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Propriedades Psicométricas da Versão Brasileira do Questionário de Ambivalência em Psicoterapia - QAP

Psychometric Properties of the Brazilian Version of the Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ)

Propiedades Psicométricas de la Versión Brasileña del Cuestionario de Ambivalencia en Psicoterapia - QAP

Resumo

Níveis elevados de ambivalência estão associados a piores resultados e abandono terapêutico. Este estudo teve como objetivo a adaptação transcultural e avaliação das propriedades psicométricas do Questionário de Ambivalência em Psicoterapia (QAP). Após adaptação cultural do instrumento, foram avaliados 181 indivíduos em psicoterapia de diversas abordagens, em clínicas-escola e consultórios particulares. O QAP foi avaliado quanto à estrutura interna e relação com variáveis externas. Na análise fatorial confirmatória, o modelo com melhor ajuste foi composto por três dimensões: duas de primeira ordem - Desmoralização e Alternância - e uma de segunda ordem - Ambivalência. A consistência interna foi 0,86. Na relação com variáveis externas, o QAP se correlacionou moderadamente com medidas de desconforto psicológico (OQ-45- Outcome Questionnaire) (r = 0,65) e motivação para mudança (URICA - University of Rhode Island Change Assessment): contemplação (r = 0,36) e manutenção (r = 0,37). A versão brasileira do QAP demonstrou ser um instrumento com boas características psicométricas, de aplicação rápida e fácil.

Palavras-chave:
ambivalência; psicometria; psicoterapia

Abstract

High levels of ambivalence are associated with poor outcomes and therapeutic abandonment. The objective of this study was to conduct a cross-cultural adaptation and assessment of the psychometric properties of the Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ). After cultural adaptation of the instrument, we assessed 181 individuals undergoing psychotherapy of different approaches in school clinics and private practices. The APQ was validated regarding internal structure and relationship with external variables. In the confirmatory factor analysis, the model with the best fit was composed of three dimensions: two first-order - Demoralization and Wavering - and one second-order - Ambivalence. The internal consistency was 0.86. In relation to external variables, the APQ correlated moderately with measures of psychological distress (OQ-45- Outcome Questionnaire) (r = 0.65) and motivation to change (URICA- University of Rhode Island Change Assessment): contemplation (r = 0.36) and maintenance (r = 0.37). The results indicated that the Brazilian version of the APQ is a suitable instrument, of quick and easy application.

Keywords:
Ambivalence; Psychometrics; Psychotherapy

Resumen

Los altos niveles de ambivalencia se asocian con peores resultados y abandono terapéutico. Este estudio tuvo como objetivo la adaptación transcultural y la evaluación de las propiedades psicométricas del Cuestionario de Ambivalencia en Psicoterapia (QAP). Después de la adaptación cultural del instrumento, 181 individuos fueron evaluados en psicoterapia utilizando diferentes enfoques, en clínicas-escuelas y consultorios privados. El QAP fue evaluado por su estructura interna y su relación con variables externas. En el análisis factorial confirmatorio, el modelo con mejor ajuste estuvo compuesto por tres dimensiones: dos de primer orden - Desmoralización y Alternancia - y una de segundo orden - Ambivalencia. La consistencia interna fue de 0,86. En relación con las variables externas, el QAP se correlacionó moderadamente con las medidas de malestar psicológico (OQ-45- Outcome Questionnaire) (r = 0,65) y motivación para el cambio (URICA- University of Rhode Island Change Assessment): contemplación (r = 0,36) y mantenimiento (r = 0,37). La versión brasileña del QAP demostró ser un instrumento con buenas características psicométricas, de rápida y fácil aplicación.

Palabras clave:
Ambivalencia; Psicometría; Psicoterapia

Introdução

Tendo em vista que todo processo terapêutico implica em mudanças, independentemente da abordagem, é necessário avaliar qual o grau de motivação para a mudança do paciente para que a terapia seja efetiva e eficaz. De acordo com o modelo transteórico de mudança (MTT) de Prochaska e DiClemente (1983Prochaska, J. O., & DiClemente, C. (1983). Stages and process of self-change of smoking: Toward an interrogative model of change. J Consult Clin Psychol, 51(3), 390-5. doi: https://doi.org/10.1037/0022-006X.51.3.390
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), a motivação para a mudança é um processo dinâmico e não linear, composto por cinco estágios: Pré-contemplação, Contemplação, Preparação, Ação e Manutenção. Apesar de se manifestar em qualquer uma das fases, é na contemplação que o fenômeno denominado de “ambivalência” se torna mais evidente.

Diversos pesquisadores têm voltado sua atenção para o estudo dos fatores que impedem a mudança comportamental, uma vez que a sua compreensão fornece indicadores importantes para o aumento da eficácia da psicoterapia (Engle & Arkowitz, 2007Engle, D., & Arkowitz, H. (2007). Viewing resistence as ambicalence: Integrative strategies for working with resistence ambivalence. Journal of Humanistic Psychology, 48(3), 389-412. doi: https://doi.org/10.1177/0022167807310917
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). Dentro dos fatores que impedem a mudança, vários estudos têm demonstrado que níveis elevados de resistência/reatância estão associados a piores resultados terapêuticos e a abandono precoce da terapia (Alves et al., 2016Alves, D., Navarro, P. F., Ribeiro, A. P., Ribeiro, E., Sousa, I., & Gonçalves, M. M. (2016). Ambivalence in grief therapy: The interplay between change and self-stability. Death Stud. 40(2), 129-138. doi: 10.1080/07481187.2015.1102177
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; Engle & Arkowitz, 2007Engle, D., & Arkowitz, H. (2007). Viewing resistence as ambicalence: Integrative strategies for working with resistence ambivalence. Journal of Humanistic Psychology, 48(3), 389-412. doi: https://doi.org/10.1177/0022167807310917
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). Não raras vezes, a resistência do paciente às sugestões do terapeuta é a manifestação observável da ambivalência que sente em relação à mudança.

Rice, Hagler, Papponi, Connors e Delaney (2017Rice, S. L., Hagler, K. J., Papponi, B. L. M., Connors, G. J., & Delaney, H. D. (2017). Ambivalence about behavior change: Utilizing motivational interviewing network of trainers’ perspectives to operationalize the construct. Addiction Research & Theory, 25(2), 154-162. doi: https://doi.org/10.1080/16066359.2016.1236191
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) sugerem que a ambivalência é vivenciada e expressada de formas diferentes pelos pacientes, o que torna mais difícil a identificação desse fenômeno por parte dos terapeutas. Nos momentos de ambivalência elevada, intervenções inadequadas podem ter como consequência o insucesso terapêutico (e.g., abandono precoce da terapia), o que indica a necessidade de instrumentos que objetivem a identificação e mensuração da ambivalência.

