérios de exclusão: (a) tipo de estudo: artigos teóricos; (b) foco do estudo: aqueles que tratavam unicamente sobre a síndrome de burnout (antecedentes, preditores e prevalência), sobre o efeito reverso entre estressor e bem-estar/tensão, os de validação de instrumentos ou avaliação de programas de intervenção para redução do estresse; (c) medição: artigos em que o bem-estar era medido apenas pela satisfação no trabalho; (d) tipo de amostra: constituídas por estudantes universitários, idosos, ou jovens não inseridos no mercado de trabalho. Na etapa final foram selecionados 50 artigos que preencheram os seguintes critérios de inclusão: (a) tipo do estudo: artigos científicos empíricos, de revisão ou meta-análise; (b) ano de publicação: entre 2006 e 2016; (c) foco do estudo: tratavam das relações entre estressores/estresse e bem-estar no trabalho/de trabalhadores, incluindo ou não variáveis moderadoras e mediadoras; (d) medição: avaliavam ou mensuravam o estresse e/ou fatores estressores no trabalho e aspectos positivos e negativos do bem-estar/saúde (físicos, psicológicos, sociais, no trabalho, entre outros); (e) tipo de amostra: trabalhadores de diversas categorias; (f) idiomas da publicação: português, inglês ou espanhol. A Figura 1 ilustra esses procedimentos realizados para a seleção do material.
Para a sistematização e análise do material foram lidos na íntegra todos os artigos que contemplaram os critérios de inclusão e posteriormente feitas as sínteses das suas principais informações, tais como autoria, ano de publicação, delineamento metodológico, foco do estudo, variáveis estudadas (variável independente-VI, variável dependente-VD, variáveis moderadoras e mediadoras) e conclusões (correlações entre variáveis, principais preditores, etc.). Variáveis preditoras são aquelas capazes de predizer efeitos em outra variável, enquanto as variáveis moderadoras são aquelas que podem afetar a direção e a força da relação entre a VI ou antecedente e a VD ou variável consequente. A variável mediadora é aquela que quando introduzida no modelo, faz com que a relação entre uma VI e uma VD deixe de ser significativa, pois a relação entre elas é melhor explicada pela mediadora31. Os dados foram reunidos em quadros, separando os estudos de revisão/meta-análise dos estudos empíricos. Foram também resumidas e integradas as sugestões dos estudos em geral, no que tange às pesquisas futuras e aplicabilidade dos resultados nas organizações.
Resultados
Os artigos analisados estão apresentados em quatro quadros, a fim de facilitar a visualização e a compreensão dos dados. Os Quadros 1 e 2 apresentam um resumo dos artigos de revisão e de meta-análise (autoria/ano de publicação; tipo de revisão e amostra; VI e VD; outras variáveis; e conclusões). O Quadro 1 reúne onze estudos publicados entre 2011 e 2016, e o Quadro 2 apresenta quatro estudos publicados entre 2006 e 2010, totalizando quinze (15). Os Quadros 3 e 4 apresentam a síntese dos artigos empíricos (autoria/ano de publicação; tipo de pesquisa e participantes; foco do estudo; e conclusões). O Quadro 3 reúne dezenove estudos publicados entre 2011 e 2016, e o Quadro 4 apresenta dezesseis estudos entre 2006 e 2010, totalizando trinta e cinco (35). Nas conclusões destacam-se os principais preditores positivos e negativos de bem-estar no trabalho (BET), os moderadores ambientais e individuais, os mediadores, os preditores positivos da tensão, dos sintomas físicos e psicológicos e dos problemas na saúde. Os estudos estão dispostos por ordem decrescente do ano de publicação, iniciando com os mais recentes, organizados pela ordem alfabética dos autores.
Quadro 1 Resumo dos estudos de revisão e meta-análise (publicados entre 2011 e 2016).
Autoria/Ano de publicação | Tipo de revisão e Amostra | VI e VD | Outras variáveis | Conclusões |
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Bragard et al.59/2015 | Estudos empíricos, transversais, com médicos de emergência. | VI: Estresse ocupacional. VD: Burnout e Qualidade de vida no trabalho - QVT (satisfação e bem-estar no trabalho). | - Preditores de Burnout: estressores como altas demandas e a falta de recursos no trabalho (baixo controle, falta de apoio de supervisores/colegas e falta de formação). - Fator relevante que minimizou o impacto dos estressores no trabalho melhorando QVT: percepção do trabalho como gratificante. |
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Ilies et al.23/2015 | Estudos teóricos e empíricos, transversais e longitudinais, e de meta-análise. Trabalhadores. | VI: Antecedentes de BET (estressores, eventos afetivos no trabalho, fatores pessoais, equilíbrio trabalho-família). VD: Efeitos no BET (reações ao estresse, satisfação no trabalho, bem-estar psicológico - BEP). | Moderadores: controle no trabalho, suporte social, outros recursos no trabalho, afetos positivos, processo de recuperação psicobiológica. | - Preditores (-) de BET: estressores psicossociais no trabalho, eventos afetivos negativos no trabalho e a experiência de conflito trabalho-família. - Preditores (+) de BET: eventos positivos no trabalho. - Moderadores que minimizam os efeitos (-) das demandas e estressores no BET: controle no trabalho, suporte social e outros recursos no trabalho, os afetos positivos e o processo de recuperação psicobiológica (desapego psicológico do trabalho, experiências de relaxamento, controle e autodomínio). |
