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Relações de Amizade nos Transtornos Alimentares: Revisão Integrativa da Literatura

Friendship Relationships in Eating Disorders: An Integrative Literature Review

Relaciones de Amistad en los Trastornos Alimentarios: Revisión Integradora

Resumo

Ainda é desconhecido o papel da amizade enquanto constitutiva da rede de apoio social nos transtornos alimentares (TAs). Esta revisão integrativa teve por objetivo analisar a produção científica sobre relações de amizade em pessoas com TAs. Foram consultadas as bases PubMed/MEDLINE, LILACS, PsycINFO, Web of Science e EMBASE, de 2010 a 2020. Dos 1126 artigos recuperados, 15 preencheram os critérios de elegibilidade. A maioria tem abordagem qualitativa e delineamento transversal, sem indicar referencial teórico. Aspectos qualitativos das relações de amizade foram associados com redução da frequência e intensidade de sintomas quando o vínculo era considerado de boa qualidade. Já amizades que envolviam comentários depreciativos e influências negativas acerca do corpo e hábitos alimentares foram considerados fatores de risco para desencadeamento dos transtornos. Investir na qualidade dos relacionamentos entre pares pode contribuir para fortalecer a rede de proteção social e reduzir a vulnerabilidade psicossocial de adolescentes com risco para desenvolver TAs.

Palavras-chave:
amizade; relações interpessoais; distúrbios do ato de comer

Abstract

There is still little knowledge about the role of friendship within the social support network in eating disorders (EDs). This integrative review aimed to analyze the scientific production about friendship relationships in people with EDs. The literature review was conducted using the PubMed/MEDLINE, LILACS, PsycINFO, Web of Science, and EMBASE databases in the period from 2010 to 2020. Among the 1126 articles retrieved, 15 met the eligibility criteria, most with a qualitative approach and cross-sectional design, without indicating a theoretical framework. The qualitative aspects of friendship were associated with a reduced frequency and intensity of symptoms when the bond was considered to be of good quality. On the other hand, friendships that involved derogatory comments and negative influences related to body image and eating habits emerged as potential risk factors for triggering disorders. Investing in the quality of peer relationships can contribute to strengthening the social safety net and reducing the psychosocial vulnerability of adolescents at higher risk for developing EDs.

Keywords:
friendship; interpersonal relationships; eating disorders

Resumen

El papel de la amistad como constitutiva de la red de apoyo social en los trastornos alimentarios (TAs) es aún desconocido. Este estudio tiene como objetivo analizar la producción científica sobre las relaciones de amistad en personas con TAs. Se consultaron las bases PubMed/MEDLINE, LILACS, PsycINFO, Web of Science e EMBASE, entre 2010 y 2020. De los 1126 artículos recuperados, 15 cumplían los criterios de elegibilidad. La mayoría tiene enfoque cualitativo y diseño transversal, sin indicar el marco teórico. Los aspectos cualitativos de las relaciones de amistad se asociaron con una menor frecuencia/intensidad de los síntomas cuando el vínculo se consideraba de buena calidad. Amistades que implicaban comentarios despectivos e influencias negativas sobre el cuerpo y los hábitos alimentarios se consideraron factores de riesgo. Invertir en la calidad de las relaciones entre pares puede contribuir a reforzar la red de protección social y reducir la vulnerabilidad de adolescentes con riesgo de desarrollar TAs.

Palabras clave:
amistad; relaciones interpersonales; trastornos alimentarios

O campo da assistência à saúde a pessoas diagnosticadas com Transtornos Alimentares (TAs) enfrenta desafios colocados pela cronicidade do sofrimento psíquico grave e persistente (Fava & Peres, 2011Fava, M. V., & Peres, R. S. (2011). Do vazio mental ao vazio corporal: Um olhar psicanalítico sobre as comunidades virtuais pró-anorexia. Paidéia (Ribeirão Preto), 21(50). https://doi.org/10.1590/S0103-863X2011000300008
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). TAs são quadros psicopatológicos marcados por perturbações no comportamento alimentar, nas quais subjaz uma percepção distorcida da autoimagem e da imagem corporal, que induz o indivíduo a adotar comportamentos nocivos à saúde (Balottin et al., 2017Balottin, L., Mannarini, S., Rossi, M., Rossi, G., & Balottin, U. (2017). The parental bonding in families of adolescents with anorexia: Attachment representations between parents and offspring. Neuropsychiatric Disease and Treatment, 13, 319-327. https://doi.org/10.2147/NDT.S128418
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). Os sintomas resultam em prejuízos significativos em diversas esferas do viver (Gil et al., 2022Gil, M., Simões, M. M., Oliveira-Cardoso, E. A., Pessa, R. P., Leonidas, C., & Santos, M. A. (2022). Percepção de familiares de pessoas com transtornos alimentares acerca do tratamento: Uma metassíntese da literatura. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 38, e38417. https://doi.org/10.1590/0102.3772e38417.pt
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; Valdanha et al., 2013aValdanha, E. D., Scorsolini-Comin, F., Peres, R. S., & Santos, M. A. (2013a). Influência familiar na anorexia nervosa: Em busca das melhores evidências científicas. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 62(3), 225-233. https://doi.org/10.1590/S0047-20852013000300007
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, 2013bValdanha, E. D., Scorsolini-Comin, F., & Santos, M. A. (2013b). Anorexia nervosa e transmissão psíquica transgeracional. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 16(1), 71-88. https://doi.org/10.1590/S1415-47142013000100006
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; Ynomoto et al., 2022Ynomoto, D. I. S., Oliveira-Cardoso, E. A., Valdanha-Ornelas, E. D., Pessa, R. P., Leonidas, C., & Santos, M. A. (2022). Escolha da profissão e da especialidade por médicos de um serviço de transtornos alimentares. Interação em Psicologia, 26(1), 99-110. https://doi.org/10.5380/riep.v26i1.78746
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).

De acordo com a classificação do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª edição - DSM 5, da Associação Psiquiátrica Americana (American Psychiatric Association [APA], 2014Associação Americana de Psiquiatria [APA] (2014). DSM-5: Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (M. I. C. Nascimento, P. H. Machado, R. M. Garcez, R. Pizzato, & S. M. M. da Rosa, Trads.) (5. ed.). Artmed.), os TAs dividem-se em seis tipos, dentre os quais os mais conhecidos são: Anorexia Nervosa (AN), Bulimia Nervosa (BN) e Transtorno da Compulsão Alimentar (TCA). Apesar das similaridades entre os tipos categorizados pelo DSM-5, há diferenças quanto às suas características e especificidades clínicas (Moraes et al., 2021Moraes, R. B., Santos, M. A., & Leonidas, C. (2021). Repercussões do acesso às redes sociais em pessoas com diagnóstico de anorexia nervosa. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 21(3), 1178-1199. https://doi.org/10.12957/epp.2021.62734
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; Rosa & Santos, 2011Rosa, B. P., & Santos, M. A. (2011). Comorbidade entre bulimia e transtorno de personalidade borderline: Implicações para o tratamento. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 14(2), 268-282. https://doi.org/10.1590/S1415-47142011000200005
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).

A pessoa que sofre de AN tipicamente se recusa a manter o peso corporal dentro do mínimo recomendado para sua idade e altura (Fava & Peres, 2011Fava, M. V., & Peres, R. S. (2011). Do vazio mental ao vazio corporal: Um olhar psicanalítico sobre as comunidades virtuais pró-anorexia. Paidéia (Ribeirão Preto), 21(50). https://doi.org/10.1590/S0103-863X2011000300008
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; Scorsolini-Comin et al., 2010Scorsolini-Comin, F., Souza, L. V. E., & Santos, M. A. (2010). A construção de si em um grupo de apoio para pessoas com transtornos alimentares. Estudos de Psicologia (Campinas), 27(4), 467-478. https://doi.org/10.1590/S0103-166X2010000400005
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). Em relação ao funcionamento psicológico, pacientes mostram tendência à introversão patológica e retraimento social, e são vulneráveis a sentimentos de inferioridade, insegurança, exclusão e inadequação (Nunes & Holanda, 2008Nunes, A. L. & Holanda, A. (2008). Compreendendo os transtornos alimentares pelos caminhos da Gestalt-terapia. Revista da Abordagem Gestáltica, 14(2), 172-181.; Siqueira et al., 2020Siqueira, A. B. R., Santos, M. A., & Leonidas, C. (2020). Confluências das relações familiares e transtornos alimentares: Revisão integrativa da literatura. Psicologia Clínica, 32(1), 123-149. https://doi.org/10.33208/PC1980-5438v0032n01A06
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). Constituem traços comuns entre as pessoas acometidas o perfeccionismo exagerado, funcionamento obsessivo e condutas evitativas (Campana et al., 2012Campana, A. N. N. B., Tavares, M. C. G. C. F., & Garcia Júnior, C. (2012). Preocupação e insatisfação com o corpo, checagem e evitação corporal em pessoas com transtornos alimentares. Paidéia (Ribeirão Preto), 22(53), 375-381. https://doi.org/10.1590/S0103-863X2012000300009
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; Oliveira-Cardoso & Santos, 2012Oliveira-Cardoso, E. A., & Santos, M. A. (2012). Avaliação psicológica de pacientes com anorexia e bulimia nervosas: Indicadores do Método de Rorschach. Fractal: Revista de Psicologia [online], 24(1), 159-174. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/fractal/v24n1/v24n1a11.pdf
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; Santos & Costa-Dalpino, 2019Santos, M. A., & Costa-Dalpino, L. R. S. (2019). Relação pai-filha e transtornos alimentares: Revisando a produção científica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 35(spe), e35nspe3. https://doi.org/10.1590/0102.3772e35nspe3
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; Scorsolini-Comin & Santos, 2012Scorsolini-Comin, F., & Santos, M. A. (2012). Psicoterapia como estratégia de tratamento dos transtornos alimentares. Estudos de Psicologia (Campinas), 29(suppl 1), 851-863. https://doi.org/10.1590/S0103-166X2012000500021
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).