Segundo Oliveira, Ribeiro e Gonçalves (2020Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M. (2020). The Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ): Development and validation studies. Clinical Psychology & Psychotherapy . Advance online publication. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.2457
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), a ambivalência é definida como posições diferentes/opostas diante de mudanças. Se refere a uma oscilação por parte do paciente entre uma atitude a favor e uma contra a mudança e pode ser acompanhada de sofrimento emocional intenso. Dessa forma, quando o paciente pensa, age ou sente de forma contrária à sua autonarrativa problemática recorrentemente retorna ao padrão problemático, em favor da estabilidade. Pensando no caso de um paciente cuja autonarrativa é dominada pelo tema “eu não valho nada, não sirvo para nada”, uma exceção poderia ser algo como “eu tenho direito a ser feliz como as outras pessoas”. Nessa sequência, o retorno ao padrão problemático poderia acontecer logo de imediato com: “mas eu não sou capaz, esta tristeza já faz parte de mim, eu sou assim”. Nessa perspectiva, em consequência a um momento de inovação (i.e., exceção à autonarrativa problemática), o paciente frequentemente aborta o seu potencial de mudança, restabelecendo a autonarrativa problemática e neutralizando a mudança (Ribeiro, Gonçalves, Silva, Brás, & Sousa, 2016Ribeiro, A. P., Gonçalves, M. M., Silva, J. R., Brás, A., & Sousa, I. (2016). Ambivalence in narrative therapy: A comparison between recovered and unchanged cases. Clin. Psychol.Psychother, 23, 166-175. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.1945
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).

Por outras palavras, o processo de mudança poderá ameaçar a autoestabilidade do paciente e este pode tender a manter o status quo. A ambivalência, então, surge da tensão entre o movimento em direção à mudança (i.e., momentos de inovação) e o movimento contrário em direção à estabilidade problemática. Essa tentativa de manutenção da estabilidade pode acarretar um fechamento defensivo e monológico do eu, o que pode atrapalhar e/ou impedir o desenvolvimento/transformação da autonarrativa (Alves et al., 2016Alves, D., Navarro, P. F., Ribeiro, A. P., Ribeiro, E., Sousa, I., & Gonçalves, M. M. (2016). Ambivalence in grief therapy: The interplay between change and self-stability. Death Stud. 40(2), 129-138. doi: 10.1080/07481187.2015.1102177
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). Assim, é comum que, ao longo do processo terapêutico, o paciente oscile entre os momentos de inovação e o retorno à autonarrativa problemática, expressando assim a ambivalência (Ribeiro et al., 2016Ribeiro, A. P., Gonçalves, M. M., Silva, J. R., Brás, A., & Sousa, I. (2016). Ambivalence in narrative therapy: A comparison between recovered and unchanged cases. Clin. Psychol.Psychother, 23, 166-175. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.1945
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).

De acordo com Morrison et al. (2017Morrison, N. R., Constantino, M. J., Westra, H. A., Kertes, A., Goodwin, B. J., & Antony, M. M. (2017). Using interpersonal process recall to compare patients’ accounts of resistance in two psychotherapies for generalized anxiety disorder. Journal of Clinical Psychology, 73(11), 1523-1533. doi: https://doi.org/10.1002/jclp.22527
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), a ambivalência é um evento natural e esperado no início do processo terapêutico, visto que é necessário iniciar um processo de mudança e, para isso, os indivíduos precisam se mover de uma posição na qual veem majoritariamente vantagens no comportamento problemático, para uma posição onde percebem as suas vantagens e desvantagens (i.e., ambivalência). Por outro lado, quando o sujeito não é capaz de ultrapassar a ambivalência, os problemas persistem e intensificam-se, resultando em insucesso e/ou abandono terapêutico (Oliveira, Ribeiro, & Gonçalves, 2021Oliveira, J. T., Faustino, D., Machado, P. P. P., Ribeiro, E., Gonçalves, S., & Gonçalves, M. M. (2021). Sudden gains and ambivalence in the unified protocol for transdiagnostic treatment of emotional disorder. International Journal of Cognitive Therapy. doi: https://doi.org/10.1007/s41811-021-00106-w
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).

Segundo Westra e Norouzian (2017Westra, H. A., & Norouzian, N. (2017). Using motivational interviewing to manage process markers of ambivalence and resistance in cognitive behavioral Therapy. Cogn TherRes, 42(2), 193-203. doi: https://doi.org/10.1007/s10608-017-9857-6
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), quando o paciente expressa ambivalência, o terapeuta muitas vezes, na intenção de facilitar o processo, o confronta. Essa indagação pode ser interpretada, pelo paciente, como uma tentativa de convencimento e/ou persuasão. Dessa forma, o terapeuta, ao contrário do que pretende, perpetua e sustenta a dinâmica da resistência, uma vez que o seu foco na mudança é sentido, pelo cliente, como uma ameaça a estabilidade do self, que tem como consequência um sofrimento psíquico. Braga, Ribeiro, Sousa, & Gonçalves (2019Braga, C., Ribeiro, A. P., Sousa, I., & Gonçalves, M. M. (2019) Ambivalence predicts symptomatology in cognitive-behavioral and narrative therapies: An exploratory study. Front. Psychol. 10(1244). doi: https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01244
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) indicam que uma possível causa para o frequente desconforto decorrente da ambivalência, consiste no fato de que o acesso simultâneo a pensamentos e sentimentos opostos pode acarretar a antecipação de emoções negativas, resultante de uma possível decisão “errada”. Para além disso, a ambivalência pode também desencadear outros processos como a ansiedade e intolerância à incerteza.

Essa dinâmica pode instaurar um processo de resistência na psicoterapia que pode influenciar a aliança terapêutica e resultar no insucesso e até mesmo abandono terapêutico (Urmanche, Oliveira, Gonçalves, Eubanks, & Muran, 2019Urmanche, A. A., Oliveira, J. T., Gonçalves, M. M., Eubanks, C. F., & Muran, J. C. (2019). Ambivalence, resistance, and aliance ruptures in psychotherapy: It’s complicated. Psychoanalytic Psychology, 36(2), 139-147. doi: https://doi.org/10.1037/pap0000237
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). Dessa forma, entende-se que a ambivalência em si, independentemente de se tornar ou não resistência, não é um problema ao desenvolvimento psicoterapêutico, mas sim à má gestão dela por parte do terapeuta. Engle e Arkowitz (2007Engle, D., & Arkowitz, H. (2007). Viewing resistence as ambicalence: Integrative strategies for working with resistence ambivalence. Journal of Humanistic Psychology, 48(3), 389-412. doi: https://doi.org/10.1177/0022167807310917
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) apontam que as intervenções mais eficazes para o manejo da ambivalência consistem na aceitação e empatia por parte do terapeuta, que não assuma o papel de defensor da mudança e ouça todas as vozes do paciente, com o objetivo de levá-las a consciência e ajudar o cliente a integrá-las.

