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Problemas de Disclosure no Brasil: o caso das empresas com ações no exterior

Resumo

Muitas companhias brasileiras, sofrendo os efeitos de um mundo cada vez mais competitivo, estão lançando valores mobiliários no exterior, a fim de reduzirem seus custos de captação. As companhias abertas, em especial as que já lançaram seus programas de American DepositaryReceipts - ADRs, estão sendo questionadas acerca das diferenças dedisclosure entre as demonstrações financeiras publicadas no Brasil e nos Estados Unidos. Esta e uma tentativa de estudar tais diferenças e analisar as demonstrações financeiras para identificar as razões subjacentes.


Problemas de Disclosure no Brasil - o caso das empresas com ações no exterior

Artur Franco Bueno

Mestrando em Controladoria e Contabilidade - FEA'USP. Bacharel em Ciências Contábeis - FEA/USP

RESUMO

Muitas companhias brasileiras, sofrendo os efeitos de um mundo cada vez mais competitivo, estão lançando valores mobiliários no exterior, a fim de reduzirem seus custos de captação. As companhias abertas, em especial as que já lançaram seus programas de American DepositaryReceipts - ADRs, estão sendo questionadas acerca das diferenças dedisclosure entre as demonstrações financeiras publicadas no Brasil e nos Estados Unidos.

Esta e uma tentativa de estudar tais diferenças e analisar as demonstrações financeiras para identificar as razões subjacentes.

INTRODUÇÃO

Com a internacionalização dos mercados de capitais, muitas empresas não norte-americanas, em busca de uma nova opção de captação de recursos, começaram a emitir suas ações no maior mercado de ações do mundo.

Devido ao crescente interesse dos capitais estrangeiros pela América Latina, algumas companhias brasileiras deram início a seus programas de lançamento de ADRs (American Depositary Receipts) ourecibos de depósitos de ações1 1 As ADRs possuem quatro níveis, a saber: Regra nº144 A (mercados primários e secundários via oferta privada, mercado de balcão ou registro no sistema de negociação eletrônica), nível I (mercado secundário e registro em balcão), nível II (mercado secundário e registro em bolsa) nível III (mercados primário e secundários via oferta publica e registro em bolsa). Para uma visão mais ampla, consulte CHOI & MUELLER (1992, p.307-312). nas principais casas bursáteis norte-americanas: Bolsa de Valores de Nova lorque (New York Stock Exchange - NYSE'), Sistema Automatizado de Cotações da Associação Nacional de Corretoras de Valores (National Association of Securities Dealers Automated Quotation - NASDAQ), Bolsa de Valores Norte-americana (American Stock Exchange - AMEX).

No vácuo desta corrida pela globalização dos mercados financeiros, muitos artigos foram escritos de forma a abranger os aspectosinterdisciplinares da internacionalização de negociação de ações de uma mesma empresa.

Embora englobe disciplinas como Economia. Finanças. Direito e Jornalismo, talvez seja o plano das Ciências Contábeis o maior beneficiário deste movimento. Isto porque as demonstrações financeiras de diferentes países não são comparáveis entre si! As formas com que os valores publicados são calculados e a maneira como são divulgados variam de país a pais2 2 Um caso famoso trata-se do reconhecimento dos efeitos inflacionários nas demonstrações contábeis. A correção de tal distorção é reconhecida em apenas alguns países. Apesar de ainda aplicada no Brasil, foi oficialmente "extinta" pela Lei nº9.249/95. . não bastando, por exemplo, fazer a versão em inglês e a conversão para o dólar das demonstrações financeiras de uma companhia brasileira3 3 O primeiro passo rumo a padronização dado pelo International Organization of the Securities Commissions - IOSCO, cujos resultados estão previstos para 1998. Gazeta Mercantil (1997). . Dessa forma haveria tão somente um balanço de empresa nacional, escrito em inglês e registrado em dólares. mas ainda assim brasileiro, não pelo fato de a firma ser de controle nacional ou por estarsediada aqui, e sim por seguir os Princípios Contábeis Aplicados no Brasil e a contabilidade societária pertinente. Portanto, coligir informações a fim de cotejar desempenho de diferentes empresas que adotam práticas contábeis distintas pode levar a resultados enganosos em sua essência4. 4 As traduções e/ou conversões de moeda freqüentemente dão a impressão ao leitos estrangeiro de que os princípios contábeis adjacentes às demonstrações convenientes foram também convertidos. Se este não for o caso, os resultados prováveis são conclusões equivocadas. "CHOI & MUELLER (1992, p.319)".