Sonnentag 17/2015 | Estudos empíricos transversais e longitudinais. Trabalhadores. | VI: Fatores do trabalho (estressores, recursos e relações interpessoais no trabalho); Recursos pessoais; Interface trabalho-casa. VD: Bem-estar no trabalho (BET). | Moderadores Ambiente: eventos positivos, autonomia, suporte no trabalho, clima de segurança. Individuais: estabilidade emocional, estratégias de autorregulação. | - Preditores (-) de BET: estressores no trabalho, interações sociais negativas e falta de apoio social no trabalho, conflito trabalho-casa. - Preditores (+) de BET: recursos e apoio social no trabalho, recursos pessoais (autoestima, coping, otimismo, autoeficácia). - Moderadores do ambiente que amenizam os efeitos dos estressores no BE: eventos (+), autonomia, percepção de suporte e clima de segurança psicológica no trabalho. - Moderadores individuais que amenizam os estressores: estabilidade emocional e uso de estratégias de autorregulação. |
Sonnentag e Fritz25/2015 | Estudos empíricos transversais e longitudinais. Trabalhadores. | VI: Estressores no trabalho. VD: Reações psicológicas (afetos, tensão e sintomas de saúde); Bem-estar/BE (satisfação com a vida e engajamento no trabalho). | Desapego psicológico do trabalho durante o periodo de folga/ afastamento do trabalho. | - Preditores (-) de BE: estressores no trabalho (pressão e sobrecarga) e < nível de desapego psicológico. - Moderador que ameniza o impacto dos estressores sobre o BE: > desapego psicológico do trabalho. |
Ford et al.2/2014 | Meta-análise de estudos empíricos longitudinais. Trabalhadores. | VI: Estressor ocupacional. VD: Tensão Ocupacional (psicológica e fisiológica). | - Preditores (+) de tensão ao logo do tempo: estressores crônicos que se acumulam mediante exposição sistemática no trabalho. - Fatores que impactam na > tensão: altas demandas e dificuldade de se desligar do trabalho durante as horas livres (desapego psicológico). |
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Schaufeli e Taris4/2014 | Estudos empíricos transversais e longitudinais com trabalhadores. | Modelo 1 VI: Demandas no trabalho. VD: Tensão e resultados (-) na saúde. Modelo 2 VI: Recursos trabalho. VD: Bem-estar (engajamento). | Moderador: Recursos pessoais (autoestima, autoeficácia, controle e resiliência). | - Modelo 1: demandas predizem tensão e problemas na saúde no longo prazo. - Moderador que reduz efeitos das demandas na tensão: recursos pessoais. - Modelo 2: recursos no trabalho predizem BE e bom desempenho no trabalho. - Moderador que aumenta efeitos dos recursos no engajamento no trabalho: recursos pessoais (também é mediador parcial na relação). |
Ganster e Rosen18/2013 | Estudos empíricos, transversais e longitudinais com trabalhadores. | VI: Estressores psicossociais no trabalho. VD: Bem-estar como saúde física e psicológica (efeitos terciários na saúde). | Efeitos primários: hormônios do estresse, tensão, ansiedade, fadiga e insônia. Efeitos secund.: pressão, colesterol. | - Preditores (-) de BE: altas demandas e baixo controle. - Efeitos dos estressores: ansiedade e tensão, pressão e colesterol alto, doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2 e depressão. - Moderador que ameniza os efeitos (-) das demandas no BE: > controle. |
Scheibe e Zacher9/2013 | Estudos empíricos transversais e longitudinais. Trabalhadores. | VI: Eventos afetivos no trabalho. VD: Tensão, estresse e bem-estar (BE). | Moderador: idade. | - Preditor (+) de BE: > idade e melhor regulação emocional. -Moderador que ameniza o impacto do estresse: idade. |
Silva et al.22/2013 | Estudos teóricos e empíricos com enfermeiros. | VI: Estressores no trabalho (sobrecarga, conflitos e acúmulo de funções). VD: BE/Saúde (físico/ psíquico). | - Preditores (-) de BE: sobrecarga de trabalho e acúmulo de funções (atividades gerenciais e assistenciais). - Efeitos dos estressores: esgotamento físico, mental e transtornos psicossomáticos. |
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Lang et al.19/2012 | Meta-análise de estudos empíricos longitudinais. Trabalhadores da Indústria. | VI: Estressores psicossociais no trabalho. VD: Saúde física (sintomas osteomusculares). | - Preditores (+) de sintomas osteomusculares: trabalho monótono, altas demandas e baixo controle sobre o trabalho, alto nível de estresse, baixo apoio do supervisor e insegurança no emprego. | |
Lawrence et al.32/2011 | Estudos teóricos e empíricos com trabalhadores. | VI: Eventos afetivos no trabalho e experiência emocional. VD: Efeitos de curto e longo prazo no Bem-estar/BE (saúde física e psicológica, atitudes, relações sociais). | Estratégias de regulação emocional (RE) e expressão emocional, Inteligência emocional (IE), Regras de expressão organizacionais. | - Preditores (+) de curto e longo prazo no BE: experiência emocional positiva, RE funcional e expressão emocional. - Preditores (-) de longo prazo no BE: experiência de emoções negativas e a RE disfuncional habitual (supressão). - Moderador entre a experiência e RE que ameniza os impactos negativos dos eventos afetivos nos resultados de BE: IE. - Moderadores entre a experiência e expressão emocional, com impacto (+) nas relações: IE e regras de expressão. |
Fonte: Elaboração dos autores.
VI: Variável Independente; VD: Variável Dependente; (+): positivo; (-): negativo.