Apesar da importância desse fenômeno, poucas investigações têm sido desenvolvidas pelos pesquisadores acerca dessa temática (Engle & Arkowitz, 2007Engle, D., & Arkowitz, H. (2007). Viewing resistence as ambicalence: Integrative strategies for working with resistence ambivalence. Journal of Humanistic Psychology, 48(3), 389-412. doi: https://doi.org/10.1177/0022167807310917
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; Rice, Hagler, Papponi, Connors, & Delaney, 2017Rice, S. L., Hagler, K. J., Papponi, B. L. M., Connors, G. J., & Delaney, H. D. (2017). Ambivalence about behavior change: Utilizing motivational interviewing network of trainers’ perspectives to operationalize the construct. Addiction Research & Theory, 25(2), 154-162. doi: https://doi.org/10.1080/16066359.2016.1236191
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), o que pode ser observado tanto na escassez da literatura acerca desse tema, quando na falta de instrumentos que possam avaliar a ambivalência em relação à mudança no contexto terapêutico no Brasil e em outros países (Santos, Jucá, Melo, & Sartes, 2019Santos, C. G. B., Jucá, T. A. C., Melo, A. L. C., & Sartes, L. M. A. (2019). Caracterização dos estudos sobre ambivalência em Psicoterapia: uma revisão de literatura. Rev. Bras. Psicoter, 21(3), 25-40. doi: https://doi.org/0.5935/2318-0404.20190021
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). Dessa forma, grande parte da investigação no âmbito da ambivalência tem sido desenvolvida com base em metodologias qualitativas. Embora essas abordagens se tenham apresentado eficazes no que diz respeito à pesquisa, requerem tempo e treinamento dos pesquisadores. Por essa mesma razão, a utilização desse método no contexto clínico é inviável. Assim, torna-se importante a disponibilidade de instrumentos fáceis e rápidos que auxiliem tanto os pesquisadores na avaliação da ambivalência, quanto os terapeutas a identificarem o nível de ambivalência de seus pacientes, para que ela seja manejada corretamente, objetivando o sucesso terapêutico.

O Questionário de Ambivalência em Psicoterapia (QAP) tem como objetivo avaliar os níveis de ambivalência dos clientes em atendimento psicoterápico. Foi desenvolvido em 2015 na Unidade de Psicoterapia e Psicopatologia da Escola de Psicologia da Universidade do Minho em Portugal. Sua fundamentação teórica tem como base a linha de investigação sobre os supracitados “Momentos de Inovação” e “mudança em psicoterapia”. Tem como público-alvo pacientes maiores de 18 anos, em psicoterapia, em qualquer abordagem, em qualquer momento do tratamento e independentemente da demanda apresentada (Oliveira, Ribeiro, & Gonçalves, 2017Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M (2017). Questionário de Ambivalência em Psicoterapia (QAP) [Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire]. In M. M. Gonçalves, M. R. Simões & L. S. Almeida (Eds.), Psicologia Clínica e da Saúde: Instrumentos de Avaliação (pp. 101-113). Lisboa: PACTOR - Edições de Ciências Sociais, Forenses e da Educação.).

Foi desenvolvido a partir de dados de arquivo previamente codificados com dois sistemas narrativos: The Innovative Moments Coding System (IMCS) e o Ambivalence Coding System (ACS) (Gonçalves et al., 2017Gonçalves, M. M., Ribeiro, A. P., Mendes, I., Alves, D., Silva, J., Rosa, C., … Oliveira, J. T. (2017). Three narrative-based coding systems: Innovative moments, ambivalence and ambivalence resolution. Psychotherapy Research, 27(3), 270-282. doi: https://doi.org/10.1080/10503307.2016.1247216
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). Foram transcritas 112 sessões de terapia de sete pacientes, totalizando 326 eventos de ambivalência. Os dados foram analisados e todos os pares de Momentos de Inovação - movimento de mudança - e Marcadores de Ambivalência - movimento de afastamento da mudança - foram identificados. Esses pares foram agrupados por temas que deram origem aos itens. (Oliveira et al., 2020Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M. (2020). The Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ): Development and validation studies. Clinical Psychology & Psychotherapy . Advance online publication. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.2457
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).

O QAP (Oliveira et al., 2017Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M (2017). Questionário de Ambivalência em Psicoterapia (QAP) [Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire]. In M. M. Gonçalves, M. R. Simões & L. S. Almeida (Eds.), Psicologia Clínica e da Saúde: Instrumentos de Avaliação (pp. 101-113). Lisboa: PACTOR - Edições de Ciências Sociais, Forenses e da Educação., 2020) é um instrumento de autorrelato, constituído por duas partes. A primeira é composta por um único item que tem por objetivo posicionar o paciente em relação à mudança, em uma régua com uma escala do tipo Likert de 11 pontos que varia de “Sinto que nada mudou ainda” a “Sinto que tudo já mudou”. Foi introduzida ao questionário por sua utilidade clínica em monitorar a percepção de mudança do paciente e, portanto, é excluída das análises de avaliação psicométrica da escala. A segunda parte possui nove itens respondidos em uma escala Likert de cinco pontos que varia de “Discordo totalmente” a “Concordo totalmente”. A subescala Desmoralização avalia sentimentos de incompetência, incapacidade de enfrentar desafios e incapacidade de realizar mudanças, e a subescala Alternância mensura o debate intrapsíquico entre os prós e contras da realização da mudança. A partir da análise fatorial confirmatória propôs-se um modelo de três dimensões, sendo dois de primeira ordem e um de segunda ordem, que apresentaram valores de ajuste adequados (Oliveira et al., 2020Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M. (2020). The Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ): Development and validation studies. Clinical Psychology & Psychotherapy . Advance online publication. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.2457
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).

Perez (2018Perez, M. R. (2018). Adaptación y validación Del Cuestionario de Ambivalencia en Psicoterapia en población clínica española. (Dissertação de mestrado). Faculdade de Psicologia, Universitat de Barcelona, Barcelona, Espanha.) realizou a adaptação transcultural e a avaliação das propriedades psicométricas da versão espanhola do QAP. Participaram do estudo 105 pessoas maiores de 18 anos (M = 43,23; DP = 12,03), em psicoterapia em diferentes abordagens, sendo 82,9% do sexo feminino. O valor do alfa de Cronbach do QAP foi de 0,84, enquanto do fator Desmoralização foi de 0,82 e do fator Alternância foi de 0,69. Assim como na versão original, propôs-se um modelo de três dimensões - dois de primeira ordem e um de segunda ordem.

