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Construção e validação de ferramenta educativa sobre insulinoterapia para adultos com diabetes mellitus

Resumo

A insulinoterapia empregada no tratamento do Diabetes Mellitus (DM) carece de ferramentas educativas que auxiliem a prática de autocuidado. Dessa forma, objetivou-se elaborar e validar uma ferramenta educativa destinada a promover a compreensão da relação entre variação glicêmica e insulinoterapia em adultos com DM1 e DM2. Trata-se de um estudo metodológico desenvolvido em três etapas: i) elaboração da ferramenta educativa; ii) validação de conteúdo e aparência por comitê de juízes; iii) pré-teste com o público-alvo. Participaram da segunda etapa dez juízes e da terceira etapa 12 adultos com DM 1 ou 2, em uso de insulina. Para avaliar a adequação do material educativo pelo comitê de juízes foi utilizado o Índice de Validade de Conteúdo (IVC). Para validação pelo público-alvo foram calculados os percentuais de concordância por itens. Como resultado, desenvolveu-se a ferramenta educativa Meu Diário de Tratamento (MDT), que obteve IVC médio de 99,6% e percentual de concordância de 99%. Conclui-se, portanto, que o conteúdo e a aparência da ferramenta MDT foram validados e adequados culturalmente para a população de adultos com DM tipo 1 e 2.

Palavras-chave:
Autocuidado; Diabetes Mellitus; Estudo de Validação; Insulina; Educação em Saúde

Abstract

The insulin therapy used to treat Diabetes Mellitus (DM) lacks educational tools to assist self-care. Thus, we aimed to develop and validate an educational tool for the relationship between glycemic variation and insulin therapy for adults with type 1 and 2 DM. The study was developed in three stages: i) elaboration of the educational tool; ii) validation of content and display by a panel of judges; iii) pre-test with a target audience. Ten judges participated in the second stage, and 12 insulin-dependent adults with type 1 or 2 DM participated in the third stage. The Content Validity Index (CVI) was used to evaluate the adequacy of the material by the judges. The percentages of the agreement by item were calculated for validation by the target audience. The My Treatment Diary (MTD) educational tool was then developed. It obtained a mean CVI of 99.6% and a percentage of agreement of 99%. The results demonstrated that the content and display of the MTD tool were validated and culturally appropriate for the population of adults with type 1 and 2 DM.

Key words:
Self-care; Diabetes Mellitus; Validation Study; Insulin; Health Education

Introdução

O Diabetes Mellitus (DM) se apresenta como um grupo heterogêneo de distúrbios metabólicos que têm em comum a elevação dos níveis glicêmicos; o que pode ser decorrente de uma insuficiência total ou parcial na secreção de insulina ou por defeitos na ação periférica desse hormônio, ou ainda, como resultado de ambas as condições anteriores11 American Diabetes Association (ADA). Classification and Diagnosis of Diabetes: Standards of Medical Care in Diabetes. Diabetes Care 2021; 44(Supl. 1):S15-S33..

Especialmente no Diabetes Mellitus tipo 1 (DM1) e nos casos avançados de Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2), a abordagem terapêutica demanda mudanças no comportamento de autocuidado da pessoa nessa condição22 Sims EK, Carr ALJ, Oram RA, DiMeglio LA, Evans-Molina C. 100 years of insulin: celebrating the past, present and future of diabetes therapy. Nat Med 2021; 27(7):1154-1164., envolvendo insulinoterapia, monitorização glicêmica e contagem de carboidratos, aliada ao seguimento de um plano alimentar.

O modelo proposto para a insulinoterapia procura reproduzir a fisiologia endócrina das células beta pancreáticas, empregando dois tipos de insulina com objetivos diferentes: i) basal e ii) bolus alimentares22 Sims EK, Carr ALJ, Oram RA, DiMeglio LA, Evans-Molina C. 100 years of insulin: celebrating the past, present and future of diabetes therapy. Nat Med 2021; 27(7):1154-1164.. Por sua vez, a contagem de carboidratos é uma técnica que pretende alcançar as metas glicêmicas pós-prandiais a partir do equilíbrio entre a quantidade, em gramas, de carboidratos ingeridos e a dose de insulina rápida ou ultrarrápida administrada em bolus alimentares33 Resende DCS, Silva AP, Tomé JM, Resende EAMR, Palhares HMC, Borges MF. Nutritional interference in the treatment of patients with Diabetes Mellitus type 1. Cien Cuid Saude 2018; 17(3):1-9..

Dada a complexidade desse tratamento, que inclui a necessidade de aderir aos aspectos específicos relacionados à insulinoterapia e à contagem de carboidratos, cabe à equipe interdisciplinar investir em estratégias educativas que apoiem o autocuidado, que promovam a autonomia das pessoas com DM44 Brehmer LCDF, Canever BP, Rosa LMD, Locks MOH, Manfrini GC, Willrich GPB. Diabetes mellitus: Health ducation strategies for self-care Rev. enferm. UFPE on-line 2021; 15(1):1-16., e que sejam capazes de auxiliar na redução dos episódios de ampla variação glicêmica, associados a doença endotelial e microvascular55 Salazar JJ, Ennis WJ, Koh TJ. Diabetes medications: Impact on inflammation and wound healing. J Diabetes Complications 2016; 30(4):746-752..

