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Afetividade e atuação do psicólogo escolar

Affectivity and performance of the school psychologist

Afectividad y actuación del psicólogo escolar

Resumos

O presente artigo buscou investigar as concepções e práticas do psicólogo escolar acerca da afetividade na relação professor-aluno. Para atender o respectivo objetivo, foram realizadas entrevistas com quatro psicólogas escolares da cidade de Salvador, que atuam em escolas particulares e no ensino fundamental. A análise qualitativa dos dados contribuiu com a elaboração de três eixos de análise: 1) O papel e as demandas do trabalho do psicólogo escolar; 2) Concepções dos psicólogos acerca da afetividade na mediação pedagógica; 3) Estratégias de suporte ao professor na mediação pedagógica. A maioria dos dados analisados indicou que há diversas vertentes nas quais o psicólogo pode configurar intervenções com foco na afetividade, a exemplo de uma maior aproximação do corpo docente e coordenação pedagógica, elaboração de trabalhos direcionados ao currículo escolar, implantação de projetos de formação para professores, observações periódicas na sala de aula e reflexões frente à didática utilizada pelo professor.

Afetividade; psicólogo escolar; interação professor-aluno


In this article we investigate the concepts and practices of the school psychologist about the affectivity in teacher-student relationships. To reach our goal, we conducted interviews with four school psychologists from the city of Salvador, who work in private and elementary schools. The qualitative data analysis contributed to the elaboration of three main perspectives: 1) The role and work demands of the school psychologist, 2) conceptions of psychologists about the affectivity in teaching mediation, 3) strategies to support teachers in pedagogical mediation. Most of the data analyzed denoted there are several aspects in which the psychologist can work and set up operations with a focus on affection, as a closer relation between faculty and teaching coordination. The psychologist can also give assistance in preparing the curriculum and specific projects, in implementing educational projects for teachers, in observing classroom and promoting reflections on teaching and teachers.

Affection; school psychologist; teacher-student interaction


Este artículo investigó las concepciones y prácticas del psicólogo escolar acerca de la afectividad en la relación profesor-alumno. Para atender el respectivo objetivo, se realizaron entrevistas con cuatro psicólogas escolares de la ciudad de Salvador, que actúan en escuelas particulares y en la educación básica. El análisis cualitativo de los datos contribuyó con la elaboración de tres ejes de análisis: 1) El papel y las demandas del trabajo del psicólogo escolar; 2) Concepciones de los psicólogos acerca de la afectividad en la mediación pedagógica; 3) Estrategias de soporte al profesor en la mediación pedagógica. La mayoría de los datos analizados indicó que hay diversas vertientes en las cuales el psicólogo puede configurar intervenciones con enfoque en la afectividad, a ejemplo de más aproximación del cuerpo docente y coordinación pedagógica, elaboración de trabajos direccionados al currículum escolar, implantación de proyectos de formación para profesores, observaciones periódicas en aula y reflexiones sobre la didáctica utilizada por el profesor.

Afectividad; psicólogo escolar; interacción profesor-alumno


ARTIGOS

Afetividade e atuação do psicólogo escolar

Affectivity and performance of the school psychologist

Afectividad y actuación del psicólogo escolar

Fernanda Drummond Ruas Gaspar; Thaís Almeida Costa

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Monsenhor Eugênio Veiga, 98, 1202, Itaigara Salvador, Bahia. Código Postal: 41815-120

RESUMO

O presente artigo buscou investigar as concepções e práticas do psicólogo escolar acerca da afetividade na relação professor-aluno. Para atender o respectivo objetivo, foram realizadas entrevistas com quatro psicólogas escolares da cidade de Salvador, que atuam em escolas particulares e no ensino fundamental. A análise qualitativa dos dados contribuiu com a elaboração de três eixos de análise: 1) O papel e as demandas do trabalho do psicólogo escolar; 2) Concepções dos psicólogos acerca da afetividade na mediação pedagógica; 3) Estratégias de suporte ao professor na mediação pedagógica. A maioria dos dados analisados indicou que há diversas vertentes nas quais o psicólogo pode configurar intervenções com foco na afetividade, a exemplo de uma maior aproximação do corpo docente e coordenação pedagógica, elaboração de trabalhos direcionados ao currículo escolar, implantação de projetos de formação para professores, observações periódicas na sala de aula e reflexões frente à didática utilizada pelo professor.

Palavras-chave: Afetividade, psicólogo escolar, interação professor-aluno.

ABSTRACT

In this article we investigate the concepts and practices of the school psychologist about the affectivity in teacher-student relationships. To reach our goal, we conducted interviews with four school psychologists from the city of Salvador, who work in private and elementary schools. The qualitative data analysis contributed to the elaboration of three main perspectives: 1) The role and work demands of the school psychologist, 2) conceptions of psychologists about the affectivity in teaching mediation, 3) strategies to support teachers in pedagogical mediation. Most of the data analyzed denoted there are several aspects in which the psychologist can work and set up operations with a focus on affection, as a closer relation between faculty and teaching coordination. The psychologist can also give assistance in preparing the curriculum and specific projects, in implementing educational projects for teachers, in observing classroom and promoting reflections on teaching and teachers.

Keywords: Affection, school psychologist, teacher-student interaction.