Considerando que no Brasil não foram encontrados instrumentos que meçam ambivalência, este estudo teve o objetivo de realizar a adaptação transcultural para o Brasil e avaliar as propriedades psicométricas do QAP, especificamente avaliou-se as evidências de validade da estrutura interna e a relação com variáveis externas. Nossas hipóteses eram que a versão brasileira do QAP obteria resultados semelhantes à versão original e à espanhola quanto a estrutura interna, e que iria se relacionar de maneira moderada com as medidas de motivação para mudança e desconforto psicológico.

Método

Participantes

A amostra do presente estudo foi composta por 181 pessoas, maiores de 18 anos, em processo psicoterapêutico, em diversas abordagens e em diferentes estágios da terapia. Os participantes foram recrutados em consultórios particulares e clínicas-escolas das cidades de Juiz de Fora - MG, Viçosa - MG e Petrópolis - RJ. Oito questionários foram excluídos porque os participantes se sentiram desconfortáveis em responder a pesquisa e não completaram o preenchimento ou não responderam a maior parte das perguntas do QAP. Portanto, as análises dos dados foram realizadas com os 173 questionários válidos.

Desses participantes, 74% eram do gênero feminino, com idades compreendidas entre 18 e 75 anos (M = 36,7; DP = 14,42). Quanto à escolaridade, 10,6% dos participantes eram pós-graduados; 21,9% possuíam ensino superior completo; 43,8% ensino médio completo e 23,7% não haviam completado o ensino médio. O tempo de terapia variou de um mês a 16 anos (M = 14,01; DP = 21,94, em meses), excluindo-se um cliente com 30 anos de terapia, que foi considerado um outlier e retirado dessa análise, para evitar o viés. As abordagens terapêuticas mais relatadas incluíram: Terapia Cognitivo-Comportamental (43,2%), Psicanálise (31,1%), Gestalt (12,9%) e Terapia Comportamental (3%). A Terapia Cognitiva, Terapia de Grupo e Psicoterapia de apoio foram verificadas em 2,3% dos casos cada uma. As Psicoterapia Breve, Junguiana, Reichiana e Humanista foram verificadas em menos de 1% cada uma.

Instrumentos

Questionário de Dados Sociodemográficos

Esse questionário contém questões acerca da idade, sexo, escolaridade, religião, nível socioeconômico, estado civil, abordagem terapêutica, local onde terapia ocorreu e tempo de terapia dos participantes.

Versão Brasileira do Questionário de Ambivalência em Psicoterapia (QAP, Oliveira et al., 2020Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M. (2020). The Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ): Development and validation studies. Clinical Psychology & Psychotherapy . Advance online publication. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.2457
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)

Desenvolvido em Portugal por Oliveira et al., (2020Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M. (2020). The Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ): Development and validation studies. Clinical Psychology & Psychotherapy . Advance online publication. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.2457
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), cuja primeira parte é constituída por um único item, respondido em uma escala do tipo Likert de 11 pontos na qual o cliente deve se posicionar em relação à mudança. A segunda parte contém nove questões distribuídas em duas áreas: Desmoralização, composta por cinco itens - 1, 6, 7, 8 e 9 - e Alternância, composta por quatro itens - 2, 3, 4 e 5 -, respondidas a partir de uma escala Likert com cinco pontos entre “Discordo totalmente” a “Concordo Totalmente”. Os escores totais podem variar de nove a 45 pontos, e escores mais altos indicam maiores níveis de ambivalência. Valores acima de 32,69 correspondem a altos níveis de ambivalência em relação à mudança, enquanto valores abaixo de 18,39 significam ambivalência baixa. A consistência interna da versão original do instrumento, medida por meio do alfa de Cronbach, foi de 0,88, de 0,85, na subescala de desmoralização, de 0,82 na subescala de alternância. A correlação encontrada no teste-reteste foi de r = 0,81. Os índices de ajuste encontrados para o modelo proposto na análise fatorial confirmatória foram S-Bχ2 (23) = 41,352, p < 0,001; S-Bχ2/df = 1,797; CFI = 0,984, p < 0,05, TLI = 0,975, p < 0,05; SRMR = 0,031 e RMSEA = 0,069, 90% CI [.033, .100], p < 0,05; AIC = 4914,509 e BIC = 4989,761.

Versão Brasileira do University of Rhode Island Change Assessment (URICA, Szupszynski & Oliveira, 2008Szupszynski, K. P., & Oliveira, M. S. (2008). Adaptação brasileira da University of Rhode Island Change Assessment (URICA) para usuários de substâncias ilícitas. Psico-USF , 13(1), 31-39. doi: https://doi.org/10.1590/S1413-82712008000100005
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)

Escala de autorrelato composta por 24 itens (versão reduzida) desenvolvidos para medir o estágio motivacional no qual o sujeito se encontra, dividida em quatro subescalas baseadas no Modelo Transteórico de Mudança de Comportamento: pré-contemplação (seis itens), contemplação (seis itens), ação (seis itens) e manutenção (seis itens), respondidos com uma escala Likert com cinco pontos entre “Discordo totalmente” e “Concordo totalmente”. O nível de prontidão para mudança é obtido pela soma dos escores da contemplação, ação e manutenção, subtraindo-se a pré-contemplação. No estudo de validação da escala para dependentes de drogas ilícitas para o contexto brasileiro, o instrumento apresentou consistência interna, medida pelo alfa de Cronbach, de 0,66, de 0,71 para a subescala de pré-contemplação, de 0,77 para a subescala de contemplação, de 0,81 para a subescala de ação e de 0,73 para a subescala de manutenção (Szupszynski & Oliveira, 2008Szupszynski, K. P., & Oliveira, M. S. (2008). Adaptação brasileira da University of Rhode Island Change Assessment (URICA) para usuários de substâncias ilícitas. Psico-USF , 13(1), 31-39. doi: https://doi.org/10.1590/S1413-82712008000100005
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).

Versão Brasileira do Outcome Questionnaire - OQ-45.2 (Silva et al., 2016Silva, S. M., Alves, I. C. B., Peixoto, E. M., Rocha, G. M. A., & Nakano, T.C. (2016). Outcome Questionnaire (OQ-45.2): Assessment of the psychometric properties using bifactor model and IRT. Psico, 47(4), a1-a11. doi: https://doi.org/10.15448/1980-8623.2016.4.24600
https://doi.org/10.15448/1980-8623.2016....
)

É um instrumento de autorrelato, composto por 45 itens, desenvolvido com a finalidade de mensurar o progresso e os ganhos do cliente em psicoterapia. O progresso do paciente é monitorado a partir de três dimensões primárias: desconforto subjetivo (25 itens); relacionamentos interpessoais (11 itens); e desempenho do papel social (nove itens), respondidos em uma escala do tipo Likert de cinco pontos que varia entre “Nunca” e “Sempre”. Os escores possíveis variam entre zero e 180 pontos, nos quais os escores mais altos refletem sofrimento mais severo. A consistência interna do instrumento, medida por meio do alfa de Cronbach, foi de 0,94, de 0,91 para subescala de desconforto subjetivo, de 0,72 para a subescala de relacionamentos interpessoais e de 0,70 para a subescala de desempenho do papel social.