Pacientes com diagnóstico de BN se caracterizam por suscetibilidade a episódios de compulsão alimentar periódica, acompanhados da adoção de métodos compensatórios inadequados para evitar o ganho de peso, como vômitos autoinduzidos, uso de laxantes, diuréticos e enemas (Rosa & Santos, 2011Rosa, B. P., & Santos, M. A. (2011). Comorbidade entre bulimia e transtorno de personalidade borderline: Implicações para o tratamento. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 14(2), 268-282. https://doi.org/10.1590/S1415-47142011000200005
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; Valdanha et al., 2013bValdanha, E. D., Scorsolini-Comin, F., & Santos, M. A. (2013b). Anorexia nervosa e transmissão psíquica transgeracional. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 16(1), 71-88. https://doi.org/10.1590/S1415-47142013000100006
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). As características mais comuns identificadas na personalidade das pessoas com BN são: baixa autoestima, impulsividade, pensamento do tipo “tudo ou nada incapacidade de encontrar formas saudáveis de obtenção de prazer e satisfação na vida, tendência a buscar problemas mesmo em questões corriqueiras, elevada exigência e perfeccionismo que acentuam a incapacidade de “ser feliz” e fruir a vida com leveza (Oliveira-Cardoso & Santos, 2012Oliveira-Cardoso, E. A., & Santos, M. A. (2012). Avaliação psicológica de pacientes com anorexia e bulimia nervosas: Indicadores do Método de Rorschach. Fractal: Revista de Psicologia [online], 24(1), 159-174. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/fractal/v24n1/v24n1a11.pdf
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). Como resultado desse padrão de funcionamento, é comum que as pessoas acometidas encontrem dificuldades em desenvolver e sustentar redes sociais saudáveis, uma vez que tendem a apresentar dificuldades nas relações interpessoais e desajustamento social agravado por vivências de exclusão (Limbert, 2010Limbert, C. (2010). Perceptions of social support and eating disorder characteristics. Health Care for Women International, 31(2), 170-178. https://doi.org/10.1080/07399330902893846
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; Rorty et al.,1999Rorty, M., Yager, J., Buckwalter, J. G., & Rossotto, E. (1999). Social support and recovery status in bulimia nervosa. The International Journal of Eating Disorders, 26(1), 1-12. https://doi.org/10.1002/(sici)1098-108x(199907)26:1<1::aid-eat1>3.0.co;2-i
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).

A despeito das particularidades entre os quadros clínicos, algumas similaridades são evidenciadas. Tanto na BN como na AN preocupação obsessiva com o peso e grave distorção da imagem corporal desempenham papel crucial na manifestação do sofrimento, além de influenciarem a autoestima dos pacientes (Oliveira & Santos, 2006Oliveira-Cardoso, E. A., & Santos, M. A. (2012). Avaliação psicológica de pacientes com anorexia e bulimia nervosas: Indicadores do Método de Rorschach. Fractal: Revista de Psicologia [online], 24(1), 159-174. Recuperado de http://www.scielo.br/pdf/fractal/v24n1/v24n1a11.pdf
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) e serem prejudiciais ao desenvolvimento saudável (Fava & Peres, 2011Fava, M. V., & Peres, R. S. (2011). Do vazio mental ao vazio corporal: Um olhar psicanalítico sobre as comunidades virtuais pró-anorexia. Paidéia (Ribeirão Preto), 21(50). https://doi.org/10.1590/S0103-863X2011000300008
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; Leonidas et al., 2019Leonidas, C., Nazar, B. P., Munguía, L., & Santos, M. A. (2019). How do we target the factors that maintain anorexia nervosa? A behaviour change taxonomical analysis. International Review of Psychiatry, 31(4), 403-410. https://doi.org/10.1080/09540261.2019.1624509
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). Com etiologia multifatorial, os TAs impõem desafios ao diagnóstico e tratamento (APA, 2014Associação Americana de Psiquiatria [APA] (2014). DSM-5: Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (M. I. C. Nascimento, P. H. Machado, R. M. Garcez, R. Pizzato, & S. M. M. da Rosa, Trads.) (5. ed.). Artmed.). Por cursarem com várias comorbidades e incidirem em período crítico do desenvolvimento, as duas constelações psicopatológicas podem resultar em prejuízos biológicos, psicológicos e sociais irreversíveis, especialmente quando iniciam na adolescência, agravando o padrão de morbimortalidade (Leonidas & Santos, 2017Leonidas, C., & Santos, M. A. (2017). Emotional meanings assigned to eating disorders: Narratives of women with anorexia and bulimia nervosa. Universitas Psychologica, 16(4), 189-201. https://doi.org/10.11144/javeriana.upsy16-4.emae
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; Valdanha-Ornelas & Santos, 2016Valdanha-Ornelas, E. D., & Santos, M. A. (2016). Family psychic transmission and anorexia nervosa. Psico-USF, 21(3), 635-649. https://doi.org/10.1590/1413-82712016210316
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). Estimam-se que, anualmente, milhões de pessoas sejam acometidas por algum tipo de TA, sendo aproximadamente 90% adolescentes do sexo feminino (Ferreira & Bossi, 2021Ferreira, P. J., & Bossi, T. J. (2021). A produção científica sobre transtornos alimentares na área da psicologia. Psicologia Revista, 30(2), 433-458. https://doi.org/10.23925/2594-3871.2021v30i2p433-458
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; Santos & Pessa, 2022Gil, M., Simões, M. M., Oliveira-Cardoso, E. A., Pessa, R. P., Leonidas, C., & Santos, M. A. (2022). Percepção de familiares de pessoas com transtornos alimentares acerca do tratamento: Uma metassíntese da literatura. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 38, e38417. https://doi.org/10.1590/0102.3772e38417.pt
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).

Por se tratar de condição crônica e recidivante, e por mobilizar intensa carga emocional, a incidência de um TA em um membro familiar implica em diversas alterações e prejuízos na vida não apenas do indivíduo acometido, como também das pessoas pertencentes à sua rede social, como amigos e familiares (Leonidas & Santos, 2015Leonidas, C., & Santos, M. A. (2015). Family relations in eating disorders: The Genogram as instrument of assessment. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1435-1447. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.07802014
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; Valdanha et al., 2013aValdanha, E. D., Scorsolini-Comin, F., Peres, R. S., & Santos, M. A. (2013a). Influência familiar na anorexia nervosa: Em busca das melhores evidências científicas. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 62(3), 225-233. https://doi.org/10.1590/S0047-20852013000300007
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; Valdanha-Ornelas et al., 2021Valdanha-Ornelas, E., Squires, C., Barbieri, V., & Santos, M. A. (2021). Family relationships in bulimia nervosa. Psicologia em Estudo (Maringá), 26, e17361. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v26i0.47361
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). Sluzki (1997, p. 41) propõe o construto de rede social pessoal (ou rede social significativa), entendida como “a soma de todas as relações que um indivíduo percebe como significativas ou define como diferenciadas da massa anônima da sociedade”. Segundo o autor, a identidade pessoal é construída e reconstruída contínua e gradativamente ao longo de todo o ciclo vital, tendo como base as interações com o outro - familiares, vizinhos, amigos, adversários, conhecidos, companheiros de grupos e demais membros da comunidade (Scorsolini-Comin et al., 2010Scorsolini-Comin, F., Souza, L. V. E., & Santos, M. A. (2010). A construção de si em um grupo de apoio para pessoas com transtornos alimentares. Estudos de Psicologia (Campinas), 27(4), 467-478. https://doi.org/10.1590/S0103-166X2010000400005
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; Souza & Santos, 2009Souza, L. V., & Santos, M. A. (2009). A construção social de um grupo multifamiliar no tratamento dos transtornos alimentares. Psicologia: Reflexão e Crítica, 22(3), 483-492. https://doi.org/10.1590/S0102-79722009000300020
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, 2014Souza, L. V., & Santos, M. A. (2014). Transtorno alimentar e construção de si no relacionamento profissional-usuário. Psicologia & Sociedade, 26(2), 506-516. https://doi.org/10.1590/S0102-71822014000200026
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).

Tendo em vista a centralidade dos relacionamentos sociais no desenvolvimento individual (Sluzki, 1997) e em conformidade com os achados da literatura (Attili et al., 2018Attili, G., Di Pentima, L., Toni, A., & Roazzi, A. (2018). High anxiety attachment in eating disorders: Intergenerational transmission by mothers and fathers. Paidéia (Ribeirão Preto), 28, e2813. https://doi.org/10.1590/1982-4327e2813
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; Rorty et al., 1999Rorty, M., Yager, J., Buckwalter, J. G., & Rossotto, E. (1999). Social support and recovery status in bulimia nervosa. The International Journal of Eating Disorders, 26(1), 1-12. https://doi.org/10.1002/(sici)1098-108x(199907)26:1<1::aid-eat1>3.0.co;2-i
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), que apontam que pessoas com TAs mostram dificuldades no estabelecimento e manutenção de relacionamentos interpessoais e afetivos, há evidências de que o comprometimento na vincularidade pode estar relacionado com a predisposição, perpetuação e/ou manutenção dos sintomas que articulam esses transtornos mentais. Essas dificuldades de formar e manter vínculos se refletem nas elevadas taxas de abandono do tratamento (Souza et al., 2019Souza, A. P. L., Valdanha-Ornelas, É. D., Santos, M. A., & Pessa, R. P. (2019). Significados do abandono do tratamento para pacientes com transtornos alimentares. Psicologia: Ciência e Profissão, 39, e188749, 1-16. https://doi.org/10.1590/1982-3703003188749
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).