Considerando-se a natureza multidisciplinar das habilidades necessárias ao autocuidado em saúde, destacam-se os benefícios de se trabalhar com ferramentas educativas que aliem baixo custo de produção e simples aplicação66 Faria CC, Géa-Horta T, Reis JS, Soares AN, Moreira AD. Elaboration and validation of an e-book with the laws about diabetes in schools. Rev Bras Enferm 2022; 75(3):e20200711.

7 Galdino YLS, Moreira TMM, Marques ADB, Silva FAA. Validation of a booklet on self-care with the diabetic foot. Rev Bras Enferm 2019; 72(2):780-787.
-88 Magri S, Amaral NW, Martini DN, Santos LZM, Siqueira LO. Health education program improves self-care indicators in diabetes and hypertension. Rev Eletron Comun Inf Inov Saude 2020; 14(2):386-400., capazes de auxiliar o desenvolvimento das potencialidades comportamental, cognitiva e clínica da pessoa com DM99 Figueira ALG, Gomes-Villas Boas LC, Coelho ACM, Foss-Freitas MC, Pace AE. Educational interventions for knowledge on the disease, treatment adherence and control of diabetes mellitus. Rev Lat-Am Enferm 2017; 25:e2863.,1010 Dias IWH, Junqueira V. Dialogic approach to the health needs of insulin users followed up in the Glucose Self-Monitoring Program. Interface (Botucatu) 2020; 24(Supl. 1):e190441.. Nessa perspectiva, a literatura tem evidenciado o desenvolvimento de estratégias educativas direcionadas para o autocuidado na insulinoterapia, como cartilhas1111 Ramos LMH, Araújo RFR. Uso de cartilha educacional sobre diabetes mellitus no processo de ensino e aprendizagem. Ensino Saude Ambiente 2017; 10(3):94-105., álbuns seriados1212 Rodrigues SC, Gonçalves LS. Tecnologia educacional para pessoas em uso de insulina. Cien Cuid Saude 2020; 19:e50376. e programas digitais1313 McGough B, Murray E, Brownlee L, Barron E, Smith J, Valabhji J. The Healthier You: NHS Diabetes Prevention Programme: digital modes of delivery engage younger people. Diabet Med 2019 ; 36(11):1510-1511.. No entanto, observa-se que ferramentas educativas validadas, especificamente elaboradas para demonstrar a relação entre insulinoterapia e variação glicêmica, ainda são uma lacuna a ser preenchida.

Nessa perspectiva, esse estudo objetivou elaborar e validar uma ferramenta educativa destinada a promover a compreensão da relação entre variação glicêmica e insulinoterapia em adultos com DM1 e DM2.

Métodos

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo metodológico1414 Severino AJ. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Editora Cortez; 2017., reportado conforme as recomendações da ferramenta Revised Standards for Quality Improvement Reporting Excellence (SQUIRE 2.0), da rede EQUATOR1515 Revised Standards for Quality Improvement Reporting Excellence SQUIRE 2.0 [Internet]. [cited 2022 out 10]. Available from: http://squire-statement.org/index.cfm?fuseaction=Page.ViewPage&PageID=471.
http://squire-statement.org/index.cfm?fu...
. Foi realizado no período de julho de 2018 a maio de 2020, em um ambulatório público de referência para o atendimento de pessoas com DM em Belo Horizonte, Minas Gerais. Estudo desenvolvido conforme as etapas apresentadas na Figura 1.

Figura 1
Fluxograma das etapas do estudo. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, 2020.

Amostra, critérios de inclusão e exclusão

Conforme recomendado na literatura, o processo de validação deve incluir um número de seis a vinte especialistas para compor o comitê de juízes1616 Pasquali L. Psicometria: teoria e aplicações. Brasília: Ed da UnB; 1997.. Para a seleção dos potenciais juízes foram realizadas consultas na Plataforma Lattes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e aplicados os seguintes critérios de inclusão: i) profissionais da área da saúde (medicina, enfermagem, farmácia, nutrição); ii) experiência mínima de dois anos no atendimento a pessoas com DM; iii) pós-graduação em nível de especialização, mestrado ou doutorado e preferencialmente com experiência em validação de materiais educativos. Foi enviado um convite por e-mail a dez profissionais, com as orientações sobre o processo de avaliação. Todos os juízes convidados aceitaram participar da pesquisa e as avaliações ocorreram entre novembro de 2018 e janeiro de 2019. A plataforma Google Drive foi utilizada para envio do link do questionário on-line para validação de conteúdo pelos juízes e a ferramenta educativa foi disponibilizada em formato impresso, entregue pessoalmente pelos Correios ou em formato digital (enviada via e-mail).