Procedimentos

Segundo as recomendações de Beaton, Bombardier, Guillemin e Ferraz (2000Beaton, D. E., Bombardier, C., Guillemin, F., & Ferraz, M. B. (2000). Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine. 25(24). doi: https://doi.org/10.1097/00007632-200012150-00014
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), a primeira etapa consistiu na adaptação cultural do questionário para o português do Brasil, que foi realizada por dois pesquisadores clínicos, de maneira independente. A utilização de dois especialistas na adaptação é indicada para evitar os vieses linguísticos, psicológicos, culturais e de compreensão teórica e prática (Borsa, Damásio, & Bandeira, 2012Borsa, J. C., Damásio, B. F., & Bandeira, D. R. (2012). Adaptação e validação de instrumentos psicológicos entre culturas: Algumas considerações. Paidéia. 22(53), 423-432. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-863X2012000300014
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).

Na segunda etapa, esses pesquisadores sintetizaram o resultado das duas adaptações, produzindo uma versão comum. Essa versão foi adaptada de volta ao português de Portugal por outros dois pesquisadores na terceira etapa. A retrotradução realizada nessa etapa não tem como objetivo uma equivalência literal entre o instrumento original e a versão traduzida, mas busca inconsistências ou erros conceituais na versão final da adaptação. Já na quarta etapa, todos os pesquisadores que participaram dos processos anteriores revisaram a adaptação e construíram uma versão final, considerando a equivalência semântica, idiomática, experiencial e conceitual entre o instrumento original e o adaptado.

Na etapa cinco, após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da CAAE 75524417.3.0000.5147, um estudo-piloto foi realizado, no qual essa versão foi aplicada em cinco participantes com o objetivo de verificar a compreensão e a necessidade de ajustes na versão brasileira do questionário. Os participantes do piloto não tiverem nenhuma dificuldade para compreender e responder o questionário e, por isso, a versão final não foi alterada.

Com a finalidade de contatar os participantes do estudo, foi realizado o contato com a coordenação das clínicas-escolas dos cursos de psicologia e psicólogos clínicos em exercício em consultórios particulares de Juiz de Fora e região. Após a autorização destes, os clientes foram convidados a responder os questionários, o que poderia ser realizado após a sessão ou quando fosse conveniente ao participante.

Por se tratar de questionários de autorrelato, os próprios clientes os preencheram, mas havia sempre presente um psicólogo e/ou estudantes de psicologia devidamente treinados para sanar quaisquer dúvidas. A aplicação dos questionários ocorreu em local isolado, estando presentes somente o entrevistador e o entrevistado. Após serem informados sobre os objetivos do estudo e assegurados da confidencialidade dos dados, todos os indivíduos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Inicialmente, foi aplicado um questionário padronizado para coleta dos dados sociodemográficos, seguido pela aplicação do QAP, da versão brasileira do URICA e o OQ-45, chamada de ordem normal. Em parte da amostra a aplicação dos questionários iniciou com o OQ-45 e finalizou com o questionário de dados sociodemográficos, chamada de ordem invertida. A ordem alternada de aplicação visou evitar possível viés de cansaço e influência nas respostas posteriores.

Análises dos Dados

Os dados coletados foram organizados e analisados com recurso ao Programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 22.0. Foram realizadas análises descritivas da população com o objetivo de caracterizar a amostra. Para avaliar a estrutura interna do QAP, foram realizadas análises de consistência interna e análise fatorial confirmatória, por meio do pacote Lavaan do software R., para verificar a adequação do modelo proposto aos dados. Os índices de ajuste seguiram aqueles resumidos por Marôco (2010Marôco, J. (2010). Análise de Equações Estruturais: Fundamentos teóricos, Software & Aplicações (1th ed.). Pêro Pinheiro: Report Number.).

Com o objetivo de avaliar as evidências de validade externa, foram realizadas análises de correlação de Pearson entre o QAP e o escore geral do URICA e com suas subescalas. Os escores do QAP e do OQ-45 foram correlacionados para averiguar a relação entre a ambivalência dos participantes em relação à mudança e o desconforto psicológico sofrido por eles. Para analisar se a ordem de aplicação dos questionários influenciou na resposta dos participantes, foi realizado um teste t independente, considerando os escores totais de cada um dos instrumentos.

Resultados

Evidências de Validade Baseadas na Estrutura Interna

Sensibilidade dos Itens

Na Tabela 1 estão apresentados os valores mínimos e máximos, a mediana, o desvio padrão, a assimetria e a curtose de cada um dos itens do questionário. Os itens que apresentaram maiores medianas foram 3, 4 e 5 que são compostos por afirmações como: “Algumas vezes sinto que tenho mudado e outras sinto que estou na mesma”.

Tabela 1
Sensibilidade dos Itens do QAP

A partir do modelo original proposto pelos autores, foi testado em primeiro lugar um modelo bifatorial (Figura 1) no qual os itens se agrupam em dois fatores, Desmoralização e Alternância. Esse modelo apresenta índices de ajuste fracos aos dados empíricos: χ2 (26) = 66,963 (p < 0,001). CFI = 0,922; TLI = 0,892; RMSEA = 0,095, 90% CI [0,068, 0,124]; AIC = 4532,882; BIC = 4621.174.

Figura 1
Modelo fatorial do QAP de duas dimensões.

Com a finalidade de melhorar os índices de ajuste do modelo, foram realizadas novas análises que incluíram uma relação entre os erros dos itens 3 e 4. O novo modelo bifatorial (Figura 2) apresenta um melhor ajuste aos dados. χ2 (25) =56,451 (p < 0,001). CFI = 0,940; TLI = 0,914; RMSEA = 0,085, 90% CI [0,056, 0,115]; AIC=4524,369; BIC = 4615,815.

Figura 2
Modelo fatorial do QAP de duas dimensões com modificações.

