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Teorias da aprendizagem

Learning theories

Teorías de aprendizaje

RESENHAS

Teorias da aprendizagem

Learning theories

Teorías de aprendizaje

Fraulein Vidigal de Paula

Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência Endereço para correspondência E-mail: fraulein@usp.br

Um presente para a Psicologia da Aprendizagem

A gift for the Learning Psychology

Lefrançois, G. R. (2008). Teorias da Aprendizagem. São Paulo: Cengage.

Para aqueles que trabalham na disciplina Psicologia da Aprendizagem, o manual de Guy R. Lefrançois deve ser recebido como um presente. Neste, as principais teorias da aprendizagem e a influência de avanços recentes em outros campos do conhecimento, como as neurociências e inteligência artificial, para a compreensão do processo de aprender estão bem contempladas. Questões contemporâneas sobre como a aprendizagem relaciona-se à memória, ao cérebro, à motivação e à emoção são igualmente abordados. Todos os 12 capítulos iniciam com uma história fictícia, apresentação dos objetivos e dos tópicos do mesmo, acrescidos de uma pequena biografia dos autores das teorias abordadas e um glossário ao final do livro.

No capítulo 1, intitulado Aprendizagem humana: ciência e teoria, o autor apresenta o conceito de aprendizagem, definida como “toda mudança relativamente permanente no potencial de comportamento, que resulta da experiência, mas não é causada por cansaço, maturação, drogas, lesões ou doenças” (p.6). Esclarece a necessidade da existência de diferentes teorias científicas a respeito desse fenômeno psicológico, tendo em vista sua complexidade e diversidade em termos de processos e resultados envolvidos. Para instrumentalizar o leitor, define teoria, ciência, os elementos da pesquisa científica e outros conceitos relacionados, além dos propósitos e critérios para avaliar a qualidade de uma teoria e seu valor social/educacional. Por último, apresenta a organização do livro e sumariza os demais capítulos.

No segundo capítulo, descreve os Primórdios do Behaviorismo: Pavlov, Watson e Guthrie, e de como esta teoria entrelaça-se com as origens da psicologia científica, traçando um panorama da teoria do condicionamento clássico de Ivan Pavlov, a fundação do behaviorismo norteamericano com John B. Watson e a teoria da aprendizagem em uma única tentativa de Edwin Guthrie.

Duas teorias fundamentais que precederam o behaviorismo radical de Skinner são discutidas no terceiro capítulo, Os efeitos do comportamento: Thorndike e Hull. A ideia de que nossas aprendizagens são controlados pelas consequências do nosso comportamento foram descritas por E. Thorndike ao estudar a aprendizagem por ensaio e erro. Clark Hull sistematizou um modelo para representar as variáveis de input (entrada/registro de estímulo) e output (saída/ produção) do comportamento, bem como, de modo ousado, incluiu entre essas as variáveis intervenientes, relacionadas a fatores internos ao aprendiz que interferem na ocorrência de um comportamento, prenunciando e contribuindo para constituição das futuras teorias cognitivas da aprendizagem.

A teoria do Condicionamento operante: o behaviorismo radical de Skinner é tema do quarto capítulo. Aborda a concepção de aprendizagem enquanto aumento da probabilidade de emissão de um comportamento em função de suas consequências e a descrição do processo de modelagem, ou seja, de aprendizagem de uma resposta alvo por meio de aproximações sucessivas. Apresenta e avalia a importância das contribuições de Bhurrus F. Skinner no sentido de investigar as leis que governam as relações entre organismo e ambiente e que determinam o comportamento. Avalia a influência de seu trabalho para a psicologia contemporânea no âmbito da pesquisa e de sua relevância em áreas da psicologia aplicada, por meio da utilização de técnicas de análise e modificação do comportamento. Este capítulo em especial prima por não distorcer ou minimizar a importância dessa concepção de aprendizagem, como é recorrente em alguns livros de psicologia da educação.

Uma tradição que tem se destacado e tem influenciado recentemente uma visão crítica do conjunto das teorias da aprendizagem é abordada no capítulo cinco, Psicologia Evolucionista: aprendizagem, biologia e cérebro. Neste, são abordados alguns conceitos como automodelagem e derivação instintiva que apontam para predisposição genética, selecionada ao longo da filogênese de cada espécie, no sentido de aprender melhor determinados comportamentos e não outros. Finalizando, o autor analisa as relações entre aprendizagem, cérebro e experiência.

A transição para o cognitivismo moderno: Hebb, Tolman e os gestaltistas é o tema do sexto capítulo. Na primeira metade do século XX, esses autores lançam formulações teóricas a respeito da aprendizagem que vão muito além de seu tempo. A complexa teoria de Donald Hebb prenuncia ao mesmo tempo os modelos conexionistas de aprendizagem, incluindo as redes neurais e a importância de se compreender as relações entre o funcionamento cerebral e a aprendizagem. Polêmico em sua época, Edward C. Tolman afirma que a aprendizagem envolve o desenvolvimento de mapas ou representações mentais da realidade, orientados por metas, enfatizando a importância da intencionalidade como orientadora e organizadora do comportamento. Por último, são sumarizados os principais princípios e pontos de vista da Gestalt sobre a percepção, as relações entre aprendizagem e memória, e o insight como uma forma de resolução de problemas e de aprendizagem, destacando-se as contribuições de Kurt Koffka, Wolfgang Köhler e Max Weitheimer.