Para a validação da ferramenta educativa pelo público alvo, foi selecionada uma amostra por conveniência constituída por 12 pessoas com DM, pacientes regulares do ambulatório de referência cenário deste estudo. A amostra caracterizou-se por indivíduos adultos (entre 18 e 59 anos), de ambos os sexos e em insulinoterapia. O número da amostra foi baseado em recomendações extraídas de estudos na área da pesquisa qualitativa e no conceito de saturação, ou seja, no ponto da coleta de dados a partir do qual nenhuma informação relevante é adicionada pelas novas entrevistas1717 Ribeiro J, Souza FN, Lobão C. Editorial: Saturação da análise na investigação qualitativa: quando parar de recolher dados? Rev Pesqui Qual 2018; 6(10):iii-vi.,1818 Minayo MCS. Sampling and saturation in qualitative research: consensuses and controversies. Rev Pesqui Qual 2017; 5(7):1-12.. Foram excluídos: i) casos de deficiência sensorial, como aqueles com diminuição grave ou perda da função visual; ii) pessoas com deficiência intelectual ou cognitiva que comprometessem a utilização da ferramenta proposta.

Protocolo do estudo

A etapa 1 consistiu na elaboração da ferramenta educativa e se iniciou pela revisão de literatura para a definição do conteúdo. Foram pesquisadas as bases eletrônicas PubMed e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), além dos manuais da American Diabetes Association (ADA)11 American Diabetes Association (ADA). Classification and Diagnosis of Diabetes: Standards of Medical Care in Diabetes. Diabetes Care 2021; 44(Supl. 1):S15-S33. e Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD)1919 Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2017-2018 [Internet] 2017 [acessado 2022 jan 15]. Disponível em: https://www.diabetes. org.br/profissionais/images/2017/diretrizes/diretrizes-sbd-2017-2018.pdf.
https://www.diabetes. org.br/profissiona...
.

Assim, originou-se a primeira versão da ferramenta educativa (V1), nomeada de Meu Diário de Tratamento (MDT), um produto com três componentes, a saber: i) manual virtual (livreto com explicação detalhada e apresentação da ferramenta educativa); ii) ferramenta educativa Meu Diário de Tratamento (folheto impresso com escalas e subescalas para preenchimento e interpretação); e iii) folha de etiquetas autoadesivas (para serem destacadas e usadas no preenchimento das escalas). Desse modo, quando, ao longo do texto, for mencionada a ferramenta Meu Diário de Tratamento (MDT), os autores referem-se aos três componentes acima apresentados.

Finalizada V1, um comitê de especialistas composto por uma médica endocrinologista, três enfermeiras e uma nutricionista, que são professoras e pesquisadoras na área do DM, foi organizado com o objetivo de auxiliar nas discussões sobre conteúdo e layout inicial da ferramenta e apontar as necessidades de ajustes, gerando a segunda versão (V2), que foi submetida à etapa 2, caracterizada pela validação pelo comitê de juízes.

De posse da ferramenta física, da folha de adesivos e de seu manual em formato virtual, os juízes avaliaram a V2 da ferramenta MDT quanto à clareza e relevância, por meio de uma escala do tipo Likert, atribuindo pontuação de 1 a 4 estrelas, que significam: 1 estrela - necessidade de reformulação completa; 2 estrelas - necessidade de reformulação parcial com muitas alterações; 3 estrelas - necessidade de reformulação parcial com alterações opcionais para aprimorar o conteúdo; 4 estrelas - sem necessidade de reformulação.

Ao final da avaliação quantitativa, os juízes teceram considerações qualitativas sobre a clareza, a relevância e a aparência da ferramenta MDT e de seu manual, em espaço destinado para esse fim, no próprio questionário on-line.

Uma vez reunidas as considerações da fase de validação pelos juízes, o comitê de especialistas reuniu-se novamente para produzir uma versão consensual pré-final (V3), onde as devidas adequações foram realizadas, envolvendo o redesenho do projeto de design, novos estudos de proporção e testes de impressão.

Procedeu-se, então, à etapa 3, que consistiu na validação pelo público-alvo. Nessa etapa, os participantes foram abordados individualmente por um pesquisador, que lhes apresentou apenas o folheto impresso da ferramenta educativa (V3) e a folha de etiquetas autoadesivas, solicitando-lhes que avaliassem sua pertinência e compreensão. As entrevistas foram conduzidas com auxílio de um questionário elaborado pelos próprios pesquisadores e que abordava: i) identificação da amostra, contendo dados sociodemográficos e clínicos; ii) avaliação da compreensão geral da ferramenta, contendo duas questões abertas e sete questões fechadas, que apresentavam quatro opções de respostas do tipo Likert, onde 4 estrelas indicava sem necessidade de reformulação e 1 estrela indicava necessidade de reformulação completa; e iii) avaliação da relevância e indicação do MDT, contendo 2 questões fechadas, também do tipo Likert, variando de 1 a 4 estrelas. Ao final do questionário, o entrevistado tinha a opção de fazer sugestões em espaço específico para esse fim.

Considerou-se como indicadores de adequação da ferramenta o reconhecimento do público-alvo a respeito do código comunicacional2020 Joly M. Objetivos e metodologia da imagem. In: Joly M. Introdução à análise da imagem. Lisboa: Edições 70; 2007. p. 54-60. adotado no MDT e a habilidade da pessoa com DM em relacioná-lo ao reflexo metabólico e farmacológico que envolve a terapêutica com insulina. Composto por ícones e elementos simbólicos desenvolvidos para representar: i) os tipos de insulina empregados em seu tratamento; ii) a biodisponibilidade e a meia-vida desses fármacos; e iii) a variação glicêmica após a ingestão de carboidratos, o código comunicacional somente atinge seu objetivo diante da identificação por parte do usuário.

