Introdução
Os agrotóxicos são compostos químicos utilizados extensivamente na agricultura, para o controle químico de espécies espontâneas em ambiente urbano e de vetores, em campanhas de saúde pública1 e representam perigo para os seres humanos e para a natureza2. Dentre os mais utilizados, destacam-se o grupo dos organofosforados (OP) que são inibidores irreversíveis da acetilcolinesterase (AChE)3. O consequente acúmulo desta molécula no organismo provoca efeitos tóxicos sobre diferentes órgãos e sistemas, como alterações no sistema nervoso, imunológicas, endócrinas e outras4-7. Dentre seus possíveis efeitos crônicos, caracterizados por surgimento tardio, estão danos potencialmente irreversíveis, como paralisias e neoplasias8.
No Brasil, com o crescimento exponencial da epidemia de dengue, em 2015, em que se registrou mais de 1 milhão de casos confirmados9 e com o surgimento da febre Chikungunya (2014) e da epidemia do Zika vírus (2015), com consequências ainda mais nocivas à população, foi demandada a revisão do Programa Nacional de Controle do Aedes aegypti (mosquito transmissor), com intensificação do uso de inseticidas para este mosquito, dando seguimento orientações de 2014, com pulverização de Malahion a 30% diluído em água a Ultra Baixo Volume (UBV)10. Este fato foi criticado pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), que divulgou uma nota técnica alertando para os perigos à saúde e ao ambiente11.
O malathion (diethyl (dimethoxythiophosphorylthio)succinate) é um OP utilizado em várias culturas para controle de espécies não desejadas e é frequentemente utilizado no controle de insetos12, cujas formulações comercializadas pode conter até doze impurezas formadas durante a fabricação e armazenamento13. Entre as impurezas importantes estão o malaoxon e isomalathion, formados a partir da oxidação14 e da isomerização química ou térmica do malathion, respectivamente15.
Sua capacidade mutagênica e potencial efeito carcinogênico vem sendo discutidos16-18. Entretanto, apesar do uso generalizado, há surpreendentemente poucos estudos sobre a associação entre malathion e câncer, a maioria realizados na América do Norte e Europa, com poucos estudos produzidos em países de economia periférica, onde a exposição é, em geral, muito maior19. Alguns autores apontam seus achados como algo preocupante, uma vez que o malathion tem apresentado elevados índices de atividade carcinogênica, além de propriedades químicas que o aproxima de outras substâncias reconhecidamente carcinogênicas como aflatoxina e benzopireno20.
Na década de 1980, o malathion foi avaliado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) como não classificável quanto à sua carcinogenicidade para seres humanos (Grupo 3)21,22, pela falta de evidências suficientes para a carcinogenicidade do malathion ou seu metabólito malaoxon em animais experimentais, e pela indisponibilidade de dados para seres humanos naquele período. Em 2015 a IARC publicou um novo documento, classificando o agrotóxico como provável agente carcinogênico para os seres humanos (Grupo 2A)19.
Tendo em vista a ampla utilização do malathion como agrotóxico em todo o mundo, tanto na agricultura como na saúde pública e diante dos riscos que ele pode trazer, este trabalho teve como objetivo a sistematização das evidências dos efeitos carcinogênicos e mutagênicos associados à exposição a este agrotóxico e seus análogos malaoxon e isomalathion.
Métodos
Dados da Busca
Foi realizada uma revisão sistemática da literatura, por meio da busca de artigos científicos publicados entre 1983 a 2015. Foi escolhido 1983 como ponto inicial da pesquisa, devido à monografia da IARC21, publicada naquele ano, considerar o malathion como “não classificável quanto à sua carcinogenicidade para seres humanos (Grupo 3)”, concluindo que não havia evidências suficientes para a carcinogenicidade do malathion ou do seu metabólito malaoxon em experimentos com animais, e pela ausência de dados relacionados a seres humanos.
A busca foi realizada nas bases de dados eletrônicas SCOPUS, PUBMED e TOXLINE (nesta última foram excluídos os resultados da PUBMED), sendo empregados dois grupos comando. O primeiro, composto por termos relativos à exposição de interesse (malathion, malaoxon e isomalathion), e o segundo contendo termos relativos ao desfecho de interesse (cancer, “carcinogenicity tests”, carcinogens, neoplasms, mutagenesis, “mutagenicity tests” e mutagens). Para a seleção dos descritores/termos utilizados, foi realizada consulta no Medical Subject Headings (MeSH). Para combinação dos termos em cada grupo, foi utilizado o operador booleano “OR” e para a combinação entre os grupos foi utilizado o operador “AND”.
Seleção dos artigos
Foram selecionados estudos originais que apresentassem resultados sobre o efeito carcinogênico e/ou mutagênico do malathion, malaoxon e isomalathion em seres vivos. Os artigos de revisão, dissertações e teses identificados nas buscas foram excluídos. Foram considerados manuscritos publicados na língua Inglesa, Portuguesa e Espanhola.
Os artigos foram selecionados pelas pesquisadoras (autoras deste artigo) em duas etapas. Na primeira, duas pesquisadoras realizaram, separadamente, a leitura do título e resumo dos artigos para seleção dos que deveriam compor a base da pesquisa. Aqueles que se apresentaram sem resumo ou sem informações suficientes para a tomada de decisão foram mantidos para a etapa seguinte. Os casos de discordância foram resolvidos por uma terceira pesquisadora.
Na segunda etapa, todos os artigos selecionados que atenderam aos critérios de inclusão/exclusão e aqueles com informações insuficientes para a tomada de decisão foram analisados na íntegra. Os dados de ambos os revisores foram novamente confrontados e as divergências foram solucionadas pelo terceiro revisor.
Os manuscritos selecionados foram analisados para a extração dos seguintes dados: autores, ano de publicação, periódico, delineamento do estudo, população alvo, país da população em estudo (nos estudos epidemiológicos), exposição (malathion, malaoxon, isomalathion, exposição mista) e principais resultados identificados quanto ao efeito carcinogênico e mutagênico do malathion, do malaoxon e do isomalathion.
As buscas foram realizadas entre 04 e 12 de julho de 2016. Foram utilizados filtros para seleção dos idiomas e período de publicação dos manuscritos nas três bases de dados.
Resultados e Discussão
Foram encontrados 178 resultados no Scopus, 147 no Pubmed e 92 no Toxline, totalizando 417 artigos (Figura 1). Foram identificadas 142 repetições, além de dois artigos publicados em outros idiomas (alemão e chinês), permanecendo 273 para avaliação da elegibilidade.

Fonte: Elaborada pelas autoras.
Figura 1 Fluxograma ilustrando os artigos que foram incluídos e excluídos na revisão sistemática, com razões para exclusão.
Após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, e da avaliação nas duas etapas, foram incluídos 73 artigos neste trabalho, todos na língua inglesa. Destes, 24 correspondem a estudos experimentais in vitro, incluindo testes de mutagenicidade e culturas celulares tanto de animais como de seres humanos; 24 estudos experimentais in vivo, incluindo camundongos, ratos, hamster, aves, sapos e moscas; 25 estudos epidemiológicos, incluindo coortes, caso-controles e estudos transversais (dois deles com experimentos in vitro associados). Os resultados encontrados quanto aos trabalhos experimentais in vitro que avaliaram o efeito carcinogênico e/ou mutagênico do malathion e seus análogos estão sintetizados no Quadro 1.
Quadro 1 Síntese de estudos in vitro que avaliaram a associação da exposição ao malathion, isomalathion e malaoxon e os efeitos carcinogênicos e/ou mutagênicos.