RESUMEN

Este artículo investigó las concepciones y prácticas del psicólogo escolar acerca de la afectividad en la relación profesor-alumno. Para atender el respectivo objetivo, se realizaron entrevistas con cuatro psicólogas escolares de la ciudad de Salvador, que actúan en escuelas particulares y en la educación básica. El análisis cualitativo de los datos contribuyó con la elaboración de tres ejes de análisis: 1) El papel y las demandas del trabajo del psicólogo escolar; 2) Concepciones de los psicólogos acerca de la afectividad en la mediación pedagógica; 3) Estrategias de soporte al profesor en la mediación pedagógica. La mayoría de los datos analizados indicó que hay diversas vertientes en las cuales el psicólogo puede configurar intervenciones con enfoque en la afectividad, a ejemplo de más aproximación del cuerpo docente y coordinación pedagógica, elaboración de trabajos direccionados al currículum escolar, implantación de proyectos de formación para profesores, observaciones periódicas en aula y reflexiones sobre la didáctica utilizada por el profesor.

Palabras Clave: Afectividad, psicólogo escolar, interacción profesor-alumno.

Introdução

Diversos autores contemporâneos discorrem sobre a afetividade na sala de aula e a relação professor-aluno, ressaltando a importância do trabalho investigativo destes temas para a formação da personalidade da criança (Leite & Tassoni, 2002). Apesar de se constatar que os estudos e trabalhos relacionados aos processos afetivos tiveram um crescimento significativo nas últimas décadas, percebe-se que as contribuições de cunho prático advindas da Psicologia ainda são muito escassas (A. R. Almeida, 1999).

Da mesma forma, de acordo com a revisão de literatura realizada para o respectivo artigo, não foram encontradas muitas publicações que abordassem especificamente as concepções e possíveis práticas do psicólogo escolar no que se refere à afetividade como suporte necessário na mediação pedagógica.

É importante pontuar que existem publicações e considerações significativas de teóricos da Educação acerca desta discussão. Entretanto, muitas das produções científicas ainda guardam elementos de uma sociedade moderna, focalizando sua atenção nas dimensões cognitiva e intelectual, deixando em aberto a lacuna da afetividade, a qual concentra importância crucial na caminhada constitutiva do sujeito (Freitas & Assis, 2007).

A presença dos processos afetivos na relação professor-aluno e a qualidade da mediação pedagógica definem-se como pontos relevantes a serem refletidos por profissionais que estudam e atuam na área de desenvolvimento infantil e Educação. Desta forma, a afetividade torna-se, ainda, uma possível ferramenta de trabalho do psicólogo escolar, quando este reconhece tal elemento como direcionador de práticas difundidas no espaço da sala de aula. O presente estudo, portanto, propôs uma discussão acerca das estratégias utilizadas pelo psicólogo escolar, ampliando e explorando o trabalho com os processos afetivos e possibilitando intervenções de caráter preventivo, criativo e interdisciplinar no desenvolvimento do sujeito.

Durante muito tempo, a formação do psicólogo escolar direcionou-se para uma prática "higienista", restringindo-se praticamente à investigação de aspectos relacionados às dificuldades no aprendizado curricular (Mitijáns-Martinez, 2005).

De acordo com Andrada (2005), o psicólogo atuava com base num modelo clínico dentro da escola, diagnosticando e encaminhando alunos com desvios de comportamento, problemas no foco de atenção e concentração, disciplina, deficiência mental e intelectual, problemas de desestruturação familiar, dentre outras causas que justificavam o fracasso escolar, tema central do trabalho desse profissional.

Ao contrário desse antigo paradigma, o qual limita e distorce a prática do profissional de Psicologia, a ciência contemporânea vem problematizando discussões focadas na Psicologia da Educação, priorizando modelos preventivos de atuação sobre as circunstâncias emergidas no contexto escolar, assim como ampliando as possibilidades de atuação do psicólogo escolar.

Dentre os desdobramentos mais atuais do trabalho desse profissional na escola, está o mapeamento institucional, condição básica para que se inicie um trabalho neste contexto, haja vista que esta estratégia de trabalho permite uma visualização do funcionamento, cultura, história e dinâmica da organização. Outras possibilidades de atuação concentram-se na promoção de um espaço que proporcione acolhimento aos alunos, familiares e funcionários da organização, estruturação de práticas de assessoramento a trabalhos coletivos junto à equipe pedagógica, assim como acompanhamento dos elementos emergidos do processo de ensino-aprendizado (Araújo & Almeida, 2005).

Em meio a estas práticas centrais, o psicólogo escolar tenta solidificar sua atuação profissional e capacitar-se tecnicamente para atender as demandas peculiares da escola. Torna-se imprescindível, então, que ele adentre o universo dos mais variados diálogos da educação, bem como em temas específicos, a exemplo das adaptações curriculares, projetos pedagógicos e interdisciplinares, processos de aprendizagem, manejo e técnicas de grupo, dentre outras propostas de trabalho que visem a uma ressignificação de olhares sobre o aluno e à redução de rotulações e diagnósticos desprovidos de análises e observações convincentes (Andrada, 2005).

Nessa direção, pensar hoje em dia na atuação do psicólogo escolar de uma forma mais interdependente no contexto educacional é também se conectar às diversas possibilidades de uma atuação educacional integrada, a qual se distancia de um modelo paradigmático de doença e problemas restritos ao fracasso escolar, e aproxima-se da noção de saúde psicológica, inaugurando estratégias de promoção e bem estar aos sujeitos em processo de desenvolvimento (Mitijáns-Martinez, 2005).