Martire e Schulz (2007Martire, M. L., & Schulz, R. (2007). Involving family in psychosocial interventions for chronic illness. Current Directions in Psychological Science, 16, 90-94. https://doi.org/10.1111/j.1467-8721.2007.00482.x
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) apontam para a função significativa e geralmente positiva que as relações sociais exercem nos sistemas biológicos, especialmente no sistema neuroendócrino-imunológico, favorecendo os comportamentos de saúde e bem-estar psicológico dos indivíduos. Com base nessa premissa, postula-se que a inclusão e envolvimento de outras pessoas no tratamento e acompanhamento de pacientes acometidos por quadros crônicos, que muitas vezes se mostram refratários ao tratamento, tais como se observa nos TAs (Ferreira & Bossi, 2021Ferreira, P. J., & Bossi, T. J. (2021). A produção científica sobre transtornos alimentares na área da psicologia. Psicologia Revista, 30(2), 433-458. https://doi.org/10.23925/2594-3871.2021v30i2p433-458
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), podem repercutir positivamente e gerar benefícios para a evolução do quadro clínico. Poder contar com o benefício de relações saudáveis tem sido associado a ganhos importantes na qualidade de vida das pessoas em geral (Abreu-Rodrigues & Seidl, 2008Abreu-Rodrigues, M., & Seidl, E. M. F. (2008). A importância do apoio social em pacientes coronarianos. Paidéia (Ribeirão Preto), 18(40), 279-288. https://doi.org/10.1590/S0103-863X2008000200006
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).

Estudo avaliou os padrões transacionais e relacionais em famílias de mulheres com TAs, por meio da utilização do Genograma (Leonidas & Santos, 2015Leonidas, C., & Santos, M. A. (2015). Family relations in eating disorders: The Genogram as instrument of assessment. Ciência & Saúde Coletiva, 20(5), 1435-1447. https://doi.org/10.1590/1413-81232015205.07802014
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). A dinâmica das relações familiares caracterizou-se pelo predomínio de padrões vinculares conflituados. As participantes mantinham relação de aliança estreita com suas mães, configurando um padrão fusional. A marcada indiferenciação psíquica entre mãe e filha suscita conflitos e tensionamentos constantes nas interações da díade, contrastando com o relacionamento com o pai, cujo padrão vincular se mostrou emocionalmente distante e/ou vulnerável. O vínculo com os irmãos foi caracterizado como harmônico ou de aliança. No que concerne à qualidade do vínculo conjugal dos pais, constatou-se empobrecimento e triangulação, e para as participantes que haviam constituído família, o relacionamento do casal também se mostrou marcado por conflitos e vulnerabilidade.

Tendo em vista que há evidências de que a qualidade do vínculo nos relacionamentos de amizade exerce influência positiva no processo de reabilitação psicossocial de indivíduos com TAs, a recuperação pode ser dificultada quando as pacientes se sentem sozinhas e nutrem forte convicção de que não serão mais aceitas no seu contexto social (Davies, 2004Davies S. (2004). A group-work approach to addressing friendship issues in the treatment of adolescents with eating disorders. Clinical Child Psychology and Psychiatry, 9, 519-531. https://doi.org/10.1177/1359104504046157
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). Dessa maneira, a rede social e seu potencial de apoio podem ficar comprometidos em jovens com TAs, o que contribui para agravar - e, em alguns casos, perpetuar - o sofrimento psíquico, constituindo um dos fatores que podem contribuir para a tenacidade dos sintomas e a cronicidade do quadro psicopatológico (Rorty et al., 1999Rorty, M., Yager, J., Buckwalter, J. G., & Rossotto, E. (1999). Social support and recovery status in bulimia nervosa. The International Journal of Eating Disorders, 26(1), 1-12. https://doi.org/10.1002/(sici)1098-108x(199907)26:1<1::aid-eat1>3.0.co;2-i
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).

Para além dos eventuais aspectos positivos da amizade em pessoas que se encontram em tratamento para TAs, Forney et al. (2012Forney, K. J., Holland, L. A., & Keel, P. K. (2012). Influence of peer context on the relationship between body dissatisfaction and eating pathology in women and men. The International Journal of Eating Disorders, 45(8), 982-989. https://doi.org/10.1002/eat.22039
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) apontam para os riscos que a influência dos pares e os comentários depreciativos recebidos sobre aparência corporal podem exercer no estabelecimento das condições propícias à configuração sintomatológica dos TAs. Os achados obtidos sustentam a hipótese de que comentários de amigas(os) sobre peso e dietas alimentares, principalmente dentro de contextos sociais femininos, modulam a relação entre insatisfação corporal e TAs. Dessa maneira, segundo os autores, para promover mudança saudável e duradoura na vida das pacientes, especialmente jovens e adolescentes, é necessário implementar programas de prevenção de TAs que focalizem as relações de amizade e as influências dos pares.

Ao considerar o alcance potencial das relações de amizade no processo de tratamento e na preservação da qualidade de vida de pacientes com TAs, não se pode perder de vista que estas também podem exercer influência negativa na evolução do quadro clínico, principalmente no contexto de adolescentes do sexo feminino (Forney et al., 2012Forney, K. J., Holland, L. A., & Keel, P. K. (2012). Influence of peer context on the relationship between body dissatisfaction and eating pathology in women and men. The International Journal of Eating Disorders, 45(8), 982-989. https://doi.org/10.1002/eat.22039
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). Todavia, ainda é pouco conhecido o lugar da amizade como parte da rede de apoio social nos TAs. É possível questionar se - e em que condições - a interação com pares exerce um papel salutar e potencializador de mudanças positivas no contexto do tratamento. Destarte, é relevante investigar qual o papel das amizades no desenvolvimento, perpetuação e prevenção dos sintomas na perspectiva das pessoas que convivem com o problema, dando visibilidade e escuta para que as pessoas com TAs possam compartilhar os significados que atribuem às suas experiências.

Considerando essas questões, considera-se relevante elaborar uma revisão com o intuito de mapear e integrar o conhecimento produzido na última década, o que permitiria fornecer subsídios para a elaboração de estratégias e programas de intervenção sensíveis à necessidade de lançar um olhar mais abrangente para o potencial suportivo da malha vincular extrafamiliar de pacientes com psicopatologias alimentares. Conhecer o estado da arte do conhecimento produzido sobre os laços de amizade pode oferecer uma oportunidade para examinar se - e como - eles influenciam a sintomatologia da AN e BN, permitindo compreender melhor as dinâmicas psicossociais envolvidas. Assim, este estudo teve por objetivo sintetizar e analisar a produção científica sobre as relações de amizade em pessoas com TAs.

Método

Trata-se de uma pesquisa documental, descritiva e retrospectiva, que se caracteriza como uma revisão integrativa da literatura (Broome, 2000Broome, M. E. (2000). Integrative literature reviews for the development of concepts. Em B. L. Broome, M. E. (2000). Integrative literature reviews for the development of concepts. Em B. L. Rodgers & K. A. Knafl (Org.), Concepts development in nursing: Foundations, techniques and applications (2nd ed., pp. 231-250). W. B. Saunders.). Considerando que a revisão integrativa da literatura é uma estratégia apropriada para sintetizar de forma sistemática o conhecimento produzido no contexto nacional e internacional (Goulart et al., 2019Goulart, S. A., Oliveira, A. C. G. A., Scorsolini-Comin, F., & Santos, M. A. (2019). Fatores relacionados aos casamentos de longa duração: Panorama a partir de uma revisão integrativa. Psico, 50(2), 30370. https://doi.org/10.15448/1980-8623.2019.2.30370
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), adotou-se o recorte temporal de 10 anos para que se pudesse manter o foco na produção científica mais recente sobre o tema investigado (Simões & Santos, 2021Simões, M. M., & Santos, M. A. (2021). Paternity and parenting in the context of eating disorders: An integrative literature review. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 37, e37441. https://doi.org/10.1590/0102.3772e37441
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).

Para o delineamento da estratégia de busca (Figura 1) e elaboração da questão norteadora foi utilizada a estratégia PIO. Essa estratégia contempla os seguintes elementos sintetizados no acrônimo: P=população (pacientes com sintomas de TAs); I=intervenção (achados de pesquisa sobre cuidados e manejos de sintomas de TAs) e O=desfecho (ou resultado: a influência de amigos/as no desencadeamento, manutenção e prevenção dos sintomas). O levantamento dos estudos ocorreu em janeiro de 2021 e foi guiado pela seguinte questão norteadora: “Qual a influência das relações de amizade no desencadeamento, manutenção e prevenção (O) de sintomas de TAs (I) em população clínica e não clínica (P)?”

Figura 1
Fluxograma das etapas de busca e seleção dos artigos segundo as diretrizes PRISMA.

Para alcançar o objetivo do estudo foram cumpridas as seis etapas da revisão integrativa propostas por Broome (2000Broome, M. E. (2000). Integrative literature reviews for the development of concepts. Em B. L. Broome, M. E. (2000). Integrative literature reviews for the development of concepts. Em B. L. Rodgers & K. A. Knafl (Org.), Concepts development in nursing: Foundations, techniques and applications (2nd ed., pp. 231-250). W. B. Saunders.), que consistem em: (1) elaboração da questão norteadora; (2) busca sistemática na literatura sobre relações de amizade no contexto dos TAs; (3) coleta de dados; (4) categorização dos estudos; (5) análise crítica e descritiva dos resultados e interpretação; (6) síntese do conhecimento produzido e identificação das lacunas da produção científica.

A busca dos artigos foi realizada em janeiro de 2021, concomitantemente nas cinco bases utilizadas. A seleção e avaliação dos estudos foi realizada de modo independente e cegada por dois revisores experientes e treinados no uso do método [FCM; MAS], obedecendo aos critérios de elegibilidade. Seguindo os passos preconizados pela literatura (Carvalho et al., 2019Carvalho, L. F., Pianowski, G., & Santos, M. A. (2019). Guidelines for conducting and publishing systematic reviews in Psychology. Estudos de Psicologia (Campinas), 36, e180144. https://doi.org/10.1590/1982-0275201936e180144
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), primeiramente os revisores realizaram a leitura do título e resumo dos artigos identificados. Nessa etapa, foi possível descartar parte substancial dos estudos identificados pelo fato de não se enquadrarem nos critérios de inclusão/exclusão. As discordâncias foram verificadas e resolvidas em consenso ou por um terceiro revisor. Em seguida, também de forma independente, foi realizada a leitura integral dos estudos que preencheram os critérios de elegibilidade, para confirmação da pertinência ou não de sua inclusão na revisão.