Autores, Ano | Periódico | População Alvo | Exposição | Principais Resultados Identificados |
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Ojha e Gupta, 201518 | Hum Exp Toxicol | Ratos albinos machos adultos da linhagem Wistar (Rattus norvegicus) | Malathion, Clorpirifós, Parationa-metílica (individualmente e em mistura) | A exposição de 8 e 12 h de linfócitos de ratos com 1/10 e 1/4 DL50 malathion (MLT) causou um nível significativamente (p<0,05) elevado de danos ao DNA (quebras de fita dupla do DNA, DSBs, e quebras de fita simples do DNA, SSBs). Verificou-se a formação de DNA-protein cross-links (DPC), em tempo e dose dependentes após a exposição ao MLT individualmente e em mistura, em condições in vitro, em comparação com o controle. |
Ojha e Srivastava, 20141 | Mutat Res Genet Toxicol Environ Mutagen | Ratos Wistar (linfócitos do sangue periférico) | Peróxido de Hidrogênio, Clorpirifós, Parationa-metílica e malathion individualmente e em mistura. | A exposição in vitro dos linfócitos de ratos malathion individualmente ou em mistura durante 2h e 4h causou um aumento significativo nos danos ao DNA, como evidenciado pelo ensaio cometa com aumento dose-dependente do % de DNA na cauda, do comprimento da cauda e do momento da cauda. Os OP induziram estresse oxidativo em linfócitos do sangue periféricos dos ratos, responsável pela oxidação do DNA. |
Josse et al., 201423 | Chem Biol Interact | Linhagem de células HepaRG de fígado humano | Malathion e isomalathion, individualmente e combinados | O malathion e o isomalathion isoladamente ou em combinação, induziram a formação de micronúcleos a baixas concentrações e tiveram efeitos genotóxicos aditivos quando combinados a 25 µM. O isomalathion individualmente ou combinado inibiu diretamente a atividade das carboxiesterases (envolvidas na desintoxicação do malathion). O isomalathion foi muito mais citotóxico do que o malathion. Ambos os compostos tiveram efeitos genotóxicos comparáveis em hepatócitos HepaRG em baixas concentrações. |
Anjum e Malik, 201324 | Environ Toxicol Pharmacol | S. typhimurium linhagens TA97a, TA98, TA100, TA102 e TA104 e mutantes de E. coli linhagem K-12. | Malathion lindane, alfa-endosulfan, Clorpirifós, monocrotophs e dimetoato (em mistura) | As amostras de teste atuam preferencialmente sobre os mutantes de pares de bases GC (desvio de trama) em comparação com aqueles com pares de bases AT no local de mutação e também iniciam a resposta induzível de SOS propensa a erros nos extratos de água mutantes de E. coli. O efeito mutagênico das amostras de teste iria evidentemente representar um risco de transformações neoplásicas em seres humanos. |
Galántai et al., 201125 | J Environ Sci Health B | Linhagem humana de células de coriocarcinoma (JAR) (modelo aceitável para as células da placenta humana) | Malathion e malaoxon | O malathion é responsável pelos efeitos cito e genotóxicos observados in vitro. Os resultados sugerem que o malathion pode exercer efeitos cito e genotóxicos em células da placenta, bem como em outros sistemas biológicos. |
Moore et al., 201126 | Mutat Res Genet Toxicol Environ Mutagen | Células de medula óssea e de sangue periférico de ratos machos da cepa Sprague-Dawley. | Malathion (98,2% de pureza) | As frequências de alterações cromossômicas nos ensaios de células de medula óssea aumentaram com o aumento da dose de malathion. Todas as doses de malathion induziram aumento significativo nos percentuais médios de danos ao DNA (de 42 ± 0,84 para 86,5 ± 0,57%) em linfócitos do sangue periférico tratados com malathion comparadas a apenas 13,5 ± 0,2% em células controle. |
Jose et al., 201027 | Mar Environ Res | Hemócitos de Penaeus monodon (camarão-tigre-gigante) | Malathion (50%w/w, preparação comercial) e monocrotofos (organofosforados), cloreto de cádmio e cloreto de mercúrio (metais pesados) | Todos os poluentes testados induziram quebras na cadeia de DNA e, assim, cometas nos hemócitos (Ensaio Cometa). Percentagem de células com caudas foi significativamente maior (P <0,05) do que o Controle para os quatro poluentes, incluindo o malathion (> 60%). No presente estudo, o malathion provou ser genotóxico para cultura hemócitos de P. monodon. |
Moore et al., 201028 | Environ Toxicol | Células humanas de carcinoma do fígado (HepG2) | Malathion (98,2% de pureza) | O malathion induziu um aumento gradual de danos ao DNA em células HepG2 com o aumento de sua concentração. Após a 48 horas de exposição, as percentagens médias de danos ao DNA sugerem que o malathion atua como um composto genotóxico especialmente no mais alto nível de exposição. |
Calaf et al., 200929 | Int J Oncol | Linhagens de células epiteliais de mama humanas imortalizadas MCF-10F. | Malathion e parationa etílica individualmente e combinados com o estrógeno. | Malathion e parationa etílica e induziram transformação maligna das células da mama através de instabilidade genômica no gene supressor p53 e do oncogene c-Ha-ras, considerados fundamentais no processo de câncer. |
Calaf e Roy, 200830 | Int J Mol Med | Células humanas epiteliais da mama | Malathion, parationa-etílica e 17ß estradiol (individualmente e combinados) | O estrógeno combinado tanto ao malathion quanto à parationa-etílica alterou a proliferação celular e induziu transformação celular, bem como exibiram capacidades invasivas significativas em comparação com a linha celular de controle MCF-10F. Vários genes foram supra-regulados pelos efeitos de todos os tratamentos, tais como as ciclinas, ciclina D1 e quinase dependente de clicina 4 IGFBP3 e IGFBP5, e queratina 18. O oncogene c-Ha-ras foi regulado pelo efeito do malathion sozinho e da combinação de estrógeno tanto com malathion como com a parationa-etílica. O gene DVL1 foi supra-regulado apenas com malathion sozinho e com a combinação de parationa-etílica e estrógeno. Expressão da HSP 27, MCM2 e TP53 induzíveis de genes proteína 3 foi suprarregulado com malathion sozinho e com a combinação de estrógeno e malathion ou parationa-etílica enquanto TP53 (síndrome de Li-Fraumeni) foi regulada pelo estrogênio sozinho e malathion sozinho. Houve indução de alterações moleculares indicativas de transformação. |
Błasiak e Kowalik, 199931 | Pestic Biochem Physiol | Linfócitos humanos de sangue periférico | Malaoxon e ascorbato de sódio | O malaoxon aumentou significativamente o momento da cauda (análise de Ensaio Cometa) dos linfócitos de uma forma dependente da dose. Na concentração mais alta do produto químico, 200µM, o aumento do momento da cauda foi sete vezes superior ao do valor inicial (19,49 ± 3,40µm versus 2,61 ± 0,22 µm, P <0,001). A concentração crescente de malaoxon causou um aumento na fração de linfócitos com maiores momentos de cauda do cometa em comparação com o do controle não exposto. Estes cometas contêm mais DNA em suas caudas, o que indica uma maior extensão de danos no DNA nessas células. |
Błasiak et al., 199932 | Mutat Res | Linfócitos de sangue periférico humano | Malathion, malaoxon e isomalathion (todos com purezas de no mínimo 99,8%) | O malathion não causou alterações significativas no comprimento do cometa dos linfócitos, nas concentrações testadas. O malaoxon, em sua maior concentração (200 mM), produziu células gravemente danificadas promovendo cometas com quase todo o DNA na cauda. Isto resultou em comprimentos de cometa excedendo mais de duas vezes o comprimento de cometa dos linfócitos de controle (p <0,001). O isomalathion promoveu um aumento no comprimento do cometa, mas as alterações não foram tão acentuadas como no caso do malaoxon - na concentração de 200 mM o aumento no comprimento do cometa foi de 72% em comparação com o controle. Malaoxon e isomalathion introduziram danos ao DNA de maneira dose-dependente. O efeito induzido pelo malaoxon foi mais pronunciado do que o causado pelo isomalathion. Os cometas resultantes de linfócitos expostos a malaoxon e isomalathion têm caudas mais compridas, portanto, eles contêm mais DNA em suas caudas do que cometas resultantes de linfócitos do controle e linfócitos expostos ao malathion. |
Błasiak e Trzeciak, 199833 | Pol J Environ Stud | Linfócitos de sangue periférico humano | Malathion e isomalathion (ambos com purezas de no mínimo 99,8%) | Os cometas resultantes da exposição ao malathion não diferiram daqueles dos controles. Com relação aos comprimentos médios de cometas para os linfócitos expostos durante 1 h ao malathion e ao isomalathion, em comparação com os controles, pode ser observado que o malathion nas concentrações aplicadas não provocou efeito significativo sobre a migração do DNA para a cauda do cometa. Já o isomalathion provocou um aumento no comprimento do cometa - na concentração de 200 µM o aumento foi de 72% em comparação com o controle. O aumento foi dose-dependente. Os cometas resultantes de linfócitos expostos ao isomalathion possuíram mais DNA na cauda do que aqueles resultantes dos linfócitos do controle e dos linfócitos expostos ao malathion. Os dados apresentados indicaram que o isomalathion, ao contrário do malathion, possui a capacidade de danificar o DNA dos linfócitos humanos isolados do sangue periférico. |