Quadro 2 Resumo dos estudos de revisão e meta-análise (publicados entre 2006 e 2010)
Autoria/Ano de publicação | Tipo de revisão e Amostra | VI e VD | Outras variáveis | Conclusões |
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Häusser et al.11/2010 | Estudos empíricos transversais e longitudinais, com trabalhadores. | VI: Modelo 1 de Demanda-controle no trabalho. VI: Modelo 2 de Demanda-controle-suporte no trabalho. VD: Bem-estar psicológico. | Modelo 1 - Moderador: controle. Modelo 2 - Moderador: suporte social e controle. | - Ambos os modelos têm bom suporte empírico. - Moderador no Modelo 1: > controle atenua o impacto negativo das demandas de trabalho no BEP (Bem-estar psicológico). - Moderadores no Modelo 2: suporte social e controle amenizam o impacto (-) da alta demanda no BEP. |
Meyer e Maltin33/2010 | Estudos teóricos e empíricos com trabalhadores. | VI: Estressores no trabalho; e Comprometimento. VD: Tensão e Bem-estar (físico e psicológico). | Moderadores: Comprometimento afetivo (CA), normativo (CN) e de continuidade (CC); Estado motivacional. |
- Preditor (+) de BE: CA. - Preditor (+) de tensão: CC; Preditor (-) de tensão: CA. - Moderadores que ora minimizam ora exacerbam o efeito (-) dos estressores: tipo de comprometimento e estado motivacional. |
Nieuwenhuijsen et al.34/2010 | Meta-análise de estudos empíricos com trabalhadores. | VI: Fatores de riscos psicossociais no trabalho. VD: Transtornos mentais relacionados ao estresse. | - Preditores (+) de transtornos mentais: altas demandas e baixo controle no trabalho, baixo suporte de colegas e supervisores, baixa justiça organizacional e alto desequilíbrio esforço-recompensa. | |
Laranjeira20/ 2009 |
Estudos empíricos com trabalhadores. | VI: Fatores estressores e de bem-estar organizacionais. VD: Efeitos de estresse e bem-estar (físicos, emocionais). | - Preditores (+) de estresse e (-) de BE: monotonia, falta de controle, impossibilidade de tomar decisões e ausência de apoio dos pares e chefia. - Preditores (+) de BE: coesão social e eficácia coletiva. |
Fonte: Elaboração dos autores.
VI: Variável Independente; VD: Variável Dependente; (+): positivo; (-): negativo.
Quadro 3 Resumo dos estudos empíricos (publicados entre 2011 e 2016).
Autoria/Ano de publicação | Tipo de pesquisa e Participantes | Foco do Estudo | Conclusões |
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Malik e Noreen12/2015 | Correlacional e transversal. Professores universitários e de escolas do Paquistão. | Investigar o suporte organizacional percebido (SOP) como moderador da relação entre estresse ocupacional e bem-estar afetivo no trabalho (BEA). | - Moderador que exacerba o impacto (-) do estresse no BE: baixa percepção de suporte organizacional. |
Mihăilă3/2015 | Correlacional e transversal. Trabalhadores selecionados via Linked In, empregados no momento. | Estudar a relação entre estresse no trabalho e comportamento organizacional (bem-estar, satisfação no trabalho, rotatividade e frustração no trabalho). | - Preditor (-) de BEe satisfação no trabalho: estresse no trabalho. - Preditor (+) de frustração no trabalho e desejo de deixar a empresa: estresse. |
Semmer et al.37/2015 | Correlacional, transversal e longitudinal. Trabalhadores Suíços. | Descrever o conceito de tarefas ilegítimas (desnecessárias) e testar sua associação com o Bem-estar (BE)/ Tensão. | - Preditores (-) de BE: tarefas ilegítimas - Preditores (+) de Tensão após 2 meses: tarefas ilegítimas. |
Carvalho et al.42/2014 | Estudo de caso com profissionais de saúde de hospital de Portugal. | Compreender as percepções individuais, as representações mentais e os atributos relacionados à gestão de emoções e do estresse no trabalho. | - Quanto melhor gestão das emoções, melhor o controle e RE < estresse emocional. - Quanto > nível de consciência dos estados emocionais > suporte de qualidade e desenvolvimento de atividades apropriadas > o bem-estar e a QVT. |
Millán de Lange et al.24/2014 | Correlacional e transversal. Docentes universitários da Venezuela. | Estudar a inteligência emocional (IE) e a disposição para fluir no trabalho como fatores de proteção frente ao estresse laboral e como promotores do BEP. | - Fatores protetores do estresse laboral e preditores de BEP (Bem-estar psicológico): IE e disposição para fluir no trabalho. |
Gomes et al.44/2013 | Correlacional e transversal. Enfermeiros de hospitais de Portugal. | Identificar fontes de estresse, estratégias de coping e relação com a saúde geral de enfermeiros de serviços de oncologia. | - Estressores: relativos a aspetos organizacionais e condições de trabalho. - Estratégias de coping: foco na resolução de problemas e melhoria do BE. - Correlação (-) entre saúde geral e estratégias de coping de evitação. |
Narainsamy e Van Der Westhu-izen55/2013 | Correlacional e transversal Trabalhadores de lab. clínicos na África do Sul. | Investigar se o BET consiste em 4 fatores: estresse ocupacional, burnout, engajamento no trabalho e satisfação no trabalho. | - Os resultados dão suporte para o modelo de BET composto por quatro fatores. - Fatores de correlação (-) com BET: estresse ocupacional e burnout. - Fatores de correlação (+) com BET: satisfação e engajamento no trabalho. |