Análise dos resultados e estatística

Para análise dos dados de validação do comitê de juízes foi calculado o Índice de Validade de Conteúdo (IVC), que mede a porcentagem de juízes de acordo com os aspectos da ferramenta educativa e seus itens. Conforme mencionado anteriormente, os três componentes da ferramenta educativa estão contidos em seu manual virtual que apresenta e explica, de maneira detalhada, a ferramenta MDT. Logo, a validação da ferramenta educativa aconteceu pela avaliação dos juízes sobre cada página do referido manual.

O IVC foi calculado com uma escala do tipo Likert de quatro pontos. De posse da ferramenta física (folheto impresso e folha de adesivos) e do manual em formato virtual, os juízes escolheram as seguintes respostas para avaliar a relevância da ferramenta a partir de cada página de seu manual: 1 ponto para “não relevante ou não representativo”; 2 pontos para “item necessita de grande revisão para ser representativo”; 3 pontos para “item necessita de pequena revisão para ser representativo”; e 4 pontos para “item representativo”. A clareza de conteúdo da ferramenta educativa também foi avaliada com a mesma escala, a partir de cada página de seu manual, variando nas opções de respostas em: 1 ponto para “não claro”; 2 pontos para “pouco claro”; 3 pontos para “bastante claro”; e 4 pontos para “muito claro”. Os dados obtidos foram analisados a partir da somatória das respostas 3 e 4 de cada juiz em cada item do MDT, dividindo-se a soma pelo número total de respostas2121 Fernandes BSM, Reis IA, Pagano AS, Cecílio SG, Torres HE. Construção, validação e adequação cultural do protocolo COMPASSO: Adesão ao autocuidado em diabetes. Acta Paul Enferm 2016; 29(4):421-429.,2222 Coluci MZO, Alexandre NMC, Milani D. Construction of measurement instruments in the area of health. Cien Saude Colet 2015; 20(3):925-936..

A validade de conteúdo consiste no grau de representatividade do conceito que a ferramenta pretende medir e prevê a avaliação dos itens conforme clareza e relevância. A clareza avalia se a construção textual dos itens do MDT permite leitura adequada e favorece a compreensão do conteúdo avaliado, enquanto a relevância refere-se ao grau de significado do conteúdo produzido, à sua capacidade de gerar impacto e de despertar interesse. Foi adotado como valor mínimo de IVC 0,902121 Fernandes BSM, Reis IA, Pagano AS, Cecílio SG, Torres HE. Construção, validação e adequação cultural do protocolo COMPASSO: Adesão ao autocuidado em diabetes. Acta Paul Enferm 2016; 29(4):421-429.,2222 Coluci MZO, Alexandre NMC, Milani D. Construction of measurement instruments in the area of health. Cien Saude Colet 2015; 20(3):925-936..

Para análise dos dados de validação do público-alvo foram calculados os valores de percentual de concordância por item avaliado. Para ser considerado como adequado, foi adotado um mínimo de 75% de concordância de respostas positivas (consideradas como avaliações de 3 e 4 estrelas) para cada item do questionário2222 Coluci MZO, Alexandre NMC, Milani D. Construction of measurement instruments in the area of health. Cien Saude Colet 2015; 20(3):925-936..

Aspectos éticos

Essa pesquisa foi avaliada e aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte conforme Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, que aprova as diretrizes e normas regulamentadoras para pesquisas envolvendo seres humanos2323 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Diário Oficial da União 2013; 13 dez.. Todos os participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE).

Resultados

Elaboração da ferramenta educativa Meu Diário de Tratamento (MDT)

Baseado na bibliografia consultada, formulou-se a primeira versão (V1) da ferramenta educativa (MDT) (Figura 2). O manual virtual do MDT foi projetado com 27 páginas em Portable Document Format (PDF) com as instruções de uso para os profissionais aplicadores do MDT distribuídas em quatro subtítulos: 1 - Conheça o MDT; 2 - Preencha o MDT; 3 - As escalas principais; 4 - Módulos cromáticos. No subtítulo 1 a ferramenta é apresentada ao leitor, assim como o seu objetivo e sua proposta de utilização. No subtítulo 2 é explicado, passo a passo, como se deve proceder no preenchimento do MDT. Para facilitar o entendimento, é apresentado um exemplo de preenchimento com dados de um paciente fictício. Nos subtítulos 3 e 4 são explicados, detalhadamente, cada escala (insulina basal, insulina para bolus alimentares e refeições com carboidratos), assim como o significado das variações de cores em cada uma. Mantém-se o exemplo de preenchimento com dados de um paciente fictício.

Figura 2
Etiquetas autoadesivas e ferramenta física MDT. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, 2020.

O folheto impresso da ferramenta educativa Meu Diário de Tratamento foi projetado no formato A3 (42 X 29,7 cm) impresso em papel couchê fosco 300 g, em escala de cores CMYK (C (cyan), M (magenta), Y (yellow) e K (black)) 4 x 4 cores (frente e verso). A ilustração do folheto contempla três escalas compostas por 24 células cada, sendo que cada uma dessas células representa uma hora do dia do plano terapêutico da pessoa com DM. A função das escalas é ter seus espaços preenchidos de acordo com os horários individualizados de refeições com carboidratos e de aplicação de insulina, tanto basal quanto para bolus alimentares, demonstrando, esquematicamente, a variação glicêmica e a meia-vida dos diferentes tipos de insulina. Seu preenchimento é realizado por meio da aplicação dos adesivos projetados de acordo com o tamanho das escalas presentes no desenho do folheto, e obedecendo-se a correspondência de cor existente entre escala e adesivo.