Pluth et al., 199834 | Mutat Res | Linfócitos de sangue periférico humano | Malathion | Mutações em vários sítios de pares de bases foram frequentes após a exposição ao malathion e foram isoladas a partir de células tratadas de pelo menos dois indivíduos diferentes. Utilizando uma base de dados de mutação de hprt humana para comparação, verificou-se que a frequência de mutações num dos referidos sítios de pares de bases 134 estava significativamente elevada nas células tratadas com malathion (p<0,0005). As mutações de Hprt em células tratadas com malathion surgiram preferencialmente em pares de bases G: C, o que é consistente com relatos anteriores de que o malathion é alquilante de nucleotideos de guanina. |
Hour et al., 199835 | Mutagenesis | Cepas de Salmonella typhimunum (JK3 e JK947) | 14 agrotóxicos, incluindo o malathion | Malathion, entre outros sete agrotóxicos, não foi mutagênico nas cepas JK947 e JK3 no teste lactam de Salmonella (método de detecção de genotoxinas). |
Gupta et al., 199636 | Asian-Australas J Anim Sci | Linfócitos de bode de sangue periférico | Malathion (MW 330) e parationa individualmente | Foi observado um aumento estatisticamente significativo (p≤0,05) na frequência de alterações cromossômicas dos linfócitos tratados com 100µg/ml de malathion (9,5%) comparadas ao controle (5,5%). Em altas doses (150 e 200 µg/ml) as frequências de alterações induzidas foram altamente significativas (p≤0,01). A incidência de quebras cromossômicas, cromossomos dicêntricos e translocações foram maiores que os outros tipos de alterações encontradas. |
Balaji e Sasikala, 199337 | Mutat Res | Linfócitos do sangue periférico humano | Malathion | Os resultados mostram que o malathion provoca um aumento dose-dependente de alterações cromossómicas, assim como - SCEs em culturas de leucócitos humanos. Foi observada uma diminuição dose-dependente no índice mitótico em todas as concentrações no presente estudo. Assim, os resultados sugerem que o malathion é um mutágeno leve e em concentrações mais elevadas pode causar genotoxicidade em humanos. |
Johnson, 199238 | Environ Toxicol Chem | Variantes, isolados mutantes escuros, da bactéria luminescente Photobacterium phosphoreum. | Progenotoxinas, genotoxinas, não-genotóxicos (grupo controle, malathion incluído) e solventes | O malathion e outras 4 substâncias consideradas não-genotóxicas (carbofunadas, ftalato de di-2-etilhexilo, simina e permetrina) não apresentaram respostas genotóxicas ou citotóxicas em doses teste de ≤ 10 µg por tubo (dados não mostrados). |
Garry et al., 199039 | Teratog Carcinog Mutagen | Linfócitos humanos de sangue periférico | Malathion, carbon tetrachloride, carbon disulfide, methyl bromide e chloropicrin | Foram observados aumentos dose-dependente estatisticamente significativos (P<0,05) das SCEs nos linfócitos humanos tratados com malathion a curto prazo (1/2 hora). Também foram observados aumentos dose-dependente das alterações cromossômicas demonstradas com ou sem ativação da fração S-9 microssomal (homogeneizado de fígado de rato). Em altas doses do organofosforado, foram encontrados dicêntricos e figuras tetrarradiais. |
Pednekaret al., 198740 | Environ Contam Toxicol | Cepas do testador Salmonella Typhimurium TA 97a, TA 98 e TA 100 | Malathion e fosalona (organofosforados), endosulfan (organoclorado) e permetrina (piretróide), | Não foram observadas atividades mutagênicas do malathion nas respectivas doses não tóxicas (33 mg/L) e 90% tóxicas (1650mg/L), antes ou depois da ativação com fração S9 (pós-mitocondrial) de fígado de rato com três cepas do testador Salmonella Typhimurium TA 97a, TA 98 e TA 100, no sistema de ensaio Ames Salmonella, nem após a sua ativação com extrato microbiano cecal de rato no mesmo sistema. |
Houk e DeMarini, 198741 | Mutat Res | Cepas de Escherichia coli B/r | malathion (73,5% de pureza), monuron, p,p'-DDT, mirex, lindane, nitrofen, chlordane, toxaphene, captana, e dichlorvós. | O malathion não foi detectado pelo ensaio de indução de fago-MicroScreen (sistema miniaturizado que utiliza indução de prófago em Escherichia coli X como um indicador do dano genético) |
Wiaderkiewicz et al., 198642 | ActaBiochim Pol | DNA de timo de bezerro | Malathion, DDVP, parationa-metílica e methylbromphenvinphos | Todos os inseticidas organofosforados estudados reagem com o DNA in vitro causando metilação de bases nitrogenadas. A cinética de metilação de bases purínicas no DNA pelo [14C]malathion mostrou que esse processo foi um pouco lento, atingindo seu máximo após 96 horas da reação. Incubação mais longa não resultou em aumento significativo no número de bases alquiladas (provavelmente devido a dois processos de competição: alquilação adicional do DNA e remoção hidrilítica de bases de purina alquiladas da cadeia polinucleotídica). Methylbromphenvinphos pareceu ser o inseticida organofosforado mais reativo, seguido pelo parationa-metílica e malathion. |
Ma et al.198343 | Environ Mutagen | Estacas de plantas do clone Tradescantia 03 e 4430 | Malathion (Malathion 5, emulsionante, 55 % de ingrediente ativo) | A genotoxicidade do malathion líquido (solução de malathion/água desionizada) absorvida através do caule foi muito baixa e muitas vezes mascarada pela alta toxicidade, causando mortes celulares no caule, folhas e meiócitos. O spray de malathion, na dosagem de 0,435% numa câmara fechada ou numa população aberta de plantas, obteve respostas negativas. Os vapores de malathion, em dosagens de 0,15-0,25%, induziram frequências significativamente superiores (0,05) de micronúcleos acima dos controles e alteraram a estrutura nuclear para formar núcleos de tamanho desigual e quebras múltiplas em cada uma das quatro células de uma tétrade. Também causou degeneração dos núcleos, "protrusões nos núcleos" e inibição do crescimento celular. Dosagens mais elevadas (acima de 0,25%) foram tóxicas. |
Gilot-Delhalle et al., 198344 | Mutat Res | Levedura Schtzosaccharomyces pombe (um mutante isogênico no locus ade6) e fígados de ratos machos da cepa Q | 12 inseticidas organofosforados, incluindo o malathion (em combinação com trichlorfon) | Foram investigados os efeitos de 3 combinações de trichlorfon com cada derivado de metil, malathion, parationa-metílica e methylazinphos. O aumento da frequência de mutação induzida por trichlorfon, por si só, corrobora os efeitos obtidos nas primeiras experiências (de mutagenicidade no sistema de teste de mutação para a frente ade6 da levedura Schtzosaccharomyces pombe) bem como a eficiência das frações do fígado microssomais S9. A mesma conclusão pode ser alcançada para o malathion e os outros dois compostos organofosforados que produziram efeitos positivos. Houve, nos 3 casos, um efeito sinérgico para a mutagenicidade entre trichlorfon e o segundo composto (P <0,001 em Xc2). Este efeito sinérgico foi maior para o parationa-metílica do que para o malathion e maior para este último composto do que para o methylazinphos. |
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Três estudos obtiveram aumentos significativos dos danos ao DNA de linfócitos do sangue periférico de ratos após exposição ao malathion1,18,26. Um aumento das frequências de alterações cromossômicas em células da medula óssea de ratos de maneira dose-dependente ao malathion também foi observado26. Ojha e Gupta18, além de observarem a redução significativa da viabilidade celular e o aumento significativo de quebras tanto em fita simples como em fita dupla do DNA, verificaram a formação de DPC, em tempo e dose dependentes após a exposição dos linfócitos de ratos ao malathion tanto individualmente como em mistura a outros dois organofosforados (clorpirifós e parationa-metílica), quando comparado ao controle. Uma vez que os DPC correspondem a lesões tóxicas associadas a mecanismos de toxicidade de compostos carcinogênicos45, o estudo evidencia o efeito carcinogênico do malathion. A pesquisa ainda conclui que o malathion, juntamente com os demais agrotóxicos do estudo, deve gerar lesões oxidativas dos pares de bases do DNA, possuindo potencial genotóxico para alterar a expressão enzimas.
Em culturas de linfócitos do sangue periférico humano expostas ao malathion, resultados mostraram aumento dose-dependente de alterações cromossômicas e trocas de cromátides-irmãs37,39, além do efeito alquilante de nucleotídeos específicos do DNA34. Ao comparar o malathion aos seus dois análogos, não foram observadas alterações significativas de danos ao DNA dessas mesmas células32, diferentemente do malaoxon e isomalathion, que promoveram lesões no DNA de maneira dose-dependente. O estudo de Blasiak et al.32 foi o único a avaliar os três agentes químicos na mesma pesquisa, e concluiu que os danos provocados ao DNA pelo malaoxon são mais acentuados que os provocados pelo isomalathion.