Considerando a elevada correlação entre os dois fatores do modelo 2, foi testado um modelo que inclui um fator de segunda ordem (Figura 3). Este apresenta melhores valores de ajuste aos dados empíricos, ainda que variáveis. O χ2 (24) = 56,451 (p < 0,001) é considerado adequado segundo Hooper, Coughlan e Mullen (2008Hooper, D., Coughlan, J., & Mullen, M. R. (2008). Structural equation modelling: Guidelines for determining model fit. Journal of Business Research Methods, 6, 53-60.), o CFI = 0,938 está acima de 0,90 conforme indicado por Hu e Bentler (1999Hu, L. T., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural Equation Modeling: A Multidisciplinary Journal, 6(1), 1-55. doi: https://doi:10.1080/10705519909540118
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), porém abaixo de 0,95 considerado como bom ajuste; o TLI = 0,908 é considerado como bom ajuste por Bentler e Bonett (1980Bentler, P. M., & Bonett, D. G. (1980). Significance tests and goodness of fit in the analysis of covariance structures. Psychological Bulletin, 88(3), 588-606. doi: https://doi.org/10.1037/0033-2909.88.3.588
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), mas menor do que 0,95 sugerido por Hu e Bentler (1999Hu, L. T., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural Equation Modeling: A Multidisciplinary Journal, 6(1), 1-55. doi: https://doi:10.1080/10705519909540118
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); RMSEA = 0,088, 90% CI [0,059, 0,119] estava no limite de 0,80 como recomendado por Hu e Bentler (1999Hu, L. T., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural Equation Modeling: A Multidisciplinary Journal, 6(1), 1-55. doi: https://doi:10.1080/10705519909540118
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), embora os melhores ajustes são considerados abaixo de 0,07; AIC = 4526,369; BIC = 4620,968. Todos os valores são interpretados como índices de ajustamento bom por Marôco (2010Marôco, J. (2010). Análise de Equações Estruturais: Fundamentos teóricos, Software & Aplicações (1th ed.). Pêro Pinheiro: Report Number.).

Figura 3
Análise fatorial confirmatória do QAP, modelo de três dimensões.

Consistência Interna

Uma análise de consistência interna foi realizada para o QAP e para cada um de seus fatores. O valor do alfa de Cronbach do QAP foi de 0,86, enquanto do fator Desmoralização foi de 0,82 e do fator Alternância foi de 0,74. De acordo com Tavakol e Dennick (2011Tavakol, M., & Dennick, R. (2011). Making sense of Cronbach’s alpha. International Journal of Medical Education, 2, 53-55.), os valores aceitáveis do alfa de Cronbach na literatura variam de 0,70 a 0,95. Os autores destacam que um alfa muito alto pode indicar a redundância de itens, ou seja, apontaria que a mesma pergunta é testada de diferentes formas. Por isso, recomendam um valor alfa máximo de 0,90. Portanto, tanto os valores das subescalas quanto da escala apresentam boas estimativas quanto à consistência interna.

Evidências de Validade Baseadas nas Relações com Variáveis Externas

A correlação entre os escores totais dos QAP e do URICA foi fraca (r = 0,28; p < 0,001). Na avaliação do QAP com as subescalas do URICA, encontrou-se correlações moderadas e significativas entre o escore do QAP e a subescala de contemplação (r = 0,36; p < 0,001) e manutenção (r = 0,37; p < 0,001), e correlações não significativas com as subescalas de pré-contemplação (r = 0,03; p = 0,687) e ação (r = -0,13; p = 0,095).

Ambivalência e Desconforto Psicológico

No intuito de avaliar a relação entre a ambivalência e a intensidade do desconforto psicológico, foram comparados os escores totais do QAP com os escores totais do OQ-45. A análise apontou uma correlação positiva moderada e significativa entre os escores (r = 0,65; p < 0,001).

Ordem de Aplicação

No QAP, a média dos participantes que responderam na ordem normal [t(136) = 25,52; DP = 7,36] foi próxima dos que responderam na ordem invertida [t(136) = 27,73; DP = 7,73]. A diferença das médias entre as duas condições foi de 2,21, que é um efeito pequeno (d = 0,29). O intervalo de confiança dessa diferença é de 0,33 a 4,75.

Da mesma forma, para o URICA, a média dos participantes que responderam na ordem normal [t(136) = 68,29; DP = 8,83] foi próxima dos que responderam na ordem invertida [t(136) = 68,13; DP = 6,81]. A diferença das médias entre as duas condições foi de 0,17, que é um efeito pequeno (d = 0,02). O intervalo de confiança dessa diferença é de - 2,53 a 2,86.

As médias dos escores do OQ-45, assim como dos instrumentos supracitados, também não apresentaram grandes diferenças entre os participantes que responderam na ordem normal [t(136) = 95,92; DP = 23,95] e os que responderam na ordem invertida [t(136) = 100,06; DP = 24,13]. A diferença das médias entre as duas condições foi de 4,14, que é um efeito pequeno (d = 0,17). O intervalo de confiança dessa diferença é de 3,98 a 12,26. Portanto, pode-se concluir que não houve influência significativa do viés de cansaço nas respostas dos participantes.

Discussão

A realização da adaptação transcultural foi desenvolvida com rigor metodológico, fundamentada nas orientações propostas por Beaton et al. (2000Beaton, D. E., Bombardier, C., Guillemin, F., & Ferraz, M. B. (2000). Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine. 25(24). doi: https://doi.org/10.1097/00007632-200012150-00014
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), que contém as fases de tradução, retrotradução, comparação com o instrumento original e comitê de juízes, com a finalidade de preservar a validade de conteúdo considerando as diferenças culturais. Além disso, foi desenvolvido um estudo-piloto com o objetivo de verificar a adequabilidade do instrumento adaptado quanto aos significados e compreensão dos itens e posterior realização dos ajustes necessários.

Segundo Borsa, Damásio e Bandeira (2012Borsa, J. C., Damásio, B. F., & Bandeira, D. R. (2012). Adaptação e validação de instrumentos psicológicos entre culturas: Algumas considerações. Paidéia. 22(53), 423-432. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-863X2012000300014
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), no processo de adaptação transcultural de um questionário, é necessário que se comprove as evidências de validade tanto da equivalência semântica, que no presente estudo pôde ser observada durante a realização do estudo-piloto, quanto das propriedades psicométricas do novo instrumento, além da comparação dos resultados com estudos realizados em outros contextos e populações.

As amostras da presente pesquisa, do estudo de validação do QAP realizado em Portugal (Oliveira et al., 2017Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M (2017). Questionário de Ambivalência em Psicoterapia (QAP) [Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire]. In M. M. Gonçalves, M. R. Simões & L. S. Almeida (Eds.), Psicologia Clínica e da Saúde: Instrumentos de Avaliação (pp. 101-113). Lisboa: PACTOR - Edições de Ciências Sociais, Forenses e da Educação., 2020) e na Espanha (Perez, 2018Perez, M. R. (2018). Adaptación y validación Del Cuestionario de Ambivalencia en Psicoterapia en población clínica española. (Dissertação de mestrado). Faculdade de Psicologia, Universitat de Barcelona, Barcelona, Espanha.), apresentaram características bastante semelhantes. Nos três estudos a amostra foi composta majoritariamente por pessoas do gênero feminino, com idade variando entre 18 e 60 anos e idade média de aproximadamente 30 anos na pesquisa portuguesa, enquanto no estudo brasileiro a idade média foi de aproximadamente 36 anos, sendo a idade mínima 18 e a máxima 75.