Rahimnia et al.39/2013 | Correlacional e transversal Enfermeiros de Hospital do Irã. | Testar um modelo no qual o capital psicológico (autoeficácia, otimismo e resiliência), emoções construtivas e destrutivas, estresse, ansiedade e depressão são antecedentes de BE. | - > capital psicológico: > emoções construtivas, < emoções destrutivas e > BE. - Preditor (+) de BE: emoções construtivas. - Preditor (-) de BE: emoções destrutivas. - A redução de emoções destrutivas tem > efeito para aumentar o BE. |
Sanches e Santos7/2013 | Estudo de caso com docentes universitários da área de saúde no Brasil. | Analisar as situações geradoras do estresse ocupacional (estressores), os sintomas e as estratégias de coping (enfrentamento) utilizadas. |
- Estressores: alunos despreparados, sobrecarga de trabalho, contexto, preocupação com a aprendizagem do aluno e prazos institucionais. - Estratégias coping: autocontrole, suporte social, solução de problemas e reavaliação. |
Bell et al.21/2012 | Correlacional e transversal. Acadêmicos de Universidades da Austrália. | Investigar a relação entre estresse percebido no trabalho (ameaça e pressão), interface trabalho-vida pessoal, e bem-estar/mal-estar. | - Preditor (-) de BE e (+) de mal-estar: estresse de ameaça. - Preditor de conflitos trabalho-vida: estresse de ameaça e pressão no trabalho. |
Bell et al.36/2012 | Correlacional e transversal. Acadêmicos de Universidades da Austrália. | Investigar a influência da espiritualidade no trabalho (SAW) no BE e estresse, e o efeito moderador da SAW na relação entre estresse e BE/mal-estar. | - SAW: correlação (+) com BE e (-) com mal-estar e estresse. - Não houve moderação da espiritualidade entre estresse e bem-estar. - Preditor (-) de BE: estresse de ameaça psicológica no trabalho. |
Niven et al.54/2012 | Correlacional e transversal. Assistentes sociais, terapeu-tas e pessoal de ambulância do Reino Unido. | Investigar se a regulação da emoção (RE) pode amenizar os efeitos negativos da exposição à agressão no local de trabalho na tensão. | - Moderador que atenuou a relação agressão-tensão no local de trabalho durante as interações dentro da organização: estratégia de reavaliação. - Moderadores que exacerbam os efeitos (-) de agressão no local de trabalho durante as interações fora da organização: estratégias de RE (reavaliação e supressão). |
Serafim et al.48/2012 | Estudo de caso com servidores do Poder Executivo, Brasil. | Analisar os fatores de risco psicossociais do trabalho (FRPT) e as relações com adoecimento no trabalho. | - Preditor de doenças e incapacidade para o trabalho: exposição contínua aos FRPT. - FRPT devem ser considerados nas avaliações dos casos de adoecimento e incapacidade profissional, e na promoção da saúde ocupacional. |
Caran et al.35/2011 | Correlacional e transversal. Docentes de Universidade Pública brasileira | Identificar a existência de Riscos Ocupacionais Psicossociais (ROP) no ambiente laboral de professores universitários e efeitos na saúde. | - Preditores de desgaste na saúde e transtornos mentais: contínua exposição aos ROP (percebidos por 87% dos docentes). - Principais alterações: estresse, ansiedade e insônia. |
Guido et al.61/2011 | Correlacional e transversal. Enfermeiros de Hospital Universitário brasileiro. | Identificar estressores, nível de estresse, estado geral de saúde e formas de enfrentamento utilizadas pelos enfermeiros no ambiente de trabalho. | - Forma de enfrentamento mais utilizada: resolução de problemas. - O < nível de estresse foi associado ao estado de saúde bom/regular e > uso de estratégias de coping focadas no problema. |
Kinman e Grant41/2011 | Correlacional e transversal. Assistentes sociais da Inglaterra, África e Caribe. | Investigar competências emocionais e sociais como preditores de resiliência e o papel dessa entre inteligência emocional (IE) e distresse/ BEP. | - Fator protetor do estresse e preditor de BEP: competências emocionais. - Preditores de resiliência: competências emocionais (IE e empatia) e sociais. -Resiliência foi preditora (-) do distresse psicológico e mediadora entre IE e BEP. |
Lee et al.56/2011 | Correlacional e transversal. Enfermeiros de hospital em Taiwan. | Analisar as relações entre estresse no trabalho, as estratégias de enfrentamento (coping), e a promoção de estilo de vida saudável. | - O > estresse foi associado a > uso de coping e < promoção de estilo de vida saudável. - O < estresse foi associado ao > coping de controle e suporte e > estilo de vida saudável (responsabilidade com a saúde e atualização). |
Mosadeghrad et al.47/2011 | Correlacional e transversal. Empregados hospitais no Irã. | Compreender as relações entre o estresse no trabalho, QVT e o impacto sobre a intenção de rotatividade. | - Estresse tem relação (-) com QVT. - Preditores de estresse: estressores, políticas, relações e o ambiente de trabalho. |
Rothmann e Malan6/2011 | Correlacional e transversal. Fármacos Hospitais África do Sul. | Investigar se o estresse no trabalho e as estratégias de coping predizem o BET (burnout/engajamento). | - Preditor (+) de BET: > coping focado no problema e < coping de esquiva. - Preditor (-) de BET: altas demandas, falta de recursos e > coping de esquiva. |
Fonte: Elaboração dos autores.
Quadro 4 Resumo dos estudos empíricos (publicados entre 2006 e 2010).