A coleta de dados incluiu periódicos indexados nas bases PubMed/MEDLINE, LILACS, PsycINFO, Web of Science e EMBASE. As palavras-chave e descritores controlados utilizados para a pesquisa nas bases de dados foram: “Friend”, “Companions”, “Companion”, “Friendship”, “Friendships”, “Acquaintances”, “Feeding and Eating Disorders”, “Anorexia”, “Bulimia”. Esses descritores foram escolhidos utilizando-se as terminologias do DeCS - Descritores em Ciências da Saúde e do MeSH - Medical Subject Headings, bem como os entry terms e demais palavras-chave empregadas em estudos que abordam a temática.

Os descritores foram combinados utilizando-se os operadores booleanos AND e OR, até que se obtivessem artigos nos diferentes arranjos, de acordo com os critérios de inclusão adotados. Para operacionalizar as buscas foi utilizada uma rede de serviços disponibilizada por uma universidade pública do Estado de São Paulo, que permite o acesso às bases de dados e aos conteúdos dos periódicos indexados, o que possibilitou extrair os artigos na íntegra. Os dois avaliadores, trabalhando de forma independente, tiveram acesso à totalidade dos artigos selecionados segundo os critérios de elegibilidade.

Na busca foram considerados os seguintes critérios de inclusão: (1) artigos publicados no período de janeiro de 2010 a dezembro de 2020; (2) artigos publicados em língua portuguesa, inglesa ou espanhola; (3) estudos empíricos que abordassem a temática das relações de amizade no contexto dos TAs; (4) que disponibilizassem o resumo na base de dados; (5) que respondessem à questão norteadora da revisão. Os critérios de exclusão foram: (1) artigos que tratavam de outros transtornos que não se enquadram nos critérios diagnósticos de TAs; (2) artigos que abordavam as redes sociais no geral, sem focalizar especificamente as relações de amizade; (3) publicações no formato de dissertação, tese, livro, capítulo de livro, resenha, manual, editorial, carta ao editor, comentário ou crítica; (4) estudos de revisão de literatura.

Os procedimentos operacionalizados empregados para a composição do corpus de pesquisa foram representados graficamente por meio de um fluxograma, desenhado de acordo com as diretrizes da estratégia PRISMA (Guidelines for Reporting of Systematic Review) para descrição do procedimento de busca e relato do processo de inclusão dos estudos (Liberati et al., 2009Liberati, A., Altman, D. G., Tetzlaff, J., Mulrow, C., Gotzsche, P. C. Ioannidis, J. P. A., & Moher, D. (2009). The PRISMA statement for reporting systematic reviews and meta-analyses of studies that evaluate health care interventions: Explanation and elaboration. PLoS Medicine, 6(7), e1000100. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1000100
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). A Figura 1 detalha o processo de busca e seleção dos estudos elegíveis para a revisão integrativa.

O gerenciador de referências online Rayyan foi utilizado para organizar os estudos primários e eliminar os duplicados (Ouzzani et al., 2016). Para a seleção inicial dos estudos, os avaliadores revisaram os títulos e resumos, de acordo com os critérios de inclusão/exclusão estabelecidos. Nessa etapa preliminar os estudos duplicados e que não atendiam aos critérios de inclusão foram removidos. As listas elaboradas pelos revisores foram sistematicamente ordenadas com amparo do software e, posteriormente, comparadas entre si de forma sistemática para validação da seleção da amostra. O resultado da seleção foi validado pelo cálculo do coeficiente Kappa, que alcançou índice de concordância inter-juízes de 0,89, indicando uma concordância quase perfeita (Viera & Garrett, 2005).

Os artigos selecionados de acordo com os critérios de inclusão e exclusão foram localizados, recuperados na íntegra e armazenados no gerenciador de referências, constituindo o corpus de análise. Para avaliação da qualidade metodológica dos estudos foram utilizados os critérios fornecidos pela ferramenta Critical Appraisal Skills Programme - CASP (2018Critical Appraisal Skills Programme. (2018). CASP (10 questions to help you make sense of a qualitative research) Checklist. Recuperado de https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/3.0/
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), que auxilia na análise crítica de relatos de pesquisa quanto ao rigor, credibilidade e relevância. Antes do início da avaliação crítica dos estudos, as decisões acerca das pontuações foram acordadas entre os revisores. A avaliação considerou as ferramentas adequadas para cada tipo de desenho incluído. Os estudos foram classificados em duas categorias: a primeira, constituída pelas investigações com pequeno viés de risco, e a segunda, pelos estudos com viés de risco moderado.

A leitura cuidadosa do material permitiu extrair as informações de interesse, utilizando-se para tanto um formulário validado (Valdanha et al., 2013aValdanha, E. D., Scorsolini-Comin, F., Peres, R. S., & Santos, M. A. (2013a). Influência familiar na anorexia nervosa: Em busca das melhores evidências científicas. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 62(3), 225-233. https://doi.org/10.1590/S0047-20852013000300007
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), que contempla os seguintes itens: identificação do estudo primário (título, ano de publicação, periódico, país de origem), objetivo, características metodológicas (delineamento do estudo conforme a nomenclatura utilizada pelos autores e amostra) e principais desfechos encontrados.

Os resultados foram organizados em uma planilha e, com base na abordagem proposta por Minayo (2013Minayo, M. C. S. (2013). O desafio do conhecimento: Pesquisa qualitativa em saúde (13. ed.). Hucitec.), submetidos à análise temática com amparo do software Atlas.ti. Após repetidas leituras, foram selecionados os conteúdos mais significativos dos relatos. Em seguida, os trechos selecionados foram agrupados por similaridade de conteúdo, sob a forma de núcleos temáticos que abordavam temas diretamente relacionados ao objetivo da pesquisa. Finalmente, foram elaboradas as categorias temáticas, de modo a possibilitar uma descrição abrangente do assunto em questão e uma análise crítica da produção científica.

Resultados e Discussão

A busca nas bases de dados resultou em 1126 estudos, que responderam aos descritores utilizados nas trilhas de busca. Após a leitura dos títulos e resumos e, posteriormente, dos artigos selecionados para leitura na íntegra, 15 atenderam aos critérios de inclusão e exclusão. Todos os estudos selecionados estavam disponíveis na íntegra e foram capturados por meio da rede de serviços que permite o acesso aos periódicos. A Tabela 1 apresenta uma caracterização dos estudos que compõem o corpus de análise.

Tabela 1
Caracterização dos estudos que compõem o corpus de análise

Do total de títulos e resumos selecionados, o maior número foi encontrado na base de dados EMBASE, totalizando 519, sendo que a PsycINFO retornou o menor número (apenas oito). Concluídas as etapas de triagem e seleção preliminar dos artigos, observou-se que a maior parte dos artigos que compõem o corpus da revisão era proveniente da base Web of Science (artigos 2, 5, 7, 9 e 15), enquanto, no extremo oposto, dos resultados inicialmente obtidos por meio da PsycINFO, nenhum restou selecionado para compor esta revisão. LILACS (artigos 8, 10 e 11) e PubMed/MEDLINE (artigos 1, 6, 13) retornaram três artigos cada e EMBASE retornou quatro artigos (artigos 3, 4, 12 e 14).

Os artigos revisados se distribuíram em uma variedade de revistas científicas. Em relação à natureza dos periódicos, a maioria dos artigos se concentra em revistas multidisciplinares, totalizando nove (60%, artigos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9, 12). Em seguida, a segunda maior área de concentração foi nos periódicos de psicologia, com quatro artigos (26,66%, artigos 8, 10, 11 e 13). Apenas um artigo (6,66%, artigo 14) foi publicado em uma revista do campo da psiquiatria. Por fim, um estudo (6,66%, artigo 15) foi encontrado em um periódico de ciências sociais. Apesar de a maior parte das revistas científicas se concentrarem na área interdisciplinar, quando observadas somente aqueles campos disciplinares que contam com mais de um artigo no corpus da revisão, predomina a área da psicologia.

No que diz respeito ao país de origem dos pesquisadores dos artigos selecionados para compor o corpus desta revisão, Reino Unido e Espanha são os que mais se destacaram em número de estudos relacionados à temática de interesse, ambos com três artigos: Reino Unido (3, 5 e 6) e Espanha (9, 12 e 15). Um estudo transcultural (13) foi produzido em coautoria por pesquisadores da Áustria, Eslovênia e Itália (quando somados, os países europeus perfazem 46,67% dos artigos). O Brasil é o único país sul-americano que conta com publicações sobre a temática, com três estudos selecionados (20%, artigos 8, 10 e 11). Os demais artigos se distribuem por diversos países de origem: França (artigo 1), Suécia (artigo 2), Estados Unidos (artigo 4), Bélgica (artigo 7) e Iraque (artigo 14).

Quanto ao idioma no qual foram redigidos os artigos selecionados, a quase totalidade foi publicada em inglês (80%). Três (20%) foram escritos apenas em português e nenhum em espanhol. Quanto ao ano de publicação, os estudos selecionados foram publicados no intervalo de 2011 a 2020. Os anos de 2012, 2013 e 2016 foram os que mais concentraram publicações no tema de interesse, com três artigos cada. Os demais tiveram distribuição diluída pelos anos: 2011 (1), 2014 (1), 2015 (2), 2018 (1) e 2020 (1).