No Brasil. alguns estudos pioneiros5 5 Por exemplo: FIPECAFI (1998); BURAKOWSKI (1998, p.153-165); MARTINS (1995); YAMAMOTO (1997); FONTES (1997, p.26-37); SOUZA (1995). foram feitos tratando de temas como: as diferenças entre os Princípios Contábeis Geralmente Aceitos no Brasil e nos EUA (US GAAP). as vantagens e desvantagens de um em relação ao outro, a internacionalização dos mercados, a captação derecursos no exterior, as diferenças de divulgação (disclosure), a evolução do disclosure no Brasil após a chegada dos investidores estrangeiros. etc.

Diferentemente, o presente trabalho abordara a divulgação, a transparência: enfim, o disclosure das empresas brasileiras nos mercados brasileiro e norte-americano.

História do Disclosure

Há muito tempo debate-se sobre a importância. a legalidade. alegitimidade. a conveniência e o sigilo das informações contábeis de uma entidade. Sabe-se que o interesse por tais informações não é exclusividade apenas de seu proprietário desde que os governos informações, nos começaram a tributar essas empresas com base no registro de suas atividades. A medida que a atividade mercantil evoluía, novos usuários das informações contábeis apareciam: credores. dirigentes não-proprietários, acionistas, trabalhadores. etc.

As companhias abertas, empresas que emitem valores mobiliários como ações ou debêntures. sempre estiveram na vanguarda da divulgação de informações. pois alem dos usuários das demais, estas empresas estão submetidas aos olhos dos acionistas investidores, que por se tratar também de uma modalidade de economia popular, mereceu uma atenção extra das autoridades. Em um exame dos trabalhos publicados a respeito do assunto conduzido por Choi & Mueller6 6 CHOI & MUELLER (1992, p.301-306) . foram observadas quatro categorias de influência no disclosure praticados: o ambiente em que a empresa esta inserida (estagio de desenvolvimento econômico do pais-sede. historia colonial, etc.(. o mercado de capitais (competição porrecursos de menor custo). influências não-financeiras como os slndicatos). e a resposta corporativa as demandas por maior transparência.

Como na maioria das ciências. a Contabilidade evoluiu também em saltos provocados por grandes crises ou dilemas7. 7 - Atualmente, por exemplo, em meio a crise financeira que assola o extremo oriente, questiona-se o disclosure e as práticas contábeis dos bancos japoneses e sul-coreanos. Este dilema veio a tona com o crash (queda abrupta) da Bolsa de Nova lorque em 1929 e questionava o seguinte: seriam as demonstrações contábeis confiáveis? A partir dai. o relacionamento empresa-governo-mercado nunca mais foi o mesmo. dando origem a importantes medidas adotadas em prol do mercado de capitais local. Dentre estas medidas, que expressam a filosofia que investidores norte-americanos estão melhor protegidos por um full e fair disclosure dos negócios de uma companhia"8 8 CHOI & MUELLER (1992, p., 307) devem ser ressaltados:

Securities Act 33 - regulamentou a oferta inicial de ações (1933):

Securities Exchange Act - criou a Comissão de Valores Mobiliários Norte-americana - SEC (1934)

ampliado pela emenda que regulamentou o mercado de balcão: (1964);

Bankruptcy Reform Act - instituiu a SEC como consultora das cortes federais (1978). ampliado pela decisão de aceitar a teoria de Mercados Eficientes: 1988).

No Brasil. no bojo das atuais discussões sobre a reformulação da legislação societária. o histórico é mais recente e pode ser resumido da seguinte forma:

- Lei nº. 4.728- mercado de capitais (1 965);

- Resolução CMN nº33 e Decreto-lei que regulamentam o fundo 157 de investimento em ações (1966):

- Decreto-lei nº1.401 - criou as sociedades de investimento de capital estrangeiro 1,975. posteriormente ampliadas pelas Resoluções CMN ni 1 .289/87 e nº1 .460/88);

- Lei nº 6.404- sociedades anônimas (1 976);

- Políticas de Divulgação de Informações - CVM (1979, posteriormente ampliadas pelo Voto CMN

nº426/78 e Pareceres de Orientação CVM nº24/92 e 29/96);

- Anexo IV da Resolução CMN nº 1 .289 - investimento estrangeiro direto em bolsas Isento de tributação (1.991).