É evidente que, no cotidiano da escola, emergem situações de conflitos de ordem afetiva e emocional, envolvendo professores, alunos, funcionários e família, bem como frequentes manifestações de raiva, desespero e irritação, dentre outras, as quais são de difícil resolução. Da mesma forma que o professor, o psicólogo envolvido neste processo deve ter a consciência do caráter de contágio das emoções, a fim de que se possa trabalhar com essas reações e mobilizações de uma forma mais positiva e interventiva, tanto para os sujeitos sob o ponto de vista individual, quanto na dinâmica coletiva de um determinado grupo em sala de aula (Galvão, 2004a).

Cabe especificar que o contágio emocional configura-se como uma tendência a imitar de forma automática expressões, posturas e movimentos de outras pessoas, ou seja, é um tipo de influência social que pode ocorrer em nível consciente ou subconsciente. Trata-se de um conceito que explica grande parte dos fenômenos sociais e coletivos, sendo, portanto, imprescindível o investimento nos estudos e métodos científicos que abarquem o campo das emoções (Gouveia, Guerra, Santos, Rivera, & Singelist, 2007).

Nesse sentido, insiste-se na ideia de que, ao reconhecer os processos afetivos como um aspecto importante e necessário na mediação pedagógica, o psicólogo escolar pode utilizar-se do trabalho com estes elementos para ampliar o seu papel e suas possibilidades de atuação no espaço da sala de aula. Logo, esse psicólogo passa a buscar novos recursos metodológicos que orientem sua prática frente ao elemento da afetividade presente no ambiente escolar e, essencialmente, na relação entre professor e aluno.

Dentro do contexto desta mediação pedagógica, há diversas trajetórias em que o profissional de Psicologia poderá caminhar e configurar intervenções com foco na afetividade, tais como os trabalhos com a equipe de pedagogos e docentes, sobretudo no que tange à metodologia e relações fomentadas em sala de aula. Vale ressaltar, contudo, que os componentes afetivos apresentam grandes dificuldades de estudo, principalmente no estabelecimento de conceituações no campo de pesquisas científicas (Leite & Tassoni, 2002).

Todavia, importantes teóricos da Psicologia e Educação, a exemplo de Vigotsky e Wallon, produziram, em suas respectivas obras, conhecimentos relevantes acerca da afetividade como parte integrante na constituição do sujeito. Conforme Galvão (2004b), o teórico Henri Wallon trouxe uma respeitosa contribuição não só para os estudos de aprendizagem, mas também para o entendimento da dinâmica vivencial do ser humano no processo de constituição da sua personalidade. Foi também o primeiro teórico a abordar especificamente as emoções dentro da sala de aula, assim como pontuar questões referentes à importância dos movimentos corporais da criança neste contexto.

Wallon (1981, citado por Mahoney, 2000) também marcou a diferença entre emoção e afetividade, conceituando a primeira como elemento mediador entre o orgânico e o psíquico. Desta forma, compreende-se a emoção como o primeiro forte vínculo da criança com o mundo, assim como uma forma de expressão adaptativa com o seu meio. Já a afetividade corresponde a um momento mais tardio do desenvolvimento, sendo este marcado por elementos subjetivos que moldam a qualidade das relações com sujeitos e objetos. Logo, pode-se dizer que a afetividade sinaliza a entrada da criança no universo simbólico, proporcionando também a origem da atividade cognitiva.

Outra contribuição walloniana, a qual não foi facilmente aceita por muitos modelos educacionais, foi a visualização positiva do conflito na sala de aula. Entende-se que o professor necessita ter habilidades e conhecimentos teóricos para perceber e intervir em situações que envolvam conflitos e crises emocionais. Como já foi explicitado anteriormente, o professor deve ter consciência do poder do contágio emocional entre as crianças e atuar nessas situações, promovendo intervenções que possam ser administradas de forma significativa e, possivelmente, benéfica para o grupo. Um trabalho bem elaborado em tais circunstâncias auxilia o processo de constituição do sujeito, pois este, ao se colocar em confronto com o outro, aprende também a se organizar psiquicamente (Mahoney, 2000).

Vigotsky, assim como Wallon, discorreu sobre as emoções partindo de uma base biológica, considerando que não há um desaparecimento destas quando o sujeito desenvolve-se, mas sim transformações na intencionalidade das manifestações emocionais decorrentes do próprio envolvimento com os processos cognitivos e simbólicos do universo da criança. As emoções passam também por um processo de refinamento durante o desenvolvimento do indivíduo, deslocando-se de uma manifestação praticamente primitiva e com caráter instintivo para uma vivência complexa e entrelaçada aos processos superiores (Leite & Tassoni, 2002).

Apesar da discreta evidência em seus escritos, a afetividade constitui-se como um importante tema mencionado na obra vigotskiana. O autor baseou-se numa abordagem complexa para explicar os processos que envolvem o desenvolvimento do indivíduo, criticando, assim, estudos que retratavam um dualismo presente nas dimensões cognitiva e afetiva no funcionamento psicológico (Vigotsky, 2007). Diante da perspectiva deste teórico, só é possível entender o pensamento do indivíduo quando se reconhecem as bases afetivo-emocionais, haja vista que estas não só influenciam, mas também dão origem aos processos de pensamento.