Josse et al.23 avaliaram os efeitos do malathion e do isomalathion individualmente e combinados sobre linhagem de células HepaRG de fígado humano e evidenciaram que, apesar do isomalathion ter sido muito mais citotóxico que o malathion, ambas as substâncias apresentaram efeitos mutagênicos semelhantes nesses hepatócitos. Já Błasiak e Trzeciak33 afirmam que os danos ao DNA de linfócitos humanos são causados pelo isomalathion e não pelo seu composto original.
Em relação à exposição do malaoxon, observou-se contradição entre os resultados encontrados. Blasiak e Kowalik31 constataram que o malaoxon promoveu um aumento significativo da extensão de danos ao DNA em linfócitos do sangue periférico humano no Ensaio Cometa, sendo maior com o aumento da dose. No ensaio de células de cariocarcinoma de linhagem humana (JAR) (modelo aceitável para células placentárias humanas), o mesmo agente não foi apontado como responsável pelos efeitos cito e genotóxicos nestas células in vitro, mas sim o malathion. Autores defendem que metabólitos de agrotóxicos com resultados contraditórios quanto ao seu potencial carcinogênico devem ser estudados, uma vez que os mesmos podem representar os verdadeiros carcinógenos46.
O malathion também foi avaliado em testes de mutação gênica que empregam bactérias, como o teste de lactam de Salmonella (método de detecção de genotoxinas)35, fago-MicroScreen (sistema miniaturizado que utiliza a indução de prófago em Escherichia coli X como um indicador de dano genético)41 e teste de Ames Salmonella40. Nos três estudos encontrados, os resultados foram negativos quanto à atividade mutagênica do malathion, não sendo observadas no último teste atividades com ou sem ativação com fração S9 de fígado de rato nas respectivas doses não tóxicas (33 mg/L) e 90% tóxicas (1650mg/L). Flessel et al.47, em revisão de literatura, também observaram os mesmos resultados e concluíram que o malathion não parece induzir mutações pontuais no DNA em sistemas bacterianos.
Dos 24 estudos experimentais in vivo encontrados nesta revisão sistemática, vinte realizaram os experimentos em ratos, camundongos ou hamsters, os demais avaliaram os efeitos do agrotóxico em aves, sapo e moscas. No Quadro 2 estão os principais resultados desses trabalhos.
Quadro 2 Síntese de estudos experimentais in vivo que avaliaram a associação da exposição ao malathion e/ou seus análogos aos efeitos carcinogênicos e/ou mutagênicos.
Autores, Ano | Periódico | População Alvo | Exposição | Principais Resultados Identificados |
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Hussain et al. 201548 | Pak J Agri Sci | Codorniz japonês macho (ave) (Coturnix japonica) | Malathion (95% grau técnico) | A frequência de eritrócitos micronucleados e binucleados aumentou significativamente em aves dos grupos D (60 dias) ao F(100 dias) em todos os dias experimentais. A frequência de eritrócitos nucleados em "blebbed" nos dias 34 e 51 nos grupos E (80 dias) ao G (120 dias) aumentou significativamente. |
Omran e Omer, 201549 | Pathol Res Pract | Ratos fêmeas Wistar | Malathion (≥ 95%) e ácido alfa-lipóico | Alterações histológicas na mama marcada por alterações fibrocísticas, hiperplasia atípica e alterações malignas, sugerindo que a exposição crônica ao malathion pode produzir consequências para a saúde humana a longo prazo. |
Selmi et al. 201550 | Toxicol Ind Health | Ratos machos Wistar | Malathion (fyfanon 50 EC 500 g/L) | Induziu estresse oxidativo avaliado pelo aumento do teor de malondialdeído (MDA), refletindo uma lipoperoxidação, diminuição do conteúdo dos grupos tiol e esgotamento de atividades enzimáticas como superóxido dismutase (SOD) e catalase (CAT), enzimas antioxidantes hepáticas e renais, e diminuiu significativamente (p < 0,01) as atividades dessas enzimas. |
Calaf e Echiburú-Chau, 201251 | Oncol Rep | Ratos fêmeas virgens da cepa Sprague-Dawley | Estrógeno e malathion (individualmente e em mistura) | Aumento significativo (p <0,05) no tamanho dos ductos na fase de proliferação (dsp / mm2) da glândula mamária, e no número de camadas epiteliais em comparação com os controles. O aumento dos ductos proliferativos induzidos pelo efeito do malathion após 10 e 20 dias, coincidiu com o aumento da expressão da proteína p53 mutante. A combinação de malathion e estrógeno induziu uma maior alteração celular nas glândulas mamárias do rato do que o estrógeno ou malathion isoladamente. |
Alfaro-Lira et al., 201252 | Int J Environ Res Public Health | Ratos fêmeas virgens da cepa Sprague-Dawley | Malathion e 17β-estradiol (estrógeno), individualmente e em mistura | A combinação de malathion e estrogênio induziu maiores alterações na seção tubular dos rins em comparação com qualquer substância isolada. O malathion causou vários tipos de danos em relação ao controle, como um aumento significativo (p <0,05) no grau de hipertrofia glomerular, sinais de danos tubulares e proliferação na zona hilium e proliferação atípica nas zonas cortical e hiliar em comparação com o grupo controle. Estas anormalidades podem ser sugeridas como um sinal de progressão de malignidade. |
Giri et al., 201253 | Aquat Toxicol | Sapo indiano skittering (Euflictis cyanophlyctis) | Malathion (50% EC formulação comercial) | Induziu a formação de micronúcleos (MN) nos eritrócitos dos girinos de forma concentração-dependente. A concentração-dependente aumentada na frequência de MN nos eritrócitos durante o período de estudo de 96h após diferentes concentrações de malathion indicam, claramente, o potencial clastogénico do agrotóxico em E. cianophlyctts. |
Giri et al., 201154 | Environ Mol Mutagen | Camundon-gos albinos Swiss | Malathion (95% de pureza) e Fenvalerato | O malathion induz um aumento dose-dependente na frequência de eritrócitos policromáticos (PCEs) micronucleados em células da medula óssea de camudongos, o que reforça o potencial clastogênico e/ou aneugênico do malathion. |
Calaf e Garrido, 201155 | Int J Oncol | Ratos fêmeas virgens da cepa Sprague-Dawley | Malathion e 17β-estradiol (estrógeno), ambos individualmente e em mistura | Alterações progressivas nos ductos das células mamárias foram observadas pelo efeito do malathion. Foram originados ductos significativamente aumentados em tamanho e número de células por milímetro quadrado e tumores como carcinoma ductal. O tratamento em combinação de estrógeno e malathion deu origem a tumores constituídos tanto de ductos proliferativos como de lóbulos secretores. |
Bernhardt et al., 201156 | Int J Integr Biol | Camundon-gos albinos Swiss | Classe comercial de Malathion (50%) e Withania somnifera L (como agente antigenotóxico). | Aumento na formação de cometas (Ensaio Cometa) em comparação com o controle de óleo de amendoim (valor de p <0,001). O dano ao DNA foi causado pelo malathion de maneira dose-dependente. |
Echiburú-Chau e Calaf, 200857 | Int J Oncol | Ratos fêmeas virgens da cepa Sprague-Dawley | Malathion e 17ß-estradiol (individualmente e combinados). | Numerosos tipos de lesões pré-neoplasicas e neoplásicas foram encontradas no epitélio bronquiolar de ratos como hiperplasia, metaplasia escamosa, carcinoma in situ e carcinoma invasivo, o que sugere um sinal de progressão da malignidade com maior possibilidade do desenvolvimento de câncer de pulmão. |
R´eus et al., 200858 | J Agric Food Chem | Ratos adultos machos Wistar | Malathion | Aumento de danos ao DNA no sangue total de ratos Wistar notadamente nas doses mais elevadas. No hipocampo, houve aumento dos danos ao DNA. |
Giria et al.,200259 | Mutat Res | Camundongos albinos Swiss | Malathion | Vários tipos de alterações cromossômicas, que consistiram em tipos cromatídicos e isocromáticos de gaps e quebras, double minutes (incluídos entre quebras isocromáticas), permutas, e uniões de cromátides irmãs (SCU). Verificou-se que as quebras do tipo de cromatídicas eram mais frequentes do que outras. O malathion induziu uma freqüência significativamente maior de alterações (p <0,001) para todas as três doses testadas. A curva dose-resposta mostra um aumento linear na freqüência de alterações com doses crescentes (r = 0,9734, p <0,05). Todas as três doses agudas de malathion, induziram uma frequência significativamente mais alta (p <0,001) de troca de cromátides irmãs (SCEs) em comparação com o valor do controle. Além disso, para as mesmas doses, observaram-se aumentos significativos (p <0,02, 0,001 e 0,001, respectivamente) na frequência de anomalias da cabeça de espermatozóides em comparação com o controle não tratado. |