Características do Disclosure

Vários autores e entidades. de diferentes nacionalidades. debruçaram-se em estudos a fim de tratar do tema disclosure, inclusive instituições como AICPA (American Institute of Certified Public Accountants-Instituto Americano de Contadores PúbIcos Certificados)IASC (International Accounting Standards Committee- Comissão de Normas Internacionais de Contabilidade), FASB(Financial Accounting Standards Board- Conselho de Padrões de Contabilidade Financeira) e IBRACON (Instituto Brasileiro de Contadores). Sintetizando muitas destas definições, Souza9 9 Souza (1995, p.1) descreveu disclosure como a divulgação deliberada de informação da empresa para o mercado, seja quantitativa ou qualitativa, requerida ou voluntária, via canais formais ou informais".

A divulgação de informações, por sua vez. não precisa ser necessariamente legal ou formal (enforced), pode ser voluntária ou informal (voluntaty), isto é, "que excedam o requerido"10. 10 Radebaugh & Gray, (1997, p.488) O fundamental e que as informações sejam as mesmas para todos., a fim de que sejamevitadas praticas condenáveis de acesso as informações privilegiadas (lnside mnformation).

Para Radebaugh & Gray, uma importante motivação para a divulgação voluntária de informações pelas multinacionais é o Relatório Anual, pois fornece a oportunidade para comunicar mais informações de orientação futura sobre planos de ação da corporação. Isto pode melhorinformar ou influenciar investidores no, cada vez mais, globalizado mercado de títulos"11 11 Radebaugh & Gray (1997, p.485). Na opinião de CHOI % MURLLER (1992, p.312), "as empresas freqüentemente excederão Disclosure mínimo requerido se elas sentirem que isto diminuirá seus custos de capital ou as capacitarão a ficar lado a lado com as práticas competitivas de disclosure". O estudo de BARRETT, apudHENDRIKSEN (1991, P.859), CONCLUIU QUE "HÁVIA EVIDÊNCIA de uma relação entre a extensão e a qualidade do Disclosure financeiro e o grau de eficiência dos mercados de capitais nacionais"". Em outro estudo citado por HENDRIKSEN (1991, p.849) CHOI constatou que "havia evidência de uma relação direta entre o disclosure financeiro aperfeiçoado e a entrada <das empresas> no mercado de capitais internacional". .

MESMO QUANDO RECONHECEM

IMPORTÂNCIA DA DIVULGAÇÃO E

TRANSPARÊNCIA DE INFORMAÇÕES,

ALGUNS DIRIGENTES E/OU

CONTROLADORES ESTÃO EM

PERMANENTE CONFLITO COM OS

ANALISTAS DE MERCADO, POIS MUITOS

DOS DADOS SOLICITADOS PELOS

ÚLTIMOS SÃO CONSIDERADOS

ESTRATÉGICOS...

Prodhan, apud Choi & Mueller12 12 Também conhecido como risco conjuntural, o oposto de risco próprio de um ativo. revelou que "empresas que fornecem disclosure por segmento geográfico. experimentam redução em seu risco sistemático'"13 13 13HENDRIKSEN (1991, p.860) .

Em outros estudos analisados por Hendriksen14 14 RADEBAUGH & GRAY (1997, p.488-489) , encontrou-se indícios de que. sem a pressão dos governos ou de contadores, as empresas relutam em aumentar sua transparência, sob os argumentos de que o disclosure ajudará os concorrentes, aumentará o poder de barganha dos sindicatos, confundirá (ao invés de esclarecer) os investidores (dada sua complexidade). tem motivação limitada pela falta de conhecimento das necessidades dos investidores, elevará os custos de divulgação.