A separação das dimensões cognitiva e afetiva enquanto objeto de estudos é uma das principais deficiências da psicologia tradicional, uma vez que esta apresenta o processo de pensamento como um fluxo autônomo de pensamentos que pensam a si próprios, dissociados da plenitude da vida, das necessidades e dos interesses pessoais, das inclinações e dos interesses pessoais, das inclinações e dos impulsos daquele que pensa (Vigotsky, 1993, p. 6).

Dentro do espaço escolar, Vigotsky atribuiu um papel crucial às relações sociais no processo de desenvolvimento, visto que a escola também exerce essa função de propiciar elementos facilitadores não só restritos às construções de conhecimento, mas também atrelados à constituição do sujeito como um todo (Vigotsky, 2007).

Torna-se evidente o papel do professor no contexto escolar, pois este ocupa uma posição de importante mediador e facilitador do processo de aprendizagem. De forma geral, tanto Wallon quanto Vigotsky buscaram incluir e destacar, em suas respectivas teorias, a presença dos processos afetivos emergidos desta mediação, assim como possíveis influências no ensino-aprendizado. (Leite & Tassoni, 2002).

Com base nas teorias acima fundamentadas, reforça-se a ideia de que a escola constitui-se como um espaço crucial para o desenvolvimento da personalidade da criança, além de se destacar como um ambiente de intensas trocas sociais, cognitivas e afetivas. Cabe enfatizar que muitos estudos sobre o campo de trabalho do psicólogo escolar têm como foco principal a atuação do professor, tornando assim evidente a demanda de um trabalho integrado entre ambos profissionais da educação, visando ao aperfeiçoamento e desenvolvimento de habilidades direcionadas às práticas afetivas e efetivas em sala de aula (Rodrigues & Garms, 2007).

Método

Desenho do estudo

Tratou-se de um estudo de levantamento regido pela coleta e análise de dados qualitativos. Esta escolha pode ser justificada pelo fato do tema buscar discutir práticas do psicólogo escolar ainda pouco difundidas no campo científico. Pode-se dizer, então, que o respectivo artigo teve um caráter exploratório, tendo em vista a escassez de dados específicos na literatura pesquisada (Ludke & Andre, 1986).

Contexto da pesquisa

A pesquisa foi realizada em quatro escolas particulares de ensino fundamental situadas na cidade de Salvador, com predomínio de um público de classe média alta. A escolha por um contexto de escola particular teve como justificativa a quase inexistência desses profissionais atuando em escolas públicas na respectiva cidade. Além disso, é relevante mencionar a dificuldade em encontrar psicólogos escolares trabalhando no cotidiano das escolas particulares. Optou-se também por entrevistar psicólogos que atuassem junto às classes de ensino fundamental I, visto que o segmento da educação infantil já se constitui como um ambiente cujas expressões afetivas e emocionais são mais frequentes e transparentes (A. R. Almeida, 1999).

Participantes

O universo empírico foi composto por quatro psicólogas escolares que atuam no cotidiano da escola de ensino fundamental I. Tais psicólogas atuam não só com os alunos e familiares, mas sim com o corpo docente que acompanha e medeia os processos de aprendizagem destes alunos. As profissionais convidadas para participar do estudo foram selecionadas conforme a disponibilidade de horários e acordos prévios com a direção da escola.

Instrumentos

Para o alcance dos objetivos do estudo, foi construído um roteiro de entrevista semiestruturada. Este modelo de entrevista frequentemente traz consigo elementos e itens baseados em um estudo prévio, tanto sobre a prática do psicólogo escolar quanto sobre o papel da afetividade presente na sala de aula.

Procedimentos de coleta de dados

Os dados foram coletados por uma aluna do 8º semestre do curso de Psicologia, no período de abril a junho de 2009. No primeiro contato com as instituições e com o psicólogo escolar, o pesquisador explicou os objetivos e a relevância do estudo, agendando posteriormente uma segunda visita para a realização da entrevista, conforme disponibilidade e planejamento do profissional. Reforça-se, mais uma vez, a dificuldade em encontrar psicólogos escolares que atuassem diretamente no cotidiano da escolar, bem como a disponibilidade deste número reduzido de profissionais na participação do estudo.

Processamento e análise de dados

Os dados qualitativos coletados nas entrevistas foram transcritos e organizados em três eixos específicos de análise, dentre as quais foram efetuadas interpretações, descrições e confrontações de hipóteses resultantes da associação do estudo teórico com os resultados das respectivas entrevistas (Alvez-Mazzotti & Gewandsznajder, 1999). Para tanto, os respectivos eixos de análise definidos foram: 1) Papel e demandas do trabalho do psicólogo escolar; 2) Concepções dos psicólogos acerca da afetividade na mediação pedagógica; e 3) Estratégias de suporte ao professor na mediação pedagógica.

Resultados e Discussão

Papel e demandas do psicólogo escolar

O presente eixo de análise foi composto por perguntas que pretendiam investigar a percepção das entrevistadas acerca do lugar atribuído ao psicólogo escolar nos últimos anos, bem como sua inserção e possibilidades de atuação. Alguns fatos destacaram-se como significativos:

O papel do psicólogo escolar mudou sim e muito! Hoje considero que o psicólogo escolar não segue uma rotina específica e está em todos os lugares da escola, inclusive dentro da sala de aula, auxiliando o professor em diversas formas dentro de uma proposta integrada. Porém, sinto que ainda guardamos elementos dessa era moderna: psicólogo escolar é àquele que "enxerga cabelo em ovo", que diagnostica, classifica, apaga incêndios, aquele que pode dar a melhor solução (Psicóloga L.).