Em relação ao tamanho das amostras estudadas foi possível notar grande variabilidade, desde uma única participante (estudo de caso individual, artigos 10 e 14) até amostras robustas não clínicas, como a constituída por 1528 estudantes (artigo 13). Quanto ao delineamento metodológico, do total, nove estudos utilizaram abordagem qualitativa (artigos 2, 5, 6, 7, 8, 10, 11, 14 e 15) e seis empregaram métodos quantitativos (artigos 1, 3, 4, 9, 12 e 13). Portanto, a maioria dos artigos aborda as relações de amizade no contexto dos TAs por meio de métodos qualitativos.

Nenhum estudo que compôs o corpus apresentou delineamento do tipo longitudinal. Dentre os estudos realizados com amostra clínica, ou seja, naqueles que arregimentaram participantes que apresentavam algum tipo de TA identificado por sistema classificatório utilizado por especialistas, os diagnósticos mais frequentes foram AN e BN. A maior parte dos estudos destacou a percepção pessoal que os(as) participantes têm sobre a amizade, assim como as influências (positivas e/ou negativas) dos amigos em diversas esferas da vida.

A partir da leitura e análise crítica dos artigos selecionados, foram identificados os temas mais recorrentes, que possibilitaram categorizar os resultados obtidos e, assim, delimitar os eixos temáticos que orientam os estudos primários. Foram elaboradas três categorias: Características das relações de amizade, Amizade como fator protetivo e Amizade como fator de risco. Essas categorias concentram seis temas. A categoria que agregou maior número de temas concerne às características das relações de amizade, compreendendo 42,85% dos artigos. O resultado mais recorrente dos estudos foi codificado sob o tema: “isolamento social como consequência dos sintomas”, identificado em 46,66% das publicações, sendo elencado na categoria que trata das amizades como fator de risco. Em seguida, os temas “comentários negativos e bullying nos contextos de amizade”, “amizades no contexto dos TAs” e “amizades fora do contexto dos TAs” foram identificados em 26,66% dos artigos cada. O somatório excede 100% porque alguns artigos forneceram material para mais de um tema simultaneamente.

A categoria Características das relações de amizade diz respeito à estrutura, dinâmica e padrões de funcionamento dos relacionamentos de amizade. Foram identificados os temas: “amizades no contexto dos TAs” (n=4, artigos 3, 5, 6 e 15), “amizades fora do contexto dos TAs” (n=4, artigos 5, 7, 10 e 12) e “amizades virtuais” (n=2, artigos 6 e 15). Dentre os temas elencados, destacam-se as amizades virtuais, devido à sua forte presença no cotidiano das participantes. Dois dos estudos selecionados para o corpus da revisão tiveram como objetivo analisar as interações sociais estabelecidas dentro do ambiente digital, mais especificamente em grupos voltados para jovens com TAs. No ambiente digital, onde o anonimato, a ocultação do corpo físico e a possibilidade de a pessoa mostrar ser o que nem sempre condiz com a realidade, pode-se habitar um mundo imaginário e fantasioso.

Os jovens relataram ter mais facilidade em socializar e fazer amigos nas plataformas digitais, uma vez que suas dificuldades de socialização são intimamente relacionadas com sustentar interações face a face, dado o desconforto sentido com o corpo e o olhar nos olhos do outro (Kendal et al., 2017Kendal, S., Kirk, S., Elvey, R., Catchpole, R., & Pryjmachuk, S. (2017). How a moderated online discussion forum facilitates support for young people with eating disorders. Health Expectations: International Journal of Public Participation in Health Care and Health Policy, 20(1), 98-111. https://doi.org/10.1111/hex.12439
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). Segundo os autores do estudo, as barreiras para a busca de ajuda dentro do ambiente virtual são menores do que fora dele, possibilitando que o jovem encontre suporte de uma forma mais fácil do que em situações presenciais. Para muitos desses jovens, a experiência de compartilhar com familiares e amigos suas vivências com o TA é dolorosa e permeada por medo, insegurança, incompreensão e temor de rejeição. Por esse motivo, ao abordar os laços estabelecidos nos grupos online, Cantó-Milà (2011Milà, N., & Seebach, S. (2011). Ana’s friends. Friendship in online Pro-Ana communities. Sociological Research Online, 16. https://doi.org/10.5153/sro.2267
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) argumenta que são amizades construídas em torno de um segredo (os sintomas, em geral, são ocultados da percepção dos pais), o que acaba por fortalecer os vínculos e a sensação de cumplicidade entre aqueles que compartilham da informação de natureza sigilosa. Para além do caráter confidencial das trocas, os pacientes também destacaram a importância de receberem suporte diretamente de seus pares, de manterem amizades com pessoas que também enfrentam adversidades e situações semelhantes, e exaltaram o potencial de apoio das comunidades virtuais.

O tema Amizades no contexto dos TAs envolveu estudos que valorizaram as relações estabelecidas entre pares que apresentam sofrimento relacionado a alguma psicopatologia do comportamento alimentar. Kendal et al. (2017Kendal, S., Kirk, S., Elvey, R., Catchpole, R., & Pryjmachuk, S. (2017). How a moderated online discussion forum facilitates support for young people with eating disorders. Health Expectations: International Journal of Public Participation in Health Care and Health Policy, 20(1), 98-111. https://doi.org/10.1111/hex.12439
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) apontam para os impactos que o papel de “mentor”, exercido por um par, pode exercer no bem-estar desses jovens. Em uma investigação conduzida em um fórum online foram analisadas as relações estabelecidas por jovens com TAs que frequentavam regularmente o grupo. Os usuários compartilham dicas e conselhos que podem ajudar outros na recuperação, tais como utilizar diários pessoais para descrever suas experiências, além de outras sugestões de atividades que têm como objetivo favorecer a “distração”, isto é, que a pessoa tire do seu foco de atenção suas dificuldades alimentares. Dentre os comentários dos jovens, extraídos da plataforma, uma participante agradeceu publicamente a ajuda recebida de outro participante, declarando que, graças aos seus conselhos e às experiências compartilhadas, conseguiu se abrir e revelar pela primeira vez sobre o seu TA para um amigo (Kendal et al., 2017Kendal, S., Kirk, S., Elvey, R., Catchpole, R., & Pryjmachuk, S. (2017). How a moderated online discussion forum facilitates support for young people with eating disorders. Health Expectations: International Journal of Public Participation in Health Care and Health Policy, 20(1), 98-111. https://doi.org/10.1111/hex.12439
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). Tal situação reflete os aspectos protetivos das amizades estabelecidas com pares que também desenvolveram TAs, uma vez que o intercâmbio de experiências por pessoas que estão em níveis distintos de progressão no tratamento pode ser benéfico tanto para quem recebe quanto para quem oferece ajuda.

De forma análoga, ao analisar as relações estabelecidas entre pacientes internados em uma enfermaria especializada no tratamento de TAs, estudo sistematizou resultados que vão ao encontro das conclusões dos outros artigos já apresentados (Malmendier-Muehlschlegel et al., 2016Malmendier-Muehlschlegel, A., Rosewall, J. K., Smith, J. G., Hugo, P., & Lask, B. (2016). Quality of friendships and motivation to change in adolescents with anorexia nervosa. Eating Behaviors, 22, 170-174. https://doi.org/10.1016/j.eatbeh.2016.06.010
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). Embora os participantes também compartilhassem suas ideações distorcidas e influências que reforçavam os sintomas de TAs, eles também se apoiavam mutuamente no ambiente de tratamento e consideraram a ajuda fornecida e recebida entre os membros mais útil e resolutiva do que o suporte de familiares e amigos externos ao universo da doença. Este é um achado saliente encontrado em estudos que abordam a grupalidade no contexto de tratamento dos TAs.

Embora reconheça o valor da partilha de apoio e ajuda mútua entre pacientes durante o tratamento, Cantó-Milà (2011Milà, N., & Seebach, S. (2011). Ana’s friends. Friendship in online Pro-Ana communities. Sociological Research Online, 16. https://doi.org/10.5153/sro.2267
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) alerta para os possíveis riscos que essas amizades podem introduzir no processo de recuperação, uma vez que muitos jovens e adolescentes estabelecem laços de amizade entre si com o intuito de incentivarem a se manterem fiéis ao transtorno. Nesses casos, comumente são oferecidas por participantes dicas de dietas restritivas. Também é apregoada a adoção de comportamentos compensatórios que exaltam e disseminam o culto irrestrito à magreza. Em grupos fechados, aqueles membros que demonstram estar se recuperando podem não ser aceitos ou, ainda, as pessoas que se mantêm ausentes no grupo por mais de três dias podem ser expulsas, o que mostra claro propósito de fidelizar os usuários e estimular a obediência cega às normas impostas.

É importante, portanto, diferenciar os vários tipos de coletivos. O objetivo dos grupos estudados por Cantó-Milà (2011Milà, N., & Seebach, S. (2011). Ana’s friends. Friendship in online Pro-Ana communities. Sociological Research Online, 16. https://doi.org/10.5153/sro.2267
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) é claramente estabelecer um padrão de contatos frequentes que estimulam os adeptos a se manterem sob a influência dos moderadores do dispositivo grupal e cada vez mais comprometidos com a manutenção de seus sintomas. Outro estudo explorou outros pontos negativos relacionados as amizades estabelecidas no cenário dos TAs (Westwood et al., 2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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). As participantes relataram que, a despeito de valorizarem o apoio recebido de outras pacientes que passavam por situações similares, sustentar os vínculos de amizade requer um investimento que envolve intensa carga emocional, o que muitas vezes se torna “prejudicial” para elas devido à sua condição física já debilitada.