As escalas presentes no folheto apresentam três cores que fazem referência aos seguintes componentes do plano terapêutico: i) escala amarela = insulina basal (NPH ou insulina de longa duração); ii) escala vermelha = refeições; e iii) escala azul = insulina para bolus alimentares (insulina rápida ou ultrarrápida). Em alaranjado, abaixo de cada escala, foi inserida uma subescala de indicação das horas correspondendo às células da escala em questão, e permitindo, por registro a tinta, a seleção dos horários correspondentes à rotina de alimentação e de medicação (insulinoterapia) prevista no plano terapêutico.

No verso da ferramenta, para reforço das orientações recebidas pela pessoa com DM durante a consulta, informações fundamentais foram inseridas sob o título de “Cinco Passos para Entender o Meu Diário de Tratamento”: 1 - Reconheça as cores: este passo contém informações sobre o significado de cada cor na ferramenta MDT (amarela = insulina basal; azul = insulina para bolus alimentares; e vermelha = refeição com ingestão de carboidrato), além de ter um espaço para que seja registrado o nome de cada tipo de insulina usada pelo paciente e os carboidratos mais comumente ingeridos por ele; 2 - Reconheça os desenhos: neste passo são apresentados os símbolos usados para insulina basal, insulina rápida ou ultrarrápida e refeições. Nos passos 3, 4 e 5 (3 - Entenda quanto de insulina basal seu corpo tem; 4 - Entenda quanto de insulina rápida ou ultrarrápida seu corpo tem e 5 - Entenda quanto de carboidrato seu corpo tem) são explicados os significados da variação de tons dos adesivos a serem utilizados para preenchimento e interpretação do MDT. Assim, adesivos com tons mais claros sinalizam menor biodisponibilidade de insulina (para as cores amarela e azul) ou menores valores de glicemia (para a escala vermelha); e adesivos de tons mais escuros indicam maior biodisponibilidade de insulina ou maior valor glicêmico.

Por sua vez, as duas folhas de etiquetas autoadesivas impressas em papel adesivo, com dimensões de 24 X 37,5 cm, apresentam 168 etiquetas medindo 3,1 X 1,5 cm cada, produzidas empregando-se a mesma técnica de impressão digital do folheto.

A ferramenta desenvolvida pode ser usada durante os atendimentos individuais de profissionais da equipe de saúde, bem como nas atividades em grupo. Sugere-se que, durante o momento educativo, seja individual ou coletivo, paciente e profissional de saúde, de posse do folheto MDT e das etiquetas autoadesivas, façam juntos o preenchimento das escalas da ferramenta, de acordo com os tipos de insulina usados e o consumo alimentar relatado, respeitando a variação de tonalidade das cores para representar maior ou menor disponibilidade de insulina e glicose no organismo.

Validação do MDT pelo comitê de juízes

O comitê multiprofissional de juízes foi composto por dez profissionais de saúde sendo que nove (90%) tinham idade entre 21 e 44 anos, nove (90%) eram do sexo feminino, três (30%) enfermeiros, três (30%) nutricionistas, dois (20%) endocrinologistas, dois (20%) farmacêuticos. Com relação à titulação acadêmica, quatro (40%) tinham doutorado, quatro (40%) tinham mestrado e dois (20%) tinham especialização.

A validação da segunda versão (V2) do MDT e de seu manual virtual, realizada pelos juízes, obteve um IVC médio de 0,996, o que indica alto índice de concordância entre os juízes (Quadro 1).

Quadro 1
Dados quantitativos do comitê de juízes relativos à análise do MDT. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, 2020.

As considerações qualitativas do comitê de juízes originadas na fase de validação de conteúdo foram apresentadas no segundo encontro do comitê de especialistas que considerou as seguintes sugestões no manual do MDT: i) Substituição do nome da ferramenta de “Meu Diário de Escolhas (MDE)” para “Meu Diário de Tratamento (MDT)”; ii) Página 11: mudança do termo “índice de glicemia” para “variação glicêmica”, uma vez que se trata de um processo dinâmico que não se restringe a um índice obtido em dosagem isolada da glicemia capilar; iii) Páginas 13 e 14: adequações de conteúdo e de léxico relacionadas ao nível sérico de insulina e à variação glicêmica pós-prandial, respectivamente; iv) Página 22: mudança de título e de texto de “REPRESENTAÇÃO DA CURVA GLICÊMICA. Observar: elevação glicêmica em até 1 hora pós-prandial com queda progressiva dos níveis de glicose circulantes, principalmente na segunda hora após a refeição realizada” para “REPRESENTAÇÃO DA VARIAÇÃO GLICÊMICA ESPERADA. Observar: ampla variação glicêmica em até 1 hora após a refeição com queda progressiva dos níveis de glicose circulantes, principalmente na segunda hora após a refeição realizada”. Seguiu-se a correção no módulo cromático correspondente; v) Página 25: ajuste do conteúdo relacionado à farmacocinética da insulina ultrarrápida, que consistiu em mudar o texto de “início de ação ocorre de 10 a 20 minutos da injeção, pico de ação em 3 horas e duração da ação de 3 a 5 horas” para “início de ação ocorre de 10 a 20 minutos da injeção, pico de ação em 1 hora e duração da ação de 3 a 5 horas”, seguido de correção no módulo cromático correspondente.