Cabello et al., 200160 | Environ Health Perspect |
Ratos fêmeas Sprague-Dawley | Eserina, parationa e malathion (inibidores de colinesterase) | Aumento significativo (p <0,05) no tamanho dos "terminal end buds" (TEBs) da glândula mamária, assim como no número de camadas epiteliais. Estas estruturas aumentaram de tamanho e houve desenvolvimento de carcinomas mamários. |
Amer et al., 199661 | J Appl Toxicol | Ratos | Malathion (100% puro), Dursban, Sevin, Lannate, DMSO e DDT (inseticidas) | Indução de alterações cromossômicas em células de baço de rato, cuja percentagem foi altamente significativa estatisticamente. Foram observadas alterações estruturais como gaps cromatídicos e cromossômicos, mas os primeiros foram as formas dominantes. |
Fourernan et al., 199462 | Environ Mol Mutagen | Adultos machos de Drosophila melanogaster | 70 produtos químicos, incluindo o malaoxon | O malaoxon foi considerado como mutagênico, juntamente com outros 15 produtos químicos, no teste de letalidade recessiva ligada ao sexo (sex-linked recessive lethal, SLRL), ensaio SLRL. |
Hoshiya et al., 199363 | Cancer Lett | Ratos F344 machos | Dietilnitrosamina (DEN), malathion, vinclozolin, S,S,S-tributilfosforotritioato (DEF), tecnazene, isoproturon e diclorana (individualmen-te e em combinação com DEN) | Malathion foi positivo na análise de glutationa S-transferase forma placentária (glutathione S-transferase placental, GST-P) foco positivo, juntamente com outros 4 agrotóxicos. Os resultados sugerem que o malathion possui atividade promotora de tumores no fígado. |
Hasegawa e Ito, 199264 | Fd Chem Toxic | Ratos F344 | 94 compostos químicos, incluindo o malathion | Aumento significativo (p<0,05) na indução do GST-P (glutationa S-transferase forma placentária) foco positivo em comparação aos níveis do controle hepatócitos dos ratos. |
Hoda e Sinha, 199065 | Internat J Vit Nutr Res. | Ratos Mus musculus | Malathion e Rogor (agrotóxicos) e Vitaminas B e C (efeito protetor) | Ambos os agrotóxicos aumentaram significativamente as anormalidades cromatídicas e cromossômicas em células da medula óssea dos ratos. |
Velázquez et al., 198766 | Environ Mutagen | Cepas de Drosophila melanogaster | Malathion, 50% de concentrado emulsionável (50% de ingrediente ativo, 50% de xilol e agentes dispersantes e emulsionantes) | Os resultados da indução de perda de cromossomo sexual (sex-chromosome loss, SCL), teste SCL, após alimentação e injeção de adultos, os resultados de SCL e não-disjunção após o tratamento de larvas de terceiro estágio foram negativos, indicando que o malathion também é ineficaz na produção de perdas totais ou parciais de cromossomos sexuais e não-disjunção. |
Alina Dzwonkowska e Henryk Hiibner, 198667 | Arch Toxicol | Hamster sírio (Mesocricetus auratus) | Malathion, demeton, dimetoato, dichlorvós, endosulfan, trichlorofon, carbaril, lindane, methoxychlor e propoxur | Aumentos estatisticamente significativos (p < 0,05) no número de células com alterações cromossômicas na medula óssea dos hamsters sírios tratados com malathion. |
Degraeve et al., 198568 | Environ Health Perspect |
Ratos machos (cepa Q) | Trichlorfon individualmen-te e combinado com malathion ou parationa-metílica ou methylazinphos (todos com 99% de pureza) | A frequência de alterações cromossômicas nas metáfases da medula óssea não foi maior nos ratos machos tratados. |
Degraeve et al., 198469 | Arch Toxicol | Ratos machos (cepa Q) | Malathion, dichlorvós, dimetoato, parationa-metílica e trichlorfon (todos com 99% de pureza) | A porcentagem de quebras cromossômicas nas células da medula óssea, não atingiu 0,5%. Foi observada uma troca cromossômica simples no grupo tratado com malathion e a frequência de gaps foi inferior ao nível do controle. Em espermatogônias, a frequência dos diferentes tipos de lesões cromossômicas foi muito baixa. O número de quebras cromossômicas observadas nos espermatócitos primários não foi significativamente aumentado. Alguns gaps (menos de 0,1%) foram detectados, mas translocações não foram observadas. No ensaio de mutação letal dominante, para cada grupo tratado, o número de embriões vivos por ninhada foi normal. A percentagem de perdas pré-implantação não foi significativamente aumentada e a frequência de mortalidade fetal pós-implantação foi inferior ao nível de controle. |
Degraeve et al., 198470 | Fd Che Toxic | Ratos (cepa Q) | Luxan Tue-Taons, Metadipterex, Dynafos (155g de malathion, 60g de dichlorvós e 75g de carbaril/litro) e Phosan Plus (95g de dimetoato, 100g de malathion e 100g de methoxychlor/litro) (misturas comerciais de inseticidas) | Não houve indução de alterações cromossômicas nas células da medula óssea, espermatogonias ou espermatócitos primários dos ratos injetados intraperitonealmente com as substâncias. Nenhuma evidência de potenciais efeitos genéticos foi obtida no ensaio de mutação letal dominante. |
Dulout et al., 198371 | Mutat Res | Ratos da cepa BALB/c | Malathion (95,5%) | O efeito clastogênico do malathion foi evidenciado pela indução de alterações do tipo subcromatídicas e cromatídicas em relação à dose utilizada, em células da medula óssea dos ratos. Os animais apresentaram aumento na frequência de metáfases anormais, gaps, quebras e permutas cromatídicas em relação aos controles durante os vários intervalos de tempo, numa relação direta dose-resposta, sendo o dano cromossômico induzido foi proporcional à dose de malathion. |
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Degraeve et al.70, em 1984, relataram que o Dynafos e o Phosan Plus, inseticidas que possuem o malathion em sua composição, não induziram alterações cromossômicas em células da medula óssea, espermatogônias ou espermatócitos primários, nem alterações no ensaio de mutação letal dominante, após injeção intraperitoneal de ratos da cepa Q. O estudo não possui qualquer dado com relação a impurezas, solventes, emulsionates etc. nesses compostos, limitando seus resultados.
No mesmo ano, esses autores expuseram ratos da mesma cepa ao malathion com 99% de pureza, mediante a ingestão de água contendo pequenas quantidades do organofosforado (8 ppm, correspondendo ao maior valor permitido na Bélgica para resíduos do agrotóxico em frutas e vegetais) em 5 dias por semana durante 7 semanas consecutivas69. Mais uma vez, não se observou aumento significativo de quebras ou gaps cromossômicas nos mesmos tipos celulares do trabalho anterior, nem no ensaio de mutação letal dominante, porém há poucas informações acerca da técnica de análise utilizada para pesquisa dessas alterações. Em 1985, o grupo avaliou os efeitos sobre ratos injetados com o malathion (com doses de 150 mg/kg) combinado ao trichlorfon (50 mg/kg) e, também, não evidenciou efeitos citogenéticos (quebras, gaps e trocas cromatídicas) da combinação68.
Do total de estudos experimentais in vivo encontrados neste trabalho, apenas quatro não evidenciaram associação positiva entre os efeitos mutagênicos e o malathion, todos da década de 1980. Os três primeiros foram os citados acima, o quarto e último deles data de 1987, que obteve resultados negativos em relação à produção de perdas de cromossomos sexuais e não-disjunção em cepas de Drosophila melanogaster expostas a malthion com 50% do ingrediente ativo, percentual este que pode ter influenciado de maneira importante os resultados encontrados66. Desde então, houve mais 17 estudos com resultados positivos para carcinogenicidade e genotoxicidade do malathion, e um para genotoxicidade do malaoxon.
Honda e Sinha65, evidenciaram um aumento significativo (a um nível de 0,1%) das alterações cromatídicas das células da medula óssea, após a exposição de ratos Mus musculus. Camudongos albinos Swiss expostos ao malathion apresentaram metáfases de células da medula óssea com vários tipos de alterações cromossômicas, tendo o agrotóxico induzido frequência significativamente maior (p<0,001) de alterações nas três doses agudas testadas (2,5, 5 e 10mg/kg) que no controle, além de frequências aumentadas de trocas de cromátides-irmãs e anomalias da cabeça de espermatozoides59. Giri et al.54 relataram o aumento dose-dependente na frequência de eritrócitos policromáticos micronucleados em células da medula óssea de camundongos da mesma espécie, após exposição in vivo a malathion com 95% de pureza.