O psicólogo escolar, de uma forma geral, ainda tem pouca inserção e percebo, através da minha pratica, o quanto faz diferença a presença e formação do psicólogo na escola. Penso que ainda não existe um mercado realmente para que ocorra essa inserção do psicólogo na escola de uma maneira significativa (Psicóloga M.).

A partir das diversas respostas coletadas nas entrevistas, pôde-se inferir que há uma compreensão bem elaborada no que se refere às mudanças e ampliações das funções do psicólogo na escola ao longo dos últimos anos. Contudo, percebeu-se que ainda se preservam resquícios de uma percepção cartesiana do lugar desse profissional, principalmente na visão de pais, professores e da sociedade, pois visualizam o papel do psicólogo como aquele profissional que dá respostas, soluciona problemas e desvios relacionados ao comportamento e a aprendizagem.

Ainda foi possível perceber a escassez de psicólogos no ambiente escolar, aspecto que foi igualmente ressaltado pelas entrevistadas, sinalizando a necessidade de investimento na atuação e inserção desse profissional, o qual pode vir a otimizar o diálogo entre especialistas da educação e as diferentes áreas do conhecimento. Nesse sentido, pontua-se uma fragilidade nesse emergente campo de atuação do psicólogo escolar, existindo, entretanto, por parte das entrevistadas, uma perspectiva crítica da ampliação do papel desse profissional, o qual já vem buscando possíveis caminhos de aproximação dos elementos reflexivos inseridos na escola.

Dessa forma, é possível concordar com Meira & Tanamachi (2003) quando elas mencionam que o melhor lugar para o psicólogo escolar é o lugar possível, sinalizando, assim, a necessidade do psicólogo apropriar-se dessa rede de elementos psicológicos que compõem a escola e caminhar na direção do que é possível articular. Este profissional deve assumir um compromisso teórico e prático com os variados aspectos presentes nesse contexto, tendo sempre como referência questões emergidas no cotidiano da escola para que, desta forma, seja possível elaborar uma atuação crítica, competente e criativa.

É cada vez mais notória a necessidade da Psicologia Escolar repensar formas de atuação junto com os outros profissionais pertencentes ao universo da escola, incluindo docentes e pedagogos, com o intuito de ampliar as possibilidades curriculares, estratégias de ensino-aprendizagem, dentre outras formas que potencializem características multifatoriais desses sujeitos em processo de desenvolvimento. É nesse sentido que caminha a prática dos psicólogos, visando privilegiar uma atuação mais preventiva, a qual possa ser compreendida e consolidada na escola, reduzindo, assim, demandas e solicitações limitadas à dimensão do problema e da doença (Rei, 2003, citado por Mitjáns- Martínez, 2005).

Concepções dos psicólogos acerca da afetividade na mediação pedagógica

Pôde-se perceber que a representação do papel do professor no ensino fundamental é de extrema valia para o trabalho do psicólogo, pois se projeta uma relação identificatória-afetiva do aluno com esse mestre. Partindo dessa concepção, é que se reconhece a fala da psicóloga:

Penso que o papel da afetividade neste período letivo relaciona-se diretamente com a comunicação do professor, com sua metodologia de trabalho e exposição do conteúdo programático. Esse aluno vive um período de elaboração de identidade e o professor torna-se mais uma figura de referência nesse processo (Psicóloga L.).

Da mesma forma, a psicóloga M. destacou, por exemplo, que o afeto não é só gostar do professor, podendo ser expresso de diferentes maneiras, cabendo ao professor ter essa sensibilidade para percebê-lo na relação e utilizá-lo como recurso de trabalho e de comunicação com os alunos. Este último ponto foi bem destacado por L. quando insistiu no fato de que a comunicação apresenta-se como uma importante ferramenta afetiva na relação professor-aluno. A escolha de bons recursos didáticos associados a essa forma de transmissão do conhecimento torna-se um aspecto relevante no trabalho do psicólogo escolar com tais profissionais que vivenciam o cotidiano na sala de aula. Leite e Tassone (2002) confirmam essa ideia, enfatizando que uma escolha adequada dos recursos e metodologias utilizados em sala de aula é aquela que assegura o vínculo afetivo entre o professor e o aluno, bem como propicia uma aprendizagem significativa dos conteúdos e trabalhos propostos.

A psicóloga M. marcou também que, nesse período escolar, a própria relação do aluno com o professor adquire outra configuração, uma vez que a questão identificatória é mais enfocada, em detrimento da relação de substituição da figura materna/paterna, muito presente na educação infantil. A expressão "cognitização da afetividade" é salientada também por Leite e Tassone (2002), reforçando a ideia de que a criança passa a valorizar uma forma de afeto manifestada não só por beijos e abraços, mas sim por um reconhecimento do professor através de elogios e incentivos nas construções pessoais do aluno.

S. Almeida (2003) confirma a validade da expressão citada anteriormente, defendendo a ideia de que, quando há um desenvolvimento na inteligência do sujeito, ocorre também, necessariamente, uma evolução dessa afetividade. Assim, para acompanhar os processos cognitivos, a afetividade passa a ser mais racionalizada, influenciando diretamente as representações afetivas consolidadas nas relações interpessoais.