Por fim, o tema Amizades fora do contexto dos TAs diz respeito às relações estabelecidas entre pessoas que sofrem de algum TA e pares sem sintomas na esfera alimentar. Os pacientes se queixam da total falta de compreensão sobre a natureza de seus problemas por parte daqueles que estão de fora desse contexto (Krug et al., 2013aKrug, I., Penelo, E., Fernandez-Aranda, F., Anderluh, M., Bellodi, L., Cellini, E., & di Bernardo (2013). Low social interactions in eating disorder patients in childhood and adulthood: A multi-centre European case control study. Journal of Health Psychology, 18(1), 26-37. https://doi.org/10.1177/1359105311435946
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). Os achados sugerem que relacionamentos familiares e laços de amizade, quando não são estabelecidos em uma base saudável, podem representar fatores de risco para o desencadeamento de TAs, principalmente em decorrência da exposição a comentários críticos e provocativos sobre o peso e forma corporal das pacientes. Os autores refletem que tal situação é mantida na medida em que as pessoas que sofrem por anos com seus sintomas de TAs encontram dificuldades em se relacionarem com seus pares saudáveis, sentindo-se deslocados e desconfortáveis em suas relações sociais por se perceberem diferentes dos demais (Krug et al., 2013aKrug, I., Penelo, E., Fernandez-Aranda, F., Anderluh, M., Bellodi, L., Cellini, E., & di Bernardo (2013). Low social interactions in eating disorder patients in childhood and adulthood: A multi-centre European case control study. Journal of Health Psychology, 18(1), 26-37. https://doi.org/10.1177/1359105311435946
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; Westwood et al., 2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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). Por se sentirem desajustados e fora do padrão de normalidade, mantêm-se reclusas, adotando o isolamento como defesa. Leonidas et al. (2013bLeonidas, C., Crepaldi, M. A., & Santos, M. A. (2013b). Bulimia nervosa: Uma articulação entre aspectos emocionais e rede de apoio social. Psicologia: Teoria e Prática, 15(2), 62-75. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v15n2/05.pdf
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) mostraram que pacientes com BN deixam de sair com amigos por temerem passar vergonha caso precisem vomitar durante os encontros, optando por permanecerem sozinhos em casa. A evitação do contato social pode ser incrementada pela percepção de falta de compreensão, pelos preconceitos generalizados e estigmas sociais cristalizados sobre os TAs, que perpetuam o temor do julgamento alheio. Há um temor de serem expostas a situações vexatórias e constrangimentos em público. Essa expectativa negativa de ser submetida a situações penosas acentua o sentimento de exclusão das pacientes, levando ao recrudescimento do sofrimento (Westwood et al., 2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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).

Por fim, o estudo de Ruysscher et al. (2016De Ruysscher, C., Annicq, P., Vandevelde, S., & Claes, C. (2016). The perception of persons with anorexia nervosa on quality of life: An initial investigation. Applied Research Quality Life, 11, 613-630. https://doi.org/10.1007/s11482-015-9425-8
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) aponta possíveis efeitos positivos e negativos das amizades estabelecidas fora do contexto dos TAs. Como benefícios, os participantes referiram o fato de que, no contato com amigos que não têm o problema, sentem maior abertura para falarem sobre outros assuntos e, assim, conseguem “esquecer” o próprio transtorno momentaneamente. Entretanto, os participantes também relataram que não se sentiam compreendidos por esses pares saudáveis e enfatizaram que tal percepção afetava sua qualidade de vida. A despeito disso, entendem que deve ser mesmo difícil para alguém que esteja do “lado de fora” compreender totalmente como funciona o mundo da anorexia (Ruysscher et al., 2016De Ruysscher, C., Annicq, P., Vandevelde, S., & Claes, C. (2016). The perception of persons with anorexia nervosa on quality of life: An initial investigation. Applied Research Quality Life, 11, 613-630. https://doi.org/10.1007/s11482-015-9425-8
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). Em síntese, os resultados dos estudos apontam para o fato de que as experiências de amizade parecem estar associadas tanto a fatores de risco como fatores protetivos.

A categoria Amizade como fator protetivo remete às características e impactos positivos dos vínculos com os amigos na prevenção da psicopatologia e no tratamento das pessoas acometidas. Foram identificados os temas: “amigos como importante fonte de apoio e motivação no enfrentamento dos TAs” (n=3, artigos 1, 3 e 4), e “amigos com a função de distração do quadro clínico e incentivo à recuperação” (n=3, artigos 2, 5 e 7).

A literatura revisada demonstra o efeito benéfico das amizades e a importância do papel dos amigos como fonte de apoio e motivação no enfrentamento do TA. O estudo conduzido dentro de uma enfermaria de TA por Malmendier-Muehlschlegel et al. (2016Malmendier-Muehlschlegel, A., Rosewall, J. K., Smith, J. G., Hugo, P., & Lask, B. (2016). Quality of friendships and motivation to change in adolescents with anorexia nervosa. Eating Behaviors, 22, 170-174. https://doi.org/10.1016/j.eatbeh.2016.06.010
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) constatou a influência que os amigos exercem na motivação para a mudança de comportamento entre adolescentes com AN em tratamento. Os resultados corroboram a relação positiva entre a qualidade das amizades e a propensão à mudança de hábitos alimentares em jovens internados. Os achados vão ao encontro da perspectiva das amizades como um fator protetivo, uma vez que relacionamentos considerados de alta qualidade, caracterizados por vínculo estreito e de confiança mútua entre os pares, estão associados a um estágio motivacional mais elevado para a mudança. Desse modo, o estudo estabeleceu uma conexão entre o apoio percebido entre amigos, a prontidão para a mudança de comportamento e, por conseguinte, a aceitação do tratamento e a qualidade das amizades.

Reforçando a suposição das amizades como importante fonte de apoio social nos TAs, Tavolacci et al. (2020Tavolacci, M. P., Déchelotte, P., & Ladner, J. (2020). Eating disorders among college students. International Journal of Environmental Research and Public Health, 17(16), 5914. https://doi.org/10.3390/ijerph17165914
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) identificaram que os dois principais recursos para buscar ajuda em situações de estresse emocional entre as jovens universitárias com conduta alimentar disfuncional foram amigos e familiares. Por outro lado, é preciso destacar as diferenças culturais observadas nos vários contextos investigados. Em um estudo realizado nos Estados Unidos, que buscou investigar a relação entre compulsão alimentar e qualidade de três fontes de apoio social distintas (família, amigos e pessoas especiais), foram encontradas diferenças relacionadas à cultura e à raça/etnia das participantes (Mason & Lewis, 2017Mason, T. B., & Lewis, R. J. (2017). Examining social support, rumination, and optimism in relation to binge eating among Caucasian and African American women. Eating and Weight Disorders: EWD, 22(4), 693-698. https://doi.org/10.1007/s40519-016-0300-x
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). Os resultados apontaram que o apoio social de amigos funciona como fator protetor contra a compulsão alimentar em mulheres universitárias caucasianas, mas não em mulheres afroamericanas.

Face ao que se observou na literatura revisada, verifica-se que a temática: amigos com a função de distração do quadro clínico e incentivo à recuperação se relaciona, em certa medida, à temática anterior, ao evidenciar que momentos agradáveis compartilhados com amigos e o consequente alívio momentâneo (“distração”) produzido na percepção do excessos de preocupações contínuas com os sintomas, podem promover benefícios terapêuticos se servirem como fontes de apoio e motivação positiva para o árduo processo de enfrentamento do TA. Isso deve ser compreendido no quadro mais amplo da relação obstinada que as pacientes estabelecem com sua sintomatologia, que tende a absorver completamente sua atenção e a drenar suas energias psíquicas. Esse padrão obsessivo-compulsivo geralmente persiste por longos períodos e pode perdurar por anos, impondo sérios prejuízos ao desenvolvimento.

Em estudo conduzido por Ruysscher et al. (2016De Ruysscher, C., Annicq, P., Vandevelde, S., & Claes, C. (2016). The perception of persons with anorexia nervosa on quality of life: An initial investigation. Applied Research Quality Life, 11, 613-630. https://doi.org/10.1007/s11482-015-9425-8
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), participantes apontaram a importância de ter amigos e familiares para manterem uma boa qualidade de vida. No entanto, ao discorrerem sobre suas famílias, mencionaram principalmente sua importância no apoio de modo geral, com foco nos aspectos instrumentais do suporte recebido. Os amigos, por seu turno, foram apontados como relevantes para outras tarefas, como se divertir e realizar atividades relaxantes, que ajudam a reduzir o estresse decorrente dos sintomas e, assim, contribuem na motivação para a mudança e recuperação. Em outro estudo selecionado para análise, participantes apontaram que o fato de estarem doentes os ajudou a reconhecerem a importância do suporte das amizades, o que forneceu motivação adicional para seguirem em frente com o tratamento até obterem alguma melhora ou estabilidade no quadro clínico (Westwood et al., 2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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).

Lindstedt et al. (2018Lindstedt, K., Neander, K., Kjellin, L., & Gustafsson, S. A. (2018). A life put on hold: adolescents’ experiences of having an eating disorder in relation to social contexts outside the family. Journal of Multidisciplinary Healthcare, 11, 425-437. https://doi.org/10.2147/JMDH.S168133
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) investigaram como adolescentes com TAs descrevem seus quadros clínicos e o tratamento, tendo como perspectiva suas relações interpessoais com pessoas externas ao contexto familiar. A maioria dos participantes relatou que foram pessoas externas ao núcleo familiar que pela primeira vez perceberam que havia algo “de errado” com eles. Uma participante mencionou que foram amigas da sua escola que perceberam que ela estava buscando formas extremas de perder peso e a encorajaram a buscar ajuda de especialistas. Outras participantes do mesmo estudo mencionaram que, antes do diagnóstico e do início do tratamento, faziam parte de uma equipe de ginástica cujos treinos eram intensos e regulares, de três a quatro vezes por semana. Foram os seus treinadores os primeiros a notarem que havia algo de errado com elas e as incentivarem a buscar ajuda profissional. No decorrer do tratamento, elas foram proibidas de manterem a regularidade dos treinos até que estivessem totalmente recuperadas. As jovens contaram que foi como se uma parte delas e de sua rotina tivesse sido tomada pelo transtorno, uma vez que, além de gostarem muito da atividade física em si, mantinham bons vínculos de amizade com colegas e treinadores. Relataram que sentiram saudade dos momentos de companheirismo que vivenciaram com a equipe de ginástica e que esse era o principal estímulo que nutriu o desejo de se recuperarem, uma vez que só assim poderiam reencontrar os amigos, restituindo a sensação de normalidade e pertencimento que experimentavam anteriormente. Esses achados relacionam-se também com a temática anterior, uma vez que os amigos exercem ambas as funções: de apoio e motivação para o enfrentamento dos sintomas de TA e são fonte de alívio e distração do sofrimento suscitado pelo quadro clínico, servindo de incentivo para a recuperação.