Autoria/Ano de publicação | Tipo de pesquisa e Participantes | Foco do Estudo | Conclusões |
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Sadir et al.51/2010 | Comparação entre grupos, transversal. Clientes de clínica psicológica brasileira. | Verificar se as variáveis de sexo, cargo, idade e estado civil interferem nos níveis de estresse e QV de profissionais em início de tratamento de estresse. | - Grupos com > estresse: profissionais entre 40 e 49 anos, mulheres e casados. - Fator QV mais comprometido em todos profissionais: saúde. - Prejuízo no fator social e afetivo: > para gerentes e < para os autônomos. |
Santos e Cardoso8/ 2010 |
Correlacional e transversal. Trabalhadores da saúde mental brasileiros. | Avaliar o estresse, estratégias de enfrentamento e QV de profissionais de serviços de saúde mental. | - Quanto > índice de estresse > uso de estratégias de fuga-esquiva. - Quanto < índice de estresse > qualidade de vida. |
Wadsworth et al.38/2010 | Correlacional e transversal. Trabalhadores da Inglaterra e Gales. | Comparar o impacto da presença/ausência de fatores do trabalho e associação com saúde mental e BE. | - A > demanda de trabalho teve > impacto no estresse. - O < apoio social teve > impacto (-) no BE. |
Afonso e Gomes43/2009 | Correlacional e transversal. Militares da Guarda Nacional Portuguesa. | Avaliar o estresse laboral e analisar suas relações com o coping proativo, comprometimento organizacional, satisfação pessoal e realização profissional. | - > estresse e < satisfação pessoal e profissional > impacto (-) na carreira. - > Coping proativo e > comprometimento predizem > satisfação pessoal/profissional. - Quanto > uso de estratégias de confronto > exaustão dos militares. |
Astudillo Diaz et al.52/2009 | Estudo de casos com profissionais de saúde de hospitais do Chile. | Conhecer os fatores protetores do estresse presentes no ambiente laboral, percebidos pelo pessoal de saúde. | - Protetores do estresse: funções bem definidas, chefia comprometida, possibilidade de romper a rotina, qualidade dos recursos, trabalho em equipe, ambiente agradável e boas relações. Fatores (+) são úteis para orientar ações de promoção da saúde no trabalho. |
Chen et al.1/2009 | Correlacional e transversal. Trabalhadores de petróleo offshore. China. | Explorar a relação entre o estresse ocupacional e a saúde mental de trabalhadores chineses. | - Preditor (-) de saúde mental: estresse ocupacional. - Quanto < suporte gerencial > risco para saúde mental. |
Goto et al.58/2009 | Estudo de caso com profissionais da Indústria automobilística brasileira. | Investigar os fatores percebidos como estressores no trabalho, as estratégias de enfrentamento, e a percepção de BE (satisfação com a vida e trabalho). | - Estressores: prazo curto e volume excessivo de trabalho, baixa autonomia. - Estratégias de enfrentamento: domínio do estresse por meio do controle da carreira e dos conteúdos do trabalho, prática de atividades lúdicas realizadas fora da empresa. |
Paris e Omar40/2008 | Correlacional e transversal. Médicos e enfermeiros da Argentina. | Identificar estressores e estratégias de enfrentamento usadas por profissionais de saúde; e explorar as relações entre estresse, bem-estar e satisfação laboral. | - Estressores: sobrecarga, falta de apoio e percepção de injustiça no trabalho. - < Estresse > uso estratégias solução de problemas/distanciamento > satisfação e BE. - > Estresse > uso de estratégias desadaptativas < satisfação e BE. |
Shimazu e Schaufeli45/ 2007 |
Correlacional e longitudinal. Trabalhadores de empresa de construção de máquinas no Japão. | Examinar os efeitos do coping focado no problema e da distração no bem-estar (respostas ao estresse; desempenho no trabalho). | - > Uso do coping focado no problema associado a < estresse nos indivíduos com alta distração e > estresse nos que tinham baixa distração. - Houve efeito (+) de curto prazo do coping focado no problema no BE e desempenho. |
Uncu et al.57/2007 | Correlacional e transversal. Médicos de assistência na Turquia. | Analisar as relações entre bem-estar afetivo no trabalho e estresse, ansiedade e depressão. | - BE afetivo: correlação (-) com estresse, depressão e ansiedade. - Afetos (-) no trabalho tem correlação com estresse, ansiedade e depressão. |
Fonseca e Soares49/2006 | Estudo de caso com enfermeiros brasileiros. | Conhecer estressores que contribuem para o desgaste emocional, tipos de enfrentamento e agravos à saúde. | - Estressores: relações interpessoais, condições ambientais, falta de recursos no trabalho. São vistos como preditores negativos de saúde e BET. - Enfrentamento: rezar, atividades físicas, aconchego do lar e no próprio serviço. - Agravos à saúde: hipertensão e enxaqueca. |
Fortes- Ferreira et al.26/2006 |
Correlacional e transversal. Bancários da Espanha. | Analisar os papéis do coping de ação direta e do coping paliativo na relação entre estressores e BEP (distresse, queixas e satisfação no trabalho). | - Preditor (+) de BEP:
coping de ação direta ou focado no problema. - Preditor (+) de distresse: coping paliativo ou de esquiva. - Moderador que exacerbou o efeito dos estressores nas queixas: coping paliativo. |
Gelsema et al.50/2006 | Correlacional e longitudinal. Enfermeiros de Hospital Universitário dos Países Baixos. | Analisar a influência das condições de trabalho (demanda, recursos, decisão, recompensas) sobre a saúde e BE (satisfação, exaustão emocional, distresse e queixas físicas), e o efeito reverso. | - Preditores (+) de satisfação no trabalho: apoio social do supervisor, recompensas e controle sobre o trabalho. - Preditores (+) de exaustão emocional: pressão de tempo, aumento de demandas no trabalho e exigências físicas. Há efeito reverso. |
Jackson et al.46/2006 | Correlacional e transversal. Educadores da África do Sul. | Avaliar a validade e consistência interna de construtos em um modelo de bem-estar no trabalho (BET) e testar um modelo estrutural de suas relações. | - Preditores (+) de BET: recursos de trabalho (suporte e oportunidades de carreira). - Engajamento mediou a relação entre os recursos de trabalho e comprometimento organizacional. Burnout mediou a relação entre demandas e doenças. |
Karlsen et al.27/2006 | Correlacional e transversal. Veteranos de guerra da Noruega. | Explorar os efeitos do estresse, trauma, coping e orientação para o crescimento sobre o bem-estar subjetivo (BES). | - O efeito do estresse foi mediado positivamente por um processo de coping focado no problema, associado a um componente de crescimento, levando a melhoria do BES. - O estresse foi mediado negativamente por um processo de coping de esquiva e um componente de distresse, levando a piora do BES. |
McCalister et al.53/2006 | Correlacional e transversal. Trabalhadores de tecnologia dos EUA. | Testar a relação entre resiliência e suporte social e os efeitos no estresse e satisfação no trabalho e a influência da afetividade negativa na relação entre estresse e a satisfação no trabalho. | - Recursos de resiliência, suporte do supervisor e dos colaboradores têm função protetora que minimiza o estresse e melhora a satisfação no trabalho. - Quanto > a afetividade negativa < a satisfação no trabalho. - Quando as outras variáveis foram incluídas como preditores no modelo, não houve correlação entre afetividade negativa e satisfação no trabalho. |
Fonte: Elaboração dos autores.