Diante dessa diversidade de expressões afetivas e dos seus diferentes níveis de intensidade, faz-se necessário o psicólogo avaliar como o professor vem administrando e acolhendo os afetos apresentados e conduzindo as relações entrelaçadas. Destacou-se, no discurso das entrevistadas, essa dificuldade que o professor vivencia:

Eu acho que existe um turbilhão de questões presentes na sala de aula e o professor não consegue lidar bem com tudo isso. Assim, esse professor ainda espera que alguém lide por ele. Quando esse turbilhão emocional aparece, é como se o coordenador pedagógico ou o psicólogo escolar precisasse entrar em cena para lidar no lugar do professor (Psicóloga V.).

Nesta faixa etária, tudo que acontece é muito intenso; os alunos são instáveis, agitados, exigem sempre muita atenção e têm dificuldades de incluir o outro. Então o professor precisa entrar para mediar as situações e ajudá-los neste processo de amadurecimento (Psicóloga H.).

Mais uma vez, foi salientada, no discurso das entrevistadas, a dificuldade do professor em administrar os afetos e levar o aluno a separar aquilo que é dele daquilo que é do outro, tornando-se vulnerável, desse modo, ao "circuito perverso". Esta expressão revela-se em situações nas quais o indivíduo, neste caso o professor, tem dificuldade para reagir de forma racional às manifestações emocionais dos alunos. Quando o professor não reconhece os possíveis indicadores e efeitos de uma emoção, suas estratégias na administração das emoções na sala de aula tornam-se cada vez menos apropriadas e efetivas (Dantas, 1992).

As psicólogas V. e M. concordam com esta preocupação em relação ao fato de os professores lidarem mal com os afetos manifestados em sala, visto que, quando este docente não consegue administrar cognitivamente as emoções e relações de afeto, acaba por alimentar este "circuito perverso", o que pode trazer prejuízos significativos na relação entre o professor e seus alunos.

Torna-se manifesta, assim, a necessidade de que os professores conheçam seus alunos não só no nível cognitivo, mas, principalmente, no âmbito emocional. Os processos afetivos constituem-se como um importante suporte à atuação do professor, contudo podem também dificultar e comprometer sua atuação quando tais aspectos não forem bem manejados e articulados no aprendizado. A psicóloga H. destacou a importância da condução e mediação do professor em meio a este turbilhão de manifestações emocionais, visto que, principalmente no ensino fundamental, o sujeito enfrenta intensas mudanças na sua constituição, refletindo assim no seu comportamento agitado e na sua forma insegura de se relacionar com o outro e consigo mesmo.

Na mesma linha de pensamento exposta pela psicóloga H., Wallon (1985, citado por Galvão, 2004b) esclarece que a criança do ensino fundamental experiencia um estágio denominado "categorial", predominando os processos centrados na inteligência ou cognição, o que leva a criança a se concentrar em questionamentos mais lógicos e sistemáticos da sua realidade. Logo, a criança vai traçando seu percurso e se inserindo num conjunto de milhares de estímulos internos e externos, direcionando gradualmente suas impressões de maneira não linear.

É importante pontuar que, de acordo com a teoria walloniana, neste período de desenvolvimento - o qual exige inúmeras superações intelectuais -, não se pode olvidar dos momentos de ludicidade tão relevantes para a aprendizagem e desenvolvimento do sujeito. Em outras palavras, articular atividades de leitura de livros com brincadeiras e outros trabalhos corporais, por exemplo, contribui para a eficácia da função pedagógica e afetiva na relação professor-aluno. Com base nessa necessidade, a psicóloga V. sustentou que o diálogo epistemológico vem sempre precedido do diálogo afetivo, insistindo assim na ideia de que, se há um investimento afetivo, bem como um interesse prévio em determinada atividade, o processo de assimilação do conhecimento torna-se mais fluido e significativo para a criança (Galvão, 2004b).

Sobre a presente temática, não é demais trazer à reflexão, também, o pensamento de Vigotsky, que resta associado à fala de H. quando ela enfocou a necessidade do professor mediar situações e ajudar no amadurecimento. Neste sentido, a obra vigotskiana respalda a ideia de que esse professor - importante mediador que é - deve refletir, em seu planejamento de aulas, acerca do desenvolvimento real dos alunos, bem como sobre o que eles podem vir aperfeiçoar e alcançar mediante os mais variados facilitadores de aprendizado (Vigotsky, 2007).

Dessa forma, torna-se relevante o auxílio na capacitação do professor para que ele possa vir a desenvolver habilidades ao se confrontar com tais explosões emocionais por parte de um único aluno, de um grupo ou de familiares. O psicólogo escolar, principal responsável pelo referido auxílio, trabalha com o professor para que este não fique vulnerável à situação de contágio emocional, impossibilitado, assim, de enxergar as nuances que circundam a situação, o que o faz perder o controle das possibilidades de ação que atenuariam tal circunstância.

Estratégias dos psicólogos

Quando questionadas sobre as formas de atuação do psicólogo, a maioria das entrevistadas destacou a formação de professores como um importante recurso estratégico no auxílio desta mediação. A seguir, percebem-se, no relato destas psicólogas, algumas possibilidades de condução desta prática.

