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Entrevista com Prof. Aloysio Bzuneck

História

Entrevista com Prof. Aloysio Bzuneck

Entrevistadora: Ana Esmeralda Carelli

JOSÉ ALOYSIO BZUNECK formou-se em filosofia pela PUC do Rio Grande do Sul. Fez mestrado e doutorado em Psicologia Escolar, no Instituto de Psicologia da USP. Bzuneck é professor no ensino superior desde 1971, na área de Psicologia Educacional. Desde 1994, atua no Programa de Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Londrina, na Linha de Pesquisa - Ensino Superior - Motivação. O seu exercício profissional é marcado por grandes êxitos e realizações, tendo orientado inúmeras dissertações de mestrado e monografias. Seu sucesso acadêmico se reverte em um número considerável de trabalhos publicados e apresentados em congressos nacionais e internacionais. O professor Bzuneck, como é conhecido por seus alunos, merece todo o respeito e consideração dos profissionais da Psicologia Escolar e Educacional, não só pela preciosa contribuição prestada à área, como também por sua determinação, sua atenção e pela amizade que dispensa a quem o procura. Por essas razões vale a pena ficar aqui o registro de sua trajetória.

Carelli: Como foi sua formação profissional?

Bzuneck: A uma razoável distância da ocorrência daqueles eventos, posso hoje determinar que minha formação em Psicologia Educacional ocorreu em duas fases. A primeira, com a graduação em Filosofia, pela PUC do Rio Grande do Sul. Àquela época, estavam nascendo aqui e ali os primeiros cursos de Psicologia, tanto que nenhum de meus professores era graduado em Psicologia. A Filosofia foi uma casualidade histórica em minha vida e, embora sempre tivesse boas notas, nunca me julguei portador do perfil de um filósofo. Entretanto, devo reconhecer que a Filosofia me proporcionou esquemas cognitivos e uma excelente base conceitual e metodológica para, em seguida, enveredar pela ciência psicológica.

Assim, pouco depois da conclusão da licenciatura, optei pela pós-graduação em Psicologia do Escolar, no Instituto de Psicologia da USP. Àquela época, a Profa. Carolina Bori era Coordenadora do Programa e acolheu-me como orientador o Prof. Dr. Samuel Pfromm Neto, que teve decisiva influência nos rumos de meus estudos na área. Na pós-graduação, são importantes as experiências de pesquisa e a literatura que se freqüenta. Mas julgo como particularmente História valiosa a influência pessoal dos professores do programa e, no caso do IPUSP, lembro-me com muito reconhecimento de todos eles, além de meu orientador, particularmente da Geraldina, do Lomônaco, do Romeu de Almeida, além do Lino de Macedo, que àquela época passou a compor o corpo docente e participou da banca de meu doutorado.

Carelli: Por que escolheu a área de Psicologia, Escolar/Educacional?

Bzuneck: A escolha da Psicologia da Educação como minha área preferencial de conhecimento e de atuação derivou basicamente do exercício do ensino, logo após a licenciatura. Em virtude da orientação pedagógica do meu curso de graduação, estava legalmente capacitado a trabalhar nessa área. Mas foi sobretudo uma questão de gosto, de inclinação pessoal, podem chamar de vocação. Uma vez formado, e por opção consciente pela área, comecei logo a ensinar Psicologia Educacional em licenciaturas, em minha Universidade e em outras Faculdades. Essa experiência com alunos e com os conteúdos da Psicologia tiveram um efeito positivo que não havia sido programado e nem mesmo previsto por mim. Esse efeito consistiu maximamente na consolidação de uma identificação positiva com a área. A razão principal pela qual tenho trabalhado tantos anos com Psicologia Educacional é porque gosto.

Carelli: Descreva sua vida profissional na área de Psicologia Escolar/Educacional.

Bzuneck: Minha vida profissional tem consistido, basicamente, em ensinar, em preparar os outros para ensinarem e em pesquisar sobre o ensino. Guardadas as devidas proporções, espelho-me, nessa autodescrição, no retrato que um grande estudioso canadense, W. McKeachie, fez de si próprio. Primeiro, fui aprendendo mais sobre a disciplina, porque não há maneira mais direta de se aprender do que ensinando. A pós-graduação, que iniciei logo em seguida, teve indubitavelmente um papel importante na atualização e aprofundamento dos conteúdos. Mas a prática em sala de aula, que incluía discussão sobre os temas mais relevantes para quem já era professor ou aspirava a ser, despertou e aguçou em mim um gosto pessoal por essas duas áreas: psicologia e educação e suas interrelações. Eu trabalhava com alunos que já tinham regência de classe ou que, na sua grande maioria, tinham aspiração pelo magistério. Eles traziam inquietações e interesses de natureza prática, ou seja, cobravam conteúdos que significassem contribuições positivas para o seu trabalho com alunos.