Por sinal, os benefícios de uma redução do custo de captação serão confrontados contra os custos de provimento de informações e possíveis desvantagens de se revelar dados estratégicos aos concorrentes, conforme sintetizados na figura elaborada por Radebaugh & Gray15

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Com relação às formas ou métodos de divulgação, estes não se resumem às demonstrações financeiras (Balanço Patrimonial,Demonstração do Resultado, Origens e Aplicação de Recursos, Fluxo de Caixa, Mutações do Patrimônio Liquido, Demonstração do Valor Adicionado, etc.) ao contrário, relevantes informações podem ser disseminadas através do Relatório da Administração, em notas explicativas, em boletins, press-releases, reuniões com analistas demercado/acionistas, etc. Também não se limitam apenas às informações financeiras (índices de liquidez, retorno, endividamento. etc.) como categorizadas pelo estudo de Meek et alii. citado por Radebaugh & Gray16. informações classificadas como estratégicas (histórico, objetivo e missões, projeções...) e como não-financeiras (política social, valor adicionado entre outros são igualmente desejáveis. Mais importante que o método de divulgação, é a decisão acerca do que se deve divulgar e sua tempestividade/oportunidade).

Obviamente, a ponderação ou a importância atribuída a cada um dos tens apresentados por uma companhia e distinta por tipo de usuário. Os sindicatos podem estar mais atentos ao investimento em treinamento e participações no lucro, enquanto que a Receita Federal certamente se preocupará com o imposto de renda a pagar, os investidores com as projeções no lucro17, os acionistas com seus dividendos e estratégias de crescimento. a comunidade com os benefícios sociais, os ecologistas com programas de combate à poluição, e assim por diante.

Mesmo quando reconhecem a importância da divulgação e transparência de informações, alguns dirigentes e/ou controladores estão em permanente conflito com os analistas de mercado, pois muitos dos dados solicitados pelos últimos são considerados estratégicos e quepodem expor aos concorrentes pontos fracos das companhias.

Diferentes empresas praticam diferentes níveis de disclosure. Do básico ou mínimo legal àquelas que enviam espontaneamente boletins ricos em informações a seus acionistas e promovem reuniões com os mesmos, com analistas e com a imprensa a fim de discutir o desempenho passado e perspectivas futuras. Importante notar, que as chamadas "peças contábeis" são parte de um todo muito mais amplo, como mostra a tabela a seguir.

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Assim, os analistas de mercado cobram políticas de full disclosure19 porparte das empresas a fim de realizar melhor seu trabalho e minimizar o risco de manipulação com ações por parte de algum insider (pessoas comacesso a informações privilegiadas); e por sua vez, as empresas- em nome de seu legitimo direito a preservação de seus negócios- parecem em alguns casos adotar um adequate dissclosure com muitos dados além do formalmente exigido, mas que na prática revelam-se de pouca utilidade.

TRATAMENTOS DAS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS PARA APRESENTAÇÃO NO EXTERIOR E CASOS SELECIONADOS

Quando uma companhia brasileira resolve colocar em pauta a hipótese de angariar recursos no exterior deve, inicialmente, ponderar os benefícios de acessar o mercado internacional de capitais com seu menor custo de captação, contra os custos de elaboração e divulgação de informações e exposição de possíveis pontos fracos.

Ao decidir ir adiante com seu programa de captação, a empresa terá que divulgar suas demonstrações contábeis conforme uma das seguintes maneiras:

- Conversão - apresentação convertida em dólares de acordo com os princípios contábeis brasileiros:

- Adaptação - divulgação em reais conforme os princípios contábeis norte-americanos:

- tradução - completa conversão, tanto da moeda (dólares) quanto dos princípios contábeis (norte-americanos).

Para dar prosseguimento a este estudo exploratório, (que sequer publicam alguma coisa) que porventura tenham tido suas demonstrações apresentadas a investidores estrangeiros, simplesmente porque não há comparação a ser feita.

Optou-se por selecionar empresas brasileiras de capital abertocom ADRs negociadas nos EUA a fim de se cotejar se os níveis de disclosure são equivalentes, elidindo-se as diferenças de práticas contábeis. Para tanto, destacou-se um elenco de itens a serem comparados. São eles:

a) Balanço Patrimonial, Demonstração do Resultado do Exercício, Demonstração das Mutações do Patrimônio Liquido e eventualmente Fluxo de Caixa e Demonstração de Valor Adicionado

-número de exercícios;

b) Estoques - composição e número de exercícios;

c) Empréstimos e Financiamento - composição. maturação, taxas e número de exercícios;

d) IRCS - alíquotas, acréscimos/decréscimos da base de cálculo e número de exercícios;

e) Planos de Previdência - resumos, contribuições, efeitos no Balanço e Resultado e número de exercícios;

f) Contingências - trabalhistas, tributárias, ambientais, antitruste e número de exercícios;

g) Partes Relacionadas - impactos no Balanço e Resultado e número de exercícios.