Considerando a totalidade dos artigos selecionados, observa-se que dos estudos de revisão e meta-análise (Quadros 1 e 2) onze foram publicados entre os anos de 2011 e 2016 (73,3%), e apenas quatro são referentes ao período anterior (2006 a 2010), indicando um aumento considerável na produção científica nos últimos cinco anos. Quanto aos estudos empíricos (Quadros 3 e 4), dezenove aparecem nesse período mais recente (54,3%).
Quanto à localização geográfica onde os estudos empíricos foram realizados, oito eram do Brasil e o restante de outros países: Portugal (3), África do Sul (3), dois ou mais países (3), Austrália (2), Irã (2), Argentina (1), Chile (1), China (1), Espanha (1), EUA (1), Japão (1), Noruega (1), Países Baixos (1), Paquistão (1), Reino Unido (1), Suíça (1), Taiwan (1), Turquia (1), Venezuela (1). Os participantes desses estudos eram trabalhadores de diversos setores, incluindo principalmente profissionais da saúde (45%), docentes (20%), trabalhadores em geral (11%) e outros (24%): servidores públicos, militares, bancários e profissionais da Indústria. Sobre os estudos de revisão e meta-análise, a procedência é bastante diversificada uma vez que contemplam muitos estudos de diferentes países, sendo a maior parte das amostras de trabalhadores em geral (80%). Dois estudos foram realizados com profissionais da saúde (13,3%) e apenas um com empregados da Indústria (6,7%).
Quanto ao método, os Quadros 3 e 4 indicam de modo claro a prevalência de abordagem quantitativa mediante uso de escalas de autorrelato nas pesquisas empíricas, correspondendo a 82,8% (N = 29). Foram encontrados apenas seis estudos qualitativos. Observa-se uma diferença significativa com relação à inclusão de moderadores e mediadores, sendo contemplados em 60% dos estudos de revisão e meta-análise e em apenas 31% dos estudos empíricos quantitativos.
Estudos de Revisão e Meta-análise: preditores
Destacam-se como principais preditores negativos de bem-estar no trabalho (BET) os estressores e a falta de recursos no trabalho: pressão e sobrecarga17,22,23,25, altas demandas e baixo controle18,20, a monotonia e o baixo poder de decisão20, as interações sociais negativas e a falta de apoio social17,20, e os eventos afetivos negativos no trabalho23. Foram citados em menor número os fatores individuais como o baixo desapego psicológico nos períodos de folga25, as emoções negativas e a regulação emocional (RE) disfuncional32; e o conflito trabalho-família17,23.
Como preditores positivos de BET ressaltam-se os recursos pessoais como a autoestima, o coping ativo, o otimismo e a autoeficácia17, o comprometimento afetivo no trabalho33, a experiência de emoções positivas e a RE funcional32. Foram apontados os recursos no trabalho4, que se referem aos aspectos físicos, psicológicos, sociais ou organizacionais do ambiente de trabalho que visam o alcance de metas e a redução de custos psicológicos, como o apoio social no trabalho17 e os eventos afetivos positivos no trabalho23. Os fatores grupais como a coesão social e eficácia coletiva foram citados em apenas um estudo20.
Como preditores da tensão, sintomas e transtornos físicos/psicológicos, salientam-se os estressores crônicos, como as altas demandas, a falta de recursos e apoio social20,32,34 e o baixo desapego psicológico do trabalho1 (Quadro 1).
Estudos de Revisão e Meta-análise: moderadores
Merecem destaque os moderadores ambientais e individuais que amenizam o impacto negativo dos estressores no bem-estar dos trabalhadores. Os principais moderadores do ambiente são os recursos no trabalho como controle e suporte social no trabalho11,18,23, os eventos positivos no trabalho, a autonomia do trabalhador, a percepção de suporte organizacional e o clima de segurança17.
Já os recursos pessoais, além de reduzirem a repercussão negativa dos estressores aumentam o efeito positivo dos recursos organizacionais no bem-estar no trabalho (BET)4. São eles: a estabilidade emocional e as estratégias de autorregulação17, a inteligência emocional (IE)32, o maior desapego psicológico25 e a idade. Adultos idosos são mais efetivos em evitar e regular os afetos negativos resultantes de eventos no trabalho, diminuindo a tensão9 (Quadro 2).
Estudos Empíricos: preditores
Como preditores negativos que prejudicam o bem-estar no trabalho (BET) aqui também se observam principalmente os estressores e a falta de recursos no trabalho: os riscos ocupacionais psicossociais35, o estresse percebido no trabalho2, o estresse ocupacional1, o estresse de ameaça psicológica21,36, altas demandas e falta de recursos6, as tarefas ilegítimas37 (vistas como desnecessárias), e a falta de suporte social38. O menor suporte gerencial foi associado ao maior risco para saúde mental no estudo de Chen et al.1. Fatores relacionados ao afeto e sua regulação foram apontados em menor número, como as emoções destrutivas39, as estratégias de enfrentamento ao estresse desadaptativas40 e o coping de esquiva6 (evitação).