Os dados da avaliação e sugestões tecidas pelo comitê de juízes foram discutidos pelo comitê de especialistas, gerando a terceira versão (V3) que foi encaminhada para a validação pelo público-alvo.

Validação do MDT pelo público-alvo

Essa etapa foi realizada por meio de entrevistas face-a-face dirigidas pelos pesquisadores do estudo. A população-alvo estudada apresentou como características sociodemográficas predominantes a faixa etária de adultos, do sexo feminino, com companheiro e com ensino superior completo. Relativo aos dados clínicos 58,33% diagnosticado com DM1, 33,34% com DM2 e 8,33% com síndrome de Wolfram. As comorbidades e complicações mais prevalentes foram cardiovasculares, retinopatia e episódios de hipoglicemia grave (Tabela 1).

Tabela 1
Dados sociodemográficos e clínicos da amostra da população-alvo. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, 2020.

Apesar de a amostra predominante apresentar-se como sendo de ensino superior completo (50%), outros graus de escolaridade foram contemplados na pesquisa, observando-se sujeitos com ensino fundamental incompleto ou ensino médio incompleto. Por sua vez, essa condição não se configurou um limite cognitivo para o entendimento da ferramenta, havendo alto índice de compreensão do MDT inclusive pelos representantes dos estratos com menor escolaridade (Quadro 2).

Quadro 2
Avaliação do MDT na fase de pré-testes. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, 2020.

Conforme observado no Quadro 2, a avaliação da compreensão e relevância atingiram os níveis esperados, uma vez que apenas um participante apresentou dificuldade de entender o termo “ultrarrápida”, referente ao item de significado conceitual da escala azul. Porém, esse apontamento não foi considerado suficiente para gerar modificações no item do MDT, uma vez que o termo “ultrarrápida” era descontextualizado da rotina de cuidados do usuário em específico.

As demais sugestões apresentadas pela amostra caracterizaram-se por: i) observações subjetivas, como predileção cromática, ou ii) dúvidas no momento de preenchimento dos campos da ferramenta (nome, data, tipo de insulina, carboidratos ingeridos), o que se resolveu com a repetição da explicação a respeito do elemento questionado. Por não se relacionarem à compreensão da ferramenta educativa, também não justificaram alterações de conteúdo ou de layout no MDT.

Encerrada a etapa descrita, atingiu-se a versão do MDT considerada válida para utilização da população brasileira com DM 1 e 2.

Discussão

A partir da realização desse estudo, pretendeu-se contribuir com a compreensão da relação entre insulinoterapia e variação glicêmica por pessoas adultas com DM1 e DM2, investindo-se na interface entre profissional de saúde e paciente, por meio de uma ferramenta educativa. Considerado como uma barreira ao autocuidado, a falta do conhecimento de fundamentos em DM justifica a necessidade de investimento científico na construção de materiais e métodos, ou ferramentas de ensino e aprendizagem, a partir de uma linguagem elementar que facilite a compreensão por parte das pessoas com menor escolaridade, melhorando a percepção individual a respeito de sua saúde e, consequentemente, dos cuidados a ela relacionados44 Brehmer LCDF, Canever BP, Rosa LMD, Locks MOH, Manfrini GC, Willrich GPB. Diabetes mellitus: Health ducation strategies for self-care Rev. enferm. UFPE on-line 2021; 15(1):1-16.,2424 Ribeiro AS, Moreira AD, Reis JS, Soares NA, Horta TG. Elaboration and validation of a booklet on diabetes for Community Health Workers. Rev Bras Enferm 2020; 73(4):1-8..

Como o MDT é uma ferramenta desenvolvida para conversação sobre a relação alimentação/insulinoterapia com a pessoa com diabetes, o educador em diabetes deve, após aplicá-lo, interpretar o resultado para o paciente, destacando a necessidade de haver níveis de insulina e de carboidratos proporcionais e adequados para prevenir amplas variações glicêmicas. A identificação dessa pertinência é ilustrada nas escalas de insulinoterapia e de refeições. Assim, ao identificar falhas nas escalas, ajustes nos horários de refeição e/ou maior atenção à insulinoterapia passam a fazer mais sentido para o usuário.

Durante o desenvolvimento desse trabalho foi possível observar a heterogeneidade dos conceitos relacionados à variabilidade glicêmica: mesmo aquelas pessoas com muitos anos de DM não sabiam definir insulinoterapia, nem entendiam claramente a influência da ingestão de carboidratos na glicemia pós-prandial. Essa condição justificou a construção do MDT e dirigiu para a adoção de uma metodologia sensível às demandas socioculturais da população de interesse.