As fontes de informações foram os balanços publicados (incluindo aqueles obrigatoriamente apresentados às bolsas e à CVM), relatórios anuais, boletins, materiais distribuídos em reuniões com analistas e na lnternet.

Apesar de feita a comparação pura e simples entre itens, desconsiderando-se as diferenças de fundamentos. Utilizou-se o disclosure checklist do Wiley GAAP 97 e os Pareceres de Orientação CVM nº 24/92 e 29/96, bem como os antecessores Pareceres, Instruções, Deliberações e Lei das S/As.

Visto que o acesso às demonstrações apresentadas no exterior revelou-se tarefa quase "hercúlea", a amostra foi restrita àqueles casos em que revelou-se mais oportuno (o que não significa que uma empresa não estudada não tenha disponibilizado seu material). Os resultados estão apresentados a seguir.

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Nota:

A empresa distribuiu, ainda que de uma forma resumida se comparado com os EUA, o Fluxo de Caixa (não obrigatório) em reunião com analistas de mercado em São Paulo.

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Notas:

Nos casos em que as demonstrações contábeis brasileiras compreendem três exercícios, foram utilizadas as Demonstrações Financeiras Padronizadas - DFP divulgadas às bolsas de valores e CVM, pois não é prática as empresas brasileiras publicarem mais do que dois exercícios.

Com exceção da Aracruz, cujas ADRs são nível III, as demais são nível I.

Discussão

Por ser um estudo de casos de caráter exploratório, a amostra utilizada pode não ser estatisticamente representativa. Também não foram utilizadas técnicas do tipo análise de conteúdo (de mensagens) dos usuários. Procurou-se, no fundo, abrir novos horizontes de pesquisa.

Ressalte-se o fato de que não foram feitas comparações entre práticas contábeis, tampouco buscou-se justificativas para diferenças de valores. A preocupação deste estudo foi buscar indícios de que as empresas brasileiras tratam distintamente os mercados nacional e internacional; e paralelamente, discorrer sobre o conceito de disclosure e como ele vem sendo aplicado no Brasil.

Conforme o material utilizado, apesar dos significativos avanços que a experiência ajuda a observar (vide os exemplos de Fluxo de Caixa e compare com alguns anos atrás), nota-se que a balança ainda pende a favor dos estrangeiros20 20 será igualmente interessante comparar no futuro as demonstrações financeiras de empresas estrangeiras divulgados no exterior e no Brasil. Isto será possível graças a versão "Tupiniquim" dos ADRs.ou seja, os BDRs Brazillian Depositary Receipts já aprovados pela CVM. . Um indicativo é a relativamente fácil tarefa de encontrar algum dirigente de empresa brasileira que pretende captar no mercado internacional, reclamar das exigências de informações requeridas para tal. Outro possível indicativo desta diferença foi apresentado por Adhikarí e Tondkar. apud Radebaugh & Gray21 21 REDEBAUGH & GRAY (1997, p.486-488). , na forma de um ranking onde o Brasil ocupa a 19ª e 18ª colocação (dentre 35 bolsas de valores) em nível de disclosure ponderado e não - ponderado respectivamente, enquanto que a Bolsa de Nova lorque encabeça ambas as listas.

Não cabe aqui julgar o comportamento dos administradores, nem é este o escopo do estudo, mas argumentos como o de Bessan22 22 Em entrevista á Gazeta Mercantil, Marcelo Bessan destacou a diferença de mentalidade do contador brasileiro (mais burocrático) em relação ao norte-americano (mais dinâmico) de forma a explicar a falta de transparência das companhias brasileiras. Tanto a observação dos Princípios Contábeis, como a legislação e a preocupação com vários usuários devem fazer parte do perfil de um bom contador. não são válidos para os casos analisados, uma vez que, apesar de auxiliados, os contadores brasileiros foram capazes de apresentar demonstrações contábeis equivalentes (ou sela, tão completo quanto os de qualquer empresa listada na Bolsa de Nova lorque a seus usuários norte-americanos.