Em relação à carcinogenicidade do malathion em experimentos in vivo, o primeiro manuscrito encontrado é de 1992, no qual o agrotóxico promoveu um aumento significativo (p<0,05) na indução de foco GST-P positivo em hepatócitos de ratos F344 em comparação com o controle64. A expressão da enzima GST-P é normalmente baixa nos hepatócitos fetais, adultos quiescentes ou em regeneração, placenta, coração e em outros órgãos de ratos machos, contudo nódulos hiperplásicos e tumores hepáticos induzidos quimicamente apresentam valores de GST-P cerca de 20 a 50 vezes e de 10 a 30 vezes, respectivamente, quando comparados aos valores do fígado normal de rato72. Assim, o estudo sugere a possibilidade do malathion ser um hepatocarcinógeno ou hepatopromotor fraco. Já o estudo de Hoshiya et al.63, também com ratos F344, conclui que o malathion possui atividade promotora de tumores no fígado.
Em ratos fêmeas virgens da cepa Sprague-Dawley, estudos têm investigado os efeitos carcinogênicos do malathion e do estrógeno, individualmente e combinados. Calaf e Garrido55 observaram alterações progressivas nos ductos das células mamárias dos ratos tratados com malathion isolado em comparação com o controle após 240 dias do tratamento. Calaf e Chau51, além do aumento significativo (p < 0,05) no tamanho dos ductos na fase de proliferação da glândula mamária de ratos tratados com o agrotóxico, encontraram um aumento da expressão da proteína p53 mutante, marcadora de detecção tumoral. Numerosos tipos de alterações pré-neoplásicas no epitélio bronquiolar de ratos injetados com malathion também foram encontradas, além de carcinomas in situ57. Em tecido renal de ratos expostos ao malathion, resultados sugerem anormalidades com sinais de malignidade52.
Na maioria dos estudos anteriormente citados51,52,57, o tratamento com a combinação de malathion e estrógeno induziu mais alterações celulares do que os tratamentos com as substâncias isoladamente. Dessa forma, a combinação do agrotóxico, encontrado no ambiente, amplamente utilizado na América Latina e em muitos outros países, e uma substância endógena, como estrogênio, tem capacidade de induzir efeitos deletérios nos seres humanos, como o câncer de mama, por exemplo51. O estrogênio também pode ser encontrado como poluente em águas superficiais e subterrâneas, e sua presença no ambiente pode ter repercussões toxicológicas e ecotoxicológicas severas, dado que esta substância é reconhecidamente um desregulador endócrino, associado à puberdade precoce, infertilidade e malformação congênita73-75.
Os resultados dos estudos epidemiológicos encontrados nesta revisão sistemática estão sintetizados no Quadro 3. Quanto ao delineamento, foram encontrados onze estudos de caso controle, oito coortes e seis estudos transversais, onde dois destes realizaram, também, experimentos in vitro com linfócitos do sangue periférico humano.
Quadro 3 Síntese de estudos epidemiológicos que avaliaram a associação da exposição ao malathion e/ou seus análogos aos efeitos carcinogênicos e/ou mutagênicos.
Autores, Ano | Periódico | Delineamento do estudo | População alvo | País | Exposição | Principais Resultados Identificados |
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Andreotti et. al., 201576 | PLoS ONE | Transversal | Trabalhadores aplicadores de agrotóxicos do sexo masculino | EUA | Malathion | Foram encontradas associações significativas entre o uso recente de malathion e o RTL (comprimento relativo do telômero) mais curto (p = 0,03), sugerindo que que o comprimento dos telômeros de leucócitos pode ser afetado pelo uso recente (e cumulativo) de certos agrotóxicos. |
Arshad et al., 201577 | Saf Health Work | Transversal | Trabalhadores de uma indústria de agrotóxicos | Paquistão | Mistura complexa de agrotóxicos, incluindo o malathion | A contagem de leucocitos aumentou significativamente com o aumento do periodo de exposicao entre os trabalhadores expostos. No Ensaio Cometa, o comprimento medio da cauda do DNA estimado nas celulas sanguíneas de trabalhadores expostos foi significativamente maior do que nos individuos no grupo controle. Malathion foi detectado em 72% das amostras de sangue. A curva de ajuste linear mostrou uma correlação significativa (R2 = 0,91) da concentracao de malathion com o comprimento da cauda do cometa. A correlacao linear entre os residuos de malathion no sangue e os danos ao DNA e muito alarmante e destaca os riscos envolvidos na exposicao direta durante a atividade de producao. |
Lerro et al., 201578 | Occup Environ Med | Coorte prospectiva | Mulheres cônjuges de aplicadores de agrotóxicos | EUA | 10 organofosfora-dos, incluindo o malathion | O uso de malathion foi associado a um risco significativamente aumentado de cancer de tireoide (RR = 2,04; IC 95%: 1,14 a 3,63). Foram observadas, tambem, interacoes significativas com o estado menopausal das mulheres e o malathion para o risco de cancer ovariano (Pinteraction = 0,04). |
Alavanja et al., 201479 | PLoS ONE | Coorte prospectiva | Agricultores e aplicadores comerciais de agrotóxicos | EUA | Malathion (entre 50 agrotóxicos específicos) | Mostrou riscos elevados, porem nao significativos, com relacao aos casos de Linfoma Nao-Hodgkin (LNH) subtipo celulas B folicular. |
Koutros et al., 201380 | PLoS ONE | Caso controle | Aplicadores de agrotóxicos licenciados em Iowa e Carolina do Norte | EUA | Malathion (entre 50 agrotóxicos) | Entre os homens portadores de dois alelos T à rs2710647 na proteína 1 de ligação ao domínio EH (EHBP1), o risco de câncer de próstata em pacientes com baixa utilização de malation foi de 2,17 vezes aqueles sem uso (95% IC: 0,91, 5,14) e naqueles com uso de malathion alto foi 3,43 vezes aqueles sem uso (IC 95%: 1,44-8,15) (P-interação = 0,003). |
Cabello et al., 201381 | Int J Morphol | Caso controle | Mulheres residentes de Arica e de Iquique | Chile | Malathion | As mulheres com mais tempo de exposição ao malathion foram 5.7 vezes mais propensas a serem diagnosticados com câncer de mama (OR = 5,7; p <0,02). As metástases foram encontradas em 30,5% do grupo exposto ao malathion e apenas em 16% no grupo nunca exposto (p <0,05) sugerindo que o aumento da taxa de mortalidade por câncer de mama ocorrendo em Arica tem uma correlação significativa com a exposição ao malathion pulverizado sobre a cidade há mais de 30 anos. |
Kachuri et al., 201382 | Int J Cancer | Caso controle | Homens residentes de seis províncias canadenses | Canadá | Herbicidas (2,4-D; Glifosato e Mecoprop), inseticidas (Methoxychlor; Malathion; Chlordane; DDT; Carbaril e Lindane) e fungicidas (Mercury dust; Captana e Formaldehyde) | A relação de Odds Ratio ajustada para o mieloma múltiplo em relação à exposição ao malathion: OR (95% IC) = 1,12 (0,71, 1,74). Excluindo-se os respondentes por procuração: OR= 1,28 (0,79, 2,07) |
Koutros et al., 201283 | Am J Epidemiol | Coorte prospectiva | Agricultores e aplicadores comerciais de agrotóxicos | EUA | Malathion (entre 48 agrotóxicos) | Quatro inseticidas foram associados ao câncer de próstata agressivo, entre eles o malathion com RR para Q4 vs. não exposto = 1,43, IC 95%: 1,08; 1,88; Ptrend = 0,04). |
Pahwa et al., 201284 | Int J Cancer | Caso controle | Homens com ≥ 19 anos | Canadá | [1,1'-(2,2,2-trichloroethylidene)bis[4-chlorobenzene]; 1,1,1-trichloro-2,2bis(4-chlorophenyl) ethane (DDT), malathion, (4-chloro-2-methylphenoxy)ácido acético (MCPA), mecoprop e (2,4dichlorophenoxy)acetic acid (2,4-D) | Os indivíduos com asma, alergias ou febre do feno (hay fever) que relataram uso de malathion, controversamente, apresentaram menor risco de LNH (OR = 1,25; IC95%: 0,69-2,26) em relação a indivíduos sem nenhuma dessas condições (OR = 2,44, IC 95%: 1,65-3,61). Foram observados efeitos semelhantes para asma e alergias avaliadas individualmente. |
Barry et al., 201185 | Environ Health Perspect | Caso controle | Aplicadores brancos de agrotóxicos do Estudo de Saúde Agrícola (AHS) | EUA | Malathion (entre 39 agrotóxicos) | Não foi encontrada associação positiva entre a exposição malathion e o câncer de próstata (exposição baixa: OR (95% IC) = 0,88 (0,69, 1,13). Exposição alta: OR (95% IC) = 0,80 (0,62, 1,04). |
Pahwa et al., 201186 | J Occup Environ Med | Caso controle | Homens residentes de seis províncias canadenses | Canadá | Malathion entre outros agrotóxicos (herbicidas, inseticidas, fungicidas) | Não foram encontradas associações significativas entre a incidência de Sarcoma de tecido mole (STS) e a frequência da exposição ao malathion. |
Hohenadel et al., 201187 | Int J Environ Res Public Health | Caso controle | Homens de seis províncias canadenses | Canadá | Malathion entre outros agrotóxicos (herbicidas, inseticidas, fungicidas) - 36 combinações de agrotóxicos | Aumento no risco associado de Linfoma Nao-Hodgkin a utilizacao do malathion em combinacao com 2,4-D, mecoprope, carbaril, glifosato, e DDT, onde odds ratio foi maior que o uso de cada agrotóxico individualmente. |