Destacam-se como preditores positivos de BET os recursos pessoais como o alto capital psicológico (autoeficácia, otimismo e resiliência) e as emoções construtivas39, as competências emocionais41, a maior consciência e gestão das emoções42, a inteligência emocional e a disposição para fluir no trabalho24, além das estratégias de coping proativo e focado no problema6,26,40,43-45. Os recursos de trabalho como suporte organizacional, crescimento e oportunidades de carreira se mostraram promotores de BET na pesquisa de Jackson et al.46.
Os principais preditores de mal-estar, tensão, estresse psicológico e outros transtornos físicos e psicológicos foram: os fatores de riscos psicossociais no trabalho, ou seja, características e condições do trabalho que funcionam como estressores35,47,48, e dentre esses ressaltam-se as tarefas ilegítimas37, o estresse de ameaça21, a pressão de tempo e prazos, a sobrecarga de trabalho, e as altas demandas e baixos recursos7,49,50. As consequências da constante exposição aos estressores podem ser danosas ao bem-estar, prejudicando a saúde dos trabalhadores7,35,49,51 (Quadro 3).
Estudos Empíricos: moderadores e mediadores
Alguns autores investigaram os fatores protetores de estresse (moderadores), ou seja, aquelas características pessoais ou do ambiente, ou a percepção que se tem sobre eles, capazes de diminuir os efeitos negativos que o processo de estresse pode ter sobre a saúde e bem-estar, sendo eles: funções bem definidas, chefia comprometida com a tarefa e com os empregados, possibilidade de romper a rotina, qualidade dos recursos, trabalho em equipe, ambiente agradável com boas relações interpessoais52; a resiliência e suporte do supervisor/colegas53 e o uso das estratégias de reavaliação cognitiva na interação com colegas de trabalho54. As competências emocionais tiveram tanto um papel protetor de estresse como preditor de resiliência e bem-estar psicológico41. Por outro lado, houve moderadores que exacerbaram o efeito dos estressores no bem-estar, como a baixa percepção de suporte organizacional12, as estratégias de regulação emocional (RE) quando usadas na interação com pessoas de fora da organização, voltadas a atender regras de expressão ocupacionais ou organizacionais (trabalho emocional)54 e o coping paliativo ou de esquiva26.
A investigação dos mediadores foi encontrada em três estudos. O primeiro é o de Jackson et al.46 que testou e confirmou a mediação do burnout na relação entre as demandas de trabalho e problemas de saúde e a mediação do engajamento no trabalho na relação entre recursos e comprometimento no trabalho. O estudo de Karlsen et al.27 concluiu que o efeito do estresse sobre o bem-estar foi mediado positivamente por um processo de coping focado no problema, associado a um componente de crescimento, levando à melhoria do bem-estar subjetivo (BES) e, por outro lado, o estresse foi mediado negativamente por um processo de coping de esquiva e um componente de distresse, levando à piora do BES. No estudo de Kinman e Grant41 a resiliência mediou a relação entre inteligência emocional (IE) e bem-estar psicológico (BEP). Sem imputar causalidade, sugerem que a IE tem um efeito indireto sobre o BEP pela via da resiliência (Quadro 4).
Discussão
A análise dos dados revela distinção na maneira como o BET é abordado. Alguns estudos abordam o BET em uma combinação de aspectos positivos e negativos6,23,55. Outros diferenciam o BET positivo e o mal-estar/tensão (faceta negativa do BET) adotando medidas em separado4,36. Os instrumentos de mensuração abordaram aspectos positivos como o bem-estar psicológico (BEP), o afetivo (BEA) e o subjetivo (BES); a saúde mental e física; o engajamento no trabalho; a satisfação com a vida e trabalho; e a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT). Os aspectos negativos foram abordados medindo-se o estresse psicológico, tensão, os sintomas/transtornos físicos e psicológicos e o burnout. Essa variedade sinaliza haver amplitude do conceito/modelos propostos de bem-estar relacionada à complexidade do fenômeno.
Observa-se que devido à grande diversidade de estudos, algumas variáveis tiveram diferentes papéis nos modelos testados, mostrando-se ora como preditores ora moderadores positivos ou negativos de bem-estar, ampliando a compreensão da dinâmica desse construto. A falta de suporte social dos pares e chefia foi preditor negativo de BET17,20 e a sua presença foi preditora positiva de BET17, exercendo também papel moderador no estudo de McCalister et al.53 ao amenizar o efeito negativo dos estressores. Em síntese, a falta de suporte social teve maior impacto negativo no bem-estar do que a sua presença contribuiu para o bem-estar44. No estudo de Lee et al.56, a busca por suporte social utilizada como estratégia de coping foi associada ao menor estresse e estilo de vida mais saudável, mostrando a importância desse fator para os empregados. A percepção de suporte organizacional, por sua vez, minimizou o efeito dos estressores no BET17, enquanto que a baixa percepção desse suporte teve efeito inverso, com impacto negativo no bem-estar12.
As estratégias de regulação emocional (RE) funcional e as competências emocionais foram preditores positivos de bem-estar32,41, bem como protetores de estresse nos estudos de Sonnentag17 e Kinman e Grant41. Além disso, o bem-estar afetivo, foi associado a menores níveis de estresse, depressão e ansiedade, no estudo de Uncu et al.57. Em alguns estudos, apesar de não terem sido testados moderadores, determinados fatores podem ter atuado reduzindo os efeitos do estresse. É o caso do estudo de Goto et al.58 em que os trabalhadores tiveram uma boa percepção de bem-estar (satisfação com a vida e trabalho), apesar de diversos estressores presentes. Pode-se supor que as estratégias utilizadas para enfrentá-los tenham sido eficazes. Na pesquisa de Bragard et al.59 houve alta satisfação laboral associada à percepção positiva do próprio trabalho, embora os empregados relatassem muitos estressores e burnout.