O capítulo sete condensa a descrição de Três Teorias Cognitivas: Bruner, Piaget e Vygotsky. Jean Piaget e Lev S. Vygotsky são autores que abordam a aprendizagem dentro do contexto mais amplo do desenvolvimento humano. Nesse sentido, são sumarizados os aspectos gerais da pesquisa e teorização de Piaget sobre a origem e desenvolvimento da inteligência humana, bem como o pensamento de Vygotsky a respeito da relação ativa entre um indivíduo e sua cultura, num dado momento histórico, como propulsora da aprendizagem e do desenvolvimento das funções psicológicas superiores, tais como a consciência. Jerome Bruner, um dos principais fundadores e críticos da psicologia cognitiva, influenciado em parte pela obra desses dois pensadores, propõe e sistematiza a teoria da aprendizagem por descoberta, concebendo o aprender como a capacidade de ir além da informação dada. Além de sua produção mais recente e de suas implicações educacionais, nesse capítulo é focalizada principalmente sua teoria sobre a formação de conceitos.

A simulação computacional é uma forma de se estudar e ampliar nossa compreensão sobre como o nosso conhecimento e comportamento se modificam. Nesse sentido, programas baseados em redes neurais são utilizados para testar e refinar modelos teóricos sobre como são aprendidos conteúdos específicos, tais como a escrita. O histórico das pesquisas iniciadas no contexto da psicologia por D. E. Rumelhard e J. L. McClelland, além da descrição das tecnologias que permitem essa forma de se estudar, dentre outras coisas, a aprendizagem, são abordados no capítulo oito, Redes Neurais: O Novo Conexionismo.

O capítulo nove, Aprendizagem e Recordação, apresenta um modelo sobre estrutura e funcionamento da memória humana, discute suas relações com a aprendizagem, bem como algumas estratégias que podem potencializar a formação de novos conhecimentos por meio da aprendizagem, fazendo o bom uso do que sabemos sobre como nossa memória funciona.

As relações entre aprendizagem e aspectos afetivos, como a motivação e as emoções, são exploradas especialmente no capítulo dez, Motivação. São apresentadas algumas teorias da motivação - tais como a hierarquia dos motivos de Maslow, a teoria da ativação, a classificação dos motivos em intrínsecos e extrínsecos, a teoria da dissonância cognitiva de Leon Festinger, dentre outras - explorando suas relações com o que move o aprender, além de suas implicações educacionais.

Outra teoria fundamental é tema do capítulo onze, Aprendizagem Social: A Teoria Cognitiva Social de Bandura. Albert Bandura é outro grande psicólogo contemporâneo, que sistematizou a teoria sobre como aprendemos ao observar o comportamento de outra pessoa ou personagem, tomando-o como modelo - aprendizagem por modelação. Constatou que somos reforçados e motivados a aprender observando as consequências do desempenho de outras pessoas e não apenas quando somos premiados diretamente pelo nosso sucesso. Destaca que o sentido de agência e o senso de autoeficácia são fundamentais para o sucesso na aprendizagem. Sua teoria e implicações para a prática clínica, social e educacional são discutidas.

O autor encerra o livro com o capítulo doze, Análise, Síntese e Integração, no qual inicialmente classifica as teorias apresentadas no contexto da abordagem behaviorista ou da cognitivista, destacando igualmente as chamadas teorias de transição. Em seguida, retoma sumariamente todo o conteúdo abordado no livro e finaliza com as propostas integradoras de Jerome Bruner – perfil do aprendiz - e a de Robert Gagné, que hierarquiza as diferentes formas de aprender, as teorias relacionadas e os tipos de resultados de aprendizagem num mesmo modelo.

Na verdade, faria apenas um reparo a este excelente texto: a não consideração da Teoria da Aprendizagem Significativa, de David Ausubel, bastante influente nos ambientes educacionais, dentre as teorias arroladas. Difícil saber a razão desta exclusão num texto que se mostra bastante preocupado em ressaltar as implicações das teorias da aprendizagem para o ensino em salas de aula.

Enfim, impecável a tradução, o modo como são apresentados os assuntos e a ordenação dos mesmos, os exemplos fáceis de serem entendidos e de os alunos se identificarem com eles. Certa vez, José Fernando Bitencourt Lomônaco, responsável pela revisão técnica dessa obra, comentou que este livro era uma herança que deixava para o curso de Psicologia da Aprendizagem do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Com certeza, posso afirmar que essa é mais uma, dentre as relevantes contribuições que o mesmo oferece, à Psicologia da Aprendizagem no Brasil.

Recebido em: 09/11/2009

Aprovado em: 09/12/2009

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    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009
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