Realizo um trabalho de reflexão com os professores, questionando sua escolha profissional e sua história com a educação e atuação. É fornecido esse suporte através da formação de professores, de reuniões periódicas e das intervenções e atividades realizadas dentro da sala de aula em paralelo com o trabalho do professor (Psicóloga L.).

Minha função não é fazer pelo professor, mas sim ajudá-lo a construir práticas significativas nessa área para que ele aprenda a lidar com essas relações, lidar com o que é do outro, lidar com o fato de que pode ser difícil para o outro lidar com aquele conhecimento (Psicóloga V.).

Todas as psicólogas reconheceram a necessidade do suporte ao professor através da utilização de alguns recursos como: o estabelecimento de reuniões interdisciplinares, elaboração de formações de professores para que se trabalhe esse lado mais pessoal e afetivo, assim como a utilização de práticas que os ajudem a entrar em contato com os seus sentimentos, valores, projetos de vida, metas etc. A psicóloga V., por exemplo, marcou, com muita propriedade, a importância do psicólogo se colocar disponível para acolher esse professor e fazer "convites" para possíveis encontros, demonstrando que é parte do trabalho estar perto deles e realizar este suporte e partilha dos elementos que permeiam sua prática. V. também destacou que esse trabalho de parceria entre psicólogo e professor se faz importante, pois, muitos desses profissionais de ensino não trabalharam esses processos afetivos e conflitivos - próprios do cotidiano de sala de aula - em suas respectivas graduações. O suporte promovido pelo psicólogo escolar e o possível trabalho de formação perpassam por essas questões de cunho prático e de difícil manejo do professor em sua atuação diária.

Sobre isso, Araújo e Almeida (2005) reforçam o trabalho do psicólogo com a formação de professores por meio do estímulo de questionamentos entre esses profissionais, assim como fazendo com que eles entrem em contato com a sua história profissional, com seus objetivos, limites e dificuldades na implantação das suas práticas.

Alguns temas específicos da vivência desse professor podem nortear o trabalhar do psicólogo, a exemplo do debate acerca das possibilidades e estratégias de comunicação criativa, reflexões sobre a compreensão do professor no que tange ao contexto educativo, a flexibilização diante de mudanças no ambiente escolar, as habilidades para negociar e mediar conflitos e a apropriação de questões técnicas acerca do planejamento pedagógico, currículo e avaliação. Vale ainda ressaltar que o professor atua como importante mediador entre o sujeito e o objeto dentro da sala de aula, o que reforça sua responsabilidade em buscar meios mais efetivos para estabelecer esta mediação como os alunos (Leite, 2006). Nesse sentido, torna-se relevante que o psicólogo invista no trabalho com a qualidade desta relação configurada em sala de aula.

Diante dessas possibilidades de intervenção mapeadas pela Psicologia Escolar, S. Almeida (2003) conclui que a experiência de formação de professores vem se apresentando como uma das práticas mais produtivas da atuação do psicólogo, visto que vem trazendo excelentes repercussões no desenvolvimento do professor, principalmente no que diz respeito aos níveis de motivação e reflexão sobre sua atuação.

Tanto M. quanto V. concordaram com o fato de que o espaço de diálogo gerado entre psicólogos e professores também favorece a eficácia dessa prática, visto que se cria um contexto com a finalidade de se estabelecer, entre estes docentes, trocas de experiências, de angústias, dificuldades, ideias, valores e percepções sobre a atuação profissional, reconstruindo assim novos significados e práticas.

A psicóloga M. enfatizou, ainda, como mais uma possibilidade de estratégia utilizada pelo psicólogo, o incentivo a trabalhos realizados na sala de aula em conjunto com a arte, elemento que aproxima o sujeito dos processos afetivos. Dessa forma, ela acredita que o psicólogo pode trabalhar auxiliando o professor no planejamento pedagógico, equilibrando atividades que valorizam o desenvolvimento afetivo-cognitivo.

Apesar de considerar esse trabalho como uma importante variável na atuação do psicólogo, ainda existem algumas dificuldades em relação à sua inserção e manejo, principalmente a partir do ensino fundamental. Pôde-se perceber, no trecho a seguir, o processo dessa consolidação da arte no projeto curricular em uma determinada instituição de ensino:

Nós temos, aqui, arte no currículo, mas no ensino fundamental isso já é algo formatado como matéria, não é algo tão espontâneo como na educação infantil. Ainda assim, incentivamos a ideia de se pensar em trabalhos dessa expressão da criatividade de uma forma mais natural (Psicóloga M.).

Ampliando as palavras da respectiva psicóloga acima, Silva (2005) defende que a inserção da arte no planejamento pedagógico vem sendo um importante recurso que auxilia o professor no trabalho com afetividade em sala de aula. O contato com obras de arte, literatura, músicas, dentre outras manifestações artísticas, permite um encontro do indivíduo com aspectos inerentes a sua condição de sujeito, como medo, alegria, angústia, saudade etc. Para realizar um trabalho com os alunos, os próprios professores necessitam primeiramente desta aproximação com a arte, para que possam repensar as possibilidades de sua prática profissional, tanto com os alunos quanto com eles mesmos. Além disso, o psicólogo pode auxiliar esse professor na sala de aula, mediante as observações e intervenções específicas, bem como participando do planejamento de aulas, suscitando reflexões acerca das escolhas desse docente e manejos de transmissão do conteúdo programático.