Queixas como as de Amaral Júnior & Rodriguez23 23 - AMARAL JUNIOR & RODRIGUEZ (1997). ou lzecson24 24 IZECSON (1997). ganham força em argumentação, embora os contra-argumentos das empresas mereçam reflexão. Com o mercado globalizado, a busca por custo de captação em níveis compatíveis com os competidores estrangeiros é cada vez mais condição imperativa para o sucesso de companhias brasileiras.

Se, por um lado, o risco de descontinuidade dos negócios de uma companhia é elevado, se reveladas todas as informações como querem os analistas de mercado, por outro lado parece no mínimo discriminatória a postura de algumas empresas (de capital aberto ou não) ao manterem diferentes níveis de disclosure. Afinal, se após refletir sobre a relação custo/benefício de uma maior transparência. uma empresa optou por uma divulgação mais ampla de informações em outros paises por que não fazê-lo também no Brasil, uma vez que o trabalho esta concluído e o risco assumido?

Conclusões

As próprias companhias colocaram uma pa de cal sobre argumentos contra a transparência quando, apesar de tudo, resolveram adotar um disclosure mais amplo nas demonstrações contábeis exibidas fora do pais. A solução deveria caminhar em dois sentidos. O primeiro com relação a disponibilizarão de informações. Mesmo publicando as demonstrações em jornais de grande circulação, as demonstrações aqui apresentadas não são mais transparentes que as divulgadas no exterior. Aliás, nos EUA, as empresas têm apenas de informar a Securitíes and Exchange Commission-SEC, qualquer divulgação mais ampla é de responsabilidade é interesse das empresas. Com o advento e popularização de sofisticados meios de comunicação, como a lnternet esta distância tende a diminuir.

Este estudo, por exemplo, teve acesso aqui do Brasil às informações disponibilizadas pelas empresas brasileiras no mercado norte-americano, provando ser esta uma alternativa factível. Ante as dificuldades domésticas atuais em telecomunicações, porém, seria de extrema utilidade a distribuição voluntária - e conforme as praticas contábeis brasileiras - de pormenores anteriormente só divulgados no exterior.

Em segundo lugar, o "cabo de guerra" entre analistas de mercado e empresas, ou entre full disclosure e adequate disclosure, talvez nunca termine, mas ao invés de discussões estéreis, a união de esforços de todas as partes envolvidas (analistas, empresas. minoritários. CVM. etc.). sem extremos, poderá produzir melhores resultados práticos como já é realidade na iniciativa do prêmio ANEFAC-FlPECAFl-BOVESPA25 25 ANEFAC - Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade FIPECAFI-Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras da FEA/USP. (que consagra a transparência entre outros aspectos). Focalizando sempre um fair disclosure, as companhias atenderão de forma equânime aos distintos usuários. os quais são diferentes nas necessidades, mas iguais e equivalentes no direito de acesso a informação.

O autor agradece às sugestões e comentários gentilmente feitos pelo Prof. Dr. Luiz Nelson G. Carvalho (FEA/USP) e por Vanuzia Rodrigues (FFLCH/USP), os quais contribuíram significativamente para este trabalho. Eventuais falhas são. contudo, de inteira responsabilidade