Fui aprendendo que o melhor modo de se motivar os alunos de licenciatura pela Psicologia era trabalhar um programa elaborado junto com eles. Dentre os inúmeros conteúdos que atualmente compõem a Psicologia Educacional é forçoso selecionar os que são objetivamente mais relevantes e que, ao mesmo tempo, sejam do interesse da classe. Por isso, considero que a elaboração do conteúdo programático tenha a participação dos alunos e que, a seguir, sejam bem trabalhados. Para que sejam bem trabalhados, com uma participação ativa e o melhor envolvimento dos alunos, surge a exigência de que o professor esteja sempre atualizado. Ora, reconheço que sempre busquei novos conhecimentos na área, especialmente na literatura internacional, produzida por profissionais do mais alto valor.

Desde os tempos de graduação, fui ávido leitor. Procurava outros livros e artigos para complementar os textos obrigatórios. Perguntava aos professores que obras poderiam me ajudar a ampliar os conhecimentos na disciplina. Mas, na graduação, essa expansão era bem limitada, sobretudo em função da multiplicidade de matérias. Uma vez formado, e atuando no ensino de Psicologia Educacional, ressurgiu a necessidade e o gosto por conhecer mais textos, autores, pesquisas e linhas, porém agora dentro de um campo específico de conhecimento. A Biblioteca do Instituto de Psicologia da USP, pela amplidão de seu acervo, junto com a da Faculdade de Educação, representaram sempre para mim, até hoje, um portal para o conhecimento que o mundo inteiro tem construído na área.

Foi nessa literatura psicológica especializada sobre ensino e aprendizagem que fui descobrindo o progresso que os autores estavam realizando em torno da motivação no contexto escolar. Esta tem sido, nos últimos anos, a linha mais específica e preferencial de pesquisa em que trabalho.

Vale a pena assinalar que, curiosamente, em grande parte do mundo, a maioria dos problemas ligados à motivação de alunos e de professores assemelha-se ao que encontramos em nosso meio. Aquilo de que as professoras brasileiras se queixam tem sido igualmente relatado por autores dos Estados Unidos, de Israel, da Coréia, da Bélgica e assim por diante. Foi pelo contato com essa literatura que me decidi, já há uns 10-12 anos, a explorar prioritariamente esse tópico específico, que afeta diretamente o ensino. É um tremendo desafio enveredar por esse caminho. Compreender os diversos mecanismos psicológicos e de interação com o ambiente, que afetam a motivação, parece uma tarefa sem limites. Mas é por isso mesmo que se torna apaixonante pesquisar esse tema.

Carelli: Como vê a Psicologia Escolar/Educacional no Brasil hoje?

Bzuneck: A Psicologia Escolar/Educacional compõe- se de pessoas que produzem e é sob esse aspecto que quero dar minha opinião. Tenho observado que há muito de positivo já tem sido alcançado. Há um grupo numeroso que estuda, publica, discute, faz avançar o conhecimento da Psicologia aplicada aos problemas educacionais de nosso meio. Um dos sinais incontestes da vitalidade dessa área são os Congressos nacionais da ABRAPEE, além da significativa representação da área em outras reuniões tanto da Psicologia como da Educação.

O que me parece ainda faltar são duas coisas. Uma é um maior entrosamento entre pessoas que pesquisam numa mesma linha. Tenho a impressão - isso é totalmente subjetivo, portanto, passível de ser alterado pelos fatos - de que se trabalha muito, mas de forma individualista. Por isso, há grandes valores individuais. No máximo, nota-se algum agrupamento dentro de uma mesma Instituição ou programa de pós-graduação. Os encontros em congressos deveriam ter continuidade em interações por meio da internet e de outras formas pelas quais as pessoas consigam interagir. Outro problema que eu vejo é o de uma falta de continuidade dentro de um mesmo objeto, ou até linha, por parte de uma mesma pessoa. Com raras exceções, noto que há pessoas que produzem e publicam, porém sua temática é cambiante. Quando alguém adentra um determinado objeto de estudo, adquire uma certa proficiência, que deveria ser investida em estudos seguidos até exaurir, se possível, todos os seus aspectos educacionalmente relevantes.

Em suma, em termos de Brasil, ao se conseguir uma saudável continuidade aliada a uma maior interação nas produções, a área da Psicologia Escolar e Educacional atingirá outro patamar, como eu verifico pela literatura que ocorre em países como Austrália, Israel, Portugal, Escandinávia, sem falar nos Estados Unidos, Canadá e Reino Unido. Naquelas regiões a Psicologia Educacional goza do mais status na comunidade científica e no contexto educacional. Eu considero que o futuro da Psicologia Escolar e Educacional no Brasil será o resultado das posições que tomarmos em termos de continuidade nos temas pesquisados e, sobretudo, em função de maior aglutinação das pessoas.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Fev 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 2001
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