Nesta perspectiva, S. Almeida (2003) torna evidente a necessidade de uma adequada capacitação para o psicólogo no que tange às práticas e planejamentos pedagógicos, para que este possa vir a intervir junto ao professor, auxiliando na construção de alternativas teórico-metodológicas de ensino, avaliação e manejo das relações e manifestações afetivo-emocionais presentes em sala de aula.

Faz-se necessário salientar que a maioria das entrevistadas apresenta um discurso voltado para a consolidação dessa parceria mais próxima e efetiva com o professor. No entanto, uma das psicólogas ainda demonstra dificuldade em se aproximar de um modelo que envolva práticas e demandas de cunho mais preventivo. É o que se pôde constatar a partir da leitura do trecho abaixo:

É preciso abrir o diálogo entre as partes, ouvir quais são as queixas dos alunos, pais ou professores, e a partir do que está sendo trazido, ajudá-los a compreender o que mobilizou o conflito, tirar dúvidas e buscar as respostas (Psicóloga H.).

Notou-se que a fala de H. possui passagens condizentes com a proposta abordada por Meira e Antunes (2003), os quais discutem que ainda é notória uma associação entre a atuação do psicólogo escolar ao fenômeno da queixa, do fracasso escolar e da necessidade de buscar respostas. Para tanto, estes autores defendem que o próprio profissional de Psicologia deve assumir um papel de mediador dos diálogos e das percepções referentes ao seu lugar na escola, objetivando, assim, a superação dessas demandas relacionadas à queixa escolar e às práticas remediativas. O discurso de H., diferente das outras psicólogas, ressaltou a presença de elementos mais distantes de uma perspectiva preventiva, demonstrando, dessa forma, que ainda existem limites e rotulações no espaço escolar no que tange à prática do psicólogo.

Considerações Finais

Em relação às estratégias utilizadas pelos psicólogos escolares para auxiliar o professor na mediação pedagógica, percebeu-se a importância de se investir num trabalho com o professor, acolhendo as demandas da sala de aula, suscitando reflexões, auxiliando no planejamento pedagógico, principalmente na forma como se estabelece a relação entre o docente e o aluno. As atividades atreladas à expressão do conhecimento através da arte fazem parte de uma possível estratégia incentivada pelo psicólogo, com o intuito de que o professor possa mediar e trabalhar com processos afetivos no contexto estudado. Ao trabalhar junto com o corpo docente, as psicólogas entrevistadas destacaram que a maior dificuldade ressaltada no discurso do profissional que ensina é a realização de um trabalho que atenda tanto as exigências conteudistas do currículo escolar quanto as necessidades afetivas.

Ademais, no que se refere ao trabalho com a afetividade, notou-se a necessidade de uma compreensão mais ampla da forma como esses afetos vêm se apresentando no ambiente de sala de aula e na relação com o professor. Por fim, as entrevistadas insistiram na ideia de que o psicólogo não trará respostas prontas às questões demandadas, mas sim auxiliará este professor por meio de leituras e escutas diferenciadas dos acontecimentos vivenciados na sala de aula, realizando assim intervenções com o grupo e promovendo o levantamento de questionamentos e reflexões com o professor, com o intuito de repensar novas práticas e espaços de sua atuação. Vale ressaltar que o estudo revelou uma pequena inserção de psicólogos atuando em escolas, tornando assim evidente a necessidade imediata de se buscar uma maior abertura e consolidação desse espaço de trabalho para este profissional, principalmente no que tange à esfera pública.

A principal contribuição desse trabalho foi sinalizar a necessidade de se pensar em novas práticas advindas da Psicologia Escolar, bem como num maior aprofundamento teórico acerca da atuação do psicólogo com o tema da afetividade na sala de aula. Faz-se necessário que o psicólogo amplie seu foco de trabalho na escola, valorizando os processos evolutivos do sujeito, tanto em nível cognitivo quanto afetivo, uma vez que já existem publicações, sobretudo na área pedagógica, buscando compreender como a afetividade tem sido considerada no contexto da sala de aula.

É bem verdade que o estudo e o aprofundamento destas questões por parte do psicólogo escolar não se esgotaram, mas certamente contribuíram para fomentar ainda mais discussões neste fértil terreno de diálogos possíveis entre a Psicologia e a Educação.

Alameda das Espatódias, 915, Caminho das Árvores

Salvador, Bahia. Código Postal: 41820-460

Recebido em: 18/01/2011

Reformulado em: 26/04/2011

Aprovado em: 24/05/2011

Sobre as autoras

Fernanda Drummond Ruas Gaspar (gaspar_nanda@hotmail.com)

Psicóloga pela Universidade Salvador - UNIFACS, Pós-graduanda em Gestalt-Terapia pelo Instituto de Gestalt-Terapia da Bahia-IGT.

Thaís Almeida Costa (taicosta@yahoo.com.br)

Psicóloga, Mestra em Educação pela PUC-MG, Professora do Departamento de Ciências Humanas e da Saúde da UNIFACS.

Trabalho anteriormente apresentado ao curso de graduação em Psicologia, da Universidade Salvador - UNIFACS, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Psicologia. Professora Orientadora: Thaís Almeida Costa

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jul 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 2011

    Histórico

    • Revisado
      26 Abr 2011
    • Recebido
      18 Jan 2011
    • Aceito
      24 Maio 2011
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