É possível notar que os fatores do trabalho (p. ex., estressores, falta de recursos, dificuldades nas relações) foram mais consolidados como preditores negativos que prejudicam o BET1,3,6,17,18,21-23,25,35-38, enquanto os recursos pessoais (p. ex., autoeficácia, regulação emocional) como preditores positivos de BET6,17,24,32,33,39-44. De acordo com a revisão de Sonnentag17 os resultados sobre os recursos pessoais são inconclusivos para indicadores negativos de bem-estar. É relevante ressaltar aspectos controversos e ambivalentes encontrados sobre as estratégias de coping e RE. Se por um lado o uso do coping focado no problema se mostre bastante consolidado na literatura como preditor positivo de BET6,40,43-45, além de relacionado ao menor estresse e melhor estado de saúde58, por outro, os resultados relativos ao coping de esquiva são contraditórios. Embora essa estratégia esteja na maioria das vezes associada a indicadores negativos de bem-estar e saúde6,44, em algumas situações parece ter efeitos benéficos40, o que reforça a ideia da importância da flexibilidade regulatória dependendo do contexto60. Ou seja, o uso de diferentes estratégias de RE de acordo com a situação facilita a adaptação aos estressores. Nesse sentido, Lawrence et al.32 ressaltam que não é a mera utilização de determinadas estratégias de regulação consideradas disfuncionais (p. ex., a supressão de emoções) que causa danos à saúde, mas o seu uso habitual.
Conclusão
A presente revisão cumpre com seu objetivo ao trazer um panorama geral dos estudos nacionais e internacionais que relacionam estresse e bem-estar no trabalho, destacando preditores, moderadores e mediadores desta relação. Em nível nacional, traz uma contribuição adicional, pois os dois estudos brasileiros de revisão encontrados analisaram somente os preditores de BET, sem considerar moderadores e mediadores. A revisão também deixa evidente o surgimento de novos modelos mais complexos e sofisticados, oferecendo novas luzes para a compreensão dos processos e da dinâmica do bem-estar. Além dos fatores do trabalho, incorporam-se nesses modelos os recursos pessoais (resiliência, autoeficácia, competências emocionais, RE, desapego psicológico), a interface trabalho-vida pessoal e os fatores no nível do grupo, esclarecendo o papel que desempenham na relação entre estresse e bem-estar.
Sobre os fatores organizacionais os resultados apontam que a ausência de suporte, de recursos, de boas relações e de outros aspectos relacionados ao trabalho repercutem mais negativamente nos indicadores de BET do que a sua presença contribui positivamente para o BET. A percepção de suporte organizacional e os recursos no trabalho, especialmente a autonomia e o suporte social de pares e chefias atuam como moderadores, reduzindo o impacto negativo do estresse sobre o BET. Sobre os recursos pessoais, eles se revelam capazes de fazer a pessoa preservar o seu bem-estar no trabalho mesmo em condições adversas. As competências emocionais e as estratégias de regulação emocional funcional além de serem preditoras de BET atuam como moderadoras eficazes, minimizando os efeitos negativos dos estressores. Vale ressaltar que apesar de algumas estratégias utilizadas para lidar com situações estressantes serem consideradas adaptativas ou desadaptativas, por estarem associadas com maior frequência a indicadores positivos ou negativos de bem-estar e saúde, as consequências podem variar dependendo do contexto. A estratégia de enfrentamento focada no problema, por exemplo, traz mais benefícios que a de esquiva, embora esta última possa ser útil provisoriamente em situações em que não se consegue ter controle sobre um ambiente aversivo.
Considerando a complexidade dessa temática, mais estudos deveriam explorar as estratégias de RE intrapessoal, testando seus diferentes papéis (moderadores e mediadores), em situações e ocupações diversas, diferentes grupos etários, incluindo também as estratégias de regulação emocional das demais pessoas com quem se interage (interpessoal). Além disso, nota-se que poucos mediadores foram testados, representando uma lacuna a ser preenchida. Embora não tenha sido o foco desta revisão, é possível notar que são poucos os estudos que exploram a eficácia de intervenções em recursos pessoais (habilidades de regulação e competências emocionais) e mudanças organizacionais, avaliando seus efeitos no estresse e bem-estar.
Sugere-se ainda, testar modelos mais amplos e integrados, que considerem a variabilidade individual frente a demandas e estressores, e os resultados de longo prazo positivos e negativos na saúde e no bem-estar. Para isso, são necessários mais estudos longitudinais que permitam inferir causalidade e também compreender o processo e a dinâmica do bem-estar no trabalho. Outra lacuna quanto ao método se refere à ampliação da mensuração para além do autorrelato, com o uso de medidas de respostas corporais, de observação do trabalho, acompanhamento diário, multiníveis (p. ex., interpessoais, grupais), integrando análises quantitativas e qualitativas.
Quanto às limitações deste estudo, pode-se apontar a seleção de periódicos, que ocorreu em diversas bases de dados e revistas relevantes para a área, embora possa haver outras não consultadas. E também pode haver outros níveis de análise e abordagens sobre estresse e bem-estar no trabalho para além das utilizadas neste estudo.
Como contribuição prática, os resultados encontrados são relevantes e podem subsidiar políticas e programas de melhoria do bem-estar e de redução do estresse dos trabalhadores, a partir de um olhar mais cuidadoso sobre os estressores, os recursos do trabalho, o suporte organizacional e social, as relações interpessoais, os recursos pessoais e o equilíbrio trabalho-vida pessoal. Esses fatores mostraram-se altamente importantes e, se não tratados adequadamente, podem se constituir em riscos psicossociais, com consequências danosas para a saúde dos trabalhadores.