Estudos2525 Cabral DAC, Silva MCP, Campos FMS, Medeiros JPV, Batista OS, Cabral LGC, Hamoy M, Mello VJ. Health education for diabetic patients in socioeconomic vulnerability in northern Brazil. Res Soc Dev 2021; 10(1):e10910111598.,2626 Fernandes LDS, Calado C, Araujo CAS. Social networks and health practices: influence of a diabetes online community on adherence to treatment. Cien Saude Colet 2018; 23(10):3357-3368. evidenciam que variáveis socioculturais influenciam o comportamento de autocuidado de populações com condições crônicas. Nesse sentido, ao investir no DM como elemento sociocultural, o MDT adota a simbolização como mecanismo de articulação do repertório e da linguagem, elaborando uma escala visual que demostra potencial educativo ao permitir uma maior compreensão da população-alvo sobre a sua condição. Durante a fase de testes da ferramenta, o MDT demonstrou que, expressar o raciocínio técnico-científico por meio de um sistema simbólico, é uma estratégia de comunicação válida para configurar a mensagem educativa e pedagógica. Essa proposta conceitual dialoga com os estudos da área da saúde voltados à aproximação de recursos sensíveis às especificidades de comunidades vulneráveis2727 Florêncio RS, Moreira TM. Health vulnerability model: conceptual clarification from social subjects' perspectivel. Acta Paul Enferm 2021; 34:eAPE00353.,2828 Conceição DS, Viana VSS, Batista AKR, Alcântara ADSS, Eleres VM, Pinheiro WF, Viana JA. Health education as an instrument for social change. Braz J Develop 2020; 6(8):59412-59416..

Especificamente no que tange ao tratamento simbólico dado à farmacocinética da insulina, o MDT encontra ressonância em estudos precedentes na área de assistência farmacêutica. Em 1991, Lefèvre já considerava as funções simbólica e psicossocial do medicamento, articuladas a seu desempenho quimioterápico na cura ou melhora dos sintomas2929 Lefèvre FO. Medicamento como mercadoria simbólica. São Paulo: Editora Cortez; 1991.. Mais recentemente, um relato de experiência em Unidade Básica de Saúde descreveu os benefícios da utilização de ícones e pictogramas para humanizar a atenção farmacêutica3030 Prata PBA, Cunha RM, Pereira ÉG, Nichiata LYI. Pharmaceutical Care and humanization of care: lessons from the promotion of adhesion to therapeutic care of users in chronic conditions. Mundo Saude 2012; 36(3):526-530.. Com o intuito de orientar o uso racional das medicações e estimular o autocuidado, foi empregada a mesma estratégia do MDT. Ao empregar recursos simbólicos de comunicação visual no folheto, como i) a representação do dia em escalas; ii) o desenvolvimento de ícones para os tipos de insulina e a ingestão de carboidratos; iii) a gradação cromática para simular a variação glicêmica e a biodisponibilidade farmacológica de insulina, o MDT age como um facilitador da aprendizagem sobre os termos e seus significados relacionados ao DM que, à maioria dessa população, apresentam-se complexos.

Desenvolver ferramentas educativas que respondam à necessidade de conhecimento da população-alvo também passa pelo desafio de aproximar educador e pessoa com DM. A partir da premissa, o projeto de comunicação do MDT propôs a articulação de dois planos de linguagem: i) técnica o suficiente para orientar a prática profissional e ii) acessível o bastante para representar informações relevantes como símbolos de fácil domínio repertorial. Inicialmente, esses planos encontram-se em interfaces distintas, para depois, no momento da prática educativa, articularem-se: manual (destinado ao profissional educador) e folheto (para uso das pessoas com DM).

Por sua vez, a literatura também disponibiliza outras estratégias aplicadas a esse contexto, desde recursos tecnológicos avançados, como aplicativos e smartphones, àquelas que se mantém nas tecnologias leves do cuidado em saúde3030 Prata PBA, Cunha RM, Pereira ÉG, Nichiata LYI. Pharmaceutical Care and humanization of care: lessons from the promotion of adhesion to therapeutic care of users in chronic conditions. Mundo Saude 2012; 36(3):526-530.,3131 Marques ADB, Moreira TMM, Carvalho REFL, Chaves EMC, Oliveira SKP, Felipe GF, Silveira JAN. PEDCARE: validation of a mobile application on diabetic foot self-care. Rev Bras Enferm 2021; 74(Supl. 5):e20200856.. Cabe ao profissional educador identificar aquela que melhor se adeque ao ambiente da intervenção e às demandas específicas da população de interesse.

Como limitações observadas no estudo destacam-se: i) a amostragem por conveniência do público-alvo que avaliou a ferramenta; ii) a necessidade de um profissional educador em saúde capacitado para atuar com o MDT; iii) e o investimento financeiro para a produção dos kits MDT (folheto e etiquetas autoadesivas).

Considerando as limitações de amostragem, ressalta-se que, apesar da mesma ter se restringido aos usuários de um serviço ambulatorial, o estudo obedeceu integralmente aos critérios de inclusão e exclusão definidos. Destaca-se que o grupo participante dessa etapa da validação apresentou distribuição equilibrada com relação ao sexo, idade, grau de escolaridade e tipo de DM, garantindo participantes com diferentes perfis no que tange a essas vaiáveis que poderiam interferir na maior ou menor compreensão da ferramenta. Soma-se o fato de o MDT ser uma ferramenta para uso durante o atendimento de saúde, e não uma ferramenta autoaplicável. Dessa forma, a presença do profissional de saúde durante sua aplicação pode facilitar a resolução de potenciais dúvidas dos usuários sobre a ferramenta.