Por fim, a categoria Amizade como fator de risco engloba temas que se conectam com as possíveis influências negativas que os amigos podem exercer no desencadeamento, evolução e perpetuação dos sintomas de anorexia e bulimia, constituindo barreiras no tratamento. Foram identificados os temas: “comentários negativos e bullying enfrentados nas relações de amizade” (n=4, artigos 5, 8, 12 e 14) e “isolamento social como consequência dos sintomas” (n=7, artigos 2, 5, 9, 10, 11, 12 e 13). Dentre os temas elencados, comentários negativos e bullying propagados nas relações entre pares foram recorrentes nos estudos, especialmente quando relacionados a fatores que maximizam o risco de aparecimento de sintomas de TAs (Gonzales et al., 2014Gonzales, G. A. L., Sacomani Junior, E., & Rondina, R. C. (2014). As vivências de um grupo de pacientes com transtornos alimentares: A relação com o espelho e a imagem corporal. Revista Subjetividades, 14(3), 383-394.; Krug et al., 2013aKrug, I., Penelo, E., Fernandez-Aranda, F., Anderluh, M., Bellodi, L., Cellini, E., & di Bernardo (2013). Low social interactions in eating disorder patients in childhood and adulthood: A multi-centre European case control study. Journal of Health Psychology, 18(1), 26-37. https://doi.org/10.1177/1359105311435946
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; Westwood et al., 2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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).

As pesquisas ressaltam que, especialmente durante a adolescência, o grupo de pares, o entorno social e a mídia são os principais responsáveis por favorecer o recrudescimento de sentimentos de insatisfação corporal nesse público, até mais do que as próprias famílias (Santos et al., 2015Santos, M. A., Garcia, R. W. D., & Liotino-Santos, M. (2015). A sujeição aos padrões corporais culturalmente construídos em mulheres de baixa renda. Demetra, Food, Nutrition and Health, 10(4), 761-774. https://doi.org/10.12957/demetra.2015.16117
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, 2019Santos, M. A., Oliveira, V. H., Peres, R. S., Risk, E. N., Leonidas, C., & Oliveira-Cardoso, E. A. (2019). Corpo, saúde e sociedade de consumo: A construção social do corpo saudável. Saude & Sociedade, 28(3), 239-252. http://dx.doi.org/10.1590/s0104-12902019170035
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). Destacam também que os principais eventos percebidos pelas participantes como associados ao início dos TAs foram conflitos nos relacionamentos interpessoais e o incômodo causado por piadas, gozações e pressões por parte de terceiros para que esses adolescentes e adultos jovens tenham um corpo magro (Gonzales et al., 2014Gonzales, G. A. L., Sacomani Junior, E., & Rondina, R. C. (2014). As vivências de um grupo de pacientes com transtornos alimentares: A relação com o espelho e a imagem corporal. Revista Subjetividades, 14(3), 383-394.; Santos et al., 2014Santos, M. A., Scorsolini-Comin, F., & Gazignato, E. C. S. (2014). Aconselhamento em saúde: Fatores terapêuticos em grupo de apoio psicológico para transtornos alimentares. Estudos de Psicologia (Campinas), 31(3), 393-403. https://doi.org/10.1590/0103-166x2014000300008
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). Em um dos estudos foi apresentado o caso de um jovem de 19 anos, hospitalizado em um serviço de saúde para tratamento de um quadro grave de AN. Os sintomas haviam começado sete anos antes da primeira internação, em uma época na qual o adolescente estava sob forte pressão e era alvo de chacotas frequentes dos amigos devido a seu corpo e excesso de apetite (Younis & Lava, 2012Younis, M. S., & Ali, L. D. (2012). Adolescent male with anorexia nervosa: A case report from Iraq. Child and Adolescent Psychiatry and Mental Health, 6(1), 5. https://doi.org/10.1186/1753-2000-6-5
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).

A temática Isolamento social como consequência dos sintomas se relaciona com a categoria anterior em uma linha cronológica, criando um ciclo vicioso, ou seja, na medida em que o retraimento social se aprofunda, em resposta aos comentários negativos dos colegas e na tentativa de se proteger do bullying, funciona também como gatilho para os sintomas de TAs. Assim, uma vez iniciado, o comportamento alimentar disfuncional pode ser retroalimentado pelo próprio isolamento social. Os achados do estudo de Westwood et al. (2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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) reforçam essa hipótese, ao afirmarem que o bullying induziu as vítimas a se isolarem, aumentando sua vulnerabilidade ao risco de desenvolverem TA. Além disso, os autores também classificaram a evitação social como uma característica central no funcionamento psicológico de pessoas com AN, que tendem a se afastar cada vez mais dos amigos na medida em que os sintomas avançam (Krug et al., 2013aKrug, I., Penelo, E., Fernandez-Aranda, F., Anderluh, M., Bellodi, L., Cellini, E., & di Bernardo (2013). Low social interactions in eating disorder patients in childhood and adulthood: A multi-centre European case control study. Journal of Health Psychology, 18(1), 26-37. https://doi.org/10.1177/1359105311435946
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; Westwood et al., 2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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).

As participantes do estudo de Leonidas e Santos (2013bLeonidas, C., Crepaldi, M. A., & Santos, M. A. (2013b). Bulimia nervosa: Uma articulação entre aspectos emocionais e rede de apoio social. Psicologia: Teoria e Prática, 15(2), 62-75. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v15n2/05.pdf
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), todas pacientes em tratamento, relataram não ter amigos e sim “colegas”. Suas redes de amizades eram compostas por pessoas com as quais não mantinham contato frequente e com quem mantinham apenas conversas superficiais. Elas eram capazes de reconhecer suas dificuldades em se aproximarem das pessoas a ponto de poderem estabelecer um vínculo seguro e de intimidade. Leonidas et al. (2013aLeonidas, C., & Santos, M. A. (2013a). Redes sociais significativas de mulheres com transtornos alimentares. Psicologia: Reflexão e Crítica, 26(3), 561-571. https://doi.org/10.1590/S0102-79722013000300016
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) reforçam essa ideia em outro estudo, identificando barreiras insuperáveis no estabelecimento de vínculos íntimos de amizade. Os achados também revelaram que a participante utilizava do distanciamento como recurso defensivo para lidar com suas inibições e o medo de perder o controle sobre seus impulsos. Para ela era difícil participar de programas sociais com amigos ou com o namorado. Para justificar sua conduta evitativa, ela usava da racionalização de que, por ter diagnóstico de bulimia, temia ter necessidade de recorrer a métodos compensatórios durante esses programas sociais, que geralmente envolvem situações de exposição à comida, o que a deixaria constrangida e envergonhada. Por conta desse receio, e buscando manter sob controle a compulsão alimentar, passou a se isolar dentro de casa, deixando de sair com amigos e até mesmo de frequentar as aulas da faculdade, alegando que se sentia emocionalmente exausta. A propósito, Westwood et al. (2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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) ouviram de uma participante, que havia sido solicitada a descrever sua experiência anoréxica, uma única palavra: “solidão”.

Lindstedt et al. (2018Lindstedt, K., Neander, K., Kjellin, L., & Gustafsson, S. A. (2018). A life put on hold: adolescents’ experiences of having an eating disorder in relation to social contexts outside the family. Journal of Multidisciplinary Healthcare, 11, 425-437. https://doi.org/10.2147/JMDH.S168133
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) chamam a atenção para a recorrência da queixa de esgotamento físico e mental das jovens com TAs em decorrência da perseveração dos sintomas. Elas se queixam de não ter forças para participar de certas atividades sociais, como sair com amigos e participar de programas com pessoas de sua idade. O TA passa a ocupar cada vez mais centralidade em suas vidas. A insistência dos sintomas exaure suas energias e toma todo o tempo livre, fazendo-as acreditar que é mais fácil lidar com suas obsessões se permanecerem reclusas em seus quartos o dia todo. Nessa vertente, Durán e Agúndez (2013Durán, M. V. C., & Agúndez, A. M. (2013). The influence of factors that define the body image model on the well-being of young women who suffer from anorexia and bulimia and healthy people. Saúde e Sociedade, 22(2), 468-484. https://doi.org/10.1590/S0104-12902013000200017
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) apontam que pessoas saudáveis parecem dar muito mais importância aos amigos do que as pacientes com TAs, o que reforça os achados de Krug et al. (2013bKrug, I., Villarejo, C., Jiménez-Murcia, S., Perpiñá, C., Vilarrasa, N., Granero, R., & Cebolla, A. (2013). Eating-related environmental factors in underweight eating disorders. European Eating Disorders Review, 21(3), 202-208. https://doi.org/10.1002/erv.2204
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), que identificaram que as participantes saudáveis do grupo controle interagiam mais com sua rede de amizades quando comparadas àquelas que tinham sido acometidas pelo problema e que se envolviam mais em atividades solitárias e não compartilhadas.