Band et al., 201188 | Prostate | Caso controle | Pacientes do sexo masculino com câncer de próstata do Registro de Câncer da British Columbia (BCCR) de base populacional e agricultores de BC da matriz de exposição ocupacional (JEM) | Canadá | 290 diferentes agentes químicos (destes, 180 agrotóxicos, incluindo o malathion) | A exposição ao malathion apresentou um excesso de risco ao câncer de próstata significante (OR = 1,34; IC 95%: 1,01-1,78), além de uma relação dose-resposta. |
Andreotti et al., 201089 | Cancer Causes Control | Coorte | Aplicadores de agrotóxicos privados licenciados e seus cônjuges residentes em Iowa e Carolina do Norte, e aplicadores comerciais residentes em Iowa, todos do Estudo de Saúde Agrícola (AHS) | EUA | 50 agrotóxicos (incluindo o Malathion) | Associações positivas significativas entre o índice de massa corporal (IMC) e câncer de cólon entre os homens que utilizaram malathion. |
Andreotti et al., 200890 | Int J Cancer | Caso controle | Aplicadores de agrotóxicos e cônjuges com cancer pancreático, residentes em Iowa e Carolina do Norte do Estudo de Saúde Agrícola (AHS) | EUA | 50 agrotóxicos (incluindo o Malathion), dos quais totalizaram 24 agrotóxicos examinados quanto às exposições sempre/nunca, e 13 agrotóxicos para dias de exposição em tempo da vida com intensidade ponderada. | A utilização (sempre) do malathion foi significativamente inversamente associada ao risco de câncer pancreático (OR = 0,4, IC 95% 0,2-0,9). |
Bonner et al., 200791 | Am J Epidemiol | Coorte prospectiva | Aplicadores de agrotóxicos e seus cônjuges residentes em Iowa e Carolina do Norte do Estudo de Saúde Agrícola (AHS) | EUA | Malathion entre 50 agrotóxicos | Não foram encontradas evidências conclusivas de que a exposição ocupacional ao malathion está associada ao aumento do risco dos cânceres: canceres linfático-hematopoiéticos combinados (mieloma múltiplo, leucemia, linfoma de Hodgkin e NHL); leucemia; NHL; Cânceres de pulmão, próstata, colon e reto, rim e bexiga; e melanoma. |
Zeljezic e Garaj-Vrhovac, 200292 | Chemosphere | Coorte | Os trabalhadores empregados em três diferentes unidades de produção de agrotóxicos (a unidade de síntese de agrotóxicos, a unidade de produção concentrada em emulsão e a unidade de produção de agrotóxicos em pó e líquidos) | Croácia | Mistura complexa de agrotóxicos (atrazine, alacloro, cianazina, 2,4-dichlorophenoxyacetic acid e malathion) | O valor médio de trocas de cromátides-irmãs (SCE) no grupo exposto foi significativamente maior em comparação com o grupo controle. O numero de trocas de cromátides-irmãs (HFC) no grupo exposto em todos os períodos de amostragem foi significativamente maior em comparação com o grupo controle. Os resultados sugerem que o aumento no numero de SCE encontradas nos indivíduos expostos não e o resultado da ação citotóxica ou ação epigenética da mistura de agrotóxico, e sim, da exposição ocupacional crônica a mistura de agrotóxicos. |
Garaj-Vrhovac e Zeljezic, 200193 | Toxicology | Coorte | Os trabalhadores empregados em três diferentes unidades de produção de agrotóxicos (a unidade de síntese de agrotóxicos, a unidade de produção concentrada em emulsão e a unidade de produção de agrotóxicos em pó e líquidos) | Croácia | Mistura complexa de agrotóxicos (atrazine, alacloro, cianazina, 2,4-dichlorophenoxyacetic acid e malathion) | O grupo exposto mostrou um aumento no número de alterações cromossômicas e cromatídicas, independente do tempo de amostragem. Os resultados da primeira série de amostragem revelaram cromossomos dicêntricos (n = 17) e trocas cromatídicas (n = 4) no grupo exposto, porém nenhum deles no grupo controle. Na segunda série de amostragem foram observados apenas dicêntricos (n = 4) no grupo exposto, ou seja, o número reduziu significativamente após 8 meses da não-exposição. Foi observada uma frequência de micronúcleos (MN) maior no grupo exposto que nos controles, independentemente do tempo de amostragem. No ensaio cometa, os linfócitos dos trabalhadores expostos expressaram uma migração de DNA maior que o controle. |
McDuffie et al., 200194 | Cancer Epide-miol Bio-markers Prev | Caso controle | Homens residentes em seis províncias canadenses | Canadá | Herbicidas, fungicidas, fumigantes e inseticidas, incluindo o malathion | O Malathion foi o único organofosforado de exposição individual associado de maneira estatisticamente significante ao Linfoma Não-Hodgkin: ORa (95% CI) = 1,77 (1,28-2,46). |
Titenko-Holland et al., 199795 | Mutat Res | Tranversal/Estudo Experimental in vitro | Linfócitos de sangue periférico humano/ Trabalhadores que estiveram envolvidos no programa de erradicação de mosquito conduzido pelo Departamento de Alimentação e Agricultura da Califórnia - EUA | EUA | Malathion (95% de pureza e 5% de impurezas, incluindo o malaoxon) | Um aumento significativo das células micronucleadas (47,5/1000 linfócitos binucleados versus 16,0/1000 em controle de Dimetilsulfóxido, p <0,001) foi encontrado em linfócitos isolados em níveis de dose elevadas (75-100 µg / ml), concomitantemente com citotoxicidade e uma forte inibição de proliferação (p <0,001). Muitas das células tratadas possuíam também micronúcleos múltiplos. |
Pluth et al., 199696 | Cancer Res | Tranversal/ Estudo Experi-mental in vitro | Trabalhador exposto ocupacionalm. (> 5 anos)/Linfócitos de sangue periférico humano | EUA | Malathion (lotes com 1 a 3% contaminação por isomalathion e malaoxon) e fosfina/ Malathion | As frequências mutantes das amostras tratadas mostraram variabilidade intra e interindividual e, em alguns casos, discretos aumentos significativos sobre os controles. Este estudo forneceu a primeira evidência de uma associação entre a exposição ao malathion e mutações específicas em linfócitos T humanos. |
Czeizel, 199497 | Mutat Res | Coorte prospectiva | Indivíduos que se auto envenenaram (tentativa de suicídio) | Hungria | Drogas e inseticidas, incluindo o malathion | Um temporário, mas significativo, aumento da aneuploidia nos leucócitos de sangue periférico das primeiras amostras coletadas entre 3 a 6 dias após a intoxicação com malathion (6,3%, p < 0,01). Aumento temporário na taxa de alterações cromatídicas e cromossômicas após a intoxicação de malathion. |
Cantor et al., 199298 | Cancer Res | Caso controle | Homens recém-diagnosticados com linfoma não-Hodgkin e leucemia nos estados de Minnesota e Iowa. | EUA | 23 inseticidas específicos utilizados em animais (incluindo o malathion), 34 inseticidas aplicados em culturas (incluindo o malathion), 38 herbicidas e 16 fungicidas. | O primeiro uso antes de 1965 foi associado com maior risco (OR = 1,8/ IC = 1,0, 3,3) do que aqueles sempre manipularam (OR = 1,3/ IC = 0,9, 2,1), e foi significativo para o uso relatado precocemente de malathion, como inseticida animal. O OR para o manuseio, mistura ou aplicação pessoal de inseticidas específicos que poderiam ter sido usados tanto em animais como em colheitas antes de 1965, evidencia um risco significativamente elevado para malathion (OR = 1,8, IC = 1,1-3,1, 31 casos). |
Rupa et al., 199199 | Environ Mol Mutagen | Transversal | Homens aplicadores de agrotóxicos | Índia | Mistura de DDT, BHC, endosulfan (35%), malathion, Parationa-metílica, phosphamidon, monocrotophos, quinalphos, dimetoato, fenvelrate ou cipermetrina | Foi observada uma diferença estatisticamente significativa (p < 0,05) entre a média da frequência de trocas de cromátides-irmãs por célula no grupo do controle (3,57) e da frequência do grupo exposto (8,46). A freqüência de SCE também foi significativamente maior no grupo exposto em todas as durações de exposição (1 a 10 anos, 11 a 20 anos e >20 anos). |
Rupa et al., 1989100 | Mutat Res | Transversal | Fumantes expostos a agrotóxicos, não fumantes (controle I) e fumantes não expostos (controle II) | Índia | Mistura de malathion, DDT, BHC, endosulfan, Parationa-metílica, monocrotophos, quinolphos, dimetoato, phosphomidon, cipermetrina e fenvelrate | As alterações do tipo cromatídicas foram maiores no controle II em comparação com o controle I. Observaram-se alterações do tipo isocromatídicas (gaps (0,04), quebras (0,02), fragmentos (0,13) e dicêntricos (0,52) no controle II enquanto foram ausentes no controle I. Na população exposta a agrotóxicos, o número de gaps e quebras cromossômicas aumentou quando comparado ao controle II. Um aumento semelhante foi observado nos fragmentos, deleções e dicêntricos na população exposta em relação ao controle II. Os poliplóides aumentaram com a duração da exposição aos agrotóxicos. A análise estatística revelou que houve um aumento significativo (p <0,05) nas alterações cromossómicas totais em fumantes expostos a agrotóxicos comparados com os fumantes não expostos a agrotóxicos. |
Fonte: Elaborado pelas autora
A maioria dos estudos (n = 16) pesquisou as correlações entre a exposição ao malathion e desenvolvimento de cânceres. Dos 25 artigos, 18 foram realizados na América do Norte (12 dos EUA e seis do Canadá), três na Europa, três na Ásia e apenas um na América Latina (Chile). Estes achados corroboram com o manuscrito da IARC, que afirma que pouquíssimos estudos nesse enfoque têm sido realizados em países menos industrializados19.