Quanto à necessidade de um profissional capacitado para aplicação ferramenta, justifica-se pela demanda de análise da relação insulinoterapia/ingestão de carboidratos. Espera-se que o educador em diabetes seja médico, enfermeiro, nutricionista ou farmacêutico - profissões que reúnem a expertise necessária para orientar de modo adequado a pessoa com DM. Assim, o fato de a ferramenta ter a possibilidade de ser utilizada por diferentes profissionais da equipe de saúde, facilita o seu uso, contribuindo para mitigar a desvantagem caracterizada pela necessidade de treinamento.

Para facilitar o acesso ao MDT, seu manual foi projetado em formato virtual, proporcionando uma mídia mais flexível para consulta em dispositivos móveis e capacitação à distância. Seu conteúdo foi redigido com uma linguagem objetiva, construída a partir de um exemplo prático, capaz de representar a realidade dos profissionais educadores e de facilitar a sua compreensão. Além disso, o formato digital do seu manual representa também uma estratégia para redução de custos, sendo necessária a impressão apenas do folheto e das etiquetas autoadesivas.

É indiscutível a necessidade de investimentos financeiros para a execução da intervenção educativa que opte por utilizar o MDT. Ressalta-se ser necessário o apoio dos órgãos governamentais para a reprodução, divulgação e ampla distribuição desse material nos serviços de saúde. Por outro lado, é importante considerar que o seu custo de reprodução (atualmente calculado em R$ 3,10/kit MDT, constituído por folheto e etiquetas adesivas) é substancialmente menor do que os potenciais gastos com os investimentos necessários para se tratar as complicações agudas e crônicas de pessoas com controle ineficaz do regime terapêutico medicamentoso para DM, situação sobre a qual o MDT pode contribuir.

Por fim, ressalta-se o desafio de apresentar os resultados de um estudo metodológico com a objetividade e clareza que a escrita científica impõe. Nesse processo, o uso da ferramenta SQUIRE 2.0 contribuiu para seleção, ordenação e apresentação das informações mais relevantes produzidas por esse estudo. As diretrizes SQUIRE 2.0 fornecem um framework bastante útil para relatar novos conhecimentos sobre intervenções para melhoraria nos cuidados de saúde, podendo ser adaptada para as mais variadas abordagens e intervenções que compartilham dessa finalidade1515 Revised Standards for Quality Improvement Reporting Excellence SQUIRE 2.0 [Internet]. [cited 2022 out 10]. Available from: http://squire-statement.org/index.cfm?fuseaction=Page.ViewPage&PageID=471.
http://squire-statement.org/index.cfm?fu...
. O seu uso tem sido crescente em estudos de desenvolvimento metodológico, incluindo estudos de elaboração e validação de tecnologias educacionais3232 Oliveira AC, Lima SVMA, Lopes-Sousa AF, Farias Neto, JP, Araújo KCGM. Construction and validation of an instrument for assessing the functionality of individuals with schistosomiasis. Rev Bras Enferm 2022; 75(3):e20210306.

33 Santos AS, Rodrigues LN, Andrade KC, Santos MSN, Viana MCA, Chaves EMC. Construction and validation of an educational technology for mother-child bond in the neonatal intensive care unit. Rev Bras Enferm 2020; 73(4):e20190083.

34 Rocha LAC, Gorla BC, Jorge BM, Afonso MG, Santos ECN, Miranda FBG. Validação de cenários simulados para estudantes de enfermagem: avaliação e tratamento de Lesão por Pressão. Rev Eletr Enferm 2021; 23:67489.
-3535 Sousa VLP, Moreira ACA, Fernandes MC, Silva MAM, Teixeira IX, Dourado Jr FW. Educational technology for bathing/hygiene of elders at home: contributions to career knowledge. Rev Bras Enferm 2021; 74(Supl. 2):e20200890..

O acesso à ferramenta para download do manual virtual e dos arquivos de impressão do folheto e das etiquetas autoadesivas é possível através do link https://drive.google.com/drive/folders/1XUSX9pWCyjc0ZzUq6PU8yZ3V3DLWDYMB, com os direitos de autoralidade cedidos para a Faculdade Santa Casa de Belo Horizonte.

Conclusões

Considera-se validados o conteúdo e a aparência da ferramenta educativa Meu Diário de Tratamento (MDT), sendo adequada culturalmente para promover a compreensão do tratamento com insulina de adultos com diabetes mellitus tipo 1 e tipo 2. Espera-se que estudos futuros sejam realizados para avaliar a efetividade do MDT como motivador de um comportamento de autocuidado adequado, capaz de produzir benefícios clínicos a partir de um maior controle sobre a variabilidade glicêmica.

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Editores-chefes:

Romeu Gomes, Antônio Augusto Moura da Silva

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    Maio 2023

Histórico

  • Recebido
    17 Jun 2022
  • Aceito
    25 Out 2022
  • Publicado
    27 Out 2022
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