As estruturas internas da versão brasileira do QAP, do questionário original português (Oliveira et al., 2020Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M. (2020). The Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ): Development and validation studies. Clinical Psychology & Psychotherapy . Advance online publication. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.2457
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) e da versão espanhola (Perez, 2018Perez, M. R. (2018). Adaptación y validación Del Cuestionario de Ambivalencia en Psicoterapia en población clínica española. (Dissertação de mestrado). Faculdade de Psicologia, Universitat de Barcelona, Barcelona, Espanha.) se mostraram semelhantes, apontando para um construto que avalia a Desmoralização e Alternância como fatores de primeira ordem que juntos compõem a Ambivalência como fator de segunda ordem. Na análise fatorial confirmatória, o modelo de três fatores apresentou índices de ajustamento dos dados próximos aos encontrados no estudo original e no estudo espanhol, embora o ajuste tenha sido melhor nessas versões. Embora apresentando alguma variabilidade, a versão brasileira apresentou valores de ajuste entre razoáveis e adequados.

Alguns fatores podem ter interferido no ajuste do modelo em relação aos estudos anteriores, como o tamanho amostral maior, já que os testes se tornam cada vez mais sensíveis a pequenas discrepâncias de ajuste do modelo à medida que o tamanho da amostra aumenta (Barret, 2007). Hu e Bentler (1999Hu, L. T., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural Equation Modeling: A Multidisciplinary Journal, 6(1), 1-55. doi: https://doi:10.1080/10705519909540118
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) discutem, por sua vez, que amostras menores que 250 indivíduos podem levar a erros do tipo 1 e tipo 2 e interferir nos resultados de ajuste. Além disso, a diferença na escolaridade entre os participantes dos estudos pode ter influenciado na compreensão acerca dos itens e, consequentemente, nos resultados encontrados. Enquanto 45,8% dos participantes do estudo espanhol possuíam ensino superior completo, apenas 21,9% dos participantes do presente estudo tinham a mesma escolaridade.

Kenny, Kaniskan e McCoach (2014Kenny, D. A., Kaniskan, B., & McCoach, D. B. (2014). The Performance of RMSEA in Models with Small Degrees of Freedom. Sociological Methods & Research, 44(3), 486-507. doi: https://doi:10.1177/0049124114543236
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) postulam que em amostras pequenas, com poucos graus de liberdade, o RMSEA tende a indicar erroneamente um modelo de ajuste pobre. Na simulação realizada pelos autores, há evidências de que as taxas de rejeição podem aumentar com o declínio dos graus de liberdade. A investigação demonstra que em amostras menores que 200 e graus de liberdade próximos a 20, como é o caso do presente estudo, os modelos tendem a ser rejeitados usando um corte de 0,08 para o RMSEA. Os autores orientam a apresentação do intervalo de confiança para o RMSEA. Nesse caso, o valor inferior indicaria uma estimativa otimista e o limite superior, um valor pessimista. Dessa forma, é importante que outros estudos possam avaliar o ajuste do modelo de três fatores com amostra maior.

As análises de consistência interna das três versões do questionário foram bastante similares. O QAP original apresentou uma consistência interna de 0,88, enquanto a da presente adaptação foi de 0,86. No primeiro, o alfa de Cronbach da subescala Desmoralização foi igual a 0,85 e no presente estudo foi de 0,82, assim como na versão espanhola. Já o alfa da subescala Alternância da versão portuguesa foi de 0,82, na versão brasileira de 0,74 e na versão espanhola de 0,69.

Em relação às evidências de validade baseadas nas relações com variáveis externas, os resultados mostraram correlações significativas com as subescalas de manutenção e contemplação do URICA. Tais resultados eram esperados, especialmente este último, uma vez que é o estágio mais caracterizado pela ambivalência na mudança de comportamento (Engle & Arkowitz, 2007Engle, D., & Arkowitz, H. (2007). Viewing resistence as ambicalence: Integrative strategies for working with resistence ambivalence. Journal of Humanistic Psychology, 48(3), 389-412. doi: https://doi.org/10.1177/0022167807310917
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). Por outro lado, os resultados indicaram correlações não significativas entre os escores gerais do QAP e do URICA e com as subescalas de ação e pré-contemplação.

De um modo geral, as correlações foram de fracas a moderadas e a hipótese levantada era de correlações moderadas. Esse resultado pode ter ocorrido devido ao fato de que o URICA não tenha pesquisas de validação para a população clínica geral no Brasil. Esse questionário foi elaborado a partir do Modelo Transteórico de Mudança e, mesmo que atualmente o modelo seja aplicado a diversos comportamentos, sua elaboração foi desenvolvida a partir de uma amostra de tabagistas, seguida de outras populações com problemas relacionados ao uso de álcool e outras drogas (McConnaughy, Prochaska, & Velicer, 1983McConnaughy, E. A., Prochaska, J. O., & Velicer, W. F. (1983). Stages of change in psychotherapy: Measurement and sample profiles. Psychotherapy: Theory, Research & Practice, 20(3), 368-375. doi: https://doi.org/10.1037/h0090198
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). No Brasil, existem outros estudos sobre as propriedades psicométricas do URICA para usuários de tabaco (Oliveira, Ludwig, Moraes, Rodrigues, & Fernandes, 2014Oliveira, M. S., Ludwig, M. W. B., Moraes, J. F. D., Rodrigues, V. S., & Fernandes, R. S. (2014). Evidências de validade da University of Rhode Island Change Assessment (URICA-24) para dependentes de tabaco. Rev. Ciênc. Méd, 23(1), 5-14. doi: https://doi.org/10.24220/2318-0897v23n1a2410
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), para jogadores patológicos (Souza, 2009Souza, C. C. (2009). Motivação para Mudança de Comportamento no Jogo Patológico: Tradução, Adaptação e Validação DA “University Rhode Island Change Assessment (URICA)”. (Tese de doutorado). Faculdade de Psicologia PUCRS, Porto Alegre, RS, Brasil. Recuperado de http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/681
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), para o comer compulsivo (Bittencourt, 2009Bittencourt, S. A. (2009). Motivação para a mudança: Adaptação e validação da escala URICA (University of Rhode Island Change Assessment) para o comportamento de comer compulsivo. (Tese de doutorado). Faculdade de Psicologia PUCRS, Porto Alegre, RS, Brasil. Recuperado de http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/680
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) e para hábitos alimentares (Bittencourt, Santos, & Oliveira, 2012Bittencourt, S. A., Santos, P. L., & Oliveira, M. S. (2012). Motivação para mudança: Análise fatorial da URICA para hábitos alimentares. Psico-USF. 17(3), 497-505. doi: https://doi.org/10.1590/S1413-82712012000300016
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). A escolha por esse questionário se deu devido à escassez de instrumentos que avaliem tanto a motivação para a mudança, quanto à ambivalência. Da mesma forma, no estudo de validação da versão espanhola do QAP, também foram encontradas correlações baixas com as subescalas do URICA (Perez, 2018Perez, M. R. (2018). Adaptación y validación Del Cuestionario de Ambivalencia en Psicoterapia en población clínica española. (Dissertação de mestrado). Faculdade de Psicologia, Universitat de Barcelona, Barcelona, Espanha.).