Quanto às evidências de genotoxicidade pesquisadas, Andreotti et al.76, em estudo transversal com aplicadores de agrotóxicos do sexo masculino, encontraram associações positivas entre a utilização recente de malathion e o comprimento relativo do telômero mais curto (p = 0,03). O encurtamento do comprimento do telômero está associado à várias doenças, e a maioria dos estudos têm relatado associações entre ele e aumento do risco de câncer101,102.
Em uma coorte prospectiva com pacientes que tentaram suicídio com drogas ou inseticidas, foram observados aumentos temporários, porém significativos, de aneuploidia de leucócitos do sangue periférico (6,3%, p < 0,01) e das taxas de alterações cromatídicas (5,3%, p < 0,01) e cromossômicas (1,4%, p < 0,01) após intoxicação com o malathion97. Além disso, uma das 14 pessoas intoxicadas pelo organofosforado veio a óbito.
Apenas um dos estudos epidemiológicos que trataram dos efeitos mutagênicos do malathion e de misturas complexas de agrotóxicos que incluíam o organofosforado não observou associação positiva95. Este trabalho, realizado tanto com estudo epidemiológico transversal com trabalhadores expostos ao agrotóxico, como com experimentação in vitro de linfócitos do sangue periférico humano também expostos, concluiu que o malathion possui um potencial relativamente baixo para causar dano cromossômico in vitro, sendo as doses correspondentes utilizadas no experimento muito mais elevadas do que aquelas que os aplicadores profissionais estão susceptíveis de serem expostos in vivo, segundo os autores.
Em outro estudo transversal, com um trabalhador ocupacionalmente exposto a agrotóxicos (primeiramente a malathion e fosfina) durante mais de cinco anos, e experimental in vitro com linfócitos do sangue periférico humano expostos ao malathion, foi envidenciado que a mutagenicidade do malathion pode ser detectada a um nível molecular96. As alterações moleculares no ensaio hprt foram observadas em doses de malathion que não produziram citotoxicidade in vitro (≤50 mg/ml) e em níveis de exposição experimentados pelo indivíduo a partir do qual o mutante in vivo foi obtido. Os autores afirmam que alterações semelhantes àquelas refletidas no hprt neste estudo podem ocorrer também em outros loci, especialmente sítios de oncogenes ou genes supressores de tumores, podendo desempenhar um papel na indução de malignidades em indivíduos expostos a este ou a um agente semelhante.
Nos estudos epidemiológicos onde houve a exposição a misturas complexas de agrotóxicos ou combinações que incluíram o malathion, todos os resultados encontraram associações positivas com efeitos genotóxicos77,92,93,99,100 e efeito carcinogênico87. As investigações de agrotóxicos focadas nos efeitos potenciais dessas substâncias de forma individual têm o propósito de facilitar a análise, além de direcionar políticas públicas. No entanto, exposições múltiplas, apesar de dificultarem a avaliação das relações entre os agrotóxicos e seus efeitos, sejam eles mutagênicos ou cancerígenos, refletem mais exatamente como estes compostos são utilizados na prática87.
Dentre os manuscritos que buscaram investigar as correlações entre a exposição do malathion e desenvolvimento de tipos diferentes de cânceres, cinco deles não observaram associações positivas significativas quanto aos casos de Linfoma Não-Hodgkin (LNH)79,91, mieloma múltiplo82, câncer de próstata85,91, sarcoma de tecido mole86, cânceres linfático-hematopoiéticos combinados, leucemia, cânceres de pulmão, colon e reto, rim e bexiga e melanoma91. Outros três encontraram associações significativamente inversas entre o uso do organofosforado e o surgimento de LNH78,84 e câncer pancreático90.
A outra metade deles obteve associações positivas em níveis estatisticamente significativos para câncer de tireóide78, câncer ovariano em mulheres na menopausa78, câncer de próstata80,88 e do seu tipo agressivo83, câncer de mama81, LNH94,98 e entre o índice de massa corporal e câncer de cólon entre homens que utilizaram malathion89.
Cerca de 33 anos após a primeira pulverização de malathion sobre a cidade de Arica, no Chile, Cabello et al.81 realizaram um estudo de caso-controle com mulheres residentes na cidade e mulheres de Iquique, cidade controle onde nunca houve a pulverização. Os autores observaram que aquelas com mais tempo de exposição ao malathion foram 5,7 vezes mais propensas a serem diagnosticadas com câncer de mama, além de 30,5% dos casos de metástases encontrados no grupo exposto, contra 16% no grupo nunca exposto (p < 0,05). O estudo concluiu que o aumento da taxa de mortalidade por câncer de mama ocorrido na cidade de Arica tem uma correlação significativa com a exposição ao malathion pulverizado há mais de três décadas.
De todos os trabalhos incluídos nesta revisão sistemática, apenas um foi realizado no Brasil58, o que evidencia a escassez de pesquisas com relação aos efeitos carcinogênicos e genotóxicos do malathion no país. Em contrapartida, a utilização de agrotóxicos, principalmente em países em desenvolvimento, vem apresentando crescimento ao longo dos anos, tornando-se imprescindível a realização de mais estudos acerca da exposição ocupacional e ambiental aos mesmos103.
A Abrasco produziu uma Nota Técnica11 alertando quanto a produtos como o malathion, utilizados atualmente no controle vetorial em ações de saúde pública, uma vez que os reais danos provocados ao ambiente e à saúde humana ainda não foram devidamente sistematizados e divulgados às populações vulneráveis, incluindo os trabalhadores expostos. Seus efeitos nocivos têm sido desconsiderados tanto no agravamento das viroses, quanto no surgimento de outras patologias como: alergias, imunotoxicidade, câncer, distúrbios hormonais, neurotoxicidade, dentre outras11.
Conclusão
Nesta revisão sistemática, foram encontrados resultados que evidênciam o efeito mutagênico do malathion utilizado como formulação comercial, ou seja, contendo seus análogos malaoxon e isomalathion, e sua capacidade de promover alterações no DNA in vivo. Dessa forma, uma vez que tais alterações possam atingir regiões de oncogenes ou supressores de tumores no DNA, processos neoplásicos podem ser desencadeados, tanto em animais como em humanos expostos.
Os resultados dos estudos in vitro, tanto em culturas celulares de animais como de seres humanos expostos ao malathion, evidenciaram danos ao DNA, alterações cromossômicas, trocas de cromátides-irmãs e micronúcleos. Os estudos experimentais in vivo mostraram evidências suficientes quanto ao potencial do agrotóxico tanto na indução de danos genéticos como na indução de neoplasias em mamíferos. Os estudos epidemiológicos evidenciaram associações positivas estatisticamente significantes para câncer de tireóide, de mama, e ovariano em mulheres na menopausa.
O efeito carcinogênico desse agrotóxico e suas implicações ao ambiente e aos seres humanos devem ser consideradas, particularmente no âmbito do controle de arboviroses.