Westwood et al. (2016Westwood, H., Lawrence, V., Fleming, C., & Tchanturia, K. (2016). Exploration of friendship experiences. PloS One, 11(9), e0163528. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0163528
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) abordam a repercussão positiva que a hospitalização pode ter na esfera social, na medida em que, no dia a dia fora da instituição hospitalar, os pacientes não contavam com uma rede de apoio funcional e se sentiam totalmente isolados socialmente. Entretanto, dentro do ambiente de tratamento, cercados pelos cuidados dos profissionais e recebendo atenção constante, além de manterem contato com outros pacientes que estavam vivendo situações análogas, eles se sentiam mais integrados e envolvidos. Por outro lado, observou-se que isso também contribuía para que os sintomas recrudescessem no momento da alta.

O isolamento social das pessoas com TA pode ser potencializado pelas deficiências de suporte familiar. Ao investigarem o apoio social em mulheres com AN ou BN, Leonidas e Santos (2013bLeonidas, C., Crepaldi, M. A., & Santos, M. A. (2013b). Bulimia nervosa: Uma articulação entre aspectos emocionais e rede de apoio social. Psicologia: Teoria e Prática, 15(2), 62-75. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ptp/v15n2/05.pdf
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) reportaram que suas redes tinham configuração restrita, com primazia de membros da família em sua composição, evidenciando empobrecimento dos vínculos e encapsulamento social. Os relacionamentos familiares, apesar de serem mais proeminentes do que outros, são marcados por conflitos e distanciamento afetivo. Além disso, o referido estudo revelou baixa densidade da rede de amizades e embotamento da vida social de modo geral, o que acentua a tendência do isolamento e agrava a dificuldade em formar novos vínculos e/ou manter relacionamentos duradouros com pessoas externas ao círculo familiar.

Os sintomas de TAs impõem tantas restrições no viver das pessoas acometidas que seu funcionamento social se torna uma área conturbada, com inibição no desenvolvimento de habilidades relacionais e prejuízos marcantes na esfera interpessoal (Andrade & Santos, 2009Andrade, T. F., & Santos, M. A. (2009). A experiência corporal de um adolescente com transtorno alimentar. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 12(3), 454-468. https://doi.org/10.1590/S1415-47142009000300003
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; Fava & Peres, 2011Fava, M. V., & Peres, R. S. (2011). Do vazio mental ao vazio corporal: Um olhar psicanalítico sobre as comunidades virtuais pró-anorexia. Paidéia (Ribeirão Preto), 21(50). https://doi.org/10.1590/S0103-863X2011000300008
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). Se por um lado já existe um corpus consistente de resultados de pesquisa que indicam a necessidade de incluir a família no tratamento (Souza & Santos, 2009Souza, L. V., & Santos, M. A. (2009). A construção social de um grupo multifamiliar no tratamento dos transtornos alimentares. Psicologia: Reflexão e Crítica, 22(3), 483-492. https://doi.org/10.1590/S0102-79722009000300020
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, 2010Souza, L. V., & Santos, M. A. (2010). A participação da família no tratamento dos transtornos alimentares. Psicologia em Estudo (Maringá), 15(2), 285-294. https://doi.org/10.1590/S1413-73722010000200007
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, 2012Souza, L. V., & Santos, M. A. (2012). Familiares de pessoas diagnosticadas com transtornos alimentares: Participação em atendimento grupal. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 28(3), 325-334. https://doi.org/10.1590/S0102-37722012000300008
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), por outro nota-se que também há necessidade de ampliar essa perspectiva para que se possa expandir e enriquecer a rede pessoal de apoio das pacientes por meio do fortalecimento das relações de amizade.

Os estudos apresentaram classificação de viés de risco de moderado abaixo, denotando que a maioria dos critérios de qualidade foram atendidos. Isso indica boa qualidade metodológica dos artigos selecionados, o que assegura a reprodutibilidade dos estudos, ainda que se deva ter cautela na generalização dos resultados para outros contextos. Também foram identificadas algumas limitações na revisão conduzida. Dentre as fragilidades deste estudo destaca-se que a maioria (n=12) dos artigos incluídos abordou amostras de pessoas com diagnóstico de TAs, sendo que apenas dois avaliaram estudantes (um deles restringiu-se ao sexo feminino) e um investigou usuários de um fórum de discussão online. Assim, os dados coligidos apontam para a necessidade de novas pesquisas que se debrucem sobre as amizades em amostras obtidas na população geral, de modo a explorar possíveis nuances do fenômeno com população clínica e não clínica. Outra limitação observada foi que apenas quatro dos 15 estudos selecionados explicitavam no objetivo a intenção de investigar as relações de amizade, ao passo que os demais exploraram essa temática como parte da rede significativa de apoio social das(os) participantes ou a questão da amizade emergiu como parte dos resultados.

Considerações Finais

Este estudo alcançou o objetivo de descrever, sintetizar e analisar a literatura científica nacional e internacional acerca da influência das relações de amizade na vida de pessoas acometidas por TAs e respondeu à questão norteadora, evidenciando que os vínculos de companheirismo e camaradagem podem ter efeito benéfico tanto na prevenção como na reabilitação psicossocial. Também foram identificados, na literatura analisada, indícios de que amizades de baixa qualidade podem se tornar, em certas situações, fatores de risco para o desencadeamento e/ou manutenção dos sintomas de TAs. Assim, os estudos sugerem que essa influência não é linear, uma vez que há fatores moderadores que determinam as circunstâncias pessoais e relacionais sob as quais as amizades podem ter efeito benéfico ou prejudicial.

A sistematização das pesquisas em categorias e temas permitiu organizar e tornar mais inteligível a análise dos resultados. Notou-se que tem sido construído gradualmente um corpo de evidências crescentes acerca do impacto que os vínculos de amizade exercem nas pessoas acometidas por anorexia e bulimia. Foi possível deduzir, a partir dos dados obtidos, que as amizades podem adquirir matizes que as fazem funcionar ora como fatores preponderantemente protetivos, ora como fatores de risco, a depender de suas características e contextos particulares. Também restou evidenciado o papel deletério dos comentários críticos e persistentes de amigos e familiares, assim como o impacto pernicioso do bullying no contexto escolar.

Conteúdos disseminados indiscriminadamente pelas mídias e redes digitais acerca do peso e formato corporal, com forte teor de gordofobia, também são fatores contribuintes, sobretudo se considerarmos que a era contemporânea entronizou a imagem de si idealizada (popularizada, por exemplo, nas selfies e nas imagens digitalmente manipuladas divulgadas nas redes sociais virtuais) e enalteceu o corpo esbelto como medidas absolutas de realização e sucesso pessoal. É com base nesses signos glorificados que se mede atualmente o valor social de uma pessoa, a partir do grau de correspondência entre a imagem que o indivíduo projeta de si e a expectativa que a sociedade manifesta sobre ele. Nesse contexto, devem ser fomentadas reflexões acerca das novas formas de subjetivação que emergem com a virtualização crescente da vida, centradas na espetacularização do corpo e no consumo conspícuo de imagens e informações distorcidas, que engendram novos processos de construção identitária e intersubjetiva que potencializam condições desencadeadoras de sofrimento.

Os achados apontam para a necessidade de incluir uma escuta qualificada e sensível para que se possa compreender o potencial de suporte social fornecido pelas amizades e implementar ações voltadas à promoção de competências e habilidades socioafetivas, visando ao fortalecimento da rede pessoal de pacientes e à mitigação do sofrimento psíquico. Os resultados das pesquisas revisadas sugerem que, quando pautadas em elementos de apoio mútuo e trocas saudáveis e de boa qualidade, as amizades funcionam como recurso protetivo em relação ao desencadeamento, manutenção e/ou perpetuação dos sintomas de TAs. Porém, se não forem vínculos de boa qualidade e se as questões que agravam as distorções da percepção corporal das(os) pacientes não forem abordadas de forma adequada pelos pares, as amizades podem se tornar tóxicas e exercer influência negativa, eliciando ou acentuando comportamentos disfuncionais preexistentes. Se predominar essa vertente nociva, os laços de amizade podem inclusive interferir negativamente na recuperação de pacientes acometidos.

É importante incorporar no tratamento ações que visem fortalecer vínculos saudáveis de amizade, inclusive entre os próprios pacientes, visto que uma possível consequência da expansão da rede pessoal nos TAs é a melhora na autoestima, na qualidade de vida e na motivação para o tratamento. Por esse motivo, recomenda-se incluir no repertório terapêutico da equipe multiprofissional a preocupação com o desenvolvimento de recursos que valorizem os benefícios das boas amizades, como potenciais fontes de apoio para as pessoas acometidas, contribuindo para potencializar ambientes salutares visando o desenvolvimento integral de jovens e adolescentes.

Três dos 15 estudos selecionados foram produzidos no contexto nacional, o que indica a contribuição da Psicologia brasileira para a área. Dentre as lacunas de conhecimento identificadas, observou-se a necessidade de novas investigações com foco não apenas nas características intrínsecas às amizades, mas também nos diferentes contextos, abordando os aspectos específicos da sociabilidade e do universo cultural latino-americano. Também devem ser encorajados estudos com desenho longitudinal, que permitam acompanhar os resultados de programas e intervenções que incorporem as experiências de amizade.

Verificou-se que pesquisas realizadas no último decênio contribuem para o aprimoramento de estratégias de prevenção e intervenção em serviços de saúde voltadas à promoção, incentivo, fortalecimento e manutenção dos vínculos de amizade. O desenvolvimento de novas investigações, que se ocupem dessa temática permitirá obter avanços no conhecimento produzido, focalizando especialmente a compreensão de fatores psicológicos específicos que conferem às experiências de amizade a relevância e espessura que elas podem adquirir no contexto de vida das pessoas que vivem com TAs.

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  • Nota dos autores: Financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP, processo número 2020/04501-8, e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq.
  • 2
    Agradecimentos e apoio institucional: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, Bolsa de Produtividade em Pesquisa - Categoria 1A e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP, processo número 2020/04501-8.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2023

Histórico

  • Recebido
    18 Jul 2022
  • Revisado
    20 Nov 2022
  • Aceito
    10 Jan 2023
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