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  • BURAKOWSKI, Leonardo T. Comparação do US GAAP com Princípios contábeis brasileiros. Sétima Semana da Contabilidade do BC. Banco Central do Brasil: Rio de Janeiro, 1998, p.153-165.
  • CARTA CAPITAL. Vantagem para poucos. São Paulo: Carta editorial, nş.51, ano2. 25 jun. 1997, p.78-80.
  • CHOI, Frederick D.S.; MUELLER, Gerhard D International accountíng, 2.ed. Prentice Hall, 1992. p.299-362.
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  • ______Conversão de demonstrações contábeis em moeda estrangeira "FAS-52'. IOB - Informações Objetivas. Caderno Temática Contábil. São Paulo. n.30.31.32. jul.- ago. 1995.
  • ______Análise comparativa dos métodos "FAS-8" e "FAS-52" de Conversão de Demonstrações Contábeis em Moeda Estrangeira. 108 - Informações Objetivas. Caderno Temática Contábil. São Paulo. nş.35.36.37, age.- set.. 1995.
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  • SOUZA. Paulo R.E.B. Analise do atual estágio de disclosure das companhias abertas no mercado de capitais brasileiro o contribuições para seu aprimoramento. São Paulo. 1995. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Economia. Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo
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  • YAMAMOTO. Marina M. Como entender melhor as demonstrações financeiras. Revista ABAMEC - Mercado de Capitais. São Paulo, anoVII. n.69. jul.- ago.1997
  • 1
    As ADRs possuem quatro níveis, a saber: Regra nº144
    A (mercados primários e secundários via oferta privada, mercado de balcão ou registro no sistema de negociação eletrônica), nível I (mercado secundário e registro em balcão), nível II (mercado secundário e registro em bolsa) nível III (mercados primário e secundários via oferta publica e registro em bolsa). Para uma visão mais ampla, consulte CHOI & MUELLER (1992, p.307-312).
  • 2
    Um caso famoso trata-se do reconhecimento dos efeitos inflacionários nas demonstrações contábeis. A correção de tal distorção é reconhecida em apenas alguns países. Apesar de ainda aplicada no Brasil, foi oficialmente "extinta" pela Lei nº9.249/95.
  • 3
    O primeiro passo rumo a padronização dado pelo
    International Organization of the Securities Commissions - IOSCO, cujos resultados estão previstos para 1998. Gazeta Mercantil (1997).
  • 4
    As traduções e/ou conversões de moeda freqüentemente dão a impressão ao leitos estrangeiro de que os princípios contábeis adjacentes às demonstrações convenientes foram também convertidos. Se este não for o caso, os resultados prováveis são conclusões equivocadas. "CHOI & MUELLER (1992, p.319)".
  • 5
    Por exemplo: FIPECAFI (1998); BURAKOWSKI (1998, p.153-165); MARTINS (1995); YAMAMOTO (1997); FONTES (1997, p.26-37); SOUZA (1995).
  • 6
    CHOI & MUELLER (1992, p.301-306)
  • 7
    - Atualmente, por exemplo, em meio a crise financeira que assola o extremo oriente, questiona-se o disclosure e as práticas contábeis dos bancos japoneses e sul-coreanos.
  • 8
    CHOI & MUELLER (1992, p., 307)
  • 9
    Souza (1995, p.1)
  • 10
    Radebaugh & Gray, (1997, p.488)
  • 11
    Radebaugh & Gray (1997, p.485). Na opinião de CHOI % MURLLER (1992, p.312), "as empresas freqüentemente excederão Disclosure mínimo requerido se elas sentirem que isto diminuirá seus custos de capital ou as capacitarão a ficar lado a lado com as práticas competitivas de
    disclosure". O estudo de BARRETT, apudHENDRIKSEN (1991, P.859), CONCLUIU QUE "HÁVIA EVIDÊNCIA de uma relação entre a extensão e a qualidade do
    Disclosure financeiro e o grau de eficiência dos mercados de capitais nacionais"". Em outro estudo citado por HENDRIKSEN (1991, p.849) CHOI constatou que "havia evidência de uma relação direta entre o
    disclosure financeiro aperfeiçoado e a entrada <das empresas> no mercado de capitais internacional".
  • 12
    Também conhecido como risco conjuntural, o oposto de risco próprio de um ativo.
  • 13
    13HENDRIKSEN (1991, p.860)
  • 14
    RADEBAUGH & GRAY (1997, p.488-489)
  • 20
    será igualmente interessante comparar no futuro as demonstrações financeiras de empresas estrangeiras divulgados no exterior e no Brasil. Isto será possível graças a versão "Tupiniquim" dos ADRs.ou seja, os BDRs Brazillian Depositary Receipts já aprovados pela CVM.
  • 21
    REDEBAUGH & GRAY (1997, p.486-488).
  • 22
    Em entrevista á Gazeta Mercantil, Marcelo Bessan destacou a diferença de mentalidade do contador brasileiro (mais burocrático) em relação ao norte-americano (mais dinâmico) de forma a explicar a falta de transparência das companhias brasileiras. Tanto a observação dos Princípios Contábeis, como a legislação e a preocupação com vários usuários devem fazer parte do perfil de um bom contador.
  • 23
    - AMARAL JUNIOR & RODRIGUEZ (1997).
  • 24
    IZECSON (1997).
  • 25
    ANEFAC - Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade FIPECAFI-Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras da FEA/USP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Out 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 1999
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