Por outro lado, a relação entre a ambivalência em psicoterapia e o desconforto psicológico medido pelo OQ-45 foi evidenciada neste estudo. Tais construtos podem ser considerados como relacionados, obtendo correlações moderadas a boas, conforme nossa hipótese inicial. Tal como no estudo de desenvolvimento da versão portuguesa do QAP (r = 0,62; p < 0,01) (Oliveira et al., 2020Oliveira, J. T., Ribeiro, A. P., & Gonçalves, M. M. (2020). The Ambivalence in Psychotherapy Questionnaire (APQ): Development and validation studies. Clinical Psychology & Psychotherapy . Advance online publication. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.2457
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), também no estudo de validação da versão espanhola do instrumento foi encontrada essa correlação (r = 0,71; p < 0,001) (Perez, 2018Perez, M. R. (2018). Adaptación y validación Del Cuestionario de Ambivalencia en Psicoterapia en población clínica española. (Dissertação de mestrado). Faculdade de Psicologia, Universitat de Barcelona, Barcelona, Espanha.). Uma explicação possível para a ocorrência dessa relação encontra-se no fato de que a mudança pode ser sentida pelo paciente como uma ameaça a estabilidade psíquica e ser acompanhada de emoções intensas, o que pode gerar desconforto e/ou sofrimento nos clientes (Oliveira et al., 2016Oliveira, J. T., Gonçalves, M. M., Braga, C., & Ribeiro, A. P. (2016). Cómo Lidiar con laAmbivalencia em Psicoterapia: Um modelo conceptual para la formulación de caso. Revista de Psicoterapia, 27(104), 83-100. doi: https://doi.org/10.33898/rdp.v27i104.122
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), aumentando a probabilidade de comportamentos de oposição, resistência às sugestões do terapeuta e menor envolvimento com o processo psicoterapêutico (Braga et al., 2018Braga, C., Ribeiro, A. P., Gonçalves, M. M., Oliveira, J. T., Botelho, A., Ferreira, H., & Sousa, I. (2018). Ambivalence resolution in brief psychotherapy for depression. Clinical Psychology & Psychotherapy, 25(3), 369-377. doi: https://doi.org/10.1002/cpp.2169
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). Por outro lado, estudos anteriores têm também demonstrado que a diminuição da ambivalência ao longo do tratamento está associada a melhores resultados terapêuticos e, por isso, à diminuição de sintomatologia (Oliveira et al., 2021Oliveira, J. T., Faustino, D., Machado, P. P. P., Ribeiro, E., Gonçalves, S., & Gonçalves, M. M. (2021). Sudden gains and ambivalence in the unified protocol for transdiagnostic treatment of emotional disorder. International Journal of Cognitive Therapy. doi: https://doi.org/10.1007/s41811-021-00106-w
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). Outro motivo provável para essa associação pode estar no sofrimento advindo da sensação, por parte do cliente, de que não consegue ou não é capaz realizar a mudança. No estudo realizado por Braga et al. (2019Braga, C., Ribeiro, A. P., Sousa, I., & Gonçalves, M. M. (2019) Ambivalence predicts symptomatology in cognitive-behavioral and narrative therapies: An exploratory study. Front. Psychol. 10(1244). doi: https://doi.org/10.3389/fpsyg.2019.01244
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) um nível de maior ambivalência em uma determinada sessão foi associada a uma maior sintomatologia na sessão seguinte. Esse achado reforça a importância clínica da ambivalência e, consequentemente, de um questionário que a avalie de forma eficaz e rápida, direcionando a atuação clínica.

Considerações Finais

O Questionário de Ambivalência em Psicoterapia demonstrou na adaptação brasileira para população clínica geral, após o processo de validação semântica, ser um instrumento adequado, de aplicação rápida e fácil, com propriedades psicométricas satisfatórias. Esse achado possibilita sua utilização na prática da psicologia clínica e nas pesquisas dessa área na realidade brasileira. Borsa et al. (2012Borsa, J. C., Damásio, B. F., & Bandeira, D. R. (2012). Adaptação e validação de instrumentos psicológicos entre culturas: Algumas considerações. Paidéia. 22(53), 423-432. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-863X2012000300014
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) sustentam que não há um consenso na literatura de quantas evidências de validade um instrumento deve possuir para ser considerado válido. Por isso, torna-se interessante que a presente pesquisa seja replicada em outras populações e contextos e com amostra maior para a comparação com os resultados do presente estudo.

Uma das limitações do estudo encontra-se na não validação do URICA para a população pesquisada. Como supracitado, a escolha desse questionário ocorreu por serem extremamente escassos os instrumentos válidos para essa população no contexto brasileiro. Isso reafirma a necessidade da realização de pesquisas que tenham como objetivo o desenvolvimento e/ou adaptação de questionários que avaliem a ambivalência em psicoterapia e/ou os estágios de motivação para a mudança da população clínica geral.

Outra limitação tem relação com o tempo de acompanhamento psicoterapêutico dos participantes. Apesar de o tempo máximo ser de 30 anos, este se tratava de um outlier. O tempo médio de acompanhamento dos pacientes foi de um ano e quatro meses. Isso ocorreu porque grande parte da amostra recebeu atendimento em clínicas escolas, nas quais os estagiários acompanharam o paciente em um período que variou, na maioria dos casos, entre seis meses e um ano. É possível que pacientes com mais tempo de acompanhamento apresentassem menor sentimento de ambivalência e desconforto psicológico e se localizassem mais próximos dos últimos estágios de motivação para a mudança. Portanto, evidencia-se a necessidade da realização da replicação do estudo em outras populações clínicas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    17 Jun 2020
  • Revisado
    21 Abr 2021
  • Aceito
    02 